Acórdão nº 0434/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução23 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública vem interpor recurso de revista excepcional, nos termos do artigo 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 14/2/2012, no recurso que aí correu termos sob o nº 5348/12.

1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:

  1. Quanto à questão de determinar se a AT, em processo de execução fiscal pode penhorar créditos por via electrónica e se pode, pela mesma via, ser dada resposta reconhecendo, ou não, a existência do crédito/débito, constando tal informação da base de dados SIPA/E, verificam-se os requisitos que permitem a interposição de recurso de revista para o STA, nos termos do art. 150° do CPTA.

  2. Uma vez que, tal questão assume relevância jurídica ou social, aferida em termos da utilidade jurídica, com capacidade de expansão da controvérsia que ultrapasse os limites da situação singular, decorrendo, da interposição do presente recurso a possibilidade da melhor aplicação do direito, tendo como escopo a uniformização do direito, dado que tal questão tem capacidade para se repetir num número indeterminado de casos futuros.

  3. Isto tendo em conta não só a pertinência da questão jurídica centrada na força probatória dos dados que constam do SIPA/E, mas também, na igual pertinência da questão da determinação da forma correcta de o devedor reconhecer, ou não, a existência de um crédito sobre ele e a AT confirmar essa resposta como a atendível de eventual devedor, como sendo questões susceptíveis de requerer uma apreciação por parte do STA, tendo em vista a necessidade de uma melhor aplicação do direito, neste e em outros casos concretos.

  4. Deve, pois, ser admitido o presente recurso de revista, uma vez que o mesmo versa sobre matéria acerca da qual é necessário clarificar o quadro legal aplicável a estes casos, sendo certo que a resposta a dar a essa questão pode interessar a um leque alargado de interessados e eventuais casos futuros, pelo que, o presente recurso servirá para uma melhor e, a partir da pronúncia do STA, uniforme aplicação do direito.

  5. Quanto ao mérito do presente recurso, o Acórdão ora recorrido fez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação da lei, arts. 191º, 192º e 224º, todos do CPPT e 23º nº 3 da LGT aos factos, pelo que, não se deve manter.

  6. Efectivamente, parece que a lei possibilita a penhora de créditos por via electrónica, conforme decorre dos artigos 191º nº 4 e 192º nº 1 ex vi art. 224º nº 1 todos do CPPT.

  7. Por outro lado, também sendo admissível tal forma de efectivar a penhora parece que nada obsta a que o hipotético devedor sobre o qual o revertido alega existir sobre ele um crédito da devedora originária, reconheça por transmissão electrónica de dados que esse crédito não existe.

  8. O não reconhecimento do crédito, por via de resposta por transmissão electrónica de dados, assume toda a relevância jurídica do ponto de vista da AT, sendo a mesma informação suficiente para que esta conclua pela inexistência do crédito.

  9. É que, a primordial função do SIPA/E é detectar activos penhoráveis, como meio de suporte à realização de penhoras, donde, no caso, não tendo sido reconhecido o crédito é desnecessário penhorar e prosseguir executando esse crédito, assumindo toda a relevância a informação do não reconhecimento do crédito constante do SIPA/E.

    Termina pedindo que seja admitido o presente recurso de revista e, analisado o mérito do recurso, seja dado provimento ao mesmo, revogando-se o Acórdão recorrido, com todas as legais consequências.

    1.3. O ora recorrido, A….., apresentou contra-alegações, concluindo da forma seguinte : 1.ª Analisados, tanto o Acórdão recorrido, como as alegações e as respectivas conclusões da RECORRENTE, é indubitável que, no presente recurso está apenas em causa o julgamento da matéria de facto realizado pelo Tribunal a quo.

    1. Neste sentido, além de se tratar de matéria que não pode ser sindicada pelo Supremo Tribunal Administrativo (cf. artigo 150º, nº 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), não se verificam os pressupostos do recurso de revista excepcional, previstos no artigo 150º, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

    2. Não obstante, e ainda que se conclua pela admissibilidade do recurso, no que não se concede, a verdade é que o Acórdão ora recorrido não merece – em concreto, na parte contra a qual se insurge a RECORRENTE – qualquer censura, pois que, conforme observado pelo Tribunal a quo (cujos fundamentos se dão aqui por reproduzidos) a Sentença proferida pela 1ª Instância “ao entender que já se tinham efectuado todas as diligências possíveis para apurar [os] bens da devedora originária, susceptíveis de serem excutidos, incorreu em erro de julgamento, quer de facto quer de direito, não se podendo manter”.

    3. Acresce que, o Tribunal a quo não determinou a revogação do despacho reclamado, apenas pela razão colocada em crise pela RECORRENTE, tendo também sustentado, para o efeito, que “em caso de efectivação da penhora, se o devedor contestar a existência do crédito, este passa a ser considerado litigioso, mantendo-se a penhora – cfr. art. 858º, nºs. 1 e 2 do CPC - pelo que, mesmo a considerar-se que a devedora não reconheceu o referido crédito, tal como refere a sentença recorrida, tal não reconhecimento não faz extinguir o crédito, o qual continua a existir no património da primitiva executada”.

    4. Assim, considerando que a RECORRENTE não colocou em crise – quer nas alegações quer nas respectivas conclusões – este fundamento, sempre se teria que julgar improcedente o presente recurso.

    Termina concluindo pela inadmissibilidade do recurso excepcional de revista interposto pela Fazenda Pública e que, caso assim não venha a ser entendido, deve ser confirmado o acórdão recorrido, sendo julgado improcedente o presente recurso.

    1.4. O MP emite Parecer, nos termos seguintes: «1. A intervenção do Ministério Público nos recursos jurisdicionais interpostos no âmbito do CPTA é subsequente à sua notificação (art. 146° n°1 CPTA).

    2. O recurso de revista de acórdãos dos tribunais centrais administrativos é característico da jurisdição administrativa, como claramente resulta de: a) inexistência no contencioso tributário de norma de competência paralela à constante do art. 24° n° 2 ETAF 2002 (cf. art. 26° ETAF 2002): b) impossibilidade de integração da lacuna por via de interpretação analógica ou extensiva da norma citada, inspirada em princípios hermenêuticos; c) composição da formação incumbida da apreciação preliminar sumária dos pressupostos substantivos do recurso: três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo (art. 150° n° 5 CPTA); d) inexistência no Contencioso Tributário de espécie paralela à 7ª espécie da Secção de Contencioso Administrativo (recursos de revista de acórdãos dos tribunais centrais administrativos; cfr. deliberação nº 1313/2004, 26.01.2004 do CSTAF).

    No sentido da inaplicabilidade do recurso de revista no contencioso tributário pronuncia-se doutrina qualificada (José Casalta Nabais Considerações sobre o Anteprojecto de revisão da Lei Geral Tributária e do Código de Procedimento e de Processo Tributário Cadernos de Justiça Administrativa nº 61 Janeiro/Fevereiro 2007 p. 13; Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV anotação 37 ao art. 279° CPPT p. 390).

    3. Sem prescindir No caso em análise o Ministério Público não se pronuncia sobre o mérito do recurso porque a relação jurídico-material controvertida não revela qualquer ameaça a direitos fundamentais dos cidadãos, lesão de interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens referidos no art. 9° n° 2 CPTA (art. 146° n° 1 CPTA 2°segmento).» 1.5. Corridos os vistos legais, cabe apreciar.

    FUNDAMENTOS 2. Nas instâncias julgaram-se provados os...

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