Acórdão nº 0301/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2012
Magistrado Responsável | FERNANDA MAÇÃS |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO 1.
A Sociedade Comercial A………, S. A.
, identificada nos autos, deduziu impugnação judicial, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, da avaliação do terreno para construção inscrito na matriz predial urbana sob o artigo provisório 6560 (P-6560), ao qual foi atribuído o valor patrimonial tributário de € 7.115.970,00, que foi julgada procedente.
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Inconformado com tal decisão, veio a Fazenda Pública interpor recurso para o TCA Norte, apresentando as seguintes conclusões das suas alegações: A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que considerou procedente a impugnação judicial deduzida por A………, S.A., visando atingir o valor patrimonial tributário atribuído ao artigo provisório P-6560.
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O objecto do presente recurso prende-se com a decisão de que o valor da avaliação do prédio não poderia exceder o montante de € 5.910.000,00, por ser esse o valor de mercado, atendendo a que se tratou do preço de aquisição do bem no âmbito de um concurso público.
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A douta sentença padece de erros de julgamento de facto e de direito, os quais acabam por inquinar toda a decisão dado que, com base em factos dados como provados, extraiu uma conclusão não alicerçada nos meios probatórios trazidos aos autos.
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Partindo de factos dados como provados (“2. O preço de aquisição referida em 1) foi de € 5.910.000,00 (cinco milhões e novecentos e dez mil euros) e foi determinado segundo as condições do concurso público aprovadas pela Câmara Municipal e Assembleia Municipal de São João da Madeira” e “15. No requerimento de segunda avaliação, a Impugnante alegou que o valor patrimonial tributário atribuído na primeira avaliação não teve em conta o real valor de mercado do prédio urbano”), limitou-se a concluir que “precisamente por ter sido vendido por concurso público e como tal, existir uma possível enorme quantidade de interessados livremente a apresentarem ofertas de compra, tendo sido transaccionado pelo supra valor, entende o Tribunal que se deveria ter considerado como valor de mercado, o referido montante de e 5.910.000,00”.
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O valor de mercado referido no n.° 4 do artigo 76.° do Código do IMI não é determinado de forma discricionária ou arbitrária.
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Nos casos de distorção, o VPT terá de ser fixado por aplicação do método comparativo dos valores do mercado (artigo 46.° n.° 3 do CIMI), pelo que este não pode ser achado de uma forma empírica, baseada no senso comum ou nas regras da experiência.
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O valor de mercado, correspondendo ao preço praticado numa transacção, pressupondo que o comprador e o vendedor actuaram com informação plena e completa do produto e das condições do mercado, não actuaram forçados e não existe coacção em comprar e vender, ambos dispõem de tempo para a realização da transacção e o pagamento é efectuado em dinheiro ou equivalente, distingue-se do preço de mercado.
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O valor da adjudicação de um prédio no âmbito de um concurso público não reflecte necessariamente o seu valor de mercado, dado que, para a aceitação das propostas por parte da entidade adjudicante, não é unicamente levado em linha de conta o elemento preço, mas uma multiplicidade de factores — a capacidade comercial do comprador, as soluções arquitectónicas, o preço e o elemento temporal.
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A douta sentença labora em erro de julgamento de direito, ao aplicar o n.° 4 do artigo 76.° do Código do IMI ao caso sub judíce.
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Na verdade, para efeitos do valor patrimonial de IMI, a obtenção do referido valor de mercado não tem qualquer relevância, pelo que não poderia o douto Tribunal recorrido aplicar aquela norma, fundando na mesma a sua decisão ora posta em crise (cfr. Ac. do STA, de 25-05-2011, proc. n.° 0239/11) K. Por conseguinte, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta decisão judicial, por padecer a mesma de um erro de julgamento de facto e de direito, por violação dos artigos 76.° n.° 4, 46.° n.° 3 e 45°, todos do Código do IMI, devendo aquela primeira norma ser interpretada e aplicada no sentido de que o valor de mercado não tem qualquer relevância para efeitos de IMI, assim se fazendo JUSTIÇA.
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Notificada das alegações da Fazenda Pública, a Sociedade Comercial A………, S. A.
, veio produzir contra-alegações, das quais se extraem as conclusões: “i. O procedimento de segunda avaliação, previsto no artigo 76. do CIMI, encontra-se legalmente previsto, não meramente para aplicar fórmulas matemáticas, mas para introduzir os necessários factores de correcção e ajustamento quando dessas fórmulas resultem valores desajustados aos valores de mercado do imóvel — como é manifestamente o caso dos autos.
ii. No caso em apreço, existem dados que evidenciam, objectiva e ostensivamente, esse desajustamento, porquanto, como resulta dos autos, o prédio foi adquirido no âmbito de um concurso público pelo valor de €5.910.000.00 e, em sede de segunda avaliação, foi atribuído ao mesmo imóvel o valor patrimonial tributário (VPT) de €7.115.970,00.
