Acórdão nº 1615/10.4TBAMT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução11 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1615/10.4TBAMT-A.P1 (Apelação) Tribunal recorrido: Tribunal Judicial de Amarante (1.º Juízo) Apelante: B… Apelado: C…, Ld.ª Acordam no Tribunal da Relação do Porto Sumário: 1. O artigo 458.º do Código Civil apenas dispensa o credor/exequente de provar a relação subjacente, mas não de a alegar.

  1. O credor munido de um documento donde consta a confissão de dívida, sem indicação da respetiva causa, ainda que o documento seja título executivo, por preencher os requisitos previstos no artigo 46.º, n.º1, alínea c), do CPC, não fica desobrigado de alegar no requerimento executivo a factualidade relativa à relação subjacente, sob pena de ineptidão do requerimento executivo.

I – RELATÓRIO A executada B… deduziu oposição à execução comum, para pagamento de quantia certa, em que é exequente C…, Ld.ª, pedindo que, na procedência da mesma, seja absolvida do pedido contra ela formulada na execução.

Para fundamentar a oposição alegou, em síntese, que nada deve à exequente, só assinou a confissão de dívida dada à execução por ter sido coagida, negando ter qualquer relação comercial com a exequente. Conclui, alegando a ineptidão do requerimento executivo, por não ter sido alegada a relação causal, que o artigo 458.º do Código Civil não dispensa essa alegação e que, de qualquer forma, o negócio feito sob coação e erro são anuláveis.

A exequente contestou, alegando as circunstâncias que levaram à declaração constante do documento apresentado como título executivo, respondendo às exceções, concluindo pela improcedência da oposição.

Foi proferido despacho saneador que apreciou e julgou improcedente a alegada ineptidão do requerimento executivo. Foi dispensada a seleção da matéria de facto.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição.

Inconformada, apelou a oponente, defendendo a revogação da sentença e a procedência da oposição.

Contra-alegou o exequente, defendendo a improcedência da apelação.

Conclusões da apelação: 1º A Recorrente considera que a decisão quanto à matéria de facto padece de alguns vícios, designadamente quanto à resposta dada ao alegado no artigo 4º da Oposição à execução.

  1. O testemunho do Sr. Dr. D…, gravado em suporte digital entre as 15:32:22 e as 16:01:52 do dia 26 de Outubro de 2011, reputado de idóneo e credível, confirma que a Recorrente não tem qualquer negócio ou ligação com a Recorrida.

  2. Apenas a sociedade E…, Lda. teve relações com a Recorrida, sendo que, de acordo com a testemunha, a confissão de dívida se destinava a cobrir riscos advenientes de eventuais problemas desta com a Administração Fiscal, pese embora desconhecer como foi fixada a quantia, sendo certo que a mesma não foi negociada com nenhum dos confessados devedores, muito menos com a Recorrente, que não conhece ou reconhece.

  3. Por outro lado, a testemunha garantiu que o teor da confissão de dívida e os termos que nela constam são da sua autoria, sendo que, na sua versão dos factos, sempre terá acordado com o representante legal daquela sociedade que os demais assinantes seriam fiadores ou garantes do cumprimento.

  4. Estas provas justificam uma alteração da decisão quanto à matéria de facto no que concerne ao artigo 4º da Oposição, o qual deve ser dado como provado.

  5. Deve ainda ser dado como provado que: a sociedade E… não podia cumprir a sentença que a condenava na entrega dos documentos contabilísticos à C…, Lda, uma vez que os mesmos não existiam, facto atendível por força do nº 2 do artigo 514º CPC.

  6. A sustentar esta afirmação está o depoimento da testemunha F…, Agente de Execução, que lavrou o auto de penhora encontrado a fls. 153 e 154 dos autos, o próprio auto de penhora e o testemunho do Sr. Dr. D…, que revelaram que a sociedade E…, Lda não tinha quaisquer documentos para entregar à Recorrida.

  7. Trata-se, na verdade, de matéria especialmente relevante uma vez que fica demonstrado, sem contestação possível, que não existia qualquer causa para a dívida confessada aqui exequenda.

  8. Por outro lado, não pode o Tribunal deixar de verificar e declarar a ineptidão do Requerimento Executivo que deu o impulso a estes autos.

  9. Foi executado um documento particular designado “confissão de dívida”, o qual não contém em si os factos referentes à causa de pedir, factos que continuaram ausentes no Requerimento Executivo, fazendo a sua aparição apenas na Contestação à Oposição à execução.

  10. No entanto, dispõe o art. 810º, nº 1, al. e) do CPC que o requerimento executivo deve conter a exposição sucinta dos factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo, sendo que a sua falta determina o indeferimento liminar por ineptidão, o que deveria ter sido decidido.

  11. A invocação dos factos apenas na contestação à oposição à execução origina, por outro lado, alteração de causa de pedir, não podendo tal ocorrer salvo acordo do executado, nos termos do disposto nos artigos 272º e 273º, nº1 CPC.

  12. Como refere Joel Timóteo Ramos Pereira, em artigo publicado na revista “O Advogado”, nº 20, de Abril de 2002: a alteração da causa de pedir é inadmissível em sede executiva, salvo se houver acordo por parte do executado (art.º 272.º do CPC).

  13. Destarte, não deve ser permitido à execução a que esta segue apensa subsistir quando a petição que lhe deu origem se encontra irremediavelmente incapaz de cumprir o seu objectivo de sustentar todo o edifício processual, por falta de causa de pedir.

  14. Na Oposição à execução, a Recorrente colocou sobre a apreciação do Tribunal a questão de não poder a Recorrida alegar, em sede de contestação à oposição, factos referentes à relação material controvertida, pelo que o Tribunal de 1ª instância deveria ter-se pronunciado sobre esta problemática.

  15. Com efeito, o artigo 660º, nº 2, 1ª parte, obriga o juiz a resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, sendo que “é nula a sentença quando: o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”, nos termos do disposto no artigo 668º, nº 1, alínea d) CPC.

  16. Uma vez que, no presente processo, não houve qualquer decisão relativa à questão suscitada pela Recorrente, nem a solução da mesma ficou prejudicada por outra decisão tomada no mesmo âmbito, ocorre nulidade da sentença por falta de pronúncia.

  17. Ocorre, igualmente, nulidade por excesso de pronúncia, porquanto a sentença em crise conheceu os factos alegados pela Recorrida na Contestação, sendo o Requerimento Executivo totalmente omisso quanto a eles.

  18. Decidindo-se que a Recorrida estava impossibilitada de alegar neste apenso os factos atinentes à relação material controvertida e subjacente à declaração de dívida, não podia o Tribunal conhecer os factos constantes da Contestação, uma vez que os mesmos consubstanciam alteração da causa de pedir, inadmissível nos termos supra defendidos, sob pena de nulidade.

  19. Num processo...

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