Acórdão nº 08758/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 31 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelCOELHO DA CUNHA
Data da Resolução31 de Maio de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção Administrativa do TCA-Sul 1.

Relatório BOEHRINGER ………….

, INC, sociedade constituída de acordo com as leis dos Estados Unidos, com sede em 90 EAST RIDGE, P.O. BOX 368, RIDGEFIELD, CONNECTICUT, 06877, USA, (doravante Boehringer, requerente ou recorrente) requereu no TAC de Lisboa, previamente à instauração de uma acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo, uma providência cautelar contra o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, o MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DO EMPREGO (MEE) e as contra interessadas, A…..S.A., a F…….. - PRODUTOS …………, LDA, a R……….. PORTUGAL - COMÉRCIO …………., UNIPESSOAL, Lda, e L…… - LABORATÓRIOS ………….., S.A., pedindo a suspensão de eficácia dos actos administrativos que são as Autorizações de Introdução no mercado (AIM’s) dos medicamentos genéricos que contêm a substância activa Telmisartan [AMPDR, Telgunti, Ranbaxy e Labestal, nas dosagens de 20, 40 e 80mg, comprimidos] durante o período de vigência da patente EP …… e o CCP41 (cujo prazo expira em 12.12.2013), sob as designações indicadas ou quaisquer outras que venham a ser as designações destes medicamentos no futuro, e que o INFARMED seja ainda intimado, enquanto a patente e a extensão do seu âmbito de protecção garantida pelo CCP 41 estiverem em vigor, a não autorizar ou não realizar a transferência da titularidade das AIMs concedidas às contra-interessadas.

Ainda pede, que a DGAE, na pessoa do MEE, seja intimada, enquanto a Patente e o CCP estiverem em vigor, de fixar os PVP’s requeridos ou na iminência de serem requeridos pelas contra-interessadas, suspendendo o respectivo procedimento administrativo, ou a abster-se de fixar tais preços sem que essa fixação fique condicionada a apenas entrar em vigor na data em que a Patente e CCP caducarem, relativamente aos mesmos medicamentos compostos pela aludida substancia ou quaisquer outras que venham a ser as designações desses produtos no futuro.

Por sentença de 12.02.2012, foi decidido julgar improcedente o processo cautelar.

Inconformada a requerente cautelar interpôs recurso jurisdicional para este TCA-Sul, enunciando na sua alegação as conclusões seguintes: “1.

O presente recurso interposto da sentença que decidiu não decretar as medidas cautelares tem efeito suspensivo nos termos dos art.ºs 143°, nº1 e n°2 do CPTA em conjugação com o art°692°, n°3 alínea d) do CPC ex vi 140º do CPTA, em conformidade, de resto, com o decidido por este Tribunal ad quem em 06.05.2010 (Processo nº06058/10) e em jurisprudência recente deste mesmo Tribunal, e sobe imediatamente e nos próprios autos, nos termos do artigo 147°, n°1 do CPTA.

  1. Contrariamente ao entendido na douta decisão, são óbvias ou, pelo menos, prováveis, nos termos do artigo 120.° n.°1 a) ou b) do CPTA, as ilegalidades imputadas pela Recorrente aos atos impugnados, devendo tal ser confirmado por este Tribunal de Recurso.

  2. O Tribunal a quo não considerou todos os factos alegados e relevantes para a apreciação da ameaça aos direitos da Recorrente, como o impunha o disposto no n.°2 do artigo 264.°e no artigo 511.° do CPC, aplicáveis ex vi artigo 1° do CPTA, que assim foram violados.

  3. Baseando-se a presente providência cautelar, nomeadamente, na alegação de que uma AIM e a fixação de um PVP se traduzem no levantamento de barreiras administrativas à violação dos direitos de propriedade industrial ("DPI") da Recorrente emergentes da EP 502314 e do CCP 41, é imprescindível à decisão da causa saber-se se a comercialização dos Genéricos Telmisartan irá violar tais direitos, tendo o Tribural a quo ignorado os factos essenciais alegados pela Recorrente a esse respeito.

  4. Fundando-se na presunção prevista no artigo 98.° do CPI a Recorrente alegou no requerimento inicial (artigo 62.° e 66.°) que a substância activa Telmisartan usada nos medicamentos Genéricos Telmisartan é produzida pelo processo patenteado pela EP 502314 e cuja protecção é estendida ao CCP 41, facto esse que tem manifesto interesse para a decisão da causa uma vez que apenas nele poderá assentar qualquer juízo sobre a ameaça de violação dos direitos da Recorrente.

  5. A aplicação da presunção a que se refere do artigo 98.° do CPI depende, para o efeito do ónus da prova relativo à não violação da Patente da Recorrente recair sobre as Requeridos e as Contrainteressadas, de se concluir que Telmisartan era um produto novo à data do pedido da Patente ou ao tempo dessa prioridade nos termos da Convenção de Paris, facto este que se encontra provado (ponto 4 dos factos dados como provados na decisão recorrida).

