Acórdão nº 0553/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Outubro de 2012

Data31 Outubro 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO 1. 1. A……, S.A. –, representada pelo liquidatário judicial da sua massa falida, intentou, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, com fundamento em responsabilidade civil desta, na qual pretendia ser indemnizada pelos prejuízos sofridos com a venda dos lotes e prédios que detinha na 2.ª fase do loteamento da B……, freguesia de Vilar de Andorinho, que teve de efectuar sem que tivessem sido realizadas as respectivas obras de infra-estruturas dessa fase do loteamento, bem como dos prejuízos resultantes das consequências que aqueles prejuízos tiveram na evolução da sua situação económico-financeira, falta de realização essa que imputou à Ré.

Por sentença do TAC de 26/10/2010, a acção foi julgada totalmente improcedente e a Ré absolvida do pedido.

Com ela se não conformando, a Autora interpôs recurso para este Supremo Tribunal, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões: 1.ª - A Ré Câmara de Gaia assumiu o compromisso, deliberado em reunião, de que as infra-estruturas dos loteamentos seriam encargo da C……, exigindo a esta, como contrapartida da emissão de licenças de utilização, documento vinculativo e de entidades representadas na sua administração, Caixa Geral de Depósitos e IGAPHE.

  1. - Entre o loteador, Autora e a Ré, foi também efectuado o compromisso de que as licenças de utilização não seriam emitidas sem estarem efectuadas ou garantida todas as infra-estruturas dos loteamentos.

  2. - A convicção da Autora de que tais infra-estruturas seriam executadas pela C……. foi fundada nas sucessivas deliberações camarárias e ofícios correspondentes.

  3. - Porém, a C…… não efectuou as infra-estruturas referidas, violando o compromisso e a condição para que lhe tosse possível obter os licenciamentos de utilização.

  4. - A Ré, Câmara de Gaia, colaborou e aceitou o rompimento do contratado, da vinculação dos representados na administração da C……, emitindo tais licenciamentos, ilicitamente.

  5. - E provocando que tivesse recaído sobre a Autora a obrigação de efectuar à sua custa tais infra-estruturas, no valor de 450.000.000$00, ficando desfalcada desse valor e desse custo.

  6. - Ilicitamente, a Ré também não accionou a fiança bancária emitida pelo Banco Borges & Irmão, no valor de 75.000.000$00, caso a C…… não realizasse as infra-estruturas contratadas, impedindo desta forma a Autora de não realizar infra-estruturas até ao referido valor garantido pela fiança bancária.

  7. - A emissão das licenças de utilização contra o vínculo jurídico resultante dos documentos, ofícios e deliberações citados, prejudicou grave e ilicitamente a Autora, bem como o não accionamento da garantia bancária.

  8. - E beneficiou a C……, que deixou de responder em 75.000.000$00 perante o Banco Borges & Irmão e de arcar com o custo das infra-estruturas pelo montante avaliado em 450.000.000$00.

  9. - Era exigível que a Ré não emitisse a licença de utilização.

  10. - Era exigível que tivesse accionado e exigido o pagamento de 75.000.000$00 a que se reportava a fiança bancária.

  11. - Houve um ilícito comportamento da Ré, privilegiando os obrigados com a construção das infra-estruturas e prejudicando a beneficiária dessa construção, a aqui Autora.

  12. - A Ré foi parcial.

  13. - Foi clamorosamente injusta.

  14. - Sabia o prejuízo que causava a quem não tinha de executar as benfeitorias, conforme acordo também subscrito e apadrinhado pela Ré.

  15. - A Ré, ademais, não prescindiu da realização dessas benfeitorias à custa da Autora.

  16. - A Ré exigiu à Autora a cedência dos direitos de uma garantia bancária (que não executou).

  17. - E igualmente nada exigiu à C…… para garantir o valor do resto das infra-estruturas (450.00.000$00 - 75.000.000$00).

  18. - Esta actuação viola o princípio da justiça, igualdade, imparcialidade, boa fé, a equidade e equidistância e a razoabilidade, artigos 52 e 62 do C.P.A. e 266, nº 2 da C.R.P.

  19. - Constitui um abuso do direito, nos termos definidos pelo artigo 334 do CC.

  20. - E promove um injustificado e ilícito enriquecimento da C……., a parte vinculada à realização das infra-estruturas, e da Caixa Geral de Depósitos e IGAPHE, que, com a poupança de 450.000.000$00 adquiriram para si esse valor, o que constitui um enriquecimento sem causa que obriga os enriquecidos a restituírem aquilo com que injustamente se locupletaram (artigos 473 do Código Civil).

  21. - A Ré locupletou-se, desta forma injusta e parcial, com as infra-estruturas pagas e suportadas pela Autora.

  22. - Era possível à Ré recusar a emissão das licenças de utilização, recusa a que estava vinculada por prévia deliberação camarária, quer porque as edificações “não estavam em condições de serem habitadas”, quer porque a Ré por acordo entre a C……, Autora e ela própria aceitaram a penalização de não emissão dessas licenças enquanto tais infra-estruturas não estivessem concluídas, como não estavam.

