Acórdão nº 2153/11.3T2AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução25 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

O Condomínio do prédio sito na Rua (…) em Aveiro, representado pela sua Administradora T (…), L.da, intentou, contra H (…) – Sociedade de Construções, L.da, ação declarativa, de condenação, com processo sumário.

Pediu: A condenação da ré: a) reparar o pavimento da cave – 2, que se encontra fissurado e provoca infiltrações, bem como a melhorar o acesso às garagens que se encontra condicionado pela inclinação da rampa e a existência de um pilar estrutural no início da mesma; b) resolver o problema das infiltrações provenientes dos tetos das varandas, bem como o das zonas dos terraços e platibandas, que causam fungos e bolores nos tetos dos compartimentos do 4º andar, sobretudo na fração “AB”; c) limpar as caleiras que apresentam lixo proveniente da construção; d) melhorar a ligação entre os rufos dos muretes e as platibandas da cobertura; e) resolver o problema das manchas esbranquiçadas à superfície dos ladrilhos, nas juntas do revestimento cerâmico das fachadas; f) reparar a fissura existente na junta de dilatação dos dois blocos do prédio do condomínio autor.

A R. foi regularmente citada e não contestou nem interveio por outra forma no processo, pelo que, nos termos do n.º 1 do art. 463.º e do n.º 1 do art. 484.º do CPC, o Sr. Juiz considerou confessados os factos articulados pelo A.

  1. Seguidamente proferiu sentença na qual, decisoriamente, rematou: Julgo nos termos e pelos fundamentos expostos, a ação parcialmente procedente e provada e, por via disso: a) - Condeno a R. a eliminar os defeitos dados como provados nos n.ºs 1.º e 2.º da alínea A) e nas alíneas B), C) e D) (todas) do n.º 11 dos Factos Provados; b) - Absolvo a R. do demais que contra ela vem pedido.

  2. Inconformado recorreu o autor.

    Rematando as suas alegações com as seguintes, essenciais, conclusões: A. a C.

    …(descritivas) D.

    Não se produziu o efeito cominatório pleno imanente ao processo sumário, porquanto na douta sentença que ora se coloca em crise, foi desatendido o pedido deduzido pelo Autor para que a Ré fosse condenada a melhorar o acesso às garagens que se encontra condicionado pela inclinação da rampa da cave -2 e pela existência de um pilar estrutural no início da mesma, bem como pela insuficiente altura de passagem sob a laje do piso da cave -1.

    E.

    Isto porque entendeu o Meritíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito do Tribunal a quo que esses defeitos (que o Autor veio enquadrar juridicamente sob a égide dos art.os 913.º, 914.º, 909.º e 798.º do Código Civil, mas que o Digníssimo Magistrado considerou subsumirem-se aos art.os 1221.º e ss., devido à remissão do art.º 1225.º, n.º 4 do Código Civil, norma material de compra e venda) eram naturalisticamente insusceptíveis de eliminação/reparação e, também, defeitos oculorum ictu.

    F… G.

    E não se conforma o Autor, ora Recorrente, porque não é este o enquadramento jurídico correcto a dar aos factos (vindo, portanto, recorrer de Direito), que antes se subsumem a uma compra e venda de bens de consumo que se vêm a revelar defeituosos e desconformes, porque inidóneos para os fins a que se destinam. Por conseguinte, são de aplicar – quer pelo princípio do primado do Direito da União Europeia sobre o Direito Interno (cf. art.os 288.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e 8.º, n.º 3 da C.R.P. e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/01/2010 [proc. n.º 2212/06.4TBMAI.P1.S1], do qual foi Relator o Colendo Senhor Doutor Juiz Conselheiro JOÃO CAMILO, consultável em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e4ce1cd7a2aa2a91802576 a9005709bc?OpenDocument e do Tribunal de Justiça da União Europeia de 10/04/1984 [proc. n.º 14/83 – caso Von Colson], consultável em http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=92351&pageIndex=0&doclang=EN&m ode=doc&dir=&occ=first&part=1&cid=119616); quer pelo princípio de que lex specialis derrogat lex generalis – (1) as normas do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio, (2) as normas da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, e (3) em tudo o que não se encontrar previsto nestes diplomas, as normas do Código Civil.

