Acórdão nº 01212/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Junho de 2008

Magistrado ResponsávelPAIS BORGES
Data da Resolução05 de Junho de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: (Relatório) I. A... e outros 76 docentes com vínculo à Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação (DREER), todos identificados a fls. 1 e segs., intentaram no TAF do Funchal, nos termos dos arts. 112º, nºs 1/al. a) e 2, 120º, nº 1/al. a), 58º, nº 2/al. b), 10º, nº 3, 9º e 12º, nº 1, todos do CPTA, providência cautelar de suspensão de eficácia do despacho nº 86/2005, de 01.08.2005, da autoria do SECRETÁRIO REGIONAL DA EDUCAÇÃO da Região Autónoma da Madeira, publicado no JORAM Nº 162, de 24.08.2005, que ordenou aos dirigentes e docentes do ensino especial, em regime de acumulação na DREER, segundo o disposto nos arts. 1º, 2º e 6º do DL nº 324/80, de 25 de Agosto, a reposição dos subsídios de especialização e de itinerância previstos nos nºs 1 e 2 do art. 1º do DL nº 232/87, de 11 de Junho, relativos aos anos de 2000 (período de Abril /Maio a Dezembro), 2001 e 2002, o que se traduziu para os requerentes na ordem de reposição das quantias reportadas na listagem constante do art. 4º da petição.

A entidade requerida deduziu oposição ao pedido, nos termos do articulado de fls. 348 e segs.

Por estar apenas em causa a legalidade do aludido despacho, e os requerentes informarem ir intentar a correspondente acção administrativa especial, o Sr. Juiz do TAF, entendendo estarem verificados, in casu, todos os pressupostos previstos no art. 121º do CPTA, decidiu antecipar a decisão sobre a causa principal, proferindo a sentença de fls. 371 e segs., pela qual anulou aquele despacho, que considerou ilegal por violação do art. 141º do CPA.

Esta sentença veio a ser confirmada, em sede de recurso jurisdicional, por acórdão do TCA-Sul de 11.05.2006 (fls. 476 e segs.).

Novamente inconformada com tal decisão, dela interpôs a entidade demandada recurso jurisdicional dirigido a este Supremo Tribunal Administrativo (mandado subir ao abrigo do art. 150º do CPTA), tendo este STA, por acórdão de 21.09.2006 (fls. 537 e segs.), em sede de apreciação preliminar sumária, decidido não admitir o recurso excepcional de revista, por falta dos requisitos legalmente estabelecidos.

Notificada desta decisão, e após a baixa dos autos ao tribunal recorrido, veio a entidade demandada, pelo requerimento de fls. 550 e segs., contendo a respectiva alegação, interpor recurso para uniformização de jurisprudência, nos termos do art. 152º do CPTA, pedindo a revogação daquele acórdão do TCA-Sul.

Após notificação para o efeito, formulou as seguintes conclusões: 1. Uma primeira questão fundamental de direito em causa nos autos respeita à qualificação jurídica dos actos de processamento de vencimento e abonos aos funcionários públicos.

  1. O Acórdão sob recurso qualifica cada um dos sucessivos actos de processamento de vencimentos e de outros abonos, de per si, como verdadeiros actos administrativos.

  2. Ao invés, o Acórdão de 09-10-1997, considera tais actos como meramente materiais e mecânicos, de mera execução, por parte dos serviços e, referindo-se à "reposição de quantias indevidamente recebidas ", conclui: «...está em causa um mero acto de processamento de vencimentos, não havendo acto administrativo a definir a situação funcional da recorrente, fixou-se na ordem jurídica.

    » 4. Há, pois, como se vê, uma contradição, ou oposição entre o decidido no Acórdão recorrido e a decisão adoptada no Acórdão do S.T.A., de 09-10-1997, a que se fez referência.

  3. Com o devido respeito, parece-nos bem mais acertada a decisão do aresto de 09-10-1997, do que a proferida pelo Acórdão recorrido.

  4. Efectivamente, o art° 120º do CPA é claro quanto ao que sejam actos administrativos, referindo: «Para os efeitos da presente lei, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta».

  5. Ora, o processamento dos montantes e abonos e as suas reposições são meros actos materiais e, como tais, não constituem actos jurídicos administrativos (V. Jéze, Carla Amado Gomes e outros).

  6. Não houve assim, ao contrário do decidido pelo Acórdão recorrido, revogação ilegal de actos administrativos constitutivos de direitos, mas correcções e reajustamentos materiais, âmbito em que se situa o art° 40º do Dec-Lei n° 155/92.

  7. A 2ª questão fundamental de direito tem a ver com a inaplicabilidade da tese do caso decidido ou resolvido (art° 141º do CPA) como facto impeditivo da revogação de actos de processamento de abonos e vencimentos.

  8. No Acórdão recorrido decidiu-se que os processamentos dos vencimentos os vão firmando na ordem jurídica, como caso resolvido ou decidido, uma vez que, sendo constitutivos de direitos para os seus destinatários, só podem ser revogados no prazo de um ano (art°s 141º do CPA e 58º n° 2, do CPTA).

