Acórdão nº 3063/10.7TBVFR-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução04 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pº nº 3063/10.7TBVFR-B.P1 Apelação (102)ACÓRDÃO Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO Por apenso aos autos de insolvência em que foi declarada insolvente B…, no âmbito do incidente de qualificação da insolvência, veio a Sr.ª Administradora da Insolvência apresentar parecer propondo que a insolvência seja qualificada como culposa, por força do disposto no art. 186º, n.º 2, alíneas a), b) e d), e n.º 3, alínea a), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

O Ministério Público aderiu ao parecer do Sr. Administrador da Insolvência, por se verificar, em concreto, a previsão das referidas alíneas do n.º 2 e do n.º 3 do art. 186º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, promovendo a qualificação da insolvência como culposa.

A insolvente deduziu oposição, com os fundamentos constantes de fls. 31 e seguintes, que aqui damos por reproduzidos. Defende que a alínea a) do n.º 3 do art. 186º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas não tem aplicação no caso concreto, por se tratar de uma pessoa singular, alegando que o imóvel identificado na escritura pública de partilha subsequente ao divórcio foi adquirido com recurso a crédito bancário, garantido por hipoteca voluntária constituída sobre o mesmo imóvel, tendo o passivo correspondente sido adjudicado ao seu ex-marido e, por outro lado, que a venda efectuada à sociedade “C…, S.A..” se prendeu com razões de gestão e fiscais, sendo certo que a insolvente não tinha a consciência de estar eminente a insolvência da sociedade “D…, Lda.”. De facto, em Junho de 2009, não obstante alguns problemas de tesouraria, foi desenvolvido um plano de reestruturação e estavam em curso negociações para regularização das dívidas junto dos bancos. Aliás, não seria o património pessoal dos sócios e avalistas que poderia garantir os créditos bancários concedidos à referida sociedade, mas antes o valor da participação que aqueles detinham na mesma, sendo do conhecimento dos bancos que o património daqueles era insuficiente para o efeito.

A Sr.ª Administradora da Insolvência respondeu nos termos de fls. 53 e seguintes.

O Ministério Público não respondeu.

Foi proferida sentença em que se decidiu: a) Qualificar a insolvência como culposa e declarar afectada por tal B…; b) Decretar a inibição da mesma para o exercício do comércio, para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa pelo período de 5 (cinco) anos; c) Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pela mesma e a sua condenação da restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.

Inconformada, apelou a insolvente, apresentando alegações, cujas conclusões são as seguintes: I. Carecem de legitimidade para vir accionar os avalistas, os credores do insolvente que não se opuseram ao Plano de Insolvência aprovado, conforme a faculdade que lhes é dada pelo artigo 216, n.º1, alínea a) do CIRE, no qual está previsto um plano de pagamento dos créditos.

II. Conforme se tem vindo a pronunciar a doutrina, nomeadamente por Catarina Serra, cujos argumentos e que se dão aqui por reproduzidos nos termos supra citados.

III. Desta forma, não pode proceder a presente acção, uma vez que os seus credores não têm legitimidade para exigir em juízo o pagamento das quantias devidas enquanto avalista.

IV. Se assim não se entender, deve a decisão ora recorrida ser revista devendo o a prova produzida ser reapreciada.

V. A Mmª. Juíza “a quo” fundamenta a decisão no que à matéria de facto concerne: - no teor dos documentos principais juntos aos autos principais e demais apensos; - no relatório apresentado pela Exma. Senhora Administradora de Insolvência (de aqui em diante apenas designada por AI) nos termos do artº. 155 do CIRE; - nos elementos que resultam do processo de insolvência 3071/10 relativo à irmã da aqui Recorrente; - no depoimento das testemunhas inquiridas, com destaque positivo para o teor do depoimento da testemunha E… e destaque negativo para o teor do depoimento da testemunha F….

VI. Mas, dos depoimentos recolhidos nos testemunhos prestados, quer pelas testemunhas arroladas pela AI quer pela testemunha arrolada pela Oponente, resultou claro que os factos vertidos nos artigos 31, 34, 36, 37, 38 e 39 da oposição, deveriam ter sido dados como provados.

VII. Quanto ao artigo 31, a testemunha F… disse claramente que a compra e venda dos imóveis à C… tinham como objectivo desenvolver a actividade imobiliária da sociedade, não tendo sido contrariado por nenhuma da restante prova produzida no presente processo (ou nos autos originais e respectivos apensos), nomeadamente pelos restantes testemunhos e/ou pela prova documental.

VIII. Quanto aos factos constantes dos artigos 36 e 37 da oposição, os depoimentos de E…, G… e F…, testemunhos que se dão aqui por reproduzidos nos mesmos termos que se encontram supra, deixaram bem claro que existiu um Plano desenvolvido pela H…, que existiram, a partir da data referida, negociações com os bancos, com vista à aplicação desse plano e que, como tal, havia a expectativa de que as dificuldades da D… fossem superadas a curto prazo.

