Acórdão nº 01158/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução31 de Outubro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I-RELATÓRIO 1. A……., S.A.

, com os sinais dos autos, impugnou, no Tribunal Tributário de Lisboa, as liquidações adicionais de IVA, relativas ao ano de 2003, e, invocando a ilegalidade de tais liquidações, solicitou a sua anulação e os juros compensatórios.

1.1.

A M.mª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa julgou a impugnação procedente, condenando a Fazenda Pública no pedido de anulação das liquidações adicionais e na restituição das quantias pagas acrescidas de juros indemnizatórios.

  1. Não se conformando com tal decisão, a Fazenda Pública interpôs recurso, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentando as respectivas Alegações, com as seguintes Conclusões: “1) Sustenta-se na decisão recorrida que a questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se incide IVA, nos termos da alínea a) do n° 1 do art. 1°, e n° 1 do art 4° (ambos do CIVA), sobre a indemnização paga à impugnante pela seguradora nas situações em que se verifica a perda total, em virtude de sinistro, dos veículos objecto de contratos de locação financeira ou de aluguer de longa duração (ALD). (sublinhado nosso) 2) Contudo, tendo em vista o referido em “D” da fundamentação de facto, bem como os termos do “contrato-tipo” celebrado pela Impugnante com os seus clientes, no âmbito da actividade de locação financeira, parcialmente reproduzido em “E,”, e, ainda, o teor da cláusula 2.3.2. aplicável aos contratos de aluguer de longa duração, na qual se estabelece que "Deve o cliente pagar à “A……., S.A.

    , no acto de denúncia e entrega do veículo, uma indemnização (…)”, pode concluir-se que, ao invés de entendido na decisão recorrida, a questão a decidir não respeita, obviamente, à indemnização paga à Impugnante pela companhia seguradora, mas antes aos valores pagos pelos clientes, a título de indemnização, em cumprimento do clausulado quer nos contratos de locação financeira quer nos contratos de aluguer de longa duração.

    3) Diversamente do que sucede relativamente à indemnização recebida da seguradora, a qual se destina meramente a reparar uma perda suportada pela Impugnante, o valor respeitante ao capital em divida recebido dos clientes, no contrato de locação financeira, que é considerado como prestação de serviços, está sujeito a tributação nos termos dos arts. 1º, n° 1, al. a), e 4°, n°1 do CIVA, sendo que a indemnização paga pelos clientes, no contrato de aluguer de longa duração, porque decorrente da responsabilidade contratualmente assumida pelos mesmos, tem indiscutivelmente carácter remuneratório, tratando-se de uma contraprestação de uma operação tributável em IVA, estando sujeita a tributação e devendo ser incluída na respectiva base tributável.

    4) Com efeito, para enquadramento da questão da sujeição ou não a IVA das quantias recebidas a titulo de indemnização, deverá considerar-se que, porque se trata de um imposto sobre o consumo, o mesmo visa tributar a contraprestação de operações tributáveis e não a indemnização de prejuízos que não tenha carácter remuneratório, razão pela qual são tributáveis em IVA as indemnizações que tenham subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços, as quais, como sucede no caso em apreço, configuram uma contraprestação a obter do adquirente de uma operação sujeita a imposto.

    5) Por sua vez, a questão objecto de apreciação no Acórdão do STA de 18/6/2008, proferido no proc. 01144/06, não se revela apenas “um pouco distinta”, tal como referido na decisão recorrida, mas, pelo contrário, completamente diversa da que aqui se discute, na medida em que a propósito daquela foi entendido que, tratando-se de uma compensação por prejuízos, se a indemnização sanciona a lesão de qualquer interesse, sem carácter remuneratório, não pode ser tributada em IVA, na medida em que não tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

    6) Ora, ao invés do concluído relativamente à indemnização em causa no questionado acórdão, constata-se que, no caso vertente, as quantias pagas complementarmente à Impugnante, pelos respectivos clientes, a título de indemnização, quer nos contratos de locação financeira quer nos contratos de aluguer de longa duração, não revestem claramente a natureza de ressarcimento de perdas e danos, resultando a respectiva obrigação, tão só, de responsabilidades contratualmente assumidas em cada um dos contratos em causa, razão pela qual deverão tais quantias ser sujeitas a IVA, nos termos dos arts. 1°, n° 1, al. a), e 4º, n° 1 do CIVA, preceitos legais que resultam violados em consequência do entendimento que fundamenta a decisão recorrida, a qual deverá ser revogada, com as legais consequências” 3.

