Acórdão nº 0902/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelASCENSÃO LOPES
Data da Resolução19 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A……, NIPC ……, com sede na ……, n.° …, no Porto, nos presentes autos de execução fiscal n.° 3387200701065785 e apensos, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 276.° e seguintes do CPPT, apresentar reclamação do despacho do Senhor Chefe do Serviço de Finanças do Porto - 4, datado de 7 de Setembro de 2009, pelo qual lhe foi indeferido o seu pedido de suspensão da venda executiva.

Por sentença de 12 de Junho de 2012, o TAF do Porto, julgou a reclamação judicial procedente na consideração de que o despacho reclamado está insuficientemente fundamentado por não concretizar as razões de facto eu determinaram a sua decisão de indeferimento do pedido de suspensão da venda executiva.

Reagiu a Fazenda Pública ora recorrente, interpondo o presente recurso, cujas alegações integram as seguintes conclusões: A.

Recorre-se da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, determinando a anulação do despacho reclamado por vício de falta de fundamentação do despacho reclamado no que concerne ao indeferimento do pedido de suspensão da venda nos termos do n.° 2 do art. 244° do CPPT, por considerar que “constata-se que o despacho sub judicio não concretiza as razões de facto que determinam a sua decisão de indeferimento do pedido de suspensão da venda executiva” e que “não se vislumbram no sobredito despacho as razões de facto determinantes da decisão, nomeadamente se, in concretu, existem ou não outros bens que possam ser vendidos, por forma a assegurar a cobrança dos créditos tributários”.

B.

Ressalvado o devido respeito, a Fazenda Pública não se conforma com a sentença exarada, porquanto a decisão de não suspensão do processo executivo não está dependente da especial exigência de fundamentação pressuposta pelo Tribunal como pilar da sua argumentação e porquanto a decisão se mostra devidamente fundamentada.

  1. Especificando, entende-se que apenas a decisão de suspensão do processo executivo, nos termos do disposto no art. 244° do CPPT, se encontra adstrita a especiais exigências de fundamentação, de forma a impor ao OEF a “ponderação” que a decisão de suspensão reclama.

    D.

    Sendo da exclusiva competência do OEF a decisão de suspensão da venda marcada, aquele não pode sem mais determinar a suspensão da execução, apenas pode suspender a execução depois de aferir do preenchimento dos pressupostos enunciados no n° 2 do ad. 244°, ou seja, o valor manifestamente superior dos créditos reclamados pelos demais credores com garantia relativamente ao valor da dívida exequenda e acrescido e a existência de outros bens sobre os quais possa a execução prosseguir para satisfação dos créditos tributários.

    E.

    Justifica-se esta exigência, na medida em que, findo o prazo do pagamento voluntário, o devedor acha-se em situação de incumprimento, sendo que, esse incumprimento legitima a cobrança coerciva, através do processo de execução fiscal e, assim, a AT não está apenas legitimada a proceder à cobrança coerciva, mas obrigada a fazê-lo, não tendo, nesta matéria, qualquer margem para critérios de oportunidade, sendo a sua actuação estritamente vinculada à lei.

    F.

    A lei é clara nessa absoluta vinculação da AT, estabelecendo quer a indisponibilidade do crédito tributário, quer a proibição da moratória, nos termos do disposto no n.° 2 do art.° 30° da Lei Geral Tributária (LGT), segundo o qual o crédito tributário é indisponível só podendo ser criadas condições para a sua redução ou extinção com respeito pelos princípios da igualdade e da legalidade tributária e n.° 3 do art.° 36° do citado diploma legal, segundo o qual a AT não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei. Pelo que, no art. 244°, n° 2 do CPPT, se exige “decisão fundamentada” do órgão de execução, com o objectivo de impor a “ponderação” e a possibilidade de controlo da verificação dos pressupostos fixados pelo legislador, ante a faculdade conferida àquele de suspender a execução.

    G.

    A douta decisão recorrida, do exarado no ad. 244°, n° 2, extrai que o OEF apenas poderia decidir pela não suspensão da venda marcada depois de aferir do preenchimento pressupostos ali exarados, sendo ilegal por falta de fundamentação a decisão tomada, ou seja, conclui-se que os requisitos de fundamentação estipulados para a decisão de suspensão o são também para exarar decisão de indeferimento do pedido de suspensão com base no disposto naquele artigo, efectuado pela reclamante, o que não aceitamos na medida em que tal decisão de suspensão se encontra estipulada como uma faculdade e não como uma obrigação.

    H.

    Com efeito, a utilização do termo “pode” e a concessão do “poder de decisão” ao OEF apontam no sentido de se estar em face de um poder discricionário atribuído não em razão da qualidade de entidade que dirige o PEF, mas em razão da “qualidade de representante da exequente”, que acumula aquelas funções, sendo, assim, um poder que o OEF como representante do titular dos créditos tributários “exercerá conforme a perspectiva que tenha sobre a melhor forma de atingir o objecto que a execução fiscal visa que é o de assegurar a rápida cobrança dos mesmos créditos”.

    I.

    Segundo o mui douto Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (que dedica à matéria em causa nestes autos as nota 5 e 7 ao art. 244° da sua obra CPPT Anotado e comentado, Áreas Editora, Lisboa, 2011, Volume IV, cuja argumentação acompanhamos), será “curial” que o OEF decida a suspensão da venda dos bens sobre que incidem os créditos reclamados quando for de presumir que eles não poderão ser utilizados ou serão desnecessários para o pagamento dos créditos tributários, sendo que aquela expressão deve ser interpretada com o significado do que é adequado, conveniente ou sensato e não como constituindo uma obrigação ou imposição.

    J.

    Esta perspectiva não nos parece autorizar a conclusão transposta para a sentença de que sem apreciar as razões de facto que determinariam a suspensão da venda, a decisão subjacente deveria ser anulada, uma vez que esta conclusão tem subjacente a interpretação do n.° 2 do art. 244° como contendo um dever, obrigação ou imposição de fundamentação da decisão de não suspensão que a lei determina ao OEF, quando na verdade, a não suspensão decidida concretiza a prossecução normal dos autos, que constitui a real obrigação do OEF, K.

    Sendo a suspensão da venda um desvio do itinerário procedimental que conduzirá à cobrança do tributo, desvio esse que só será admissível quando o interesse do próprio exequente o imponha, justificando-se só em caso de suspensão o preenchimento dos respectivos requisitos.

    L.

    Aliás, é muito questionável a legitimidade do executado, aqui reclamante, para tomar a iniciativa de suspender a venda com este fundamento, atento o interesse público de cobrança que está subjacente à norma em discussão.

    M.

    Por outro lado, a exigência de fundamentação dos actos administrativos (conceito em que se inserem os actos tributários, à face do preceituado no art. 120.° do CPA) é formulada no art. 268°, n.° 3, da CRP, que estabelece que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”.

    N.

    Em matéria tributária, o dever de fundamentação dos actos decisórios de procedimentos tributários e dos actos tributários é concretizado, de forma genérica, no art. 77.° da LGT, nos termos do qual “a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária” e a “fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.

    O.

    Com a devida vénia, o Supremo Tribunal Administrativo, tem vindo a entender que a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.

    P.

    Fora de situações especiais em que são exigidos acrescidos de fundamentação (como é o caso da decisão de suspender o PEF com base no art. 244°, n° 2), o acto considera-se suficientemente fundamentado quando é atingido formalmente esse propósito, dando a conhecer os elementos que a lei exige que sejam indicados e, sendo atingido tal objectivo, qualquer irregularidade ou omissão deverá considerar-se sanada, aferindo-se tal efeito face ao acto efectivamente praticado, perante o qual terá que ser cotejada a sua adequação.

    Q.

    A fundamentação formal visa possibilitar um conhecimento concreto das razões que determinaram a AT a actuar como actuou, permitindo conhecer o seu itinerário cognoscitivo e valorativo, enquanto a fundamentação material ou substancial caracteriza-se pela enunciação de motivos aptos e legítimos a suportar a decisão de fundo, visando encontrar a base substancial que a legitima, por forma a demonstrar que se verificam os pressupostos legais dos quais depende a sua actuação.

    R.

    Ora, a AT emanou decisão fundamentada no sentido de esclarecer a requerente da impossibilidade de suspensão da venda, com base no art. 244°, n° 2 do CPPT, porque como resulta da informação que sustenta o despacho reclamado, a presidir à decisão de suspensão está o interesse público.

    S.

    Decorre dessa informação que no caso de os créditos não tributários consumirem o produto da venda, não há justificação para que credores que não o...

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