Acórdão nº 111/08-1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução29 de Abril de 2008
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, precedendo conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1.

Nos autos de inquérito n.º /, pendentes nos Serviços do Ministério Público da Comarca de ... em que se investiga o desaparecimento de M.M.

e a eventual ocorrência da prática de crimes de rapto, homicídio, exposição ou abandono de menor e ocultação de cadáver, o Exmo. Senhor Procurador