Acórdão nº 477/10.6TBTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução11 de Dezembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I. Relatório No Tribunal Judicial de Tondela, A..., cidadão alemão, casado, residente em ..., na Alemanha, veio instaurar contra B..., divorciado, residente na Rua ... Tondela, acção declarativa de condenação, então a seguir a forma sumária do processo comum, pedindo a final seja declarada e confirmada a resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado com o réu e este condenado a devolver a quantia entregue a título de sinal elevada ao dobro, acrescida dos juros vencidos desde a citação.

Em fundamento alegou, em síntese útil, ter celebrado com o réu, em 11 de Fevereiro de 2009, acordo escrito, nos termos do qual o segundo, como promitente vendedor, prometeu vender ao demandante que, por seu turno, se obrigou a comprar, pelo preço de € 35 000,00, o prédio urbano que identifica no art.º 1.º da petição inicial. Mais alegou ter entregue ao réu, na pessoa do procurador deste, e aquando da outorga do contrato, a quantia de € 1 500,00 a título de sinal, obrigando-se a celebrar o contrato prometido até 31 de Julho de 2010.

Tendo-lhe sido referido, aquando das negociações prévias à celebração do contrato, que o prédio prometido vender tinha uma área superior àquela que constava da matriz urbana, com indicação das respectivas estremas, a verdade é que, meses volvidos, quando intentou demarcar o prédio, já os limites apontados foram diferentes dos inicialmente identificados, tendo sido apurada uma área de 8 040 m2 em levantamento topográfico cuja realização foi ordenada pelo aqui demandante, muito distante dos 12 000 m2 referenciados pelo réu.

Dadas as divergências encontradas no que respeita à área do imóvel e respectiva demarcação, bem como no que concerne à sua configuração, diz ter perdido o interesse na realização do negócio, o que é fundamento de resolução, pelo que emitiu declaração resolutiva, dada a conhecer ao réu em carta que para tanto lhe enviou em 29 de Julho de 2009.

Deste modo, conclui, porque foi o réu quem deu causa à resolução, tem direito a haver para si a restituição do sinal em dobro, conforme peticiona.

* Regularmente citado, o réu deduziu oposição, na qual impugna que o prédio tenha área inferior àquela que pelo réu foi referida; pelo contrário, no levantamento topográfico efectuado apurou-se a área de cerca de 13 282,00 m2, precisamente a área demarcada e ocupada pelo autor na sequência da celebração do contrato promessa, que nela procedeu ao abate de dezenas de árvores, locupletando-se com valor superior a € 5 000,00.

Porque o autor não procedeu à marcação da data para celebração do contrato prometido, conforme lhe competia nos termos do acordo celebrado, tomou o contestante a iniciativa de o fazer, não tendo o autor comparecido nem justificado a omissão.

Com fundamento no incumprimento, por banda do autor, do contrato celebrado, deduziu reconvenção, pedindo seja proferida sentença que produza os efeitos da declaração negocial do contraente faltoso, condenando-se este a pagar ao reconvinte a quantia de € 33 500,00, correspondente ao remanescente do preço em falta.

Subsidiariamente, e para o caso de assim não ser entendido, pretende a condenação do reconvindo no perdimento a seu favor da quantia entregue a título de sinal e também no pagamento da quantia de € 5 000,00 a título de ressarcimento pelos danos causados no prédio prometido vender.

Respondeu o autor, impugnando ter provocado quaisquer danos no prédio prometido vender, antes pretendendo tê-lo beneficiado com o corte de mato, silvas e acácias rasteiras que nele cresciam, pugnando pela improcedência do pedido reconvencional.

* Fixado valor à causa e determinado o prosseguimento dos autos sob a forma ordinária do processo comum, foi proferido despacho a admitir a reconvenção, selecionados os factos assentes e organizada a base instrutória. Destas peças reclamaram autor e réu, com êxito parcial.

Teve lugar audiência de julgamento e, decidida a matéria de facto sem reclamações, foi a final proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo o réu do pedido, mas julgou procedente e provado o pedido reconvencional principal, determinando “a execução específica do contrato promessa de compra e venda constante de fls. 16 e 17, condenando o autor no pagamento do preço remanescente, no total de € 33 500,00”.

