Acórdão nº 00644/06.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Junho de 2008

Data26 Junho 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . “S..., L. da”, com sede na Quinta ..., Caminha, veio interpor o presente recurso jurisdicional da decisão exarada, em 13/12/2006, a fls. 184 dos autos, pela qual foi decidido notificar as partes para apresentarem alegações escritas, porquanto inexistia matéria controvertia que justificasse a abertura de um período de produção de prova e, simultaneamente da sentença do TAF de Braga, datada de 19 de Junho de 2007, que julgou improcedente a acção administrativa especial, interposta pela recorrente contra o “MUNICÍPIO de CAMINHA”, onde se questionava o acto da Presidente da respectiva Câmara Municipal, de 9/2/2006, que converteu em definitivo o projecto de decisão de 28/11/2005 do Vice Presidente da CM, referente à declaração de caducidade do loteamento atinente ao prédio sito no lugar de Estação, Caminha, titulado pelo alvará nº- 8/93, emitido em 28/9/1993.

*** A recorrente apresentou alegações onde formalizou o pedido de provimento e, em consequência, a revogação da sentença recorrida, substituindo-se por nova decisão que julgue a acção procedente ou, subsidiariamente, que anule o processado e ordene a produção de prova sobre a matéria ainda controvertida, nomeadamente, a matéria dos itens 123º a 128º da p.i., e as seguintes conclusões: 1ª. O acto impugnado está inquinado de vício de forma.

  1. Em primeiro lugar, porque não foram inquiridas as quatro testemunhas que arrolou na sua resposta no âmbito da audiência prévia, nem foi proferido qualquer despacho fundamentando a decisão de as não inquirir, não equivalendo a qualquer decisão minimamente fundamentada a proposição, sem a referência a qualquer norma legal, segundo a qual a autora do acto impugnado declarou que “não via qualquer interesse na inquirição das testemunhas arroladas” e que “a matéria eventualmente controversa é sujeita à forma escrita, para além dos documentos existentes serem manifestamente suficientes”.

  2. A audiência prévia foi transformada numa mera "formalidade para cumprir calendário", com a absoluta perversão do direito da Autora de participar na decisão do procedimento.

  3. Para além do thema decidendum no procedimento ter passado a englobar necessariamente todas as questões abordadas na resposta da Autora no âmbito da audiência prévia, a entidade decisora passou a estar vinculada igualmente à realização das diligências de prova requeridas na parte final dessa peça, de forma séria, efectiva, exaustiva e rigorosa, com o controle do principal interessado, ou seja, da recorrente.

  4. A visão da audiência prévia que obteve guarida na douta sentença, é uma visão formal, ao bastar-se com a vaguidade, abstracção e generalidade da expressão referida na conclusão 2ª. Para impedir a inquirição das testemunhas arroladas, ainda por cima quando a própria autora do acto se limitou a aludir a matéria “eventualmente controversa”, sem a definir em concreto, a matéria “sujeita a forma escrita”, sem o fundamentar e a “documentos existentes” sem dizer quais.

  5. Sem se saber, em concreto, aquilo que as testemunhas arroladas sabiam sobre os factos alegados na Resposta apresentada pela ora recorrente, não era possível concluir-se se os respectivos factos estavam ou não sujeitos a forma escrita, sendo que, se o estivessem, sempre a sua não redução a escrito seria da responsabilidade do Município, sendo completamente perversa a invocação de irregularidades próprias para se dificultar a prova à contraparte, não podendo isso deixar de consubstanciar uma manifesto “venire contra factum proprium”, ao arrepio do disposto no art. 6º-A do CPA.

  6. Aquilo que foi manifestamente querido pelo recorrido na audiência prévia foi o afastar a inquirição das testemunhas arroladas pela recorrente, sob a falsa invocação de razões que nada esclareceram e mesmo completamente incongruentes, para além de vagas, genéricas e imprecisas.

  7. Em segundo lugar, verifica-se violação da audiência prévia em função da completa omissão de decisão no que respeita ao requerimento formulado pela recorrente na parte final da Resposta apresentada, da apensação de processos para prova de matéria concretamente alegada nessa peça, nomeadamente, a matéria dos itens 16. a 20. e 23. a 25. da mesma.

  8. Não vale o argumento da douta sentença recorrida segundo o qual haveria que presumir que essa parte da resposta foi tacitamente indeferida, pois que o acto praticado foi um acto expresso, sendo que num acto desta natureza não podem deixar de ser apreciadas expressamente todas as questões colocadas, todas as diligências requeridas e todas as provas solicitadas.

  9. Não é admissível que relativamente a um acto expresso caiba a invocação de partes do mesmo tacitamente indeferidas e que o destinatário como tal tivesse de presumir apenas porque o seu autor se tivesse eximido de apreciar, porventura porque seriam difíceis, incómodas ou inconvenientes.

