Acórdão nº 4817/11.2TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Janeiro de 2013

Data07 Janeiro 2013
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

4817/11.2TBVNG.P1 Recorrente/réu – B…, Lda.

Recorrida/autora – C… Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: 1 – Relatório: 1.1 - Os autos na 1.ª instância e a decisão sob recurso C… intentou a presente ação contra a sociedade B…, Lda.

e pediu que "1 – Seja declarada ilícita a resolução contratual produzida pela ré; 2 - Que a ré seja declarada única e exclusiva responsável pelo incumprimento contratual; 3 – Declarar-se resolvido o contrato promessa celebrado entre as partes; 4 – Condenar a ré a restituir à autora a quantia recebida a título de sinal, em dobro, no valor de €10.000,00, acrescidos de juros legais desde a sua citação até efetivo pagamento".

A autora, fundamentando a sua pretensão, veio dizer, ora em síntese: - No dia 14.04.10 celebraram a autora (promitente-compradora) e a ré (promitente-vendedora) um contrato promessa de compra e venda que teve por objeto uma moradia Unifamiliar com três frentes, sito na freguesia …, Concelho de Vila Nova de Gaia, pelo preço convencionado de €260.000,00, tendo entregue €5.000,00 a título de sinal. Acordaram que a escritura seria feita no prazo máximo de 90 dias, contados da promessa e que o imóvel estaria totalmente terminado nessa altura.

- As partes incluíram no contrato as cláusulas 7 e 8, designadas por especiais, que previam os seguintes termos: “7.º CLÁUSULA ESPECIAL PARA O PRIMEIRO OUTORGANTE: a) Caso, o Primeiro Outorgante não obtenha, no período de 90 dias a partir desta data, o Alvará de Licença de Ocupação, não será possível escriturar o imóvel; b) Se eventualmente o Segundo Outorgante quiser rescindir o contrato, ser-lhe-á devolvido apenas o valor ora dado como sinal, sem qualquer outra indemnização ou penalização; 8.º CLÁUSULA ESPECIAL PARA O SEGUNDO OUTORGANTE: No caso de o segundo outorgante, por motivos alheios, não conseguir obter financiamento no referido prazo de 90 dias, o primeiro outorgante poderá rescindir o contrato devolvendo o sinal ora dado em singelo e sem qualquer mais-valia.” - Sucede que a ré não obteve o alvará de licença de ocupação dentro de 90 dias e tal facto obstou à realização da escritura. Em 16.07.10, a autora comunicou que apesar de ultrapassado o prazo, o seu interesse mantinha-se intacto, aguardando que a ré obtivesse o Alvará de Licença de Ocupação, mas a ré nada disse. Em 11.08.10, sabendo que já havia obtido o alvará, a autora enviou carta registada com a/r, dando à ré o prazo de 30 dias para marcar a escritura pública, sob pena de perder todo o interesse na realização do contrato prometido. No dia 13.08.10, a autora rececionou carta do mandatário da ré na qual dá conhecimento da obtenção do alvará e designa a data de 23 de agosto para a realização da escritura. Em 17.08.10, a autora comunicou a impossibilidade de realização da escritura na data proposta, justificando os motivos e indica o dia 07 de setembro ou outra data desde que posterior. Em 24 de agosto a ré comunicou que havia estado presente no dia 23 no cartório para realização da escritura e que em virtude da falta de comparência incorria em mora, indicando nova marcação agora para o dia 31.08.10, acrescentando que nova falta de comparência na data designada levaria à resolução do contrato. Nesse mesmo dia, a autora, através do mandatário, comunicou que rejeitava a imputada mora e reiterava a informação anterior, solicitando novamente a marcação da escritura para o dia 07 de setembro ou qualquer outra data desde que posterior.

- A ré nada disse e pretendeu resolver o contrato a partir de 31 de agosto, conforme se extrai da s/comunicação datada de 24 de agosto e do seu comportamento posterior a esta data, resolução com a qual a autora não se conforma. No dia 06.05.11, a autora comunicou à ré a perda definitiva do seu interesse na realização do negócio, e a consequente resolução do contrato promessa, em virtude da ausência de qualquer resposta tendo em consideração o já longo lapso de tempo desde então ultrapassado.

Uma vez citada, a ré contestou. Defende que a questão a apreciar é puramente de direito e que teve toda a legitimidade para rescindir o contrato por incumprimento da autora. Com efeito, a demandante comunicou-lhe que ficaria a aguardar "o prazo estritamente necessário à obtenção da licença de ocupação e marcação da escritura definitiva do imóvel", ou seja, estava a solicitar a marcação da escritura para logo que a licença de habitabilidade fosse obtida. A autora foi informada que a ré já estava na posse da licença e solicitou a marcação num prazo máximo de trinta dias, o que a ré fez, designando o dia 23 de agosto e, nessa data, esteve presente. Novamente voltou a interpelar a autora, agora para a realização da escritura em 31 de agosto e sob pena de rescindir o contrato e a autora não compareceu. Por tudo, só restava à contestante rescindir o contrato e fazer seu o valor entregue a título de sinal.

A ré igualmente se pronuncia "no que tange aos documentos juntos, remetidos pelo Ilustre Advogado da A. ao Advogado da R." que entende deverem "ser desentranhados dos autos, ao abrigo do dever de reserva, já que a sua divulgação viola o artigo 26º do Código Deontológico dos Advogados".

A autora respondeu. Nessa peça defendeu que "ao invés do que a Ré pretende fazer crer, os documentos juntos aos autos, remetidos pelo seu Advogado ao mandatário da R., não violam qualquer dispositivo Deontológico dos Advogados, em particular o aludido dever de reserva". Com efeito, "a indicada correspondência, dirigida ao mandatário da R., foi elaborada por Advogado em representação da A. e visa apenas alterar a data proposta para realização de Escritura Pública", não se tratando de "correspondência sobre qualquer malograda transação, como a R. pretende fazer crer".

Findos os articulados e conclusos os autos foi fixado o valor da causa - €260.000,00 (duzentos e sessenta mil euros) e a ação passou "a correr os termos do processo ordinário de declaração".

No prosseguimento do processo foi designada uma audiência preliminar, requerida e deferida a suspensão da instância e, mais adiante, foi proferido Saneador-Sentença. Nesta peça – que vem a ser o objeto desta apelação – depois de, em sede de questão prévia se ter considerado que "os documentos juntos pelas partes que configuram correspondência trocada pelos seus ilustres mandatários com vista à marcação de data para a realização do contrato definitivo e questões conexas por não se enquadrarem no disposto nos art.º s 87 nº 4 e 108 do Estatuto da Ordem dos Advogados não se mostram abrangidos por qualquer restrição como meio de prova" veio a decidir-se o seguinte: "Termos em que considero a presente ação procedente e, por via disso, declaro validamente resolvido pela A. o contrato-promessa descrito nos factos provados nºs 1º a 5º, por incumprimento definitivo imputável à Ré e condeno-a a pagar à A. a quantia de euros 10.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, devidos desde a citação e até integral pagamento. Custas a cargo da Ré".

1.2 – Do recurso Inconformada, a ré veio apelar. Pretende a revogação da decisão e formula as seguintes Conclusões: 1 - Vem o presente recurso interposto do saneador sentença que julgou “…a presente ação procedente e, por via disso, declaro validamente resolvido pela A. o contrato promessa descrito nos factos provados nºs 1º a 5º, por incumprimento definitivo imputável à Ré e condeno-a a pagar à A. a quantia de euros 10.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, devidos desde a citação e até integral pagamento. Custas a cargo da Ré” 2 - Salvo o devido respeito, o Tribunal fez uma errada interpretação e aplicação do direito.

3 – Salvo o devido respeito, face à matéria de facto assente, fez uma errada subsunção dos factos ao direito e sobretudo uma errada interpretação do contrato.

4 - O Contrato promessa em causa, além das clausulas “típicas” dos contratos promessa, que mais não são do que a reprodução do estatuído no artigo 442º do Código Civil, estatuía duas clausulas “especiais” de salvaguarda.

5 - Uma a favor do promitente comprador, cláusula sétima: “7ª: a) Caso, o Primeiro Outorgante não obtenha, no período de 90 dias a partir desta data, o Alvará de Licença de Ocupação, não será possível escriturar o imóvel; b) Se eventualmente o Segundo Outorgante quiser rescindir o contrato, ser-lhe á devolvido apenas o valor ora dado como sinal, sem qualquer outra indemnização ou penalização;” 6 - Outra a favor do promitente vendedor, cláusula oitava: “8ª: No...

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