Acórdão nº 01149/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução16 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A……, Lda.” (adiante Oponente ou Recorrente) deduziu oposição à execução fiscal que contra ela foi instaurada para cobrança de dívidas provenientes de taxas de promoção do “Instituto da Vinha e do Vinho, I.P.” (adiante IVV ou Recorrido) por ela autoliquidadas relativamente aos meses de Janeiro a Abril de 2010, pedindo ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a extinção da execução fiscal com os seguintes fundamentos, que subsumiu, respectivamente, às alíneas i) e a) do art. 204.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT): · a inconstitucionalidade orgânica e material das normas do CPPT que determinam a prática de funções jurisdicionais pelo Serviço de Finanças no âmbito da execução fiscal, em especial o n.º 1 do artigo 188.º do CPPT, o que o que acarreta a nulidade do mandado de citação emitido pelo Chefe do Serviço de Finanças e, consequentemente, da citação efectuada; · a não autorização para a cobrança da taxa de promoção, uma vez que tal cobrança «se encontra suspensa por decisão comunitária, como aliás, o IVV bem sabe» (As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente são transcrições, aqui como adiante.

) A Oponente pediu também a isenção da prestação de garantia.

1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, em sede liminar, considerou que o pedido de dispensa de garantia deveria ser apresentado mediante requerimento a efectuar no próprio processo executivo e endereçado ao órgão de execução fiscal, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 170.º do CPPT, que atribui ao órgão de execução fiscal, e não ao tribunal, o poder de decidir sobre essa pretensão. Já na sentença julgou a oposição improcedente, considerando, em resumo, que a oposição à execução fiscal não podia proceder com o primeiro dos fundamentos invocados na petição inicial, pois não há qualquer inconstitucionalidade na prática pelo órgão de execução fiscal de actos de natureza não jurisdicional, enquanto que o segundo fundamento «outro suporte não tem que não seja o de uma argumentação que traduz uma leitura “muito especial” de normas e procedimentos comunitários, leitura que não tem qualquer aderência à realidade verificada».

1.3 Inconformada com a sentença, a Oponente interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, o qual foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

1.4 A Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a oposição à execução, por erro na forma de processo e, uma vez que, alegadamente, não foi invocado nenhum dos fundamentos elencados no n.º 1 do artigo 204º do CPPT.

  1. A pretensão da A…… de oposição à execução da respeita o elenco taxativo do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, bem como a pretensão por si deduzida tem viabilidade e concludência, razão pela qual não é manifesta a sua improcedência.

  2. Na petição de oposição à execução foram invocados, em suma, os seguintes vícios: (i) a inconstitucionalidade orgânica e material das normas do CPPT que determinam a prática de funções jurisdicionais pelo Serviço de Finanças no âmbito da execução fiscal, em especial, o n.º 1 do artigo 188.º do CPPT; (ii) a cobrança de uma taxa não autorizada/inexistente nas leis em vigor; (iii) a pendência de processo contencioso com efeito suspensivo.

  3. O primeiro dos vícios apontados pela A…… na sua petição de oposição é enquadrável na última alínea do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT: a inconstitucionalidade invocada consubstancia fundamento que, desde logo, não envolve a apreciação da legalidade da liquidação da quantia exequenda, nem representa interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que emitiu o título, sendo provada, simplesmente, a partir de documentos – in casu, pelo documento de citação da A…… para a execução fiscal –, sendo certo que afecta a eficácia do acto de citação e consequente exigibilidade da dívida exequenda.

  4. O segundo dos fundamentos invocados na petição de oposição que dá causa aos presentes autos, que se prende com a inexistência da taxa em questão nas leis em vigor/não autorização da cobrança da mesma taxa, tem cabimento expresso na alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

  5. É ilegal a cobrança coerciva de uma quantia proveniente de uma taxa inexistente ou cuja cobrança não se encontra autorizada.