  6. Tendo ficado provada a novidade da substância ativa Telmisartan, e porque entre os factos provados não se encontram quaisquer factos relativos ao concreto processo utilizado na obtenção do Telmisartan que compõe os genéricos das Contrainteressadas, e às suas diferenças quanto ao processo patenteado na EP 502314, tanto bastaria para não se considerar ilidida a presunção prevista no artigo 98.° do CPI, devendo assim dar-se como provado o alegado nos artigos 62.° e 66.° do Requerimento Inicial: o Telmisartan usado nos Genéricos Telmisartan é produzido de acordo com o processo descrito e protegido nas reivindicações da EP 502314 e correspondente CCP 41.

  7. Se assim não for entendido - o que apenas se configura para efeitos de raciocínio, sem conceder - e se se entender que deve ser ampliada a decisão de facto após a devida. produção de prova testemunhal pela ora Recorrente, nos termos do disposto no artigo 649.° do CPC, aplicável por força do artigo 1° do CPTA, deve a mesma ser ordenada e ter lugar nos termos do disposto no n°2 do artigo 149° do CPTA ou, caso não se entenda ser aplicável esta disposição, mediante a anulação oficiosa da decisão e baixa do processo à 1a Instância (712° n°4 do CPC, aplicável ex vi o disposto no artigo 140° do CPTA).

  8. Atendendo a que o Tribunal a quo não se pronunciou na decisão recorrida quanto aos argumentos de inconstitucionalidade da Lei 62/2011, suscitados pela Recorrente aquando da resposta ao requerimento de fls. do Infarmed sobre a referida lei, nos termos da alínea d) do n.°1 do artigo 668.° do CPC deve a sentença recorrida ser considerada nula e por isso revogada. Sendo declarada nula a sentença, pode o Tribunal de recurso decidir o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito, nos termos do artigo 149.°, número 1, do CPTA.

  9. O Tribunal a quo considerou que a providência cautelar deveria ser declarada improcedente ao abrigo das alíneas a), b), e c) do número 1 do artigo 120° do CPTA, sendo que a providência foi requerida nos termos do disposto na alínea a) do n°1 do artigo 120° do CPTA e subsidiariamente pela alínea b) - visto tratar-se de uma providência cautelar conservatória - pelo que não cabia a consideração da alínea c) do mesmo preceito legal.

  10. A sentença recorrida omite a análise integral dos requisitos da concessão da providência quanto à intimação relativa ao MEE e aos atos a aprovar pela DGAE de aprovação de PVP, não se pronunciando, em consequência, sobre este concreto pedido, o que configura nulidade da sentença nos termos do artigo 668.° n° 1. d), que também se invoca.

  11. Verifica-se nos presentes autos o fumus bonus júris no seu mais elevado grau, ao abrigo do disposto no artigo 120.°, n°1, alínea a), do CPTA, o que não foi corretamente identificado e interpretado pelo Tribunal a quo, incorrendo em erro de julgamento.

  12. Uma vez que o presente processo cautelar reveste-se de natureza conservatória, deve também considerar-se que o requisito ao fumus non malus juris previsto no artigo 120º nº1 b) do CPTA se encontra verificado no presente caso, facto que foi ignorado pela Tribunal a quo, violando, pois, a referida norma e incorrendo também em erro de julgamento.

  13. As providências cautelares deveriam ter sido decretadas, visto que não se verificam quaisquer factos que conduzam a um juízo acerca da manifesta falta de fundamento da acção principal.

  14. A questão jurídica que aqui se coloca, é a de saber se, um acto administrativo que concede uma autorização de comercialização de um produto que irá violar uma patente válida e em vigor, é inválido porque ilegal e, por isso, deve ser invalidado pelo Tribunal.

  15. Se o Tribunal a quo tivesse corretamente identificado e interpretado a questão jurídica em discussão, teria concluído, como foi alegado pela Recorrente no requerimento inicial, que as AIMs impugnadas deveriam ser declaradas nulas ao abrigo dos artigos 135° e 133°, n°2, alíneas c) e d) do CPA e o MEE condenado a abster-se de emitir PVPs.

  16. Os atos de concessão de AIM ou de fixação de PVP de um medicamento são atos administrativos cujo objeto é o da viabilização jurídica da atividade de comercialização desse medicamento no território nacional, atividade essa que, doutro modo, estaria interdita ao interessado, decorrendo, além disso, da AIM e da aprovação do PVP, a imposição ao seu titular do dever de exercício dessa mesma atividade.

  17. Tais actos são assim ilegais, na medida em que violam o princípio da legalidade, no seu conjunto (bloco de legalidade).

  18. O princípio da legalidade contém um comando de obediência à Lei e ao Direito, ou seja, uma total conformidade não só com as leis e os princípios jurídicos que disciplinam especificamente uma certa conduta da Administração, mas também aqueles que constituem todo o ordenamento jurídico.

  19. O direito emergente da Patente é um direito fundamental, análogo aos direitos liberdades e garantias, com específica proteção constitucional, beneficiando do regime constitucional a estes aplicável, conforme resulta do artigo 17.° da Constituição, estando assim a Administração vinculada ao seu respeito, nos termos do artigo 1° da Constituição, devendo conformar a sua atividade à sua proteção de acordo com o artigo 266.° da Lei Fundamental. São também direitos fundamentais pelo direito e jurisprudência comunitária (artigo 6.°, números 1 e 3 do TUE e 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia).

  20. A...

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