Acórdão nº 1432/09.4T2AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | ARLINDO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 09 de Outubro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A....., viúva, doméstica, residente na Rua S. Martinho de Anta, Espinho, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra: B....., casado, bancário, residente na R. Torrão do Lameiro, Edifício Casinhoto, Ovar; C....., com sede na Av. de França, 680 e 694, Porto e; D....., (sendo que, quanto a esta, foi a extinta a instância, conforme decisão de fls. 239 a 249, já transitada).
Por via da presente acção, pretende a A. que os RR. sejam condenados a pagar-lhe a quantia de € 100.000,00, com juros de mora vencidos à taxa aplicável às operações comerciais.
Para o efeito alegou que o R. B....., na qualidade de gerente do R. BPN, sugeriu à A. que aplicasse as suas poupanças em papel comercial da CNE, aplicação cujo retorno, no prazo de 1 ano e à taxa acordada, o Banco lhe garantia, sendo que, passado tal período, não o fez.
Considera a A. que a responsabilidade do R. B.....emerge do disposto no artº 497º Código Civil.
Contestando, disse o BPN que, à data da operação financeira efectuada pela A., a CNE e o BPN pertenciam ao mesmo grupo empresarial e financeiro. A CNE resolveu emitir papel comercial tendo recorrido, para o efeito, ao Banco Efisa, também integrante do mesmo grupo empresarial, tendo este solicitado a colaboração do BPN que, assim, actuou como mero intermediário financeiro.
De resto, o BPN disponibilizou aos seus clientes uma nota informativa onde se continha a explicação de todas as particularidades do produto em causa, informação que também foi veiculada à A., à qual nunca foi dito tratar-se de um depósito a prazo ou que o Banco assegurava o reembolso do capital e juros.
Por sua vez, o R. B....., em articulado de contestação, disse que agiu sempre sob as ordens e em representação do BPN, não existindo qualquer responsabilidade solidária entre si e aquele.
Mais afirmou que a A. sabia perfeitamente não se encontrar a realizar um depósito bancário a prazo, pois também efectuou um nestes moldes, acrescentando que o por si transmitido, segundo instruções hierárquicas recebidas, era que “o Banco cobriria sempre a solvabilidade do produto”.
Houve réplica, na qual a autora impugnou a versão dada por cada um dos réus na respectiva contestação, reiterando o por si já alegado na petição inicial.
Com dispensa da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e se procedeu à elaboração dos factos assentes e da base instrutória, sem reclamação.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com recurso à gravação da prova produzida e plena observância das formalidades legais, tendo o Tribunal decidido a matéria de facto nos termos constantes de fls. 252 a 255, sem reclamações.
Após o que foi proferida a sentença de fl.s 257 a 266, na qual se decidiu o seguinte: “Pelo exposto, julga-se a presente acção procedente e, em consequência, condena-se o Banco a restituir à A. a quantia de € 100.000, 00, com juros remuneratórios, à taxa de 5, 553%, desde 22.1.08 até 22.1.09, e juros moratórios legais (actualmente à taxa de 4%) sobre aquele capital, desde 23.1.09 e até integral pagamento.
Absolve-se do pedido o R. B......
Custas por A., na parte da absolvição do co-R. pelo R. BPN no que toca à condenação deste.”.
Inconformado com a mesma, interpôs recurso o réu BPN, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 358), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1.
O teor das contestações apresentadas nos autos pelos 1º e 2ª réus não foi nunca notificado ao banco apelante, constituindo tal omissão uma nulidade processual relevante, já que na posse do conhecimento do teor desses articulados, a estratégia de defesa e os meios probatórios por si apresentados seriam seguramente diferentes.
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Mais grave do que isso é que ao banco apelante não foi nunca notificada a junção aos autos do documento junto pelo 2º réu, e denominado Instrução de Serviço nº 19/01 (fls. 119 dos autos), de 05.02.2003, cujo teor se veio a revelar importante – parece que até decisivo – na decisão que recaiu sobre a matéria de facto, como se alcança da sua motivação.
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Tendo o banco apelante conhecimento da existência de tal documento nos autos e do seu teor apenas quando leu a decisão relativa à matéria de facto e sua motivação.
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Já que as intervenções que teve o seu mandatário nos autos após a junção de tal documento se limitaram à elaboração e junção via CITIUS do seu requerimento probatório, e uma vez que a Mma Juiz a quo dispensou nos presentes autos a realização da audiência preliminar.
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Não teve, assim, o banco apelante a oportunidade de impugnar o teor de tal documento, e muito menos o de auxiliar o tribunal na sua correcta interpretação, tanto mais que se trata de documento contendo regras genéricas sobre o procedimento do banco em todas as emissões e colocação de papel comercial, independentemente da entidade emitente.
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A existência de tais nulidades tem por consequência que deve ser anulado tudo o que nos autos ocorreu a partir do momento em a notificação da junção desse documento deveria ter ocorrido, uma vez que é manifesta a influência da omissão e irregularidade em causa no exame ou decisão da causa.
