Acórdão nº 8881/11.6TBCSC-A.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | MARIA AMÉLIA AMEIXOEIRA |
Data da Resolução | 18 de Outubro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO: G, SA, em representação de I – FIIF intentou o presente procedimento cautelar não especificado contra A Massa Insolvente da Sociedade I – I U, SA, Alegando, em síntese que celebrou contrato de empreitada com a Requerida, a qual procedeu à resolução de tal contrato em virtude do não pagamento de várias facturas. Mais alega que a Requerida a impediu de aceder à obra para efectuar vistorias, alegando a existência de direito de retenção.
Termina pedindo que se intime a Requerida a permitir o acesso ao empreendimento de qualquer pessoa indicada pelo Requerente tendo em vista a avaliação, vistoria técnica e inspecção dos trabalhos efectuados, removendo para o efeito, quando tal lhe for solicitado pela Requerente, um ou mais dos blocos colocados no acesso ao empreendimento; ou permitindo (para o mesmo efeito) a remoção pela Requerente; a abster-se de praticar qualquer acto que impeça ou dificulte o acesso ao empreendimento do Dono da Obra ou de alguém ao seu serviço.
Veio a Requerida opor-se à presente providência, alegando a existência de direito de retenção e a não verificação dos requisitos de decretamento da providencia.
Produzida a prova requerida, foi fixada a matéria de facto assente e, a final, foi proferida decisão que julgou o presente procedimento cautelar procedente, e, em consequência, condenou a Requerida: - a permitir o acesso ao empreendimento dos autos de qualquer pessoa indicada pelo Requerente tendo em vista a avaliação, vistoria técnica e inspecção dos trabalhos efectuados, removendo para o efeito, quando tal lhe for solicitado pela Requerente, um ou mais dos blocos colocados no acesso ao empreendimento; ou permitindo (para o mesmo efeito) a remoção pela Requerente; - a abster-se de praticar qualquer acto que impeça ou dificulte o acesso ao empreendimento do dono da obra ou de alguém ao seu serviço.
Inconformada com o teor da decisão, a Requerida interpôs recurso, que concluiu da forma seguinte: Quanto à inexistência do “fumus bonus iuris” O direito de retenção do empreiteiro (a ora Requerida e Recorrente) sobre a Empreitada, para garantia de pagamento de verbas devidas pela sua execução, enquanto direito garantistico de natureza real, não pode, nem deve ceder face à pretensão do Dono da Obra de aceder à Empreitada, designadamente para vistoriar os trabalhos executados, nem tão pouco para os fiscalizar tanto mais que, resolvido o contrato de empreitada com base na falta de pagamento das verbas que legitimam o direito de retenção, tais trabalhos já não estão em curso.
Dito de outro modo, o empreiteiro que legitimamente exerce o direito de retenção sobre uma Empreitada pode legitimamente recusar que o Dono da Obra devedor tenha acesso à mesma, incluindo para efeitos de vistoriar ou fiscalizar os trabalhos executados.
Se assim não for, o direito de retenção da Requerida passará a ser meramente virtual na medida em que Requerente continuará, na prática, a fazer o que bem entender no local dos trabalhos sob a ficcionada justificação de pretender fiscalizar ou fazer vistorias à Empreitada… Se a Requerente pretende inspeccionar e avaliar os trabalhos realizados, bem sabe que existe procedimento processual adequado a ser realizado por pessoas com especiais competências, sob a tutela judicial e segundo regras processuais claras (ie. o incidente de produção antecipada de prova).
Pelo que, torna-se evidente que a justificação apresentada pela Requerente e sufragada (erradamente) pelo Tribunal “a quo” para a presente providência simplesmente não colhe porquanto o que pretende é, de forma ilegal, esvaziar de utilidade prática o exercício do direito de retenção e, simultaneamente, continuar a não pagar à Requerida a elevada verba que lhe deve! Ao entender doutro modo, a Sentença recorrida violou o disposto nos arts. 1209.º e 755.º e seguintes do Código Civil e, ainda, o disposto no n.º 1 do art. 381.º do C.P.C..
