Acórdão nº 01437/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Janeiro de 2013
Magistrado Responsável | ASCENSÃO LOPES |
Data da Resolução | 09 de Janeiro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1- RELATÓRIO A……………, S.A., pessoa coletiva n.° ……….., com sede na ………, …./…, no Porto, executada no processo de execução fiscal n.° 3182199901018280, deduziu Reclamação, ao abrigo do disposto no art.° 276° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), do acto de compensação de dívidas, no valor de €7713,05.
No Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto foi proferida sentença, em 27.07.2012, em que absolvendo a Fazenda Pública da instância quanto ao pedido de juros indemnizatórios, no mais, julgou procedente a reclamação, anulando o acto de compensação, decisão com que a reclamada Fazenda Pública não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional para o TCA-Norte que por acórdão de 25/10/2012 se declarou incompetente em razão da hierarquia para o conhecimento do recurso declarando a competência deste STA.
A recorrente alegou, tendo concluído da seguinte forma: A. Julgou a douta sentença recorrida procedente a reclamação de actos do Órgão de Execução Fiscal interposta, nos termos do artigo 276.° do CPPTT, que teve por objecto o acto de compensação n.° 1465947/2012.
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Vindo alegado como fundamento da reclamação em apreço o vício de violação de lei (mais concretamente, dos artigos 52.° n.°s 1 e 2 da LGT, 89.° e 169.° n.°s 1 e 11 do CPPT), a douta sentença começou por considerar como questão prévia que se verificavam os pressupostos para a subida imediata a Tribunal da reclamação apresentada pela Reclamante/Recorrida C. e, subsequentemente, julgou a reclamação procedente, com a consequente anulação do acto reclamado, por entender que o sobredito acto de compensação padece de ilegalidade.
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Ressalvado o devido respeito, com o que desta forma foi decidido, não pode a Fazenda Pública, conformar-se, existindo erro na aplicação do direito, por violação do disposto no artigo 278.° n.°s 1 e 3 do CPPT, atendendo às razões que se passa a desenvolver.
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Assim, contrariamente ao sentenciado, perfilha pois a Fazenda Pública o entendimento, já defendido na sua contestação, de que no presente pleito inexistem pressupostos para a subida imediata a Tribunal da reclamação apresentada pela Reclamante, visto não se verificarem os necessários pressupostos legais, nomeadamente por não ter tido lugar o momento legalmente relevante para o efeito, bem como por inexistir um prejuízo irreparável ou uma perda de utilidade à própria reclamação com a sua não subida imediata.
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Com efeito, por força do consagrado no artigo 276.° do CPPT, as decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1ª instância.
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Devendo a reclamação ser apresentada no prazo de 10 dias após a notificação da decisão, indicando-se expressamente os fundamentos e conclusões (cfr. artigo 277.° n.° 1 do CPPT).
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Por sua vez, refere o artigo 278.° do CPPT, no seu n.° 1, que o tribunal só conhecerá das reclamações quando, depois de realizadas a penhora e a venda, o processo lhe for remetido a final.
I. Contudo, em conformidade com o disposto no n.° 4 do artigo 278.° do CPPT, devem os autos ser remetidos ao tribunal pelo órgão da execução fiscal no prazo de oito dias, não se seguindo a regra geral contida no n° 1 do mesmo preceito, quando a reclamação se fundamentar em prejuízo irreparável causado por qualquer das situações previstas no n° 3 daquela mesma norma.
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Ora, a douta sentença recorrida considerou que como a compensação tem um efeito comparável na esfera jurídica da executada ao da penhora de um bem, lhe deve ser dado um tratamento idêntico quanto ao momento do conhecimento.
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Entende, porém, a Fazenda Pública, salvo o devido respeito, que é muito, que tal analogia não poderá ser feita, face à presunção de que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cfr. artigo 9.° n.° 3 do Código Civil).
L. De facto, se fosse a intenção do legislador que o momento do conhecimento de reclamações de actos de compensação por parte do tribunal fosse idêntico ao das reclamações de penhoras, teria dotado o n.° 1 do artigo 278.° de uma redacção distinta à actualmente em vigor, que fosse consentânea com tal propósito.
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Nestes termos, e sempre com o devido respeito pelo labor do Tribunal a quo, somos de parecer que ao ter determinado a subida imediata da presente reclamação em virtude da mencionada analogia errou na aplicação do direito.
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Por outro lado, a situação controvertida também não se subsume em nenhuma das quatro alíneas do n.° 3 do artigo 278.° do CPPT.
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No entanto, como bem salientou a decisão sob recurso, apesar do carácter taxativo dado ao elenco dos casos de subida imediata das reclamações, a doutrina e a jurisprudência têm entendido que não pode deixar de se admitir a possibilidade de impugnação imediata em todos os casos em que o diferimento da apreciação jurisdicional da legalidade do acto lesivo praticado pela Administração Tributária puder provocar um prejuízo irreparável.
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Todavia, o facto de se ter previsto a subida imediata da reclamação como excepção à regra da subida deferida, aponta no sentido de poderem apenas se considerar como relevantes para esse efeito prejuízos que não sejam os que estão associados normalmente a qualquer processo executivo.
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Na verdade, a admitir-se que prejuízos omnipresentes na generalidade das execuções possam relevar para efeitos de subida imediata, chegar-se-ia à conclusão de que este regime de subida seria a regra, o que estaria em contradição com o disposto no n° 1 do artigo 278.° do CPPT.
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Além disso, tal como se encontra evidenciado no Acórdão do STA de 09/08/2006, proferido no recurso 0229/06: é seguro que o legislador não quis impor a subida imediata de todas as reclamações cuja retenção pode originar prejuízos. Não está em causa, pois, poupar o interessado a todo o prejuízo. Por isso se estabelece que as reclamações sobem imediatamente só quando a sua retenção seja susceptível de provocar um prejuízo irreparável. Em súmula, a reclamação que não suba logo não perde todo o seu efeito útil, mesmo que não evite o prejuízo que se quer impedir, desde que seja possível repará-lo (sublinhado e negrito nosso).
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Por isso, a interpretação correcta do regime de subida prevista no predito artigo 278°, será a de que só haverá subida imediata quando, sem ela, ocorrerem prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer execução ou que sem ela, a reclamação perca toda a utilidade.
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A Recorrida/Reclamante teria que invocar a existência desse prejuízo irreparável, com indicação do facto ou factos de que ele deriva, não bastando referir a existência do eventual prejuízo irreparável.
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É, pois, essencial que se aleguem factos que levem a aceitar a existência de situação que provoque o aludido prejuízo.
V. Resultando, pois, que o regime excepcional de subida imediata da reclamação ao tribunal, terá de derivar, não do facto dos reclamantes invocarem expressamente o prejuízo irreparável para solicitar esse regime de subida, mas da demonstração fáctica da verificação desse mesmo prejuízo irreparável e consequente fundamentação do mesmo, de acordo com os princípios gerais da prova.
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Donde, é irrelevante, para efeitos de determinação do regime de subida da reclamação, que os reclamantes peçam a subida imediata da mesma e com a menção expressa do “prejuízo irreparável”, se depois não procedem à demonstração do preenchimento dos requisitos cumulativos da previsão dos n°s 3 e 5 do artigo 278.° do CPPT, para que, efetivamente, se operasse a subida imediata dos autos para decisão.
X. Destarte, para que haja conhecimento imediato do pedido, é necessário que, para além da existência de um acto lesivo que se reputa ilegal, esse mesmo acto possa causar prejuízos irreparáveis, se não for imediatamente eliminado.
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Logo, para que haja lugar ao conhecimento imediato do pedido, impunha-se apreciar se a Recorrida/Reclamante invocou factos concretos (e juntou os respectivos meios de prova) que permitissem concluir que o acto precisava de ser imediatamente removido, sob pena de afectar de forma irremediável os seus direitos e interesses legalmente protegidos.
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E, como supra referido, era sobre a Recorrida/Reclamante que impendia o ónus da prova desses factos (neste sentido vide, entre tantos outros, o Acórdão do TCA Sul, de 15/07/2008, proferido no recurso n.° 02432/08).
AA. Assim, é o reclamante quem tem o ónus de especificar e concretizar os potenciais prejuízos irreparáveis, devendo alegar factos concretos demonstrativos dos mesmos - ou que os façam presumir -, em termos de causalidade adequada, que lhe advirão da diligência controvertida.
BB. Porém, como bem se decidiu na sentença recorrida, quanto a esta parte, a aqui reclamante não logrou efectuar tal prova.
CC. Acontece que, de facto, acarretando um prejuízo irreparável é completamente inútil a reclamação com subida diferida.
DD. No entanto, o eventual prejuízo decorrente das decisões da Administração Tributária apenas é irreparável, obviamente, quando não possa ser reparado.
EE. Ou seja, a predita inutilidade não pode deixar de relacionar-se com a irreparabilidade do prejuízo.
FF. Por fim, importa sublinhar que tendo presente a regra geral enunciada no n.° 1 do artigo 278.° do CPPT, não se vislumbra que no caso vertente a subida diferida faça perder utilidade à própria...
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