Acórdão nº 0677/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Maio de 2012
Magistrado Responsável | LINO RIBEIRO |
Data da Resolução | 30 de Maio de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. A……, Lda, devidamente identificada nos autos, interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a impugnação da liquidação do Imposto Municipal de Sisa, no valor de 14.963,94€, que lhe foi notificada em 15/2/2005 pelo Serviço de Finanças de Estarreja.
Nas alegações, concluiu do seguinte modo:
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No seu requerimento, a ora recorrente alegou que a diferença entre o valor dos bens permutados não era de Esc. 30.000.000$00, mas de apenas de Esc. 10.000.000$00, na medida em que permutou quatro fracções autónomas no valor global de Esc. 40.000.000$00, por um terreno a que foi atribuído o valor de Esc. 50.000.000,00.
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No entanto, a decisão proferida não se pronunciou sobre a questão essencial suscitada pela então impugnante, sobre a qual deveria ter-se pronunciado, o que determina a nulidade da sentença, nos termos do disposto no art. 125°, nº 1, do CPPT.
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No texto da escritura de permuta em momento algum a aqui recorrente declarou que o terreno por si adquirido era destinado a revenda, antes declarou que as duas fracções futuras, objecto da permuta, integrariam o prédio que iria edificar no terreno acabado de adquirir, o que implica necessariamente que o destinaria a construção urbana.
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Nesta conformidade, não tem qualquer fundamento factual a afirmação, contida na sentença recorrida, de que os prédios adquiridos não podem beneficiar das prorrogativas estabelecidas nos arts. 11°, n° 3, e 13°, do CIMSISSD, uma vez que não se destinaram a revenda e carece de fundamento legal a decisão proferida nesse pressuposto.
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Na escritura pública de permuta outorgada a 16.05.1997, a fls. 24 a 28 do Livro 119-C do Cartório Notarial de Estarreja, as partes declararam, em síntese: - Os ali segundos outorgantes B…… e mulher C……, que cediam à sociedade recorrente o direito de propriedade do prédio rústico ali identificado; - Os legais representantes da sociedade, ali primeiros outorgantes, que cediam aos segundos outorgantes o direito de propriedade de duas fracções designadas pelas letras “G” e “H”, que integram o prédio em construção ali identificado; - Que, para efeito da permuta, atribuíam o valor de cinquenta milhões de escudos ao prédio rústico e de dez milhões de escudos a cada uma das fracções autónomas “H” e “G”; - A diferença de valores verificada naquela permuta, de trinta milhões de escudos, seria paga, pela entrega, naquele acto, de dez milhões de escudos e os restantes vinte milhões de escudos conforme adiante estabelecido; - A recorrente confessou-se devedora para com os ali segundos outorgantes da quantia de vinte milhões de escudos, obrigando-se a efectuar o seu pagamento em espécie através de duas fracções autónomas que integrarão o edifício a erigir pela devedora no prédio rústico então adquirido, correspondentes ao quarto andar esquerdo e direito; - Em caso de incumprimento imputável à ora recorrente a outra parte poderá exigir-lhe o pagamento em numerário da quantia de vinte milhões de contos.
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A recorrente efectuou a prestação a que se obrigara, através de escritura pública outorgada a 10.05.2000, a fls. 44 a 45 do Livro 132-A do Cartório Notarial de Estarreja, transferindo para os referidos B…… e mulher o direito de propriedade das fracções autónomas designadas pelas letras “l” e “J”, correspondentes ao quarto andar esquerdo e direito do prédio ali identificado, edificado sobre o terreno adquirido através da escritura de permuta supra referida.
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O art. 2° do Código do Imposto Municipal de Sisa estabelecia que este imposto incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade sobre bens imóveis, estabelecendo no § 1° do seu art. 7° que, nos contratos de permuta de bens imobiliários, qualquer que seja a sua natureza, o imposto será pago pelo permutante que receber os bens de maior valor.