* Inconformado com o assim decidido, interpôs o autor tempestivo recurso, extraindo das alegações produzidas as seguintes conclusões: “1.ª A douta sentença é nula por não especificar os fundamentos de facto em que se baseia e os de direito que justifiquem a decisão de determinar a execução específica do contrato.

  1. As partes clausularam o cumprimento do contrato promessa impreterivelmente até ao final do mês de Julho de 2009 (cláusula 4ª).

  2. Era ao A. que incumbia o dever de notificar o R. do dia e lugar da escritura.

  3. Em carta registada, o A. declarou ao R., em Julho de 2009, a resolução do contrato.

  4. O que configura a vontade do A. de não cumprir a promessa.

  5. O R., em carta de 19.08.09, interpretou o comportamento do A. como de incumprimento do contrato: “apenas posso concluir que pretende desistir….reservo o direito de reter o sinal entregue…” 7.ª A carta (sem procuração à signatária) enviada ao A., um ano depois, não quer dizer que ele estivesse então em mora, depois de, um ano antes, ambos terem declarado o incumprimento.

  6. No mês acertado para a escritura, o A. incumpriu o contrato.

  7. A própria sentença diz, no penúltimo parágrafo do capítulo IV, que “foi o A. quem incumpriu”.

  8. Há que aplicar ao caso o art. 830º nºs 1 e 2 do C. Civil.

  9. As partes afastaram a execução específica por convenção tácita, pois existiu sinal.

  10. Dispositivo legal (nº2) que se aplica até por força de cláusula 7ª do contrato, onde as partes aplicam ao presente contrato o regime do art.º 830.º do C. Civil.

  11. Era ao R. que incumbia o ónus de elidir a presunção da lei, o que não fez, aliás em concordância com a sua carta de 18.08.09.

  12. A jurisprudência dá razão ao A. e a lei é objectiva, aplicando-se ao caso o n.º 2 do art. 830º do CC.

  13. Isto porque o objecto do contrato é um prédio rústico e existiu sinal.

  14. Atento o incumprimento e a existência de sinal, não poderá ser determinada a execução específica mas, quando muito, a perda do sinal.

  15. A douta sentença, padecendo de invocada nulidade, violou, entre outras, as normas do art.ºs 442.º-2 e 830.º-1 e 2 do Cód. Civil”.

    Com tais fundamentos, pretende a revogação da decisão no tocante à determinação da execução específica, admitindo no limite a sua condenação na perda do sinal.

    O réu reconvinte contra alegou doutamente, batendo-se pela manutenção do julgado, extraindo a seguinte síntese conclusiva das contra alegações apresentadas: “1.ª A douta Sentença recorrida encontra-se devidamente assinada electronicamente e muito bem fundamentada, quer de facto quer de direito, não padecendo de qualquer vício susceptível de justificar a sua nulidade; 2.ª A execução específica requerida pelo ora recorrido e reconvinte B... corresponde a uma acção de cumprimento, exprimindo a opção pelo cumprimento, por perdurar o seu interesse na prestação.

  16. Essa opção do ora Recorrido pelo cumprimento da promessa não pode ser esmagada pela imposição unilateral da vontade do Recorrente A... da sua recusa terminante em não cumprir.

  17. Só o promitente vendedor fiel (o ora Recorrido) gozaria da faculdade de resolver o contrato-promessa por incumprimento do promitente faltoso ora Recorrente.

  18. O direito à execução específica, no caso de promessa de compra e venda de um prédio urbano, não pode ser afastada por convenção das partes, nem pela entrega de sinal”.

    * Sabido que o objecto do recurso se limita em face das conclusões insertas nas alegações do recorrente, como resulta do preceituado nos art.ºs 684 n.º 3 e 685.º-A, ambos do CPC, são as seguintes as questões a decidir, correctamente identificadas pelo réu nas suas contra alegações: i. da nulidade da sentença por falta de fundamentação; ii. do incumprimento definitivo e sua coexistência com o pedido de execução específica do contrato; iii. da existência do sinal e conciliação com o recurso à execução específica.

    * II- Fundamentação De facto Da 1.ª instância vem-nos a seguinte factualidade: A. Em 11 de Fevereiro de 2009, o Autor e o representante do Réu, seu pai C...

    , procurador com os devidos poderes legais para o acto, outorgaram contrato promessa de compra e venda, pelo qual o Réu (através do seu procurador) prometeu vender e o Autor, por sua vez, prometeu comprar, livre de encargos e ónus de natureza real...

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