  23. - E não se admite, um venire contra factum proprium, que a C…… pudesse litigar e obrigar a Ré a emitir tais licenças, de harmonia com o condicionalismo dado como provado.

  24. - A Autora, ao acordar com a Ré na renovação do alvará 2.ª fase, não acordou que a obrigação de construção das infra-estruturas deixasse de ser obrigação da C……. .

  25. - E a Ré, apesar desse acordo, manteve a exigência à C…… e às entidades representadas na Administração, até porque estava sem cobertura de garantia acima dos 75.000.000$00.

  26. - A condenável actuação da Ré e a gestão danosa da C……., que criaram até ao fim da extinção do seu património e do seu activo a falsa convicção de que iriam cumprir aquilo a que se obrigaram, ofende o Direito, a Justiça e a ética exigida num ente público.

  1. 2.

    A Ré, Câmara Municipal de Gaia, ora recorrida, não contra-alegou.

  2. 3.

    A Excelentíssima Magistrada do Ministério Público neste STA emitiu o seguinte parecer: “A Autora, “A……, S.A.”, representada pelo liquidatário judicial da massa falida, intentou no TAF do Porto contra a Ré, Câmara Municipal de Gaia, a presente acção para efectivação da responsabilidade da Ré.

    Invoca que, tendo transferido para a Ré, pela da escritura de cessão de créditos de 26.11.1986, o crédito que detinha sobre a “C……, Ldª”. à realização das infra-estruturas relativas ao alvará n° 55/87 (2ª fase do loteamento da B……), bem como a garantia bancária, relativa á mesma, acabou por suportar os custos dessas infra-estruturas e outros danos, porque a Ré não exigiu da “C……” o cumprimento da obrigação, nem accionou a garantia.

    Invoca, ainda, que a Ré, além de não ter accionado a “C ……” para obter o cumprimento da obrigação da realização das infra-estruturas nem accionado como a garantia bancária, emitiu a favor da C……, ilicitamente, licenças de habitabilidade relativas aos imóveis pela Ela construídos na sequência do alvará n° 102/81, (1.ª fase do loteamento), o que permitiu a sua alienação e posterior desaparecimento do património da empresa, que constituía a garantia dos credores.

    A Ré, na contestação, veio dizer que: A cessão do crédito à realização das infra-estruturas, que o loteador dizia possuir sobre a C……, ocorreu porque este pretendia que a Câmara emitisse o alvará relativo à 2ª fase do loteamento e Esta deliberou emitir o alvará desde que a garantia prestada pelo B.B.I. EP., que era acessória daquele, fosse prestada a favor da Câmara.

    A garantia para as infra-estruturas tinha sido fixada em 492.241.000$00, que podia exigir ao loteador, e que veio a aceitar do loteador uma caução de apenas 112.000.000$00 pelos meios supra referidos, a garantia bancária veio a que foi reduzida para 75.000.000$00.

    Estes factos ocorreram porque o loteador e a A. pretenderam que a Ré lhes facilitasse a emissão do alvará e que, quando pela escritura de cessão de 26.11.86, recebeu o crédito de execução das infra-estruturas não assumiu a obrigação de as executar.

    A emissão das licenças de utilização dependia apenas de normas urbanísticas não tendo havido qualquer ofensa para a A. com a sua concessão.

    O presente recurso vem interposto da sentença do TAF que, considerou não se verificarem os pressupostos da responsabilidade civil extra-contratual por facto ilícito e julgou a acção totalmente improcedente.

    A Recorrente na sua Alegação, invoca, em síntese que: - A decisão recorrida não fez correcta aplicação do direito aos factos como provados; - Não valorou o conteúdo do “contrato” estabelecido entre as partes e o consequente enriquecimento dos outros intervenientes; - Entre o loteador, Autora e a Ré foi efectuado o compromisso de que as licenças de utilização relativas à 1.ª fase do loteamento não seriam emitidas sem estarem efectuadas ou garantidas todas as infra-estruturas relativas à 2ª fase; - A convicção da Autora de que tais infra-estruturas seriam executadas pela C…… foi fundada nas sucessivas deliberações camarárias; - A Ré colaborou e aceitou o rompimento do contratado, da vinculação dos representados na administração da C……, emitindo tais licenciamentos, ilicitamente; - Era exigível que a Ré não emitisse as licenças de utilização, porque estava vinculada por prévia deliberação camarária, porque a Ré por acordo entre a C……, a Autora e Ela própria aceitaram a condição de não emissão dessas licenças enquanto as infra-estruturas em causa não estivessem concluídas, e porque a casas não estavam concluídas; - A Ré não exigiu da C…… a realização das infra-estruturas nem accionou a garantia bancária, em conformidade com o acordo de 26.11.1986; - E não prescindiu da realização das infra-estruturas à custa da Autora, locupletando-se com as infra-estruturas por si pagas; - O comportamento da Ré violou o acordado, bem como os princípios da justiça, da igualdade, da boa fé, da equidade, constantes dos art°s 5° e 6° do C.P.A. e 266°, no 2, da C.R.P.; - Causando, assim, danos a A..

    Resultaram provados, além de outros, os seguintes factos: - Em 22 de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT