Acórdão nº 0429/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 26 de Setembro de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A…… recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal de 6 de Maio de 2011, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação de IRS referente ao ano de 2002.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. A douta sentença ora em recurso padece de três grandes vícios:
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Não se pronuncia sobre questões suscitadas pelo impugnante, questões essas cujo conhecimento se reputa essencial à boa decisão da causa (omissão de pronúncia); b) Existe manifesta contradição entre a matéria considerada provada e a decisão final; c) A fundamentação da douta sentença está em contradição com a decisão, pois naquela elencam-se vários acórdãos sobre a aplicação no tempo do DL 202/96 e, nesta, iguala-se a posição do recorrente aos factos que deram origem aos mencionados arestos, factos que em nada são semelhantes aos do recorrente.
Há violação dos arts 125° CPPT, 659°-2-3, 660°-2 e 668-1-c)-d) CPC.
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O recorrente submeteu-se a nova junta médica e obteve atestado nos moldes daquele DL, atestado que foi considerado como respeitando «...integralmente todos os requisitos legalmente exigidos e constantes do no 5 do art° 44º EBF e dos Decretos-Lei n°s 202/96 e 174/98, respectivamente, de 23-10 e 19/07...», incluindo, obviamente, o princípio da capacidade restante.
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O que o impugnante colocou em crise, foi a ilegalidade da AF em exigir um terceiro atestado com data posterior a 03-06-2002, arbitrariamente escolhida e não fundamentada, data que, dois anos mais tarde veio a saber que se tratava da data do relatório, que ainda nem tinha sido sancionado.
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A AF poderia, quanto muito, exigir um atestado à data de 31-12-2002, ao abrigo do n° 7 do art° 14° CIRS. Mas, mesmo assim, a jurisprudência não é unânime quanto a essa possibilidade, conforme é reconhecido nos acórdãos que serviram de fundamento à decisão da douta sentença em recurso.
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Além disso, e porque a douta sentença, certamente por Lapso, entendeu que o caso do recorrente se assemelhava aos casos dos arestos nela indicados, não apreciou os restantes fundamentos alegados pelo impugnante, resguardando-se na excepção do art° 660°- 2 CPC, que não estava verificada, havendo, quanto a estes, omissão de pronúncia conforme é detalhado no Capítulo VI destas alegações e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
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A alínea a) do ponto 5 das Instruções Gerais do Anexo I ao DL 202/96, que, sob a capa de instruções, impõe o princípio da capacidade restante, mais não é do que uma norma Limitadora da atribuição dos benefícios fiscais, que colide com as garantias dos contribuintes, cuja competência é da Assembleia da República. Não tendo o governo obtido a prévia e necessária autorização legislativa, houve violação da Constituição - art°s 106°-2-3 e 168°-1-i) CRP.
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O modelo de atestado constante do anexo II do ao DL 202/96, ao exigir que a doença seja revelada no próprio atestado, viola os art°s 26°, 106°-2-3 e 168°-1-b) CRP em vigor ao tempo, tanto sob o ponto de vista da inconstitucionalidade orgânica (pois era necessário que o governo obtivesse autorização legislativa para fazê-lo), como sob o ponto de vista da inconstitucionalidade material, já que essa revelação viola o princípio da reserva da intimidade da vida privada do cidadão. À AF basta-lhe saber que o sujeito passivo é ou não deficiente, sem necessidade de que este lhe revele as doenças de que padece - acórdão do TCAS de 10-07-2002 (proc° 6687/02).
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Houve, ainda, violação dos art°s 18° e 266° CRP e 4°, 5°, 6° e 6°-A CPA violação dos direitos, liberdades e garantias, dos princípios do interesse público, protecção dos direitos e interesses do cidadão, da justiça e da confiança legítima.
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A revogação implícita do atestado de 06-04-99 viola ainda o princípio da igualdade previsto no art° 13° CRP, já que em casos de atribuição indevida de benefícios fiscais (supondo que se trataria disso para a AF), a AF emanou instruções em sede de Contribuição Autárquica, através do ofício circulado n.° 40 042, de 02.05.2001, segundo as quais se trataria de acto constitutivo de direitos que não poderia ser revogado. Mas, não agiu de igual forma perante o IRS do recorrente que, na óptica da AF, estaria em situação semelhante.
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O novo modelo do atestado, viola ainda: - O Art° 80° CCivil - violação da reserva da intimidade da vida privada; - As Bases XIII, no 2 e XIV da Lei 48/90, de 24-08 (Lei de Bases da Saúde) - a informação médica sobre os doentes é confidencial; - O art° 13°, alínea c) do DL 282/77, de 05-07 (Estatuto da Ordem dos Médicos) - é dever do médico guardar segredo profissional.
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O (segundo) atestado médico, emitido ao recorrente, nos moldes do DL 202/96 e a confirmação pela AF, após um rigoroso processo de inquérito, como respeitando integralmente todos os requisitos legalmente exigidos e constantes do n° 5 do art° 44° EBF e dos Decretos-Lei nos 202/96 e 174/98, respectivamente, de 23-10 e 19/07...» é um acto constitutivo de direitos, que não pode ser livremente revogado pela autoridade que o praticou (ARS) e, muito menos, pela AF que, encapotadamente, o pretendeu fazer ao exigir outro atestado com data posterior a 03-06-2002, apesar de saber que a ARS não tinha revogado ou anulado aquele atestado.
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Ao revogar, de forma implícita, despacho de 19-05-99 do DGI, que considerou o atestado de 06-04-99 como respeitando todos os requisitos do DL 202/96, a AF violou ainda o art° 18° CPT ao tempo em vigor, pois os actos tributários praticados por autoridade fiscal competente em razão da matéria são definitivos quanto à fixação dos direitos dos contribuintes.
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Tal revogação implícita, violou ainda os art°s 266° CRP e art°s 4°, 5°, 6° e 6°A CPA - princípios da prossecução do interesse público, protecção de direitos e interesses dos cidadãos, da justiça e da confiança legítima.
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O despacho de 19-05-99 enquadra-se no âmbito do art° 68° LGT, pelo que a AF não poderia proceder de modo diverso da informação prestada.
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Houve violação de direitos adquiridos, pela revogação de um acto constitutivo de direitos que não pode ser revogado livremente pela entidade que praticou o acto e, muito menos, por outra entidade sem competência para tal - art.° 12°, n° 4 do EBF e alínea b) do n.° 1 do art.° 140° CPA.
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E, ainda que tivesse sido revogado pela entidade que praticou o acto (a SRAS), esta teria de fazê-lo dentro do prazo estipulado na Lei, que também não foi respeitado - art°s 138°, 140°, 141°, 142° CPA.
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Com o mesmo acto de revogação do atestado por parte da AF, esta procedeu de forma ilegal, praticando um acto nulo, pois a revogação só pode operar-se por acto da própria autoridade que praticou o acto ou seu superior hierárquico, o que não aconteceu - houve violação do art° 133°-1-2-b) CPA.
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E violou ainda os art°s 347° e 369° a 372° CC, porquanto o atestado é um documento autêntico dotado de força probatória plena que só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto, o que a AF não logrou fazer.
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Ao exigir a apresentação de novo atestado, sem fundamentação, a AF praticou um acto ininteligível e de conteúdo impossível, violando as seguintes normas - art° 77° LGT e n° 1 e alínea c) do n° 3 do art° 133° CPA.
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A AF suportou o seu procedimento num hipotético erro de cálculo na atribuição da capacidade restante. Porém os novos cálculos feitos no inquérito à actuação das juntas médicas, não consideraram o estatuído no Despacho Normativo n° 217/78, de 07-09, que manda considerar o valor máximo dos coeficientes quando estes variarem dentro de certo intervalo, para a mesma deficiência.
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