IX. Expectativa essa que ainda hoje se mantém, como se pode ver pela aprovação do Plano de insolvência aprovado pela AI, que se encontra devidamente aprovado pelos credores da D…, conforme as declarações da mesma testemunha F….

X. Esta situação sai, mesmo reforçada, pelos documentos juntos aos autos e que consubstanciam as alíneas aa) e bb) dos factos dados por provados na sentença proferida no âmbito do processo de insolvência 3071/10 mencionado na motivação da sentença recorrida, nos quais consta que, com as datas de 16 e 20 de Novembro de 2009, respectivamente com o I…, SA e com o J…, SA a D… celebrou contratos de reestruturação do seu crédito.

XI. O artigo 38 da oposição resulta provado com o depoimento da testemunha G…, que confirmou que o K… não considerou o projecto da H… viável.

XII. No que diz respeito ao artigo 39 da oposição, a testemunha L…, funcionário do M…, S.A., deixou bem claro que os créditos eram concedidos sem qualquer avaliação ou sequer confirmação do património dos avalistas.

XIII. Após este depoimento, não restam dúvidas que os créditos eram concedidos com base única e exclusivamente no valor da D…, de outra forma, teria sido feita uma análise detalhada ao património pessoal dos avalistas, ou seja, o Banco ter-se-ia assegurado da existência de bens desonerados em quantidade suficiente para assegurar o pagamento do crédito o que, como verificámos, não aconteceu.

XIV. Resulta do exposto que os factos constantes dos mencionados artigos 31, 36, 37, 38 e 39 da oposição devem ser dados como provados.

XV. Sendo assim, e por maioria de razão, também têm que se dar como provados os factos vertidos no artigo 34 da mencionada oposição uma vez que os Administradores da Sociedade e, naturalmente os seus sócios, sempre acreditaram na viabilidade da empresa, nunca se convencendo que o desfecho seria a insolvência.

XVI. Mais deve o Tribunal rectificar a alínea a) dos factos provados porquanto a presente acção tem como objecto a insolvência de B… e não de O…, conforme se encontra na mencionada alínea.

XVII. Mais se recorre das alíneas aa) e bb) dos factos provados uma vez que consubstanciam factos novos, não invocados por nenhuma das partes.

XVIII. Entende-se ainda que, dos depoimentos já citados, não resultaram provados os três pressupostos em que o Tribunal baseia a douta sentença.

XIX. Não houve qualquer disposição de bens em proveito pessoal ou de terceiros por parte da Recorrente, aquando da partilha por Divórcio.

XX. Como resulta da alínea m) dos factos provados da douta sentença, a Recorrente transferiu então para o património do cônjuge não avalista, a propriedade dos imóveis aí descritos.

XXI. Contudo, transferiu-se também o passivo a ela associado, ou seja, a hipoteca e o pagamento do empréstimo, recebendo a quantia de 50.943,80 euros a título de pagamento de tornas.

XXII. Sendo assim, não houve qualquer prejuízo para os credores uma vez que, ao partilhar os imóveis em questão, a Recorrente deixou de ter um encargo, ou seja, o pagamento de um empréstimo, sobre um bem que não seria de utilidade aos credores, uma vez que se encontrava hipotecado a favor da N… e ainda recebeu uma quantia significativa de dinheiro de valor superior ao outro imóvel partilhado, que certamente enriqueceu o património da agora insolvente.

XXIII. Também não houve qualquer prejuízo para os credores da Recorrente com a celebração das escrituras pública de 1 de Junho (rectificada a 5 de Junho do mesmo ano) e 10 de Julho de 2009, através das quais a Insolvente vendeu à sociedade C…, Lda., da qual era sócia, os cinco imóveis descritos nas referidas escrituras – alíneas k), l) e n) dos factos provados da sentença ora recorrida.

XXIV. Sociedade essa que viu o seu capital social aumentado, passando a quota da insolvente a ter o valor de 10.000,00 quando antes era de 1.000,00 euros – alínea x) dos factos provados.

XXV. Ou seja, a Recorrente não só manteve a sua quota na sociedade compradora, como ainda aumentou a mesma.

XXVI. Como tal, não deixaram os imóveis de estar acessíveis aos credores da Recorrente, porquanto a mencionada quota, fazendo parte do seu património era, obviamente, um bem penhorável.

XXVII. Os credores da Recorrente ficaram mesmo, com tal negócio, beneficiados, senão vejamos: dos bens vendidos, a Recorrente era detentora de uma quota correspondente a 3/42 enquanto que, na sociedade C…, a sua participação era de 8/42, conforme se explica detalhadamente no artigo 62 supra.

XXVIII. E não houve qualquer prejuízo para os credores na posterior venda das acções da Recorrente, conforme resulta dos factos provados na alínea y) da Sentença agora recorrida, uma vez que tal venda não foi resolvida pela Senhora Administradora da...

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