Acórdão nº 05590/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução22 de Novembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

A Caixa Geral de Aposentações, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue: A. A CGA entende que a decisão recorrida deve ser revogada tendo em conta o bem fundamentado parecer do Médico Chefe datado de 2002-05-16 (parcialmente transcrito em V) dos Factos Assentes, e erradamente datado de 2003-05-16), onde se refere, de forma especializada, mas clara, que não é possível estabelecer uma ligação entre a doença de que padece o agravado e o serviço militar, e se explica a razão da impossibilidade do estabelecimento dessa ligação expressando que o saber médico apenas reconhece que o interessado "...tem, como linha, o risco de desenvolver em algum momento da sua vida manifestações da sua diátese ulcerogénica." sendo impossível, contudo, estabelecer qualquer relação com a actividade militar.

B. Em face da explicação que o citado parecer do Médico-Chefe da CGA ali promove (e mesmo face a outros pareceres, inclusivamente de médicos exteriores à CGA, como o do Dr. A..., transcrito em O) dos Factos Assentes) que outra fundamentação mais concreta pode a CGA oferecer? C. Importa notar que, para além dos juízos efectuados pelos órgãos da CGA, são irrelevantes quaisquer outros acerca da relação entre a doença e o serviço, para efeitos de aposentação, sendo certo que os exames efectuados pelas juntas da Caixa correspondem a uma actividade inserida na chamada discricionariedade técnica, uma vez que traduzem a aplicação de princípios e critérios extrajurídicos, de natureza técnica, próprios das ciências médicas, como, aliás, tem sido reconhecido pela jurisprudência referente a tais juntas.

D. A tecnicidade e especialização dos conhecimentos aplicados conduz a que a fiscalização jurisdicional sobre o conteúdo das soluções atingidas se restrinja a casos-limite, a situações excepcionais em que se torna patente mesmo a um leigo - como é o juiz - o carácter ostensivamente inadmissível, grosseiramente erróneo, dos resultados que a Administração afirma estarem fundados em regras técnicas.

E. Só em casos extremos é que o juiz se imiscuirá no exercício da discricionariedade técnica da Administração, anulando os correspondentes actos administrativos com fundamento em "erro manifesto de apreciação" (cfr., de entre uma jurisprudência numerosa e constante, os Acórdãos do STA de 16/1/1986, processo nº 20.919; de 22/3/1990, processo nº 18.093; de 16/2/2000, processo nº 38.862; e de 30/1/2002, processo nº 47.657).

F. Nada existe de gritantemente irrazoável, arbitrário ou inadmissível no juízo dos peritos médicos intervenientes no caso dos autos, de a doença do agravado não ter sido adquirida pelo autor no exercício das suas funções militares e por causa desse exercício. Aliás, esta conclusão, atingida no parecer de 2002-05-16 (cfr. V) dos factos assentes) e pela junta medica realizada em 2002-09-04 (cfr. W) dos factos assentes), é idêntica a atingida pelas anteriores junta médicas e pelo perito Dr. A..., a quem a Junta Médica da CGA solicitou parecer por ter tido dúvidas sobre o nexo de causalidade entre a doença e o serviço (cfr. N) e O) dos factos assentes).

G. Porventura, o que o Tribunal a quo pretenderia era a fundamentação da fundamentação, mas essa não é exigida por lei.

H. Sobre uma questão idêntica à dos autos, veja-se o recente Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 2009-04-30, tirado no Processo n.° 04448/08, segundo o qual "...o parecer da Junta médica não é susceptível de controlo jurisdicional, por se tratar de actividade que releva da chamada discricionariedade técnica, exigindo conhecimento especializado (médico) que o tribunal não possui..." (cfr. 5.° parágrafo de página 8 do Doe. l que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os legais efeitos).

  1. Deverá, assim, a Sentença recorrida ser revogada, e substituída por outra que julgue totalmente improcedente a acção proposta nos presentes autos contra a CGA.

