Acórdão nº 0916/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | DULCE NETO |
Data da Resolução | 10 de Outubro de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a reclamação judicial que a sociedade executada A………, S.A., deduziu, ao abrigo do disposto no artigo 276.º do CPPT, contra o despacho proferido em 30.03.2012 pelo Exm.º Chefe do Serviço de Finanças do Porto-2, de indeferimento do pedido de prestação de garantia através de fiança a prestar pela sociedade B………, SA., para efeitos de suspensão da execução fiscal n.º 3182200201010085.
1.1.
Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões: A) Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal deduzida contra o despacho proferido em 2010/03/30, pelo Chefe do Serviço de Finanças do Porto-2, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3182200201010085, que ali corre termos.
B) O despacho reclamado concluiu, em obediência ao princípio da legalidade e na prossecução do interesse público, pela falta de idoneidade da garantia oferecida, para efeitos de suspensão da execução, na modalidade de fiança e no montante de € 19.136,00, por via da qual a sociedade B………, SA., se constitui fiadora da executada, ora reclamante.
C) Por via dos presentes autos vem a reclamante alegar que o despacho controvertido incorre na violação de lei, mais concretamente do disposto no art.º 199º do CPPT.
D) A douta sentença recorrida julgou a presente reclamação procedente, com a consequente anulação do despacho reclamado, por entender verificado o vício de violação de lei, porquanto considerou que a garantia oferecida se mostra idónea para os efeitos previstos no referido art.º 199.º do CPPT.
E) Ora, contrariamente ao sentenciado, e com o devido respeito que nos merece a decisão do Tribunal a quo, perfilha a Fazenda Pública o entendimento, já defendido na sua contestação, de que não padece o acto controvertido de qualquer ilegalidade, antes enfermando a sentença sob recurso de erro de julgamento de direito.
F) Acontece que o art. 52.º da LGT, nos seus nºs 1 e 2, permite a suspensão da cobrança da prestação tributária efectuada no processo de execução fiscal nos casos ali expressamente previstos, sendo que G) Por sua vez, o art. 169.º do CPPT condiciona a suspensão da execução à constituição de garantia, em conformidade com o art. 195.º do mesmo diploma, à sua prestação, nos termos do disposto no art. 199.º, também do CPPT, ou à penhora em bens suficientes para garantir o pagamento da divida exequenda e respectivo acrescido.
H) Especifica este último preceito que a garantia a prestar deverá ser idónea, consistindo em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível' de assegurar os créditos da Fazenda Pública.
I) Estamos, portanto, perante uma tipificação clara das referidas garantias (garantia bancária, caução, seguro-caução), seguida de um conceito aberto: “ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos exequendos”.
J) Tal redacção tem motivado uma leitura, quer doutrinal quer jurisprudencial, de que a enunciação daqueles tipos de garantia é meramente exemplificativa, pois a redacção da parte final daquele número amplia essa possibilidade a todas as outras garantias, desde que de valor, suficiente para assegurar os créditos do exequente.
K) Coloca-se, pois, a questão de saber se a fiança se inclui como uma garantia prevista pelo legislador no art.º 199.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário como idónea, em sede de execução fiscal, com vista à suspensão dos processos executivos, importando concretizar o já referido conceito aberto.
L) É entendimento da Fazenda Pública, salvo o devido respeito por melhor opinião, que essa concretização acontece de seguida, no n.º 2 do mesmo preceito legal, onde se prevê que “[a] garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária”.
M) E ainda no n.º 4 que acrescenta uma última situação passível de integrar o conceito de garantia idónea: “vale como garantia para os efeitos do n° 1 a penhora já feita sobre os bens necessários para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido ou a efectuar em bens nomeados para o efeito pelo executado”.
N) A redacção do artigo 199.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao definir os tipos de garantia aceitáveis e referindo, no seu n.º 1, especificamente, a garantia bancária, a caução e o seguro-caução, acrescentando um conceito aberto, não o faz para mostrar que se trata de uma configuração meramente exemplificativa (se assim fosse, seria desnecessário o n° 2, pois a hipoteca e o penhor seriam incluídas no n° 1 por qualquer intérprete que prosseguisse a leitura com mais exemplos de garantias), mas para dizer que além destes três tipos existem outros, que o legislador especifica nos números seguintes.