Pelo que deve a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue o procedimento cautelar vertente improcedente.
Quanto à inexistência do “periculum in mora” É, ainda, evidente que a Requerente não logrou cumprir o ónus da prova da factualidade passível de preencher o segundo requisito relativo ao “periculum in mora” estabelecido no n.º 1 do art. 381.º do CPC e que a fundamentação do Tribunal “a quo” para o considerar como preenchido é manifestamente insustentável e violadora do disposto nos arts. 1209.º e 755.º e seguintes do Código Civil e, ainda, o disposto no n.º 1 do art. 381.º do C.P.C..
Com efeito, a alegação do Tribunal “a quo” de que “a não realização das vistorias atrasará o normal prosseguimento da obra com a consequente perda de investimento” e que a Requerente “ficará impedida de comercializar o empreendimento dos autos e receber o respectivo retorno financeiro”, não é minimamente aceitável, nem sustentável, parecendo mesmo que o Tribunal “a quo” se equivocou sobremaneira.
É que o normal prosseguimento da obra está prejudicado: Em primeiro lugar e no que diz respeito à Empreitada adjudicada à Requerida, em virtude da resolução do Contrato de Empreitada sustentado no incumprimento, pela Requerente, da obrigação de pagamento de elevadas verbas há muito vencidas; Em segundo lugar, em virtude do direito de retenção exercido pela Requerida.
Mais se salientando que nenhuma relação existe entre o não prosseguimento da obra e a (não) realização de vistorias! Ou seja, neste particular, os fundamentos invocados pelo Tribunal “a quo” não existem e redundam numa clara violação do direito de retenção da Requerida, já que é claro que não é, obviamente, a não realização das vistorias que impedirá a Requerente de comercializar o empreendimento e receber o retorno financeiro.
No limite, também nos parece evidente que o que poderá impedir a comercialização do empreendimento é o direito de retenção exercido pela Requerida. E esse direito não é, como se disse, atacado pela Requerente nos presentes autos, sendo antes reconhecido, o mesmo se dizendo da Sentença recorrida.
Sendo certo que de tal facto a Requerente apenas se pode queixar dela própria na medida em que o direito de retenção foi invocado e vem sendo exercido em virtude da falta de pagamento de elevadas verbas e bastará à Requerente proceder ao seu pagamento para poder dispor livremente do seu património.
Dito isto, importa ainda salientar a confusão adicional em que incorre o Tribunal “a quo” quando conclui: “pela existência de um fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito da Requerente”.
Para tal, importa ter presente que o direito que o Tribunal “a quo” reconheceu (ainda que erradamente) à Requerente nos presentes autos é o “direito a fiscalizar os trabalhos da empreitada” que, por sinal, já não estão em execução; Ora, o alegado prejuízo irreparável da Requerente tido por relevante pelo Tribunal “a quo” não tem qualquer relação com o direito de fiscalizar a empreitada! Mas apenas e tão só com a comercialização do empreendimento! Ou seja, o Tribunal “a quo” sustenta a alegada existência de um direito (o de fiscalizar) mas o prejuízo que pretende evitar com o decretamento da providência não está associado ao não exercício do direito de fiscalizar, mas antes ao direito da Requerente poder dispor livremente do empreendimento. Como se não houvesse o direito de retenção da Requerida que, correndo o risco de nos repetirmos, não é contestado! Pelo que, também por este motivo, deve a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue o procedimento cautelar vertente improcedente.
Conclui no sentido de dever o presente recurso merecer provimento e, consequentemente, ser proferido acórdão a revogar a sentença recorrida e a julgar improcedente a providência cautelar.
A Requerente/recorrida respondeu ao recurso, concluindo da forma seguinte: A) Constitui objecto do recurso apurar se o exercício do direito de retenção por parte do empreiteiro, admitindo que o mesmo existe, I) permite a este recusar o acesso do dono da obra à mesma, para efeitos de vistoria ou...
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