* O Recorrido contra-alegou, concluindo como segue: a) O agravado foi incorporado no serviço militar, em 17JUL67, como recrutado, tendo embarcado para a Guiné em 28OUT68, onde foi integrado no Grupo de Artilharia de Campanha n° 7, com a especialidade de campanha munições, a fim de cumprir uma comissão de serviço.

b) Ao fim de cerca de dois meses de comissão de serviço sempre em zona de intensa actividade operacional, foi acometido de doença que a veio a ser diagnosticada como úlcera gástrica tendo por duas vezes sido evacuado para o HMP durante a sua comissão de serviço.

c) Durante o cumprimento da sua comissão de serviço na Guiné, às tensões e ansiedades próprias de uma situação de guerra, e ao facto de não ter recebido tratamento adequado e de ter sido considerado clinicamente curado e mandado regressar à sua unidade, sofreu agravamento da sua doença ulcerosa, que levou a nova evacuação para o HMP poucos meses após ter sido reenviado para a sua unidade.

d) As circunstâncias em que se desencadeou a sua doença ulcerosa encontram-se relacionadas com o serviço militar (nomeadamente, a comissão de serviço na Guiné) o que está provado no processo e) O despacho recorrido contraria os pareceres dos médicos especialistas militares e civis juntos aos autos sem apresentar as razões de facto e de direito que estão na base de tal decisão.

f) O agravado antes da incorporação sempre gozou de boa saúde não possuindo qualquer doença do foro gástrico.

g) Só durante o cumprimento do serviço militar e devido às condições de serviço a que estava sujeito é que adoeceu, sendo a doença desencadeada e agravada pela prestação do serviço militar em circunstâncias de campanha, e em consequência do mesmo, tendo-se aí manifestado, na sequência das condições a que a prestação do serviço militar o sujeitou.

h) Tendo a doença sido desencadeada durante o serviço militar e nas condições concretas especiais deste, face ao ordenamento jurídico vigente, esta terá de considerar-se como adquirida em serviço e em consequência do mesmo.

i) Mesmo que assim se não entenda, sempre o serviço militar contribuiu decisivamente para o agravamento da doença, tanto mais que se encontra provado no processo que ao agravado não foram prestados os cuidados adequados e que foi indevidamente considerado curado e mandado regressar à sua unidade, pelo que deveria ter sido estabelecido o respectivo nexo causal, considerando-se a doença agravada em serviço e em consequência do mesmo.

j) Também não se atendeu às normas que estabelecem a não descaracterização causal pela predisposição patológica e que, não existindo prova de qualquer doença do foro gástrico ocorrida antes do serviço militar, tendo-se esta manifestado neste, deve ser considerada adquirida em serviço.

k) È de salientar que o despacho recorrido é de conteúdo semelhante ao despacho do Órgão Directivo da CGA datado de 04FEVOO que o Tribunal Central Administrativo (P. 11018/01, 2a subsecção do CA) mandou anular por falta de fundamentação.

l) A Junta Médica da CGA limita-se a uma afirmação categórica de que a doença de que padece o agravado não foi adquirida nem agravada pelo exercício do serviço militar sem explicitar quais as razões clínicas e funcionais que, no caso concreto do ora recorrente -uma vez que o que está sob julgamento não é saber, em abstracto, quais os factores que podem desencadear uma úlcera duodenal, mas saber-se em concreto, se o serviço militar foi um factor desencadeante ou agravante da doença na pessoa do agravado - implicam a manutenção da situação anterior, sendo certo que o Tribunal considerou não fundamentado o parecer da Junta Médica anterior, que era em tudo semelhante ao presente.

m) Uma vez que o acto ora recorrido contrariou os elementos clínicos juntos ao processo e as conclusões das entidades militares, competia-lhe explicitar, de modo inequívoco ao interessado (como é direito deste), porque razão divergiu destes elementos, o que não foi feito, sofrendo de vício de forma por absoluta falta de fundamentação, vício esse que foi julgado...

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