Acórdão nº 2458/10.0TBPBL-E.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Dezembro de 2012

Data19 Dezembro 2012
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA 1.

A (…), requereu, no processo de insolvência que lhe foi instaurado por C (…) Lda, a exoneração do passivo restante.

O Sr. Administrador e os credores pronunciaram-se contra tal pedido.

Foi proferida decisão na qual, atento o estatuído no art. 238, nº 1 alíneas d) e e) e nº 1, (quereria dizer-se nº2) se indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo.

  1. Inconformado recorreu o insolvente.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: I.Não se pode entender que desde Maio de 2010 que o Insolvente já tinha conhecimento da sua situação de insolvência, carecendo os autos de elementos que conduzissem a Meritíssima Juiz a tal conclusão.

    1. No despacho inicial de indeferimento não são tais factos indicados, não se baseando, pois, o despacho de que se recorre, em factos concretos que decorrem do presente processo.

      III.É entendimento do Recorrente que não incumpriu o lapso temporal que se encontra previsto no artigo 238.º, n.º 1, d), do CIRE, porquanto não existe da sua parte obrigação de apresentação à insolvência, mas a verdade é que assim que a sua insolvência foi requerida, o Recorrente assumiu a mesma, já que apenas nessa data se apercebeu da actualidade da sua situação de insolvência.

      IV.Não se pode concluir, como erradamente fez a Meritíssima Juiz “a quo”, que não foi cumprido o lapso temporal de 6 meses estabelecido no artigo 238.º, n.º 1, d), do CIRE.

      V.Mesmo que se entenda que o Recorrente não cumpriu o lapso temporal de seis meses estabelecido no artigo 238.º, n.º 1, d), do CIRE – o que apenas se concede por mera questão de raciocínio – não constitui motivo justificativo que esse facto por si só, necessariamente, conduza ao indeferimento da concessão da exoneração do passivo restante, nos termos do disposto no artigo 238.º, n.º 1, d).

    2. Não basta que o devedor, não estando obrigado a se apresentar à insolvência, não o tenha feito nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, exigindo o artigo 238.º, n.º 1, d) que exista prejuízo para os credores e que o devedor soubesse, ou não pudesse ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

    3. Compulsados os autos temos que não resulta dos mesmos que os credores tenham sofrido prejuízos pela não apresentação à insolvência, por parte do Recorrente, nos seis meses posteriores à verificação da situação de insolvência, até porque tais prejuízos não foram sequer invocados pelos credores que se limitaram a indicar que se opunham a que fosse concedida a exoneração do passivo restante ao Recorrente.

      VIII.Não decorre do despacho recorrido que a Juiz “a quo” tenha vislumbrado a existência de prejuízos para os credores, baseando-se o despacho de que se recorre numa venda de património pertencente ao Recorrente, não se podendo, no entanto, inferir de tal venda que a mesma tenha causado, de uma forma intencional, prejuízo aos seus credores.

      IX.A existir prejuízo para os credores o mesmo teria necessariamente que implicar um agravamento da divida do Recorrente, ou seja teria que existir um aumento dos valores em divida, facto que não ocorreu nos presentes autos e nem sequer foi alegado pelos credores ou sequer decorre do despacho de que se recorre.

      X.Não foi o facto de ter o Insolvente procedido à venda do seu património que agravou a sua situação de insolvência, tal apenas aconteceria se tivesse existido um incremento dos valores em divida, facto que não sucedeu e nem sequer serviu de base ao despacho que de que se recorre que se limita a fundamentar o indeferimento liminar da exoneração do passivo restante na venda do património do Recorrente.

    4. A venda de património foi assumida, nos presentes autos, por parte do Recorrente, nunca tendo sido ocultado esse facto, já que foi o próprio Insolvente que indicou, aquando da sua intervenção nos autos, que havia efectuado tais alienações, comunicando ao presente processo que tais bens faziam parte do seu activo, tendo consciência e assumindo que os mesmos eram seus.

    5. Ao ter sido indicado pelo Recorrente que é proprietário dos bens em causa, e que tempos antes os havia vendido, é forçosa a conclusão que não teve qualquer intenção de ocultar património, ou de actuar de forma menos lícita ou de prejudicar os seus credores.

    6. A intenção do Recorrente foi levar ao presente processo a verdade, sendo este comportamento revelador da sua postura de transparência, boa fé, tendo a noção de que a venda efectuada não podia permanecer.