iii. Por via da regra 16ª. do nº. 4 do artigo 12º. do CIMT, o legislador veio afastar, para diversas situações, a regra geral de determinação do valor tributável para efeitos de IMT prevista no nº. 1 do artigo 12º. do CIMT, determinando que no caso dos bens adquiridos ao Estado ou às Autarquias Locais, o valor tributável para efeitos de IMT é o “preço constante do acto ou contrato”.
iv. Se para efeitos de IMT e igualmente para efeitos de Imposto do Selo (nº. 4 do artigo 9º do respectivo código), no caso de bens adquiridos ao Estado ou às Autarquias Locais, o próprio legislador confirma como verdadeiro e inquestionável o preço constante do contrato, sendo esse o valor que corresponde o valor tributável para efeitos daqueles impostos, também para efeitos de IMI terá que ser reconhecido esse valor como o valor patrimonial tributável do terreno - pela simples razão de que, num e noutro caso, se trata da mesma realidade económica e jurídica.
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Senão decisivamente, o preço de compra e venda, quando for (e é o caso) manifestamente inferior ao VPT, deve, ao menos, ser considerado e levado em linha de conta, na determinação do valor do imóvel.
vi. Após as alterações legislativas do artigo 76º. do CIMI que entraram em vigor em 01.01.2009, o procedimento de segunda avaliação passou a consagrar dois regimes distintos: - um, efectuado ao abrigo do nº. 1 do artigo 76º, a utilizar quando estiverem em causa a alteração/correcção dos elementos declarados ou dos factores dos parâmetros usados para o cálculo do VPT, método que, no entender da Recorrida, não corresponde a uma verdadeira segunda avaliação, na medida em que se trata de uma mera correcção de factores multiplicativos que foram declarados pelo contribuinte ou corrigidos pelos peritos avaliadores, não se justificando o recurso a peritos especializados para esse efeito; e, - outro, efectuado ao abrigo do nº. 5 do artigo 76º., a utilizar quando, não obstante não se verifiquem incorrecções ao nível dos factores multiplicativos da fórmula, o VPT apurado por essa via se desvie, para mais ou para menos, em pelo menos 15%, face ao valor de mercado — esta sim, uma verdadeira segunda avaliação, digna dessa designação, em que se torna imprescindível a análise do processo por especialistas na área da avaliação de imóveis e justificando a formação de uma comissão com poderes para fixar os VPT’s.
vii. No caso em análise, a Recorrida fundamentou o seu pedido de segunda avaliação na distorção entre o VPT e o valor de mercado.
viii. Sendo certo que o VPT é fixado de acordo com os “critérios objectivos” fixados nos artigos 38º. e seguintes do Código do IMI, desde a entrada em vigor da Lei nº. 64-A/2008, de 31 de Dezembro que se permite que, quando a aplicação daqueles critérios conduza à fixação de um valor patrimonial tributário que se apresente distorcido relativamente ao valor normal de mercado, o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção possa ser fixado por aplicação do método comparativo dos valores de mercado ( Cfr. o nº. 4 do art. 76º do Código do IMI, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 93º da Lei nº. 64-A/2008, de 31 de Dezembro.
).
ix. Como ressuma da sentença sob recurso, o facto de a nova redacção do artigo 76º do Código do IMI apenas ter entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009, não constitui obstáculo à sua aplicabilidade à segunda avaliação, uma vez que se trata de norma de cariz procedimental, e, portanto, é de aplicação imediata - a menos que tal aplicação prejudique garantias, direitos e interesses legítimos dos Contribuintes ( Cfr. o nº. 3 do artigo 12º da LGT.
), o que no caso não ocorre.
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Bem andou o Tribunal a quo, portanto, ao decidir como decidiu, sendo esse, aliás, o entendimento da nossa Jurisprudência Superior ( Cfr. Ac. STA de 18.11.2004, dado no proc. nº. 0765/09.
).
xi. O Tribunal a quo julgou a impugnação procedente, por violação do disposto no artigo 76. nº 4 do CIMI, e, desse modo, absteve-se de conhecer os demais vícios invocados — o que, agora, impõe o seu conhecimento pelo Tribunal de Recurso ( Cfr. Arts. 715º nº. 2 e 726º CPC, ex vi art. 2º al. e) CPPT.
).
xii. Não se vislumbra em que se baseia a majoração do coeficiente de localização (CI) em 0,85 na avaliação em apreço, tendo em conta que, como referido, o artigo 45º CIMI não estabelece tal coeficiente para determinação do VPT de terrenos para construção.
xiii. Aliás, a não ser assim, verificar-se-ia uma dupla ponderação do factor “localização”, uma vez que a mesma já é considerada em 22% da percentagem do valor do terreno de implantação — como resulta claro da concatenação entre o disposto no artigo 45.º n.º 2 e 3, e artigo 42.º n.º 3 CIMI.
xiv. Também não se vislumbra em que se baseia a majoração do coeficiente de afectação (Ca) em 1,20, tendo em conta que o artigo 45.º CIMI não estabelece tal coeficiente para determinação do VPT de terrenos para construção, como se não entende em que se baseia a majoração do...
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