    H.

    Ora, aplicando casuisticamente a interpretação que vem sendo assinalada pela doutrina mais esclarecida e pela jurisprudência mais autorizada, a interpretação a dar ao n.º 3 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, na versão que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio, impõe concluir que o bonus pater familiae, colocado na situação em que os condóminos se encontravam aquando da negociação para celebração do contrato de compra e venda das fracções autónomas e respectivas garagens, poderia razoavelmente ignorar que 4% a 9% de inclinação de uma rampa de acesso a uma garagem a tornava inidónea para o fim dela esperado.

    I.

    Se assim é, porque tais defeitos foram denunciados em tempo e porque é possível a sua reparação, deve o Recorrido ser condenado a executar as referidas obras de eliminação/reparação dos defeitos.

    J.

    Tais defeitos poderão, nomeadamente, ser eliminados/reparados através da execução de um enchimento na zona extradorso na rampa (na zona da curva da rampa), de modo a que as rodas dos veículos permaneçam equilibradas e todas em contacto com a rampa aquando da execução da subida em curva.

    K.

    Acresce que, durante a execução de um possível ajuste da inclinação da rampa, é possível executar uma camada superficial da rampa, adoptando medidas que garantam maior aderência que a superfície existente (exemplo: sulcos no pavimento). Um primeiro passo consistiria na remoção da camada superficial existente, e posteriormente, executada nova camada superficial com os elementos, que garantem maior a aderência, embutidos.

    L.

    No que à exequibilidade das operações de aumento da altura que medeia entre a rampa e a laje superior concerne, uma solução que poderá minimizar estes embates, será a execução de um “chanfro” na face inferior do bordo da laje. A execução deste “chanfro” iria proporcionar um pequeno aumento na altura livre de passagem, dando alguma “folga” e conforto a quem circula na rampa. Outra solução que aumentaria a altura livre de passagem dos veículos, seria o recuo do limite da laje do piso -1, pelo que também neste particular deve o Recorrido ser condenado em suprimir esse defeito.

    Sem conceder e subsidiariamente, M.

    O douto despacho saneador de que ora se recorre encontra-se ferido de nulidade, porquanto consubstancia um exemplo paradigmático de uma decisão surpresa, dado que o Meritíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito do Tribunal visado não permitiu que o Autor pudesse, sequer, tentar demonstrar a susceptibilidade de reparação/eliminação dos defeitos da rampa e do aumento da altura que medeia entre ela e a laje superior.

    Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., atendendo à antecedente apelação, deverá ser dado provimento ao presente recurso, condenando-se a Recorrida:

    1. A eliminar/reparar os defeitos da rampa de acesso à cave -2, designadamente sulcando o pavimento; b) A aumentar a altura de passagem que medeia entre a rampa e a laje do piso da cave -1; Sem conceder e subsidiariamente, Deverá ser julgada procedente a nulidade invocada do despacho saneador sentença, porquanto consubstancia uma decisão surpresa, que assim deve ser conhecida e declarada; Sem conceder e subsidiariamente, Deverá ser parcialmente anulado o despacho saneador sentença.

    Assim se revogando, nessa parte, a sentença prolatada pelo Tribunal a quo e fazendo-se a mais lídima JUSTIÇA! 4.

    Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 685-A º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são, lógica e metodologicamente, as seguintes: 1ª – Nulidade do despacho saneador/ sentença por constituir uma decisão surpresa.

    1. – Procedência total do pedido 5.

    Os factos dados como provado e considerados foram os seguintes: 1 – O edifício sito na Rua Conceição Maria do Anjos, Blocos 2 e 4, freguesia de Vera Cruz, descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro sob o nº 961/19920326 daquela freguesia, é composto por dois blocos - “A” e “B” – de cave, rés-do-chão, quatro andares e aproveitamento de sótão, destinados a habitação, e foi constituído em propriedade horizontal, com trinta fracções autónomas, e tal acto inscrito no registo predial sob a Ap. 3349 de 2009/04/14 – fls. 13/21.

    2 – Por deliberação...

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