Acórdão nº 399/12 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Agosto de 2012

Data28 Agosto 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 399/2012

Processo n.º 566/12

  1. Secção

Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros

Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei do Tribunal Constitucional), do acórdão daquele Tribunal de 9 de maio de 2012.

    2. Pela Decisão Sumária n.º 379/12 decidiu-se não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto, com a seguinte fundamentação:

      “O presente recurso vem interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, nos termos da qual, cabe recurso para o Tribunal Constitucional de decisão que aplique norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo (i). Tratando-se de um recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade indispensável é ainda que a norma cuja inconstitucionalidade se requer tenha constituído o fundamento normativo da decisão recorrida (ii).

      (i) 2.1. No sistema português de fiscalização de constitucionalidade o controlo exercido pelo Tribunal Constitucional tem natureza estritamente normativa, não contemplando a apreciação da conformidade constitucional da decisão judicialmente proferida. O recurso de constitucionalidade delineado pela Constituição da República Portuguesa não prevê o «recurso de amparo» ou «queixa constitucional».

      Em conformidade, os recursos de constitucionalidade interpostos de decisões de outros tribunais apenas podem ter por objeto «interpretações» ou «critérios normativos» identificados com caráter de generalidade, e nessa medida suscetíveis de aplicação a outras situações, independentemente, pois, das particularidades do caso concreto. A respetiva admissibilidade depende, assim, da identificação da interpretação ou critério normativos cuja desconformidade constitucional se suscita.

      2.2. No caso sob apreciação o recorrente formula do seguinte modo a pretensão que apresentou ao recurso:

      O arguido pretende que o Tribunal Constitucional declare a norma do artigo 25.º, n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22.01 inconstitucional quando interpretada no sentido de que não fere o direito pleno de defesa e da presunção da inocência inscritos no artigo 32.º n.ºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa o preenchimento do crime de tráfico de menor gravidade sem conhecer pericialmente o estado psíquico e neurológico do arguido e o modo e grau do seu contudo de heroína, bastando-se com os elementos circunstanciais que o impedem de saber se a finalidade exclusiva do arguido era ou não a de conseguir o dinheiro necessário ao seu consumo diário

      .

      Como fundamento da inconstitucionalidade, o recorrente indica a violação do «direito pleno de defesa e da presunção da inocência inscritos no artigo 32.º n.ºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa».

      Como objeto do pedido, identifica a interpretação do artigo 25.º n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22.01 no sentido de permitir «o preenchimento do crime de tráfico de menor gravidade sem conhecer pericialmente o estado psíquico e neurológico do arguido e o modo e grau do seu contudo [leia-se consumo] de heroína, bastando-se com os elementos circunstanciais que o impedem de saber se a finalidade exclusiva do arguido era ou não a de conseguir o dinheiro necessário ao seu consumo diário».

      A pretensão assim formulada não apresenta no seu objeto as características de «normatividade» indispensáveis à realização de um controlo de constitucionalidade

      Se numa primeira aproximação ainda é possível surpreender um ensaio de abstração na interpretação da norma identificada, o desenvolvimento da formulação adotada não resiste, porém, à particularização do caso concreto. Ao recortar a interpretação do julgador como «bastando-se com os elementos circunstanciais que o impedem de saber se a finalidade exclusiva do arguido era ou não a de conseguir o dinheiro necessário ao seu consumo diário», o recorrente faz inelutável apelo a um momento da decisão que concretizou a mera aplicação da norma às circunstâncias do caso concreto, desta forma eliminando o vislumbre de critério genérico inicialmente ensaiado.

      2.3. Para além da exigência de objeto normativo, o Tribunal Constitucional tem entendido serem ainda requisitos de admissibilidade do recurso interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, a suscitação prévia da questão da constitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal recorrido (artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da CRP; artigo 72.º, n.º 2, da LTC) e o esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC).

      Além da identificação no recurso de constitucionalidade da interpretação normativa cuja constitucionalidade questiona, é necessário que já anteriormente, no decurso do processo, a parte tenha identificado expressamente a referida interpretação, em termos de o Tribunal estar obrigado a dela conhecer. Impõe-se o levantamento da questão de inconstitucionalidade junto do tribunal a quo de forma expressa, direta e clara de modo a criar para este tribunal um dever de pronúncia sobre a matéria. Como tem sido entendimento uniforme do Tribunal Constitucional, a identificação da inconstitucionalidade deve ser feita em termos de o Tribunal «a poder enunciar na decisão, de modo a que os respetivos destinatários e os operadores do direito em geral fiquem a saber que essa norma não pode ser aplicada em tal sentido» (cfr., entre muitos, o Acórdão n.º 367/94).

      No recurso que apresentou ao Tribunal da Relação o recorrente condensou a sustentação da «inconstitucionalidade do acórdão por violação das garantias de defesa», na seguinte alegação: «no caso presente, o tribunal de modo não explicitado, aplicou efetivamente uma interpretação inconstitucional do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01 porque, sem conhecer pericialmente o estado psíquico e neurológico do arguido e o modo e grau do seu consumo de heroína, decidiu que o mesmo cometeu o crime de tráfico de menor gravidade não aludindo à possibilidade de ter o mesmo cometido ao invés, o crime de tráfico consumo tipificado no artigo 26.º do mesmo diploma, ferindo desse modo as garantias da defesa e da presunção da inocência».

      Uma tal enunciação não autonomiza nenhum critério normativo suscetível de ser apreciado e...

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