Acórdão nº 5740/09.6TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução11 de Dezembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA, SA, propôs, contra BB, SA, ambas com os sinais dos autos, acção condenatória seguindo forma ordinária, distribuída à 3ª Vara Cível de Lisboa, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de € 68.417,06, acrescida de juros legais, alegadamente por aquela devida, pela prestação de serviços de hotelaria e restauração.

Contestou a R., sustentando a inexistência do invocado crédito - e concluindo pela improcedência da acção.

Efectuado julgamento, foi proferida sentença, na qual se considerou a acção improcedente, absolvendo-se a R. do pedido.

Inconformada, veio a A. interpor recurso de apelação, para o Tribunal da Relação de Lisboa que, concedendo provimento ao recurso, revogou a decisão recorrida e, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré apelada a pagar à A. apelante a quantia de € 67.427,06, acrescida, com a restrição que mais adiante refere, dos reclamados juros.

Foi a vez de a Ré, BB, irresignada, vir interpor recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES A) O douto Acórdão recorrido, no qual "(...) se acorda em, concedendo provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e, julgando a acção parcialmente procedente, condenar a R. apelada a pagar à A. apelante a quantia de €67.427,06 - acrescida, com a aludida restrição, dos reclamados juros", para além de nulo, viola o disposto no art. 342.° do Código Civil, que interpretou e aplicou incorrectamente.

B) Das Conclusões então formuladas pela Recorrida resulta claro e inequívoco que o objecto do recurso consistia: a. na impugnada, mas não alterada, resposta ao quesito 15.° da Base Instrutória; b. na alegada, mas não apreciada, violação dos artºs. 847.° e 851.° do CC; e, c. na alegada existência de um crédito remanescente a seu favor, no montante de € 23.857,37.

C) A Recorrida nunca alegou, ou sequer admitiu, que a resposta ao quesito 15.° da Base Instrutória se revelava insuficiente e/ou inconclusiva no que diz respeito ao montante mínimo dos créditos objecto da declarada compensação (vício que, aliás, sempre deveria ser arguido nos termos e ao abrigo do art. 669.° do CPP), apenas tendo alegado que, mantendo-se a resposta ao quesito 15.° inalterada, nem assim o pedido poderia/deveria ter sido julgado totalmente improcedente.

D) Nas suas Alegações e respectivas conclusões a Recorrida não invocou, como constituía ónus processual da mesma (cf. alínea b) do n.º 2 do art. 685.° do CPC), que a correcta interpretação/aplicação do art. 342.°, n.º 2, do Código Civil, impunha a improcedência total da excepção de compensação de créditos invocados pela ora Recorrente, sendo certo que o Tribunal ad quo também não recorreu à faculdade prevista no n.º 3 do art. 685.°-A do CPC.

E) O Douto acórdão recorrido concluiu, sem alterar os factos provados, que "em face da resposta, restritiva ou negativa, aos respectivos artºs. 16° e 16.°-l, nos quais se referiam as condições concretas desse acordo, resulta esvaziado de conteúdo o "encontro de contas", a cuja feitura se reporta o art. 15° da Base instrutória".

F) O Douto acórdão recorrido não se ateve ao objecto fixado nas alegações da Recorrida, antes conhecendo/declarando um vício/erro de julgamento que não havia sido invocado por esta nas referidas alegações, bem como, interpretando e aplicando as normas aplicáveis num sentido que não havia sido indicado/reclamado pela mesma.

G) O Douto Acórdão recorrido não procedeu à revogação/modificação da decisão proferida peia 1ª instância, tendo-se limitado a esclarecer uma aparente "obscuridade ou ambiguidade da decisão e dos seus fundamentos", extraindo da resposta ao quesito 15.° um conteúdo/alcance distinto do assumido por aquela, reformando a decisão em termos não requeridos pela Recorrida, e "extravasando" os seus poderes (cfr. art. 669.°, n.º 1 e 670.°, n.º 2, ambos do CPC).

  1. Deste modo, nos termos do disposto nos artºs. 716.°, n.º 1, 668.°, n.º 1 alínea d), 684.°, n.º 3, 669.°, n.º 3 e 685.°-A, n.º 1 e n.º 2 alínea b), todos do CPC, o acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia, devendo ser revogado.

  2. Ao considerar como não provado o acerto de contas acordado entre as partes, bem como que, ao condenar a mesma na (quase) totalidade do crédito reclamado pela Recorrida, o Tribunal a quo violou os nºs 1 e 2 do art. 342.° do CC, tendo, por um lado, decidido contra a matéria de facto provada e, por outro, para além da mesma.

  3. da resposta ao quesito 15.° resulta inequivocamente provado, que, por força desse mesmo "acerto de contas", e dos respectivos créditos em confronto, se extinguiram, pelo menos, os créditos da Recorrida indicados na alínea E) e F) dos Factos Assentes.

  4. Aliás, se dúvidas houvessem relativamente ao entendimento da 1ª instância, e aos factos dados assentes pela mesma, bem como ao sentido da decisão proferida, em sede de aplicação do direito aos factos refere-se, expressamente, que: "Compulsando a factualidade provada constata-se que a Ré não pagou as facturas, supra referidas em 2.1.1. F., que perfazem o valor global de € 8.091,50 e estão também por pagar pela R. os serviços prestados pela A. e descritos nas facturas identificadas em 2.1.2. 1., que totalizam € 1.145,50.

    No entanto, está também provado que dadas as relações existentes entre Dr.CC, presidente do conselho de administração da A. e o Administrador da ora Ré, Dr. DD que por sua vez são sócios/accionistas em várias sociedades comerciais, devedoras da Ré, Autora e Ré acordaram na feitura de um encontro de contas, tudo cf.. 2.1.1. J., K. e 2.1.2. 2. a 16., o que se entende, pois, as sociedades de que a Ré é credora integram - ou integravam - o mesmo universo/grupo empresarial da A., cf.. 2.1.2. 2. e 3. dos factos provados.

    Donde, nos termos do acordo existente entre as partes o preço dos serviços, ainda em dívida pela Ré, deveria ser liquidado através do encontro de contas entre as partes e, tendo em conta os factos provados, resulta claro que desse encontro de contas, as obrigações da Ré perante a A. ficarão extintas, por compensação, art. 847° do CC." L) Tendo em conta que a vontade real das partes considerada provada foi no sentido de regularizar por "encontro de contas" os (quaisquer) saldos que se encontrassem em aberto entre ambas, o efeito jurídico pretendido, ou seja, a extinção dos contra-créditos, decorre, de forma automática, do acordo considerado (e mantido) provado.

  5. Os quesitos 16.° e 16.°-I, não se reportam a factos constitutivos das excepções invocadas pela ora Recorrente, mas sim às consequências jurídicas do acordo celebrado entre as partes, correspondendo, portanto, a matéria conclusiva e/ou de direito e, como tal, insusceptível de prova.

  6. Quanto muito, tais factos "apenas" se revelavam constitutivos de uma outra excepção também invocada peia ora Recorrente, mais concretamente a remissão de dívidas alegada no art. 24.° da Contestação.

  7. Tendo em conta que da resposta aos quesitos 15.° e 16.° resulta inequivocamente provado que as partes entenderam compensar os créditos a que aludem as alíneas E) e F) dos factos assentes, com os créditos a que aludem os quesitos 2.° e 6.° a 14.° da Base instrutório, o Douto Acórdão recorrido violou e interpretou incorrectamente o n.º do art. 342.° do CPC.

  8. No limite, da resposta ao quesito 15.° resulta que, quanto muito, foram incorrectamente considerado incluídos no acerto de contas os montantes resultantes das respostas ao quesito 1.° e ao quesito 6.°, em relação aos quais tal resposta, e a decisão, são aparentemente omissas/contraditórias, matéria que, no entanto, deveria ter sido suscitada pela Recorrida em sede de esclarecimento ou reforma da sentença, e nos termos e ao abrigo do art. 669.° do CPC.

  9. Apenas ficou provado em ambas as instâncias que se encontram por pagar as facturas indicadas na alínea F) dos Factos assentes, no montante de € 8.091,50, bem como as facturas indicadas na resposta ao quesito 1.° da Base Instrutória, no montante de € 1.145,50.

  10. No demais, e desde logo porque não constam dos Factos Assentes, nem da Base Instrutória, quaisquer outros factos constitutivos do crédito invocado pela Recorrida, esta não logrou provar que se encontram em dívida quaisquer outras facturas indicadas na alínea B) dos Factos Assentes.

  11. Face à matéria provada/bem como ao estipulado no n.º 1 do art. 342.° do Código Civil, em caso de procedência parcial do pedido, a ora Recorrente não pode, em caso algum, ser condenada a pagar à Recorrida um montante superior a € 9.237,00 (nove mil duzentos e trinta e sete euros), ou seja, o único montante que comprovadamente se encontra por pagar.

  12. Termos em que deverá ser revogado o douto Acórdão do Tribunal a quo e substituído por outro que, à semelhança do Tribunal de 1ª Instância, absolva a Recorrente do pedido, ou, caso assim não se entenda, condene a mesma, unicamente, no pagamento do montante provado, e não extinto por compensação, do crédito da Recorrida.

    Não foram apresentadas contra-alegações no presente recurso.

    Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, pois nada obsta ao conhecimento do objecto do presente recurso, sendo que este é delimitado pelas conclusões da alegação do Recorrente, nos termos, essencialmente, do art.º 684º, nº 3 do CPC, como, de resto, constitui doutrina e jurisprudência firme deste Tribunal.

    FUNDAMENTOS Das instâncias, vem dada como provada a seguinte factualidade: A.

    A ora A. é uma sociedade anónima que se dedica, no âmbito do seu objecto social, ao fornecimento de serviços de hotelaria e restauração.

    B.

    No âmbito da sua actividade comercial, a ora A. prestou diversos serviços à ora R., melhor descritos nas facturas infra mencionadas: 1- Factura n° 18716 emitida em 19/1/2003 no valor de € 300 2- Factura n° 19345 emitida em 21/2/2003 no valor de € 96,30 3- Factura n° 22769 emitida em 15/8/2003 no valor de € 180 4- Factura n° 22949 emitida em 26/8/2003 no valor de € 414 5- Factura n° 23466 emitida em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT