Acórdão nº 08B1935 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelCUSTÓDIO MONTES
Data da Resolução10 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam Supremo Tribunal de Justiça Relatório Declarada a falência de AA e mulher BB, foram reclamados créditos, designadamente, pela recorrente Caixa Económica Montepio Geral, garantido por hipoteca sobre o imóvel apreendido, e por CC e DD, gozando o destes do direito de retenção sobre o mesmo imóvel, conforme sentença, transitada em julgado,(1) que estes intentaram contra AA e mulher BB, agora falidos.

Na sentença de graduação de créditos foi reconhecido o crédito dos reclamantes CC e DD.

Este crédito foi graduado à frente do crédito hipotecário da recorrente, por gozar do direito de retenção, nos termos do art. 759.º, 2 do CC.

Inconformada, a Caixa Económica Montepio Geral interpôs recurso de apelação, sem sucesso e , agora, pede revista, terminando as suas alegações com as seguintes Conclusões 17.(2), sempre terá que se considerar o escrito particular que as partes denominaram Contrato Promessa de Compra e Venda nulo, vício que pode ser apreciado nesta fase do processo, atento o disposto nos artigos 410.º e 220.º do CC.

  1. O referido escrito foi celebrado entre familiares próximos, não foram as assinaturas nele constantes, reconhecidas e feitas na presença de notário e não se encontra certificado pelo notário a existência da respectiva licença de utilização ou de construção da "coisa" objecto desse escrito.

  2. A omissão dos requisitos legalmente exigidos para a formação do contrato promessa pode ser invocado por qualquer terceiro interessado na não produção dos efeitos que se pretendiam obter com a celebração do contrato, atento o disposto no artigo 410 do CC, pelo que a Recorrente tem legitimidade para arguir a nulidade.

  3. É inconstitucional, por errada interpretação do artigo 410.º do CC, o Assento do S.T.J., de 28JUNI994, relativamente à omissão das formalidades previstas no nº 3 do artigo 410° do C.C., quando o mesmo considera que " ... no domínio do n° 3 do artigo 4100 do CC (redacção dada pelo DL 236/80, de 18/7), a omissão das formalidades previstas nesse número não pode ser invocada por terceiros ... " 21. A inconstitucionalidade invocada ocorre por violação e atropelo do princípio constitucional ínsito no artigo 20.º da CRP, na medida em que impede a Recorrente de fazer valer em juízo os seus legítimos interesses.

  4. Entende a Recorrente que, nos termos do artigo 286° do CC, o terceiro interessado pode invocar, a todo o tempo, a nulidade do contrato promessa de compra e venda referido nos autos.

  5. Daqui resulta que, declarada a nulidade do referido contrato, não se produzam os efeitos jurídicos a que o negócio se propunha, não podendo, portanto, falar-se aqui propriamente em direito de retenção em virtude da alegada tradição/entrega invocada ser insusceptível de conferir ao promitente comprador uma posse legitima.

  6. No caso de assim se não entender, haveria que considerar a inconstitucionalidade material, em concreto, na situação em apreço, do regime jurídico do direito de retenção.

  7. Os diplomas legislativos - Decretos-Lei n.º 236/80, de 18 de Julho e n.º 379/86, de I I de Novembro - que vieram conceder o direito de retenção do promitente comprador de prédio urbano ou de uma sua fracção autónoma, no caso de ter havido tradição da coisa objecto do contrato promessa, são inconstitucionais, por tal direito ofender os direitos e interesses patrimoniais legitimamente constituídos (no caso presente - o direito de hipoteca), constituída e registada em data anterior à invocação de tal direito de retenção.

  8. É o próprio princípio da segurança do comércio jurídico imobiliário que é posto em causa, ferindo-se, assim, o princípio de consagração constitucional da confiança do comércio jurídico, bem como o princípio constitucional ínsito no artigo 2° da Constituição da República Portuguesa (confiança).

  9. As normas constantes do n.º 2 do artigo 442.º e alínea f) do n.º 1 do artigo 755°, ambos do Código Civil, na redacção que lhes foi dada pelo Dec. Lei 379186, de 11 de Novembro, são materialmente inconstitucionais no caso em apreço, em concreto, por violadoras dos direitos patrimoniais do credor, titular de urna hipoteca constituída e registada anteriormente à invocação do alegado aparecimento do direito de retenção.

  10. Tais normas são inaplicáveis à situação concreta dos autos por enfermarem de inconstitucionalidade.

  11. Inconstitucionalidade material que se considera deve ser declarada, com as consequências legais.

  12. Por outro lado, também há que considerar a inconstitucionalidade orgânica dos Decretos-lei nº 236/80, de 18 de Julho e nº 379/86, de 11 de Novembro.

  13. O artigo 442° do CC sofreu duas alterações introduzidas por cada um daqueles diplomas e a alínea f) do nº 1 do artigo 755.º do mesmo Código foi introduzida pelo Dec. Lei de 1986.

  14. E, através das alterações e inovações introduzidas pelos dois referidos diplomas veio a criar-se um direito na esfera jurídico patrimonial do promitente comprador que lhe permite invocar o direito de retenção, mesmo perante o credor hipotecário, com...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT