Acórdão nº 40/11.4PTVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Julho de 2012
Magistrado Responsável | MARIA DO CARMO SILVA DIAS |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
(proc. n º 40/11.4PTVNG.P1)* Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto: *I- RELATÓRIO 1. No 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, nos autos de processo comum (tribunal singular) nº 40/11.4PTVNG, foi proferida oralmente sentença, em 30.11.2011 (fls. 33 a 35), constando do dispositivo (ditado para a acta nos termos do art. 389º-A, nº 2, do CPP) o seguinte: Pelo exposto e ao abrigo dos citados preceitos condeno o arguido B……, pela prática em 29 de Outubro de 2011, pelas 20:45 horas, no entroncamento com a Rua 14 de Outubro com a Rua Diogo Casseis, área desta comarca, como autor imediato e sob a forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 69º, nº 1, al. a) e 292º, nº 1, do CP, na pena de multa de 70 (setenta) dias de multa à taxa diária de € 7,00 (sete euros) e na pena acessória de proibição de condução de veículos com motor de qualquer categoria durante 5 (cinco) meses.
*Condeno ainda o arguido nas custas do processo e nos demais encargos a que a sua actividade deu causa (…).
*2. Não se conformando com a sentença, recorreu o arguido B….. (fls. 41 a 49), formulando as seguintes conclusões: A- O arguido veio acusado de conduzir veículo em via pública com uma taxa de álcool no sangue de 1,41 g/l tendo, contudo, sido condenado por conduzir veículo em via pública com uma taxa de álcool no sangue de 1,51 g/l e, consequentemente, é nula a sentença pela aplicação das normas dos arts. 379º, nº 1, al. b) CPP e 20º e 32º CRP; B- O facto implícito na condenação do arguido “o volume de álcool que se deu como provado existir no momento do exame estivesse igualmente presente durante a condução não está minimamente fundamentado, pelo que vai a sentença irremediavelmente ferida de nulidade, cfr. arts. 389º-A, nº, al. b), 374º, nº 2 e 379º, nº 1, al. a) todos CPP e 205º CRP.
C- O resultado do exame de álcool não pode ser valorado uma vez que foi obtido com ofensa à integridade física do arguido e fora dos circunstancialismos legais, nos termos do art. 32º, nº 8, CRP.
Sem prescindir: D- A valoração de declarações do arguido por meio de depoimento indirecto constitui prova nula, por violar o princípio da não incriminação e, em concreto, os arts. 129º e 348º CPP, com especial relevo para as normas dos arts. 129º, nº 3 e 343º, nº 1, in fine CPP.
E- Uma vez omitido o resultado do primeiro exame realizado, jamais se poderá aceitar o resultado do segundo, por violação dos direitos de defesa do arguido, ínsitos entre outros no art. 32º CRP.
F- O facto “o arguido tinha uma taxa de álcool no sangue de 1,51 g/l” teria que ser declarado não provado por se desconhecerem os resultados do outro exame realizado em aparelho idêntico em com o mesmo valor probatório, assim se cumprindo o princípio favor reum decorrente do princípio da presunção de inocência, consagrado no art. 32º, nº 2, CRP.
G- O facto “arguido conduziu um veículo na via pública em estado de embriaguez” terá de ser declarado não provado uma vez que não se produziu prova que demonstrasse que o arguido tinha a mesma taxa de álcool no sangue durante a condução e uma hora após a mesma, cfr. arts. 350º, nº 1 Código Civil e 32º, nº 2 CRP.
H- Deve a douta sentença recorrida ser revogada e o arguido ser absolvido no crime e custas, assim se fazendo justiça.
Termina pedindo a revogação da sentença e a sua absolvição com as legais consequências.
*3. Na 1ª instância o Ministério Público respondeu ao recurso do arguido (fls. 59 a 64), pugnando pelo seu não provimento.
*4. Nesta Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer (fls. 77 a 84), concluindo pelo não provimento do recurso.
*5. Foi cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP, tendo o recorrente apresentado a resposta que consta de fls. 88 a 90, concluindo como no recurso.
*6. Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
*7. Ouvida a sentença sob recurso, que se mostra gravada, verifica-se que foram considerados provados os seguintes factos: No dia 29.10.2011, [às 20 horas…[1]] entre as 20h25m e as 20h45m, no cruzamento ou entroncamento da Rua 14 de Outubro com a Rua Diogo Casseis, o senhor[2] conduzia o veículo de matrícula ..-..-HT, com uma TAS de 1,51 g/l.
O arguido havia ingerido bebidas alcoólicas antes de iniciar esta condução, sabia que não podia conduzir o veículo na via pública depois de ter ingerido bebidas alcoólicas Agiu de modo livre, deliberado e consciente.
Dá-se como provado o teor do CRC junto aos autos.
Aufere 620 euros[3].
Tem a seu cargo um filho de 5 anos.
A mulher ganha o salário mínimo.
Pagam 500 euros de renda de casa.
Na fundamentação dessa decisão proferida sobre a matéria de facto, mencionou-se: O tribunal fundou a sua convicção nos seguintes elementos de prova: no conjunto da prova produzida em audiência de discussão e julgamento que valorou livremente, fazendo apelo a regras da experiência comum e normalidade do acontecer; em concreto, o tribunal valorou as declarações das testemunhas que depuseram de modo isento e objectivo e que claramente afirmaram que, no dia descrito na acusação, foi o arguido quem conduziu o veículo de matrícula ..-..-HT, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas naquela acusação, tendo embatido no carro da testemunha C….., na sequência do que veio a ser submetido a teste de pesquisa de álcool no sangue.
Todas as testemunhas são unânimes em afirmar que mediou algum tempo desde o momento em que o arguido conduziu o seu veículo e aquele em que foi feito o exame mediante o ar expirado uma vez que a primeira reacção do arguido, após o embate, foi a de abandonar o local, ao qual regressou algum tempo depois.
No que concerne a este tempo, as declarações das testemunhas diferem, como não podia deixar de ser, uma vez que nenhuma delas se socorreu de instrumentos de medição[4].
Com fundamento em tais declarações teremos como tempo máximo entre a ocorrência do embate e a submissão do arguido ao exame de pesquisa de álcool no sangue o decurso de, sensivelmente, uma hora.
Daqui não decorre, porém, o comprometimento da prova no que concerne à condução do veículo pelo arguido sob o efeito de álcool.
Na verdade, nos termos do disposto no art. 2º, nº 1, da Lei nº 18/2007, de 17 de Maio, quando o teste realizado em analisador qualitativo indicia a presença de álcool no sangue, ou seja, aquele teste que é feito no local, o examinado é sujeito a novo teste, agora quantitativo, devendo, diz a lei, sempre que possível, o intervalo entre os dois testes não ser superior a 30 minutos.
O legislador estabeleceu assim um procedimento indicativo, salvaguardando, também, na referida norma, a possibilidade do teste quantitativo não ser realizado no período de tempo indicado. Por isso é que na lei se diz “sempre que possível”, sem que daqui decorra a perda de validade da prova assim obtida e, bem assim, do resultado da leitura feita no teste quantitativo.
Do exposto decorre, em nosso entendimento, que o resultado do teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue a que foi submetido o arguido constitui prova válida, devendo ser valorada pelo tribunal, a qual conjugada com a prova testemunhal, fundamentou a resposta positiva à matéria de facto dada como provada, sendo que o arguido não quis prestar declarações na audiência de discussão e julgamento.
O tribunal valorou ainda o teor do CRC do arguido e as declarações do mesmo no que concerne às suas condições de vida.
*II- FUNDAMENTAÇÃO O objecto do recurso, interposto pelo arguido, demarcado pelo teor das respectivas conclusões (art. 412º, nº 1, do CPP), suscita a apreciação das seguintes questões: 1ª – Verificar se há nulidade da sentença por, na sua perspectiva, o arguido ter sido condenado por factos diversos dos constantes da acusação e, por falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto; 2ª – Analisar se foi valorada prova proibida (na sua perspectiva, por o exame de álcool ter sido realizado por ordem nula do agente da PSP, sem o consentimento do arguido e, sem prescindir, por ter sido indevidamente valorado depoimento indirecto de C…… sobre o que disse ter ouvido ao arguido logo a seguir ao acidente) e se foi omitido ou destruído o resultado de um primeiro exame realizado (assim sendo prejudicados os seus direitos de defesa); 3ª – Averiguar se houve erro de julgamento quanto à TAS dada como provada no momento em que o arguido conduzia, por incorrecta apreciação da prova (na sua perspectiva, desconhecendo-se o resultado de um primeiro exame que teria efectuado, o segundo resultado não podia ser valorado, sendo certo que, tendo sido realizado o segundo exame passado uma hora do primeiro, não podia ser atendido esse resultado, para além do tribunal desconhecer o que o arguido andou a fazer no período em que esteve ausente do local e de deverem funcionar os princípios in dubio pro reo e da presunção de inocência).
Vejamos então as questões colocadas pelo recorrente.
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Questão Começa o recorrente por invocar a nulidade da sentença, por um lado por ter sido condenado por factos diversos dos constantes da acusação e, por outro lado, por falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto.
Quanto ao primeiro fundamento de nulidade da sentença (art. 379º, nº 1, al. b), do CPP) alega que vinha acusado de conduzir com uma TAS de 1,41 g/l e foi condenado por conduzir com uma TAS de 1,51 g/l, portanto, superior à que lhe era imputada.
Porém, só por manifesto erro de leitura dos autos é que o recorrente pode alegar que foi acusado de conduzir com uma TAS de 1,41 g/l.
É que basta consultar o processo, ler o auto de notícia de fls. 3, bem como a acusação de fls. 13 e 14, para se verificar facilmente que o arguido foi acusado de conduzir o veículo de matrícula ..-..-HT no cruzamento ou entroncamento da Rua 14 de Outubro com a Rua Diogo Caseis, com uma TAS de 1,51 g/l.
Por seu turno, ouvindo a sentença sob...
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