  9. Entendimento diverso tem o Acórdão do S.T.A., de 12/05/1996 o qual, não obstante considerar que o processamento de vencimentos e abonos possa ser constitutivo de direitos, aspecto de que se discorda nos termos referidos, no entanto, entende haver, neste caso, um desvio ao prazo de revogação, não se lhe aplicando o art° 141°, n° 1, do CPA, mas o prazo de cinco anos do art° 40° do Dec-Lei n° 155/92, de 28/7, no respeitante a reposições ao Estado, já que, só as decisões judiciais importam caso julgado.

  10. É neste sentido que, em nosso entender, deve ser proferido acórdão de uniformização da jurisprudência, no âmbito do presente recurso, por ser o que melhor salvaguarda o interesse público que a lei visou proteger.

  11. Tal questão veio, aliás, a ser resolvida por norma interpretativa (Lei 55-8/2004, de 30 de Dezembro - art° 77°) e, portanto, retroactiva, que introduziu um novo número 3 no art° 40° do Dec-Lei n° 155/92, de 28/7, do seguinte teor: «3 - O disposto no N° 1 não é prejudicado pelo estatuído pelo artigo 141 ° do diploma aprovado pelo Decreto-Lei N° 442/1991, de 15 de Novembro.

    » 14. Não poderá, pois, deixar de ser este o sentido e alcance das disposições citadas, a consagrar no acórdão a proferir, uniformizador da Jurisprudência quanto às duas questões fundamentais de direito em oposição, entre o Acórdão recorrido e os Acórdãos citados.

  12. Assim, deverá ser proferido Acórdão fixando-se a seguinte Jurisprudência: a) Tanto os actos de processamento como os de reposição de vencimentos ou abonos a funcionários são meros actos de execução material, por parte dos competentes serviços, e não actos administrativos; b) Em qualquer caso, entendidos ou não como actos administrativos, ainda que constitutivos de direitos, e tendo o art° 77º da Lei n° 55-B/2004, de 31 de Dezembro, aditado um n° 3 ao art° 40º do Dec-Lei n° 155/93, temos que o prazo previsto nesta disposição prevalece sobre o do artº 141º, nº 1, do CPA; c) Atenta a natureza interpretativa do nº 3 do artº 141º do Dec-Lei nº 442/91 de 15 de Novembro, aditado pelo art. 77º da Lei nº 55-B/2004, de 31 de Dezembro, tem a mesmo aplicação retroactiva.

    1. Contra-alegaram os recorridos, nos termos de fls. 608 e segs., sustentando, em suma, que as duas questões de direito sobre que é invocada oposição devem ser decididas no sentido propugnado no acórdão recorrido, ou seja, no sentido de que o acto de processamento de abonos ou de vencimentos é um verdadeiro acto administrativo e não mero acto material, e que a sua não revogação pelo órgão competente, ao abrigo do art. 141º do CPA, os transforma em caso decidido ou caso resolvido, inviabilizando a sua revogação posterior.

    Houve vista simultânea dos autos, nos termos do art. 92º do CPTA.

    (Fundamentação)

    1. Factos relevantes considerados pelo acórdão recorrido (deu por reproduzida a matéria de facto fixada na 1ª instância): 1. O Secretário Regional de Educação proferiu o seguinte acto administrativo: "SECRETARIA REGIONAL DA EDUCAÇÃO Despacho nº 86/2005 Considerando que no Relatório nº 31/04-FS da Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas, com referência à Auditoria orientada à gerência de 1999 da Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação, aquele Tribunal constatou, na conferência efectuada, e com base no Decreto-Lei nº 232/87, de 11 de Junho, que foram abonados ilegalmente subsídios de especialização e de itinerância aos docentes do ensino especial, em regime de acumulação, e, bem assim, aos que exerciam funções dirigentes, aspectos que vieram a ser (re) confirmados nos Relatos das auditorias, orientadas às gerências de 2000, 2001 e 2002 daquela Direcção Regional.

    Considerando ainda, que para suporte daquele entendimento o Tribunal de Contas entendeu que os contratos de prestação de serviços invocados, são celebrados com base no nº 1 do art. 9º da Portaria nº 169/91, segundo o qual a remuneração do pessoal docente especializado, em regime de acumulação, apenas tem por base o índice do escalão remuneratório do docente e que assim sendo, para além dos suplementos em causa não integrarem o índice do escalão remuneratório do docente, se estaria a pagar duas vezes pelo mesmo pressuposto, havendo uma duplicação de pagamentos o que configura um pagamento indevido.

    Acresce ainda ter-se entendido também que, relativamente ao pessoal docente especializado com funções dirigentes que optou pela remuneração de origem e estando em causa o Decreto-Lei nº 232/87, sendo esta uma lei especial que define expressamente que o direito aos suplementos de especialização e de itinerância depende do exercício efectivo de funções na educação e ensino especial de crianças e jovens, os valores processados a título de gratificação àqueles dirigentes, não estando enquadrados nestes pressupostos, deverão ser considerados pagamentos indevidos.

    Os docentes interessados foram devidamente notificados, em cumprimento do princípio da audiência dos interessados, para dizerem o que se lhes oferecia sobre o assunto, nada tendo alegado de novo que possa alterar o sentido do nosso despacho de 28 de Março de 2005, com excepção das questões da relevação da reposição das...

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