Acórdão nº 0212/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução16 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A……. (adiante Autor ou Recorrente) apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro uma petição inicial em cujo cabeçalho disse vir deduzir «Acção Declarativa de Condenação sob a forma de Processo Sumário» (() (As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente são transcrições, aqui como adiante.)) contra a sociedade denominada “B……, Lda.” (adiante Ré ou Recorrida).

Alegando, em síntese, que a referida sociedade, que foi sua entidade patronal, não comunicou à Segurança Social os valores correctos das contribuições referentes ao trabalho que lhe foi prestado pelo Autor e, consequentemente, deixou por pagar à Segurança Social as diferenças correspondentes, concluiu formulando o seguinte pedido: «a) Ser a Ré condenada a comunicar à Segurança Social o valor correcto das contribuições referentes ao trabalho efectuado pelo Autor, na quantia de € 19.800,01 e, consequentemente, b) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor as Contribuições para a Segurança Social em falta, na importância de € 6.880,50, a efectuar junto dessa Instituição».

1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro rejeitou liminarmente a petição inicial com o fundamento de que «o pedido do autor não é passível de ser apreciado uma vez que as relações jurídicas tributárias são apreciadas relativamente a actos administrativos praticados pela administração tributária e não actos de particulares».

1.3 O Autor não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, que foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.4 O Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « I. O aqui Recorrente interpôs contra a aqui Recorrida a competente Acção Declarativa de Condenação emergente de Contrato Individual de Trabalho com Processo Comum, no Tribunal de Trabalho de Santa Maria da Feira, que correu os seus termos ao abrigo do Processo n.º 617/10.5TTVFR.

  1. Requereu o Recorrente que a Recorrida fosse condenada a comunicar à Segurança Social o valor correcto das contribuições respeitantes ao trabalho efectuado pelo Recorrente, na quantia de € 19.800,01, bem como, a pagar ao Recorrente as contribuições para a Segurança Social em falta, na importância de € 6.880,50, a efectuar junto dessa Instituição.

  2. Por Sentença proferida a 22 de Fevereiro de 2011, entendeu a Juiz a Quo [(() (O Recorrente refere-se à Juíza do Tribunal de Trabalho de Santa Maria da Feira.))] julgar o Tribunal de Trabalho incompetente em razão da matéria para apreciar dos pedidos formulados pelo Recorrente e, consequentemente, absolver a Recorrida da Instância (cf. documento junto aos autos).

  3. Isto porque, compete aos Tribunais Administrativos e Fiscais conhecer da acção na qual se pretende obter a condenação da Recorrida a regularizar os pagamentos das contribuições à Segurança Social, em conformidade com a Douta Sentença e, segundo os doutos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 29 de Junho de 2005 e 28 de Setembro de 2009 (in www.dgsi.pt).

  4. Neste seguimento, veio o ora Recorrente interpor a competente Acção Declarativa de Condenação contra a Recorrida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, peticionando a condenação desta a comunicar à Segurança Social o valor correcto das contribuições para a Segurança Social referentes ao trabalho efectuado pelo Recorrente, na quantia de € 19.800,01 e, consequentemente a condenação da mesma a pagar ao Recorrente as Contribuições para a Segurança Social em falta na importância de € 6.880,50, a efectuar junto dessa Instituição.

  5. Acontece que, por Sentença proferida a 2 de Junho de 2011, entendeu a Juiz [do Tribunal] a Quo rejeitar liminarmente a mencionada Acção Declarativa de Condenação, uma vez que as relações tributárias são apreciadas relativamente a actos praticados pela Administração Tributária e não a actos de particulares.

    Ora, VII. Uma vez que o Autor, aqui Recorrente, pretendia a condenação da Ré, aqui Recorrida, a comunicar à Segurança Social e a efectuar junto desta o pagamento das contribuições em falta, entende o mesmo que o Tribunal competente será o Tribunal Administrativo e Fiscal, mais precisamente, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro.