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O § 1° do citado art. 2° definia, para efeitos de sisa, que compra e venda era o contrato pelo qual se trocam bens imobiliários por bens mobiliários e que troca era o contrato em que prestações de ambos os permutantes compreendam bens imobiliários.
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O nº 8 do § 3° do artigo 19º daquele código estabelecia que nas permutas de bens imobiliários tomar-se-á para base da liquidação a diferença declarada de valores, quando esta for superior à diferença entre os valores patrimoniais.
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Estabelece o art. 236° do Cód. Civil que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, determinando o art. 238° do mesmo diploma que, nos negócios formais, como é aquele em apreço, a declaração vale com um sentido que tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
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Analisando o texto das duas indicadas escrituras públicas, verificamos que o negócio jurídico que as partes pretenderam efectuar foi uma permuta de bens imóveis, em que a prestação do B…… e mulher se traduziu na transmissão do prédio rústico para a ora recorrente, avaliado em cinquenta mil contos, e que a prestação desta consistiu na transmissão para aqueles do direito de propriedade sobre quatro fracções autónomas, sendo duas bens actuais e outras duas bens futuros, a que foi atribuído o valor global de quarenta mil contos, sendo a diferença entre as duas prestações, no valor de dez milhões de escudos, paga em dinheiro aquando do primeiro acto notarial.
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As duas fracções objecto da troca que já se encontravam licenciadas e definidas foram objecto de permuta na primeira escritura e apenas porque as outras duas fracções eram bens incertos e indefinidos, a concretização da sua troca pelo prédio rústico foi diferida no tempo, a recorrente se confessou devedora do valor que as partes lhes atribuíram, que pagou em espécie através da segunda escritura.
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O pagamento da quantia de vinte mil contos de que a recorrente se confessou devedora apenas seria exigível em caso de incumprimento definitivo que lhe fosse imputável, o que consiste no estabelecimento duma cláusula penal e não o modo de efectuar a prestação.
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A dação em pagamento verifica-se quando se efectua a prestação de coisa diversa da devida, não sendo o que se verificou na segunda escritura, em que a recorrente efectuou a prestação a que contratualmente se obrigara: transmissão das duas fracções autónomas prometidas trocar e identificadas na primeira escritura.
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Aquelas escrituras contêm, por conseguinte, um erro na expressão da vontade negocial que, no entanto, tem correspondência com o texto do documento e não invalida a interpretação das declarações de vontade das partes feita supra, das quais decorre com toda a clareza que estas acordaram na primitiva escritura um pagamento em espécie, que concretizaram através do segundo acto notarial, o qual não constitui, pois, uma dação em pagamento em alternativa a diversa prestação contratualmente fixada mas a efectiva concretização da prestação a que a devedora primitivamente se obrigara.
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O imposto de sisa tributa a riqueza efectivamente transmitida; nas permutas de imóveis este imposto procura atingir os valores em que se traduziu o efectivo enriquecimento patrimonial e, por isso, só está a ele sujeito o contratante que tenha recebido mais do que aquilo que entregou —Ac. STA de 27.01.1999, Ac. Dout. STA 450— pág. 798.
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Na troca ou permuta para efeitos de sisa, a prestação de uma das partes pode englobar bens imóveis futuros — cfr, entre muitos outros, Ac. Tribunal Central Administrativo de 25.05.1999, BMJ 487 — pág.
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Tendo as partes permutado um terreno avaliado em cinquenta mil contos por quatro fracções autónomas avaliadas em quarenta mil contos, o Imposto Municipal da Sisa apenas deve incidir sobre a diferença daquele para estas, que é, actualmente, de € 49.879,79 (quarenta e nove mil oitocentos setenta e nove euros e setenta e nove cêntimos).
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A sentença recorrida está ferida de nulidade nos termos do disposto no art. 125°, nº 1, do CPPT e viola o disposto no art. 99° do CPPT e nos arts. 2° e 7°, § 1°, do CIMSISSD 1.1. Não houve contra-alegações.
1.2. O digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido na procedência do recurso porque...
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