Acórdão nº 0855/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Novembro de 2012

Data06 Novembro 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A……… A/S (“A………), com os sinais dos autos, interpõe recurso de revista excepcional, ao abrigo do artº150º do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido a fls. 705 e segs. dos autos, que negou provimento ao recurso interposto da sentença de 1ª Instância, que lhe indeferiu o pedido de suspensão de eficácia dos actos de aprovação dos preços de venda ao público ( PVP) de medicamentos com a substância activa Escitalopram.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A. O presente recurso tem efeito suspensivo nos termos do disposto nº1 do artº143º do CPTA.

B. O presente recurso deverá ser admitido na medida em que as questões levantadas pela Recorrente no âmbito do presente recurso de revista assumem não só especial relevância jurídica, mas também conduzirão indubitavelmente a uma melhor aplicação do direito – cf. Acórdãos do presente Alto Tribunal de 9.5.2012 (proc.0387/12, 0390/12, 0391/12, 033/12 e 385/12).

C. As questões que a Recorrente pretende ver tratadas por este Tribunal implicam operações exegéticas de alguma dificuldade, motivadas desde logo pela interpretação e aplicação de algumas disposições pouco claras e ambíguas da recente Lei nº62/2011, de 12 de Dezembro, diploma que suscita dificuldades pelo carácter genérico da sua formulação e pela novidade que veio introduzir no nosso ordenamento jurídico.

D. Ainda que se considerasse que o presente recurso não assume uma especial relevância jurídica, sempre teria de ser admitido por ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito por estarmos perante um confronto entre os direitos de propriedade industrial e os limites de actuação das autoridades administrativas, adstritas ao cumprimento do princípio da legalidade, maxime constitucional, no exercício dos poderes que lhe são conferidos.

E. A entrada em vigor da Lei nº62/2011 envolve a aplicação de princípios e normas consagrados supranacionalmente, designadamente de âmbito comunitário, a que o Estado Português e, por maioria de razão, os seus tribunais, se encontram vinculados e devem obediência e por cujo cumprimento são legalmente responsáveis. Por essa razão, merecem ser apreciadas por este Supremo Tribunal.

F. Além disso e na medida em que estamos em face de uma decisão que a lei qualifica como recorrível, ao admitir que dela se interponha um recurso ordinário para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artº150º do CPTA e nos termos do artº668º do CPC, o presente recurso deve ser admitido para apreciação da nulidade de que padece o Acórdão recorrido.

G. A Lei nº62/2011 não tem qualquer relevância para a análise da verificação do requisito do fumus boni iuris ou do fumus non malus iuris, requisitos para a concessão da presente providência, pelo que não deveria ter sido aplicada pelo Tribunal a quo ao caso vertente, por carência dos pressupostos para a sua aplicação.

H. As disposições constantes do artigo 8.º, n.º 1, 2, 3 e 4 da Lei nº62/2011, são insusceptíveis de obstarem à procedência da acção principal, ou seja, à declaração de invalidade ou invalidação dos actos impugnados ou à declaração da sua ineficácia, até ao termo dos direitos de propriedade industrial da Requerente e, consequentemente também não poderão obstar à procedência do presente processo cautelar.

I. Tendo o tribunal a quo entendido que as normas constantes do artigo 8º, nº1, 2, 3 e 4 da Lei nº62/2011, contêm uma proibição absoluta de que o MEE/DGAE tomem conhecimento, no quadro do procedimento de aprovação de PVP, da existência de violação de patente por parte do medicamento objecto desse procedimento, ou os obriguem a deferir os respectivos requerimentos de aprovação de PVPs para tais medicamentos, tais disposições seriam materialmente inconstitucionais por violação, nomeadamente, dos artigos 17º, 18º, 62º, nº1 e 266º da Constituição da República Portuguesa, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.

J. A norma do artigo 9.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 é, também, inconstitucional pois que, ao atribuir natureza interpretativa às normas da mesma Lei, procura o objectivo de lhes atribuir efeito retroactivo, com vista a atingir situações criadas ao abrigo de leis pré-existentes, como é o caso do acto de concessão de AIM e de PVP aqui em crise.

K. Tal desiderato não pode, neste caso, ser atingido sem violação da Constituição, que, no seu artigo 18.º, n.º 3, proíbe a atribuição de efeito retroactivo a normas restritivas de direitos, liberdades e garantias.

L. Uma vez que o tribunal a quo aplicou as referidas normas no caso vertente com base no artigo 9º, nº1 da Lei nº62/2011, tal interpretação ( e aplicação) é inconstitucional por introduzir uma restrição retroactiva de um direito fundamental, violando-se o artº18º, nº3 da Constituição, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.

M. A alteração legislativa implementada pela Lei nº62/2011 não alterou os termos da avaliação do pedido da Autora, ora Recorrente, na acção principal da qual estes autos são dependentes.

N. Com efeito, os pedidos formulados na acção principal fundamentam-se, além do mais, na circunstância de a aprovação de PVP ter por objecto mediato uma actividade – a comercialização dos Genéricos pelas Contra-interessadas – violadora dos direitos de patente da Requerente, ora Recorrente, que constituem um direito fundamental de natureza análoga à dos “ direitos, liberdades e garantias”, beneficiando, assim, do regime constitucional que a estes é aplicável conforme resulta do artigo 17º da Constituição, considerada pela lei como um crime.

O. Nessa acção não se defende que a aprovação de PVP em causa seja, per se, violadores dos direitos de patente invocados pela ora Recorrente.

P. Com efeito, invocou a Recorrente na acção principal a nulidade dos actos de concessão de AIM destes autos com base nos dispositivos dos artº133º, nº2, alíneas c) e d) do artigo 135º, ambos do Código de Procedimento Administrativo (“CPA”), por tais actos serem violadores do conteúdo essencial do seu direito fundamental emergente da patente e certificado complementar de protecção dos autos e porque a actividade por eles licenciada é uma actividade criminosa, punida como tal pelo artigo 321º do Código de Propriedade Industrial.

Q. Mais invocou que o mesmo acto era inválido, nos termos do art.º 135.º do Código de Procedimento Administrativo, por ter como única finalidade a de permitir uma prática comercial ofensiva de vinculações que para o Estado derivam dos efeitos que a lei atribui a um acto administrativo...

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