Acórdão nº 0420/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução05 de Junho de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A…… LDA., com melhor identificação nos autos, veio interpor recurso para uniformização de jurisprudência, nos termos do art. 152º do CPTA, do acórdão do TCA Sul de 12.1.2012, que decidiu não conhecer do recurso jurisdicional interposto da decisão proferida, com a invocação do art. 27º, n.º 1, alínea i), do CPTA, pelo TAF de Almada, de 5.8.2011 – por ter entendido que o meio próprio de reacção era a reclamação para a conferência, nos termos do n.º 2, e não o recurso - que julgou improcedente a acção de contencioso pré-contratual que propôs contra o MUNICÍPIO DE ALMADA, e em que figura como Contra-interessada a B…… LDA.

Indicou como fundamento o acórdão proferido pelo TCA Sul no Processo 6360/10, de 14.7.2010, que constitui o Acórdão Fundamento.

Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: A) No presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência vem impugnado o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul (2° Juízo, 1ª Secção), no âmbito do Proc. n.° 08262/11, datado de 12.01.2012, pelo qual se considerou não ser de conhecer do recurso jurisdicional interposto pela ora Recorrente contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada de 05.08.2011, no âmbito do Proc. n.° 214/11.8BEALM; B) Foi posição expressa no Acórdão Impugnado que não obstante o Tribunal designar essa decisão como uma sentença, a mesma era insusceptível de recurso, já que proferida por juiz singular (relator) com invocação da alínea i) do n.° 1 do art. 27° CPTA, com o que era obrigatório o uso da reclamação para a conferência, sendo irrelevante a qualificação que o tribunal emissor da decisão dá à mesma, mais considerando que sob o termo “despacho” constante do n.° 2 do art. 27.° CPTA também se integram por interpretação extensiva as “sentenças”; C) Com fundamento no art. 152°, n.° 1, alínea a), a Recorrente invoca a oposição de julgados do exposto nesse Acórdão Impugnado, com o previamente fixado sobre a mesma matéria pelo Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (1ª Secção, 2° Juízo) proferido no âmbito do Proc. n.° 6360/10, de 14.07.2010, que constitui o Acórdão Fundamento nesta matéria; D) Neste aresto (Acórdão Fundamento) fixou-se que, ainda que a decisão final seja praticada por juiz singular, tratando-se de decisão qualificada e apelidada de “sentença” e com tal conteúdo, o meio jurisdicional de reacção é o recurso jurisdicional, como desenvolvido pela ora Recorrente, não relevando a aplicação do n.° 2 do art. 27.° CPTA aos actos praticados ao abrigo da alínea i) do n.° 1 do art. 27.° CPTA neste contexto; E) A admissão do Recurso para Uniformização de Jurisprudência obedece à verificação de requisitos: existe uma contradição entre o sentido expresso pelo Tribunal Central Administrativo Sul no Acórdão fundamento e o sentido expresso no posterior Acórdão impugnado. Esta contradição emerge dos próprios termos da decisão em ambos os Acórdãos. Ambos os Acórdãos se acham estabilizados na ordem jurídica por trânsito em julgado. Sobre esta matéria em específico não existe jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo recente. Existe ainda identidade na questão fundamental a ser definida por uniformização de jurisprudência; F) O Tribunal a quo estribou-se na alínea i) do n.° 1 do art. 27.° do CPTA para invocar a simplicidade da questão, a fim de a sentença ser proferida por juiz singular - aqui entendido como relator por força do art. 92.°, n.° 1 CPTA. A alínea i) do n.° 1 do art. 27.° do CPTA menciona que os poderes conferidos ao relator por seu intermédio são os de “proferir decisão quando entenda que a questão a decidir é simples (...)”; G) No confronto da expressão “proferir decisão” constante da alínea i) do n.° 1 do art. 27.° CPTA, com a norma contida no n.° 2 do art. 27.° CPTA - norma que se entendeu no despacho em resposta obstar ao recurso jurisdicional - notamos o uso deliberado pelo legislador de diferentes expressões para designar actos de decisão jurisdicional (numa usa-se a expressão vaga “decisão” - alínea i) do n.° 1, na outra a acepção concreta de “despachos” - n.° 2). Tal não existia na legislação anterior. O n.° 2 do art. 27.° do CPTA obriga a submeter a conferência os “despachos do relator”.

  1. Distintamente dos despachos, as sentenças proferidas por tribunais (actos que também quadram o conceito de “decisão”), tal como os acórdãos, são qualificados pelos tribunais e esperados pelas partes destinatárias como actos finais, conclusivos e que conhecem do mérito da causa, contra os quais apenas a apelação é meio adequado para sua reversão; I) É uma aplicação inconstitucional do n.° 2 do art. 27.° CPTA e da alínea i) do n.° 1 do art. 27.° CPTA, aplicar os mesmos no sentido de considerar que apesar de um Tribunal apelidar certo acto seu de sentença e essa ser uma decisão de mérito que remete para um regime de recurso jurisdicional, entender um Tribunal superior que a qualificação dada não estava, afinal, correcta e que como tal, as reacções jurisdicionais dessas não se poderiam ter conformado com essa qualificação que os próprios tribunais haviam dado.

  2. Esse entendimento atenta, designadamente, contra os princípios do Estado de Direito Democrático (art. 2.° CRP) e seus corolários ao nível dos princípios derivados de confiança e estabilidade e aceso ao direito e justiça (art. 20.° CRP), já que a confiança das partes processuais se vê posta em causa perante quaisquer decisões jurisdicionais, já que deixam de poder confiar na qualificação que os tribunais - órgãos de soberania com competência para administrar a justiça - fazem dos seus próprios actos; K) Nada se refere no n.° 2 do art. 27.° CPTA quanto à obrigação de actos que seja sentenças serem submetidos a conferência pela via da reclamação, o que se terá de assumir ter significado e ser opção legislativa ponderada; L) Não procede...

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