  10. No que concerne à apreciação do thema decidendum após a resposta apresentada pela ora recorrente, o acto impugnado mostra-se manifestamente deficiente, ao não ter seleccionado, sequer, os factos assentes no procedimento, nomeadamente, aqueles que foram expressamente alegados na Resposta apresentada, definindo os que considerava provados e os que considerava não provados, o que desde logo impossibilita o destinatário do acto de ter conhecimento concreto daqueles que relevaram e não relevaram para o sentido e motivação da decisão adoptada, sendo que essa é uma menção obrigatória do acto administrativo e é absolutamente decisiva para a fundamentação do mesmo.

  11. O acto impugnado não apreciou a matéria concretamente alegada pela recorrente, nomeadamente quanto à violação do princípio da boa fé, expressamente alegado e invocado pela recorrente na Resposta que apresentou na audiência prévia - itens 8º a 22º e 28º a 37º da mesma – e que constituía a parte mais substancial de tal peça, sendo que estava obrigado a fazê-lo.

  12. O acto impugnado padece igualmente de vício de violação de lei, antes de mais por erro nos pressupostos de facto e de direito.

  13. Verifica-se contradição entre o regime jurídico aplicável à caducidade da licença de loteamento invocado no projecto de decisão e aquele que foi invocado no acto impugnado.

  14. Quer o preceito do art. 38º do DL. 448/91, de 29.11, quer o preceito do art. 71º do DL. 555/99, de 16.12, contêm vários números, com várias normas e distintas hipóteses, nenhuma delas tendo sido concretamente invocada, o que não permite verificar-se se a lei foi correctamente aplicada e que lei foi aplicada.

  15. O Tribunal, para julgar da legalidade ou ilegalidade do acto impugnado, não podia deixar de apreciar que lei era, afinal, aplicável ao procedimento no qual foi praticado aquele.

  16. Tal como competia à autora do acto impugnado, se entendia que não era aplicável a norma que invocou no projecto de decisão, dizer porquê, competia-lhe definir, com toda a clareza, que lei era aplicável ao caso e o porquê do seu entendimento ter sido alterado.

  17. É irrelevante que os dois preceitos dos dois diplomas tratem da mesma matéria, pois que a tratam de forma diferente e não é indiferente a aplicação de uma ou outra lei a determinado procedimento concreto.

  18. Se bem que não tenha sido invocado erro na aplicação da norma do art. 71º do DL. 555/99, a verdade é que não estava o Tribunal impedido de conhecer a questão, ao abrigo do disposto no art. 95º/2 do CPTA, respeitado que fosse o princípio do contraditório, se tal se mostrasse necessário face ao que constava já das alegações das partes relativamente a tal matéria.

  19. No caso justificava-se, de todo, fazê-lo, pois que, face à confusão provocada pelo recorrido nos regimes legais em confronto e na definição daquele que seria aplicável ao caso, era fundamental começar por definir-se qual deveria ser o regime aplicável em matéria de caducidade.

  20. E a verdade é que ao procedimento e ao acto impugnado era aplicável, não o regime do art. 71º do DL. 555/99, de 16.12, mas antes o art. 38º do DL. 448/91, de 29.11, por força do disposto no art. 128º do primeiro daqueles diplomas, verificando-se que a autora do acto lhe aplicou erradamente um regime que legalmente não podia.

  21. Não tendo, sequer, sido dito que número e que alínea do art. 71º do DL. 555/99 foi concretamente aplicado, o facto acabou por resultar numa enorme confusão, pois que até houve manifesta contradição na invocação da causa de caducidade que, pelos vistos, a autora do acto impugnado fez operar.

  22. Não é ao administrado que compete escolher a norma que eventualmente a Administração tenha aplicado na prolação de determinado acto administrativo, cabendo, ao invés, a esta declarar que norma aplicou face aos factos concretos que fez relevar.

  23. No plano dos factos, a autora do acto impugnado declarou a caducidade da licença de loteamento com base na pretensa não execução de quaisquer obras de urbanização, e não na não conclusão das mesmas, quando é certo que, exactamente ao contrário, existiam obras de urbanização realizadas.

  24. O próprio recorrido levou a efeito obras de urbanização no prédio da recorrente que foi sujeito a operação de loteamento, tal como vem reconhecido no acto impugnado, tal como consta expressamente da informação técnica de 26.08.2004, emitida no processo de loteamento e tal como é dado por adquirido na douta sentença, não deixando de ser obras de urbanização do loteamento pelo facto de terem sido construídas pelo recorrido e não pela recorrente.

  25. Quer a autora do acto impugnado considerasse aplicável ao procedimento o DL. 448/91, quer considerasse aplicável o DL. 555/99, sempre a situação que na lógica da sua posição se verificaria, seria a da al. c), e não a da al. a) do nº. 2 do art. 38º, no primeiro caso, ou a da al. d) e não da al. a) do nº. 3 do art. 71º, no segundo caso.

  26. Ao contrário daquilo que se considera na douta sentença, as obras de urbanização não são de cada um dos lotes de uma operação urbanística de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT