Acórdão nº 2111/11.8TJLSB-B.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Agosto de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução06 de Agosto de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: A 17/10/2011 “A” apresentou-se à insolvência e ao mesmo tempo requereu a “exoneração do passivo restante”.

Por sentença de 14/11/2011, foi declarada verificada, desde Dezembro de 2008, a situação de a insolvência do requerente e em consequência decretada a sua insolvência e admitiu-se, para análise posterior, o pedido de exoneração.

Na assembleia de credores que teve lugar a 23/01/2012, a Srª administradora da insolvência opinou no sentido do deferimento do pedido de exoneração, mas o mesmo veio a ser indeferido com base nos seguintes fundamentos de direito [quanto aos factos serão transcritos mais à frente]: “A exoneração do passivo restante tem como pressuposto (art. 235 CIRE) o de que as dividas do insolvente não hajam sido pagas integralmente, nos cinco anos posteriores ao do encerramen-to do processo, e exige o requisito de que o devedor tenha perspec-tiva de rendimentos disponíveis para satisfação de parte maior ou menor daquelas (art. 239/2 do CIRE). E com relevo para este mo-mento processual, estatui-se ainda que o pedido de exoneração é liminarmente indeferido nas situações previstas no art. 238 do CIRE, enumerados de forma taxativa, e que na economia do diplo-ma correspondem a factos impeditivos da pretensão do requerente, isto é em que sobre ele não incide o ónus da demonstração da mesma factualidade na formulação contrária.

E especificando a situação que relevará considerando a maté-ria provada, respigue-se com interesse, que o devedor é pessoa sin-gular não titular de empresa, e nessa medida não está obrigado a apresentar-se à insolvência (art. 18/2 do CIRE), sendo que de harmonia com o disposto no art. 238/1d) do CIRE o pedido de exoneração é liminarmente indeferido se “o devedor não estando obrigado a se apresentar (à insolvência), se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo para os credores, e sabendo ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica”.

Retomando os factos, os que foram trazidos aos autos depois da sentença de insolvência de 14/11/2011 não põem em crise, pelo contrário, o que já naquela dissemos sobre a “gota que faz trans-bordar o copo” da incapacidade do insolvente em solver as suas obrigações, com o vencimento em 2008 da dívida a Millenium BCP, empréstimo ..., liquidada então em 15.669,80€, quando os rendimentos daquele eram prospectivamente, como o serão hoje, da ordem do salário mínimo nacional. E neste quadro, as situações de mora repetidas desde pelo menos 2009, são mera confirmação a posteriori da situação de insolvência verificável pelo menos em Dezembro de 2008, e em que as designadas renego-ciações (sic) das dívidas já então vencidas, sem a demonstração de qual fosse a sua justificação económico-financeira, de antemão se advinhavam meros paliativos destinados a servir o interesse indivi-dual do(s) então mutuante(s) renegociador(es), ou o que este assim julgasse, implicando seguramente o comprometimento do acautelar da posição da generalidade dos credores do insolvente.

E se assim era para terceiros, por maioria de razão no que ao insolvente concerne, isto é, já em Dezembro de 2008 o mesmo bem sabia, ao renegociar dívidas, que não tinha possibilidade efectiva de as solver, ou, na expressão do legislador (parte final da referida alínea d) do art. 238/1 do CIRE), “não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica”.

Por outro lado, este comportamento de inércia do insolvente, não se apresentando à insolvência até Junho de 2009 (6 meses de-pois de Dezembro de 2008), só o fazendo em 17/10/2011 (data do requerimento inicial), isto é mais de mais de 2 anos depois do termo exigível, permitiu inviabilizar à generalidade dos credores que logo reagissem, designadamente que em finais de 2009 Barclay’s Bank não renegociasse a dívida em mora de 6200€ (cartão de crédito) que em Abril de 2011 já estava de novo em incumprimento agora por 9934,04€, que em 26/05/2010 o BES não contratasse empréstimo de 9.138€, que em meados de 2010 o BNP Paribas Personal Finance, SA, (Cetelem, SA) não renegociasse dois créditos ao consumo em mora que não obstaram ao incumprimento menos de 1 ano depois, em Abril de 2011, de parte de 27.871€.

Em suma, a não observância pelo insolvente do prazo de apresentação tempestiva à insolvência, ocorreu quando ele sabia que não havia perspectiva de melhoria, sendo aquela também causal de prejuízos para os credores. E no caso dos autos em que não existindo bens do insolvente se adivinha o encerramento ime-diato da liquidação, nos próximos 5 anos não existindo previsível rendimento disponível do insolvente, face ao total de dívidas superior a 150.000€, temos para nós a evidente incapacidade do mesmo em pagar a esmagadora maioria (ou mesmo a totalidade) dos seus débitos, não tendo sentido face à lei exonerá-lo do que seja o restante quando nenhum pagamento se vislumbra.

Em conclusão, face à inércia do insolvente no período pos-terior à verificação da situação de insolvência, e face à inexistência pela sua parte de pagamento de qualquer parcela das dívidas por que é responsável, estão reunidos os requisitos de natureza objec-tiva e subjectiva, que desde já o privam do benefício de exoneração do passivo que remanescesse nos 5 anos posteriores ao encerra-mento da liquidação (art. 239 CIRE), indeferindo-se liminarmente o pedido neste incidente formulado.” O insolvente recorreu desta decisão, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões [que se transcrevem ipsis verbis porque, como se verá, está em causa a sua apreciação]: “Devendo, pelo exposto, concluir-se:

  1. Pela revogação do despacho inicial de indeferimento do requerimento de exoneração do passivo restante; B) Pelo deferimento do pedido apresentado no requerimento de exoneração do passivo restante apesar do insolvente não ter à presente data rendimento disponível para colocar à disposição dum fiduciário para pagamento das dívidas por que é responsável, devendo fixar-se um limite a um eventual e futuro rendimento que venha a ser auferido pelo devedor a partir do qual o insolvente deverá colocar o rendimento acima desse limite à disposição dum fiduciário, em virtude de não ser exigível este requisito para o deferimento da exoneração; e, C) Por não se ter verificado por parte do insolvente inércia, não tendo este causado pelo facto prejuízos para os credores, devido a ausência de prova de existência de prejuízo e em virtude de várias renegociações feitas por parte do devedor insolvente, com pagamento de juros com taxas mais elevadas.” Não foram apresentadas contra-alegações.

    * Neste tribunal de recurso, foi proferido o despacho inicial: “Nos recursos as conclusões são proposições que sintetizam os fundamentos pelos quais o recorrente pretende a alteração ou anulação da decisão (art. 685-A, CPC), proporcionando um quadro escorreito e preclaro delas, sem prolixidade nem floreados, e, enfim, facultando ao olhar mais atento uma panorâmica do merecimento da sua posição.

    São, pois, relevantíssimas, delimitando afinal o objecto do próprio recurso, de tal sorte que a sua deficiência é susceptível de prejudicar o conhecimento do recurso (art. 685-A/3).

    Como diz Fernando Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª ed., 178 e ss., “expostas pelo recorrente, no corpo da alegação, as razões de facto e de direito da sua discordância com a decisão impugnada, deve ele, face à sua vinculação ao ónus de formular conclusões, terminar a sua minuta pela indicação resumida, através de proposições sintéticas, dos fundamentos, de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão.

    (...) Se o recurso respeitar a matéria de direito, as conclusões devem indicar, de harmonia com o disposto no n.° 2 do art. 685-A:

    1. As normas jurídicas violadas; b) O sentido com que, no...

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