    Isto porque, VIII. Consagra o artigo 26.º, n.º da LOFTJ (Lei n.º 52/2008, de 28/08) que os Tribunais Judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.

  6. Preceito que se encontra em sintonia com o disposto no artigo 211.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual, “Os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais”.

  7. Dentro dos Tribunais Judiciais encontram-se os Tribunais de Trabalho, cuja competência se encontra definida no artigo 118.º da LOFTJ: “Compete aos Juízos de Trabalho conhecer em matéria cível: b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho; (...) i) Das questões entre instituições de previdência ou de abono de família e seus beneficiários, quando respeitem a direitos, poderes ou obrigações legais, regulamentares ou estatutárias de umas ou outros, sem prejuízo da competência própria dos tribunais administrativos e fiscais; (...) o) Das questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o juízo seja directamente competente”.

  8. Acontece que, no caso sub judice, a alínea i), do art. 118.º (LOFTJ) não se mostra preenchida, pois, a presente Acção não versa sobre um litígio entre um trabalhador e uma qualquer Instituição da Segurança Social.

  9. Por outro lado, a alínea o) do aludido art. 118.º, ao atribuir competência à jurisdição laboral para o conhecimento das “questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal seja directamente competente”, mostra-se afastada pelo facto de, na presente Acção, não ser formulado qualquer outro pedido para além do pedido de condenação da Ré, aqui Recorrida, no pagamento das contribuições para a Segurança Social relativas ao período compreendido entre 1990 e 2009.

  10. A questão submetida a apreciação judicial não se reporta à relação jurídica prestacional (entre a Beneficiária e a Segurança Social), mas sim, à relação jurídica contributiva (entre a Entidade Empregadora - contribuinte - e a Segurança Social).

  11. Deste modo, verifica-se que a competência dos Tribunais Judiciais comuns é residual, só se verificando quando as regras reguladoras da competência de outra ordem jurisdicional não abranjam o conhecimento da questão que é submetida à apreciação do Tribunal.

  12. Conforme prescreve a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 212.º, n.º 3, “Compete aos Tribunais Administrativos e Fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.

  13. Mais, estipula o ETAF (artigo 1.º, n.º 1) que, “Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.

  14. Por outro lado, estabelece no seu artigo 4.º, n.º 1 aI. a) que, “Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto: Tutela de direitos fundamentais, bem como dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares directamente fundados em normas de direito administrativo ou fiscal ou decorrentes de actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo ou fiscal”.

  15. Tem sido entendimento da maioria da Jurisprudência que os Tribunais Administrativos e Fiscais são competentes, isto é, a jurisdição administrativa e fiscal - mais exactamente os Tribunais Tributários - para a acção intentada pelo Trabalhador contra a Entidade Patronal, pedindo o reconhecimento de que certas parcelas remuneratórias constituem matéria colectável pela Segurança Social e a consequente condenação a proceder aos respectivos pagamentos contributivos (cf. neste sentido, Acórdão do Tribunal de Conflitos de 04.10.2007 - in www.dgsi.pt).

  16. A Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 05.06.2002 - in www.dgsi.pt.

    ), por sua vez, considera as contribuições para a Segurança Social como receitas tributárias ou parafiscais e entende que são competentes os Tribunais Tributários de 1.ª Instância para apreciar a impugnação dos actos que se relacionem com a liquidação de tais contribuições.

  17. Assim, é entendimento sufragado pela Jurisprudência que, compete aos Tribunais Administrativos de Círculo o conhecimento dos litígios entre as Instituições da Segurança Social e os respectivos Beneficiários, que tenham por objecto a negação de uma prestação devida, quer se trate de negação total da prestação, quer de divergência quanto ao seu montante (cf. neste sentido, Acórdãos do Tribunal dos Conflitos de 13.05.2003 e 01.07.1997 - in www.dgsi.pt).

  18. O ETAF, de igual modo, consagra no n.º 1, do artigo 49.º, as competências dos Tribunais Tributários, prevendo-se na al. c), as acções destinadas a obter o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos em matéria...

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