    O BANCO A’……., S.A. (entidade que incorporou por processo de fusão a A…….), deduziu Contra-alegações, com as Conclusões seguintes: “1.ª A A sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios, relativas ao ano de 2003, por considerar que não incide IVA, nos termos dos artigo 1.º e 4.° do Código do IVA, sobre os montantes pagos pela companhia seguradora à Recorrida nas situações de perda total, em virtude de sinistro, de veículos objecto de locação financeira ou aluguer de longa duração, porquanto tais indemnizações serviam para ressarcir os prejuízos sofridos correspondentes ao capital afecto às operações; 2.ª A Recorrente imputa um erro de julgamento à decisão recorrida quanto ao objecto do litígio, afirmando que o que estava em causa eram as quantias pagas complementarmente à Impugnante, pelos respectivos clientes, a título de indemnização, quer nos contratos de locação financeira quer nos contratos de aluguer de longa duração, e não as indemnizações pagas à Impugnante pela companhia seguradora; 3.ª Sucede, porém, que quem incorre em erro é o Ilustre Representante da Fazenda Pública porquanto não foi sobre os valores pagos complementarmente pelos locatários que incidiu o IVA impugnado mas sim sobre os valores de indemnização pagos pela Seguradora, sendo que sobre as quantias pagas pelos locatários a própria Recorrida liquidou o IVA, não incidindo nesse âmbito qualquer correcção por parte da administração tributária; 4.ª Os serviços de inspecção tributária consideraram que deveria incidir IVA não apenas sobre o diferencial não coberto pela indemnização paga pela seguradora, exigido aos clientes, mas também sobre o próprio montante recebido pela Impugnante correspondente à indemnização paga pela seguradora e foi sobre esse montante que liquidaram o IVA impugnado; 5.ª Uma vez que o próprio Ilustre Representante da Fazenda Pública reconhece que a indemnização recebida da seguradora se destina meramente a reparar uma perda e sendo inequívoco que é sobre tal indemnização que se discute a incidência de IVA nos presentes autos, reconhece-se, pois, a ilegalidade das liquidações adicionais de imposto, pelo que de imediato se impõe declarar a improcedência do presente recurso; 6. Sem prejuízo de inexistir qualquer erro na sentença recorrida sobre a questão a apreciar e decidir, cumpre ainda realçar que bem andou o Tribunal a quo ao decidir, como decidiu, que sobre as indemnizações em causa não incide IVA porquanto não visam compensar proveitos deixados de obter mas sim ressarcir prejuízos incorridos; 7.ª Resulta da factualidade provada nos autos que a natureza da indemnização em questão, atribuída em virtude da perda total de veículo automóvel, é a de verdadeira indemnização, sendo assente que o prejuízo da Impugnante correspondia ao valor dispendido na aquisição dos bens e que não tinha sido amortizado, seja o capital em dívida à data do sinistro, no caso do contrato de locação financeira, seja o valor que o veículo tinha na sua contabilidade à data do sinistro, no caso do ALD; 8.ª Irreleva saber se a locadora transfere o risco da perda do bem directamente para a seguradora ou contrata com o locatário que seja este formalmente a transferir esse risco para a seguradora, sendo este o tomador do seguro, porquanto a lesão ocorre no património da locadora e a indemnização recebida serve em todo o caso o propósito de ressarcir a perda do bem, sendo indiscutível a natureza ressarcitória da indemnização paga; 9.ª O encontro de contas que é efectuado, a final, com o locatário visa, tão- só, evitar um enriquecimento injustificado da Recorrida permitindo que esta receba um quantitativo pecuniário equivalente ao seu efectivo prejuízo, calculado pela dedução ao valor comercial do bem — correspondente à cobertura do seguro — do montante financeiramente já amortizado através do pagamento de rendas; 10.ª De acordo com o entendimento da Comissão Europeia, transcrito na sentença recorrida, nem sequer sobre os montantes pagos pelos locatários (remanescente não coberto pela indemnização da seguradora) deveria ter incidido IVA, menos ainda sobre as indemnizações pagas pela seguradora, pelo que se conclui que o recurso da Fazenda Pública está inexoravelmente votado ao insucesso; 11.ª Com efeito, mesmo que estivessem em causa indemnizações pagas pelos locatários à locadora, visando ressarcir tão-só o valor líquido do veículo, o certo é que se manteria o julgamento de Direito de que tais indemnizações não revestiriam natureza remuneratória, não sendo por isso abrangidas pelo campo de aplicação do IVA, mantendo-se a sentença recorrida; 12.ª Ficando provada nos autos, sem réstia de dúvidas, a natureza de pura indemnização dos montantes recebidos nas presentes situações de perda total do veículo e sendo pacífico o entendimento de que tais indemnizações não configuram a contraprestação de qualquer operação sujeita ao IVA (cf. neste sentido, por todos, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.06.2008, proferido no recurso n.° 1144/06, e do Tribunal Central Administrativo Sul, de 03.03.2009, proferido no recurso n.° 2507/08), não poderia deixar de anular-se as liquidações impugnadas, razão pela...

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