      XIV.Dificilmente se compreende o despacho de indeferimento liminar proferido, não se percebendo como pôde a Meritíssima Juiz “a quo” ter entendido que o Recorrente ocultou o seu património, quando o sucedido foi precisamente o contrário! XV.Sempre seria fácil para os credores apresentar no presente processo prova documental que levasse a concluir que o Insolvente praticou efectivos e múltiplos actos de gestão que terão eventualmente sido determinantes para a situação deficitária em que se encontra.

      XVI.A verdade é que tais elementos não foram trazidos aos autos pelos credores ou pelo Senhor Administrador da Insolvência, conforme lhes competia.

      XVII.No sentido do exposto veja-se o Acórdão proferido pela 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto, no processo n.º 926/10.3TBVCD-A.P1, bem como o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no processo n.º 3850/09.0TBVLG-D.P1.S1, em 21 de Outubro de 2010, que determinou que “B) – Ónus dos requerentes. Entende o recorrente que “é ao requerente que cumpre alegar e demonstrar os factos concretos que, encandeados entre si, permitam concluir que o incumprimento do dever de apresentação à insolvência não teve qualquer incidência na sua situação económica, nem prejudicou os seus credores, pois que tal prejuízo presume-se no caso em que o requerente há muito não tem bens em número e valor susceptível de satisfazer as suas dívidas”. Cremos que também não tem razão. É que e conforme resulta do disposto no nº3 do artigo 236º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o devedor pessoa singular tem apenas, no requerimento de apresentação à insolvência em que formula o pedido de exoneração do passivo restante, de “expressamente declarar” que “preenche os requisitos” para que o pedido não seja indeferido liminarmente.

      Ou seja e como refere Assunção Cristas “in” Exoneração do Devedor pelo Passivo Restante” – Themis/Revista de Direito/Setembro de 2005, página 168 “o devedor pessoa singular tem o direito potestativo a que o pedido seja admitido e submetido à assembleia de apreciação do relatório, momento em que os credores e administrador da insolvência se podem pronunciar sobre o requerimento (artigo 236º/1 e 4)”. Isto significa, em nosso entender, que o devedor não tem que apresentar prova dos requisitos. Até porque, bem vistas as coisas, as diversas alíneas do nº1 do artigo 238º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas estabelecem os fundamentos que determinam o indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante.

      Não constituem factos constitutivos do direito do devedor de pedir esta exoneração. Antes e pelo contrário, constituem factos impeditivos desse direito. Nesta mediada, compete aos credores e ao administrador da insolvência a sua prova – cfr. nº2 do artigo 342º do Código Civil.

      Um afloramento deste entendimento pode encontrar-se na alínea e) do referido artigo 238º, quando aí se prevê o caso de para a indiciação da existência a culpa do devedor na criação ou agravamento da situação de insolvência e no caso de não constarem já do processo, os elementos serem fornecidos pelos credores ou pelo administrador da falência. No caso concreto em apreço e em relação à questão anteriormente tratada sobre a existência de prejuízos para os credores, não foram fornecidos quaisquer elementos ou factos que contrariassem o alegado pelos devedores, para além do avolumar do juros que, já vimos, não pode se tido como prejuízo. Assim, bem de andou no acórdão recorrido em considerar como não verificado o pressuposto em causa.” (sublinhado nosso).

      XVIII.Não se compadece com o despacho recorrido que tenha existido qualquer ocultação de património, até porque a venda de um bem imóvel não é passível de ocultação, atenta a sua obrigatoriedade de registo.

      XIX.Neste sentido já se pronunciou o referido Acórdão proferido pela 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto, no processo n.º 926/10.3TBVCD-A.P1, tendo determinado numa questão semelhante que “Quanto ao imóvel não há qualquer intenção de ocultação, uma vez que foi o próprio requerente que o mencionou, depois porque, tratando-se de um bem imóvel, não, por natureza passível de ocultação ou dissipação.”.

    7. Não resulta dos autos que o Recorrente soubesse, ou não pudesse ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica, nem pode tal resultar dos autos, pois não é pelo facto de as empresas de que o Recorrente é sócio e gerente se terem apresentado à Insolvência que daí poderá resultar tal conclusão.

    8. Uma das sociedades pertencente ao Insolvente encontra-se em processo de recuperação e não de liquidação, o que significa que a actividade profissional do Recorrente se vai manter e que grande parte das suas dívidas será liquidada, até porque estas decorrem maioritariamente de aval prestado a essas mesmas sociedades.

    9. O que leva a que exista prejuízo para os credores é o agravamento da...

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