Acórdão nº 0303/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Outubro de 2012

Data23 Outubro 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório 1.1. ERC – ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL recorre para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150.º do CPTA, do acórdão do TCA Sul, de 07 de Dezembro de 2011, que confirmou «a decisão de 1.ª instância de anular a sua deliberação de 22.02.2007 pela qual considerou deficiente a publicação de um texto de resposta a uma notícia no Jornal ……… e ordenou nova publicação nos termos que delineou como adequados».

1.2. No recurso da referida decisão, a Recorrente – ERC – formulou as seguintes conclusões (quanto ao mérito): «(…) Y) Não pode deixar de ser refutado veementemente o entendimento do tribunal a quo de que o direito de resposta se reconduz a um litígio entre particulares; Z) Tal entendimento desvirtua o direito de resposta - enquanto integrante do complexo de direitos em que se traduz a liberdade de expressão e informação, consagrada no art. 37° da CRP -, esquecendo o interesse público que lhe subjaz e o justifica, reconduzindo-o a um mero interesse privado; AA) Daí decorre outra consequência, qual seja a de considerar aplicável ao recurso sobre denegação do direito de resposta o procedimento de queixa previsto nos art.s 55° a 58° dos Estatutos da ERC; BB) Reservando o tribunal a quo a aplicação do disposto nos art.s 59° e 60° dos mesmos Estatutos para os casos em que esteja em causa o direito "de resposta ou réplica política".