  6. O IVV pretende fazer-se pagar de uma taxa cuja cobrança se encontra suspensa por decisão comunitária.

  7. Nos termos do n.º 3 do art. 88.º do Tratado CE (TCE), o Estado Português encontra-se inibido de executar qualquer auxílio que esteja a ser objecto de um processo de apreciação pela Comissão até à emissão, por aquela entidade, de uma decisão final de aprovar (ou não) o auxílio em causa – cf. art. 88.º, n.º 3, in fine, do TCE –, conforme sucede com o auxílio que a taxa de promoção em causa financia.

    I. A própria Comissão «recorda a Portugal o efeito suspensivo do n.º 3 do art.º 88.º do Tratado CE e remete para o art. 14.º do Regulamento (CE) n.º 659/1999 do Conselho que dispõe que os auxílios ilegais poderão ser reembolsados pelos seus beneficiários» – cf. considerando n.º 147 do processo C 43/2004, junto aos autos como documento n.º 2 com a contestação apresentada pelo IVV.

  8. Até que a decisão final seja proferida pela Comissão quanto ao auxílio do período em questão, tanto esse auxílio, como o seu incindível modo de financiamento – a taxa de promoção – não podem ser postos em execução, o que equivale a dizer que a sua cobrança não está, ao momento da liquidação, autorizada, e que os diplomas nos quais essa liquidação se baseia são de considerar, de momento, juridicamente inexistentes.

  9. A A…… pode invocar em juízo o efeito directo da proibição de execução constante do n.º 3 do art.º 88.º do TCE, para com isso fundamentar a ilegalidade da cobrança deste tributo, o que fez nos presentes autos.

    L. O IVV, ao solicitar a instauração de processo de execução fiscal, e a Administração Tributária, ao instaurá-lo, estão simultaneamente a violar uma norma de direito comunitária e a aplicar legislação que à data tem forçosamente de se considerar juridicamente inexistente (ou, pelo menos, como não estando a produzir efeitos, o que será equiparado à inexistência).

  10. Tais factos constituem manifestos fundamentos de oposição à execução, enquanto atinentes com a ilegalidade abstracta do tributo, nos termos do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea a), do CPPT.

  11. Este fundamento de oposição à execução não deverá ser julgado improcedente, atento, inclusivamente, o próprio teor das decisões comunitárias juntas aos autos pelo IVV com a sua contestação (cf. docs. 1 e 2 juntos aos presentes autos com a contestação do IVV), decisões nas quais o Tribunal a quo sustenta, precisamente, o indeferimento ou improcedência de tal fundamento – cf. página 6 da sentença proferida nos presentes autos.

  12. Em Julho de 2010, foi com efeito proferida uma decisão pela Comissão Europeia no âmbito do procedimento de apreciação de auxílio estatal, decisão que foi junta pelo IVV como documento n.º 2 com a contestação apresentada nos presentes autos. Todavia, para além do próprio teor da decisão em questão e para além de tal decisão ser uma decisão condicional e de não ter ainda transitado em julgado (em face do recurso interposto pela República Portuguesa, junto como doc. n.º 3 pelo IVV), P. Será relevante notar que essa decisão limita-se ao exame da aplicação da taxa de promoção a partir da sua entrada em vigor e até 31 de Dezembro de 2006 (cf. ponto 133 da referida decisão, junta como doc. n.º 2 pelo IVV), data em que entraram em vigor novas orientações comunitárias para ao auxílios estatais, Q. Sendo certo que, por um lado, a Comissão ainda não proferiu decisão relativamente à aplicação da taxa de promoção para além dessa data e, por outro lado, os presentes autos respeitam a uma execução fiscal instaurada para cobrança coerciva da taxa de promoção relativa ao período de Janeiro a Abril de 2010, período, portanto, desde logo não abrangido pela decisão referida! R. Não poderá proceder o entendimento de que o fundamento de estarmos perante a cobrança de urna taxa não autorizada/inexistente nas leis em vigor é improcedente por ter sido já proferida decisão final no aludido procedimento comunitário.

  13. No que respeita à pendência de processo contencioso com efeito suspensivo – fundamento que não foi apreciado pelo Tribunal a quo –, a jurisprudência e a doutrina...

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