O) Ou seja, ao contrário do entendimento vertido na sentença recorrida, entende a Fazenda Pública, salvo o devido respeito, que o ns.º 2 e o n.º 4 do art. 199.º do CPPT serviram para o legislador especificar, então, o que se entende por “qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente”.
P) Desde logo porque em ambos os números é feita referência ao n.º 1; no n.º 2, onde se diz que “a garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda (...)”, entendendo a Fazenda Pública que a expressão “ainda” só pode significar “para alem da garantia bancária, caução e seguro-caução”, sendo ilógico e contraditório entender como “para além de todos os meios susceptíveis de assegurar os créditos do exequente”, onde já se incluiriam o penhor e a hipoteca que o legislador de seguida repetia; no n.º 4 dizendo que “vale como garantia para efeitos do n.º 1 (...)”.
Q) O quadro então definido, afigura-se ser de tipificação das garantias atendíveis, com um tratamento diferenciado que se justifica pela posição da administração tributária em relação a cada uma: - garantia bancária, caução e seguro-caução, estando a administração fiscal vinculada à sua aceitação, sempre que o valor assegure o cumprimento da obrigação; penhor e hipoteca voluntária, "mediante concordância da administração tributária" e penhora, por actuação da administração tributária na constituição da garantia; R) Esta configuração legal também parece indiciar uma justificada preferência atribuída pelo legislador às garantias com maior grau de liquidez que melhor assegurem o cumprimento da obrigação, como acontece com a garantia bancária, caução e seguro-caução, concluindo-se não ser de incluir a fiança como uma garantia admitida pelo legislador nos exactos termos em que preceituou o artigo em análise.
S) Acresce que o Tribunal a quo, em reforço da posição defendida na douta sentença sob recurso, invoca o despacho n.º 642/2002, de 2002/03/11, do SEAF, o qual considera “a única tomada de posição administrativa que conhecemos a propósito do tipo de garantias admissíveis para efeitos do disposto no artigo 199.º” T) Porém, como já defendeu a Fazenda Pública em sede de resposta aos presentes autos, tal despacho não pacificou a interpretação do normativo em crise, uma vez que não detém eficácia para vincular a AT, porquanto carecia da transposição em circular administrativa como condição de eficácia, como o mesmo reconhece na sua parte final1 e ainda em conformidade com o disposto no art.º 55º do CPPT e no art.º 68º-A da LGT, o que nunca aconteceu.
U) Porém, sem prescindir, e caso se considere ser de improceder este entendimento da Fazenda Pública, importa então analisar se, admitidas outras garantias que não as elencadas do art.º 199° do CPPT, a fiança se inclui como uma garantia idónea, em sede de execução fiscal, com vista à suspensão dos processos executivos, desde que preenchidos os demais requisitos.
V) A arrecadação da receita fiscal, já em fase de cobrança coerciva, implica a realização, no PEF, do princípio da efectividade da tutela judicial do direito do credor do imposto, que preside àquele processo judicial tributário, e necessariamente aos meios admissíveis de garantir a cobrança coerciva da dívida tributária em vista da suspensão da execução.
W) Como tal, com a utilização da expressão "garantia idónea", pretende-se significar que nem todas as garantias serão sempre adequadas e que a indicação exemplificativa dos meios de garantia bancária, caução ou seguro-caução, antes da alternativa "qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente", tem de entender-se como uma restrição pretendida pelo legislador dos demais meios que poderão enquadrar-se no conceito de garantia idónea.
X) O escopo do processo judicial tributário de execução é sempre de assegurar a efectiva cobrança da divida, designadamente no que às garantias a prestar para suspensão da sua tramitação respeita, independentemente da qualidade do prestador.
Y) Apontando a lei, preferencialmente, para certos tipos de garantia, dos quais se evidencia a vinculação de...
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