CC) Ora, "Por direito de resposta e de réplica política entende-se o direito dos partidos políticos da oposição parlamentar de responder a qualquer declaração política do Governo e destina-se a permitir aos partidos da oposição parlamentar contrapor os seus argumentos e posições às do Governo. Pressupõe naturalmente que as declarações políticas do Governo, que são objecto de resposta ou réplica política, tenham sido veiculados na rádio ou na televisão"; DD) Na verdade, o recurso para a ERC relativo a questões emergentes do direito de resposta e de rectificação, consagrado no art. 37°, n.º 4 da CRP., ao contrário do defendido no acórdão recorrido, tem de ser enquadrado na Secção III do Capítulo V dos Estatutos da ERC, designadamente no art. 59°, n.º 1, e não nos art.s 55° a 58°; EE) A clareza da norma é suficiente e, até à data, nenhum órgão de comunicação social pugnou pelo afastamento da sua aplicabilidade, invocando, em contrapartida, a aplicabilidade do procedimento previsto nos art.s 55° a 58° dos Estatutos da ERC aos casos em que estava em causa o recurso previsto no art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa, no art. 62°, n.º 3 da Lei da Rádio (Lei n.º 54/2010, de 24/12) ou no art. 68°, n.º 3 da Lei da Televisão (Lei n.º 27/2007, de 30 de Julho, alterada pela Lei n.º 8/2011, de 11 de Abril); FF) De realçar que a nova Lei da Rádio e as alterações introduzidas na Lei da Televisão vieram ajudar à separação sistemática dos dois direitos, com diferentes regimes jurídicos; GG) O art. 60° dos Estatutos da ERC estabelece, por sua vez, a garantia de cumprimento do que vier a ser decidido pelo Conselho Regulador quanto aos diferentes direitos em causa: direito de resposta e de rectificação (art. 37°, n.º 4 da CRP.); direitos de antena, de resposta e de réplica política (art. 40° da CRP.); HH) De referir - e este argumento, embora literal, não é de todo despiciendo - que o art. 60°, n.º 1 dos Estatutos da ERC expressamente determina: "A decisão que ordene a publicação ou transmissão de resposta ou de rectificação, de direito de antena ou de réplica política deve ser cumprida ... ", sendo certo que o direito de resposta ou de réplica política só pode ser exercido nos meios audiovisuais (rádio e televisão) e não na imprensa escrita, razão pela qual não pode ser objecto de publicação; II) O procedimento a seguir pela ERC, no caso dos recursos relativos ao direito de resposta e de rectificação, tem de ser diferente do seguido nos demais procedimentos administrativos porque está obrigada a um dever de celeridade que não se compadece com as regras instituídas nos artigos 55° a 58° dos seus Estatutos; JJ) Acresce que a interpretação normativa do art. 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC - que restringe a sua aplicação apenas aos recursos em que está em causa o direito de resposta ou de réplica política às declarações políticas do Governo (art. 40°, n.º 2 da CRP), excluindo o direito de resposta e de rectificação (art. 37°, n.º 4 da CRP) - é inconstitucional por violar o disposto nesta última disposição que assegura a todas as pessoas, singulares ou colectivas, o direito de resposta e de rectificação em condições e igualdade e de eficácia, consagrando o princípio da "equivalência comunicacional"; KK) O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar aplicável ao recurso sobre direito de resposta, apresentado junto da entidade reguladora, o procedimento de queixa previsto nos art.s 55° a 58°, quando lhe são aplicáveis os art.s 59° e 60° dos Estatutos da ERC; LL) Equivoca-se o tribunal a quo quando afirma que a norma especial do art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa não foi revogada pela norma geral do art. 55° dos Estatutos da ERC. E o equívoco é duplo: primeiro, o que é aplicável ao caso é o art. 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC; segundo, o art. 59°, n.º 1 derrogou, no que ao prazo de recurso para a entidade reguladora diz respeito, o art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa, contendo ambos os artigos normas especiais; MM) Apenas o legislador da Lei da Televisão teve a preocupação de explicitar que o recurso para a ERC deveria ser apresentado nos termos e prazos da legislação especificamente aplicável, ou seja, no prazo de 30 dias, mantendo o prazo de 10 dias de recurso para o tribunal judicial (art.68°, n.º3 da Lei n.º 27/2007, de 30 de Julho); NN) É certo que a actual Lei da Rádio apresenta uma redacção semelhante à da Lei de Imprensa, não tendo o legislador sentido a necessidade de explicitar, como fez na Lei da Televisão, que o recurso para a ERC teria lugar nos termos e nos prazos da legislação especificamente aplicável (art. 62°, n.º3 da Lei n.º 54/2010, de 24 de Dezembro); OO) Efectivamente, tal não era necessário porque ainda que a Lei da Televisão o não dissesse, assim teria de ser entendido após a entrada em vigor da Lei n.º 53/2005 já que o art. 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC se aplica ao incumprimento ou cumprimento deficiente do direito de resposta por "qualquer entidade que prossiga actividades de comunicação social", sem fazer qualquer distinção consoante os meios; PP) A interpretação normativa do art. 27°, n.º 1, feita pelo tribunal a quo, que considera aplicável o prazo de 10 dias aí previsto aos recursos para a entidade reguladora por incumprimento ou cumprimento deficiente do direito de resposta, -é ainda inconstitucional por violação do princípio da igualdade previsto no art. 13°, n.º 1 da CRP; QQ) Incorreu o tribunal a quo em erro de julgamento sobre matéria de direito ao considerar que o art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa não foi derrogado, no que ao prazo de recurso para a ERC diz respeito, pela Lei n.º 53/2005 que aprovou os Estatutos da ERC e consignou, no art. 59°, n.º 1 destes, o prazo de 30 dias; RR) O tribunal a quo considera que o prazo de recurso para a entidade reguladora, em caso de incumprimento ou cumprimento deficiente do direito de resposta, é um prazo de caducidade quer se entenda aplicável o art. 27°, n.º 1 da Lei de Imprensa, quer os art.s 55° ou 59°, n.º 1 dos Estatutos da ERC, contados nos termos dos art.s 279° e 296° do CC; SS) A Recorrente sustenta que o prazo previsto no referido art. 59°, n.º 1 deve ser entendido como prazo adjectivo, contando-se nos termos previstos no art. 72° do C.P.A., atendendo a que a ERC é uma pessoa colectiva de direito público, entidade administrativa independente; TT) Ao ser exercido tempestivamente o direito de resposta, o órgão de comunicação social a ele obrigado toma necessariamente uma decisão, que pode ser implícita ou explícita, e que se reconduz a: (i) acatar o direito; (ii) acatá-lo deficientemente; (iii) recusá-lo sem fundamento; (iv) recusá-lo fundamentadamente. Trata-se em qualquer caso de uma decisão tomada por um particular (órgão de comunicação social), sobre o qual impedem deveres de conteúdo público e garantístico, da qual é possível recorrer se lesiva dos interesses públicos e privados em jogo; UU) Já existe, pois, um procedimento em curso, conduzido por entidades privadas, mas regulado por normas públicas de natureza garantística, que visam a salvaguarda de um direito fundamental direito de resposta - o qual integra a liberdade de expressão e de informação; VV) É hoje aceite que existem procedimentos levados a cabo por sujeitos jurídicos privados, adoptados em obediência a disposições de direito público (v. caso do direito de resposta ou normas de protecção ambiental) que podem ser objecto de impugnação de um particular contra outros particulares (v. art. 10°, n.º 7, art. 37°, n.º 2, aI. c), e n.º 3 e art. 112°, n.º 2, aI. f), todos do CPTA); WW) Nesse caso, os prazos a observar devem ter a mesma natureza daqueles que vigoram no âmbito do procedimento administrativo, como garantia de defesa mais alargada do particular, pelo que o prazo do art. 59°, n.º 1 deverá ser considerado um prazo adjectivo a que se aplicam as regras do CPA; XX) Se assim se entender, forçoso é concluir que não se verificou a caducidade do direito a recorrer para a entidade reguladora por parte do contra-interessado; YY) Acresce que, entre as suas atribuições constitucionalmente consagradas, encontra-se a de assegurar "o direito à informação e a liberdade de imprensa" e "o respeito pelas normas reguladoras das actividades de comunicação social" (art. 39°, n.º 1, al.s a) e e) da CRP), o que vem igualmente reproduzido no art. 8°, al.s a) e j) dos Estatutos da ERC; ZZ) Compete-lhe, pois, assegurar o cumprimento do disposto nos art.s 24° a 26° da Lei de Imprensa, relativos ao direito de resposta; AAA) Assim sendo, pode igualmente...

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