Acórdão nº 053/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Julho de 2012

Data05 Julho 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – O Município de Braga, vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de 28 de Novembro de 2011, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações adicionais de imposto sobre o valor Acrescentado nos montantes de € 87.810,41 e de € 5.489.946,01, relativas aos 3º e 4º trimestre de 2004.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. Na sequência da presente Impugnação Judicial, e tendo constatado o erro, a AF, por despacho do Substituto legal do Director-Geral, de 10.11.2008, mandou anular na totalidade a liquidação adicional de IVA nº. 08119058 e parcialmente a Liquidação Adicional de IVA n.º 08119056, seguindo apenas esta última pelo valor residual de € 71.699,13 (se bem que não se entende minimamente o porque deste valor).

  1. Na contestação, o Representante da Fazenda Publica, no ponto 114, reconhece que foram anuladas as liquidações, juntando o Anexo B com o despacho de anulação das referidas liquidações, mas de forma algo incompreensível, não requer a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto à liquidação 08119058 e alteração do montante liquidado quanto à liquidação 08119056.

  2. Na douta decisão, nada é dito na matéria de facto quanto à anulação das liquidações, (anulação total da primeira e parcial da segunda) e, consequentemente, não se ordene como deveria, a extinção da instância quanto à liquidação 08119058 e correcção do valor da liquidação 08119056.

  3. Trata-se assim, de matéria que deveria ter sido conhecida na douta decisão recorrida, com influência decisiva na fundamentação e na decisão final.

    V Pelo exposto a douta decisão é nula, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 668, nº 1, al. d) do CPC.

  4. Resulta dos princípio e normas subjacentes às decisões jurisprudenciais do TJUE invocadas nas presentes alegações, que o Município de Braga, ao ceder, através do contrato em apreço, o Novo Estádio Municipal (que é um bem do seu domínio privado), com o intuito de o rentabilizar (entenda-se, receber receitas pela cedência e não ter que suportar os encargos decorrentes da sua gestão corrente), para o A…… organizar jogos de futebol profissional (atividade lucrativa), operou uma “atividade económica”, agindo como um verdadeiro sujeito passivo de IVA, para efeitos do artigo 9º da Diretiva IVA.

  5. O que define um ato como “ato de autoridade pública” é o ato em si, os seus pressupostos e efeitos jurídicos, o facto de o mesmo ter sido praticado no âmbito do ius imperii próprio dos poderes de autoridade, e não causas extrínsecas ou estranhas ao ato, como se pretende na decisão recorrida.

  6. O facto do Município de Braga ter atribuições na área do planeamento desportivo, construção e gestão de infraestruturas desportivas apenas legitima, do ponto de vista do princípio da legalidade, a construção e gestão do Novo Estádio Municipal, mas não qualifica automaticamente — como se pretende na decisão recorrida - como ato de gestão pública o contrato em análise.

  7. O contrato em apreço foi celebrado por razões de racionalização económica (razões de gestão em sentido estrito), de cedência de um bem do domínio privado do Município, sob pagamento de uma renda e assunção, pelo clube contratante, dos custos da gestão corrente do bem, tratando-se, por isso, de um ato de comércio, próprio do direito privado.

  8. Clubes de futebol, associações, autarquias têm um verdadeiro mercado de troca (alugueres) de campos de futebol de onze, sendo que o próprio A…… aluga campos e estádios a outros clubes do concelho para jogos e treinos, a autarquia de Braga possui mais dois campos (estádios) que aluga e cede gratuitamente a clubes do concelho. Ou seja, ao contrário do que se afirma na decisão recorrida, existe um verdadeiro mercado para a prestação dos serviços em causa, isto é, para a cedência de campos e estádios de futebol.

  9. O artigo 63º do CPPT é uma norma de direito processual, pelo que a argumentação constante da decisão recorrida não pode convencer. Na verdade, a Diretiva IVA preceitua sobre normas e princípios relativos a incidência, isenção, matéria colectável e outras matérias de direito substantivo, isto é, não dispõe sobre questões processuais, tais como prazo de prescrição, de caducidade, formalismos inspectivos, exercício do contraditório, etc.

  10. Entender-se que o artigo 63º, ao exigir um procedimento próprio, para a aplicação de disposições anti-abuso, restringe a aplicação das normas e princípios da Diretiva IVA é o mesmo que entender que o artigo 45º da LGT, ao impor um prazo de caducidade na liquidação do IVA, restringe e limita a aplicação do direito comunitário relativo a este imposto, já que, como se referiu, a Diretiva IVA não contém normas sobre caducidade, prescrição, exercício do contraditório, etc., mas sim normas e princípios de direito substantivo (incidências, isenções, matéria colectável, conceitos, etc…).

  11. Não tendo a Administração Fiscal seguido o procedimento previsto no artigo 63º do CPPT, os atos de liquidação e atos de correcção posteriores fundamentados no relatório da inspecção fiscal (aberto para além dos 3 anos após a cláusula alegadamente abusiva) são ilegais e devem ser anulados.

  12. O conceito de prática abusiva decorrente da jurisprudência do TJCE, em especial no Ac. Halifax, transporta consigo, indisputadamente, um abuso de formas na medida em que o juízo de abuso (ou a sua hipótese) emana de um complexo de operações motivado exclusivamente por razões fiscais. Quer dizer, não fora a perseguição de vantagens fiscais, não se estaria perante um complexo de operações.

  13. Esta conclusão sai ainda reforçada pela circunstância de o Tribunal sempre afastar do conceito de práticas abusivas o exercício de uma opção fiscal que, para além de ser legitima, nos coloca no plano das alternativas do contribuinte entre uma operação ou outra, por oposição a um complexo de operações.

  14. Para melhor se ilustrar esta ideia, bastará que atentemos no seguinte exemplo: não há dúvidas de que uma renúncia à isenção, tal como prevista entre nós no art.º 12. do Código do IVA, não constitui uma prática abusiva, mas antes o exercício legítimo da chamada “opção fiscal” ou do exercício de um “direito de escolha de natureza fiscal”. Não obstante, tal opção pode comportar por um lado, a obtenção de um benefício fiscal que gere um desequilíbrio na neutralidade do imposto (na medida em que o imposto a cuja dedução se tem direito pode ser muitíssimo superior ao imposto a gerar na actividade tributada) e, por outro lado, é óbvio que existe uma inequívoca motivação fiscal na escolha empreendida pelo contribuinte. Ora aqui seria incompreensível uma qualquer “censura” — o legislador assim mesmo o quis.

  15. Com efeito, nestas circunstâncias, o TJCE não tem qualquer pejo em afirmar que não está em causa uma prática abusiva. E, sublinhe-se, pode dar-se o caso de o desequilíbrio entre o imposto legitimamente deduzido e o imposto gerado na actividade tributada ser drástico, o que é já suficiente para afastarmos a ideia de que “o desequilíbrio na neutralidade do imposto” radica exclusiva e forçosamente nesta estrita relação financeira ou economicista.

  16. Questão diversa é aquela, como a que o Tribunal enfrentou no Ac. Halifax, em que em lugar de um contrato de empreitada para a construção de quatro call centers, entre duas entidades, se celebram mais de 30 contratos em menos de 6 meses, envolvendo mais de 5 entidades. É a diferença entre uma operação (que teria, desde logo, as suas alternativas legítimas, inclusivamente de natureza fiscal) e um complexo de...

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