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O que, aliás, sai comprovado e reforçado com a leitura da interpretação feita pela Mma Juiz a quo do teor de tal documento de fls. 119, já que, à revelia da sua letra, dá por assente que dele resulta a garantia de solvabilidade de papel comercial por parte do banco ora apelante.
Por outro lado, 8.
As respostas dadas aos nºs 8, 9 e 10 da base instrutória deverá ser alteradas, de acordo, não apenas com a necessária reapreciação do teor do documento acima citado, mas também com a interpretação corrigida do depoimento das testemunhas que, na motivação da decisão relativa à matéria de facto, se têm por relevantes.
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Devendo, assim, tais respostas passar a ser do teor seguinte: - “provado que não teria qualquer risco de retorno dado ser a CNE uma empresa do mesmo grupo do banco “ ( nº 8) ; - “provado que o 2º R. assegurou à A. que, dado o facto de serem empresas do mesmo grupo, o retorno dos valores aplicados estava garantido pelo BPN “ ( nº 9); - “ provado ainda que o 2º R. mais assegurou que, por força das razões indicadas nas respostas dadas aos nºs 8 e 9, os valores aplicados seriam retornados por depósito na dita com tal, em Ovar, no prazo máximo de um ano, no termo do 1º ano de realização da aplicação “ ( nº 10).
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Estas alterações, aliás, permitem compatibilizar as respostas dadas aos ditos nºs 8, 9 e 10 com as respostas dadas aos nºs 33, 51, 52 e 53 da mesma base instrutória, pelo que, a não serem aceites, verificar-se-ia então uma clara contradição entre aquelas e estas respostas, contradição essa sancionada com a anulação de umas e outras.
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De resto, e admitidas as alterações à matéria de facto acima sustentadas, sempre haveria que concluir pelo teor e conteúdo de contrato entre a autora e o banco apelante que não abrangia, de forma alguma, a existência de uma garantia absoluta e incondicionada do banco ao efectivo reembolso do capital investido pela autora.
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Já que o banco apenas teria garantido tal reembolso no pressuposto de ser a CNE – a entidade emitente do papel comercial aqui em causa – uma empresa integrada no mesmo grupo a que o próprio banco pertencia, residindo nesse facto, de forma essencial, a existência de tal garantia.
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A destruição e desaparecimento de tal pressuposto por facto a que o banco ora apelante é inteiramente alheio não pode deixar de pesar na interpretação do compromisso existente entre as partes, desqualificando a conduta do banco como sendo de incumprimento de obrigação contratualmente assumida.
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E ainda que assim não se entendesse, sempre a alteração imprevista e imprevisível desse pressuposto afastaria a culpa da sua parte no incumprimento dessa obrigação de reembolso, culpa essa que constitui um dos requisitos para que se possa concluir pela existência de responsabilidade contratual da sua parte.
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Caso se entenda não conterem os autos elementos necessários a concluir nesse sentido, dir-se-á então que eles foram objecto de alegação nos nºs 48 a 55 da contestação do banco apelante, pelo que a insuficiência da matéria de facto relevante sempre deveria levar à repetição do julgamento para o seu apuramento e consideração.
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Em regra, a responsabilidade pelo pagamento do capital investido na subscrição de papel comercial cabe apenas à entidade dele emitente, ou seja, e no caso presente, a CNE, só em circunstâncias excepcionais sendo de admitir solução diferente, e que no caso presente não se verificam.
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A douta decisão recorrida traduziu-se, em suma, na responsabilização do banco apelante – que integrava o denominado Grupo SLN – de dívidas de uma outra empresa desse mesmo grupo.
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Mas sem que o banco ora apelante fosse a sociedade dominante de tal grupo, condição indispensável a essa responsabilização por dívidas de outras entidades.
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A douta decisão recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, as disposições dos arts. 236 nº 1 e 799 nº 1 do CCivil, 15º nº 1 al b) do Dec-lei nº 69/2004, de 25.03, 201 nº 1, 205 e 526, todos do CPC, bem como, finalmente, dos arts. 491 e 501 nº 1 do CSC.
Nos termos expostos, e nos mais de direito que V. Exªs doutamente suprirão, deverá o presente recurso de apelação ser julgado provado e procedente, e a decisão recorrida revogada nos termos constantes das conclusões acima apresentadas.
Assim se fará JUSTIÇA! Contra-alegando, a autora, pugna pela manutenção da decisão recorrida, valendo-se dos argumentos nesta expendidos, designadamente que inexiste a invocada nulidade, que a prova foi bem apreciada e aplicada a lei em conformidade com a factualidade apurada e solicitou a condenação do recorrente como litigante de má fé, por este alterar a verdade dos factos e entorpecer a acção da justiça, ao recorrer sem fundamento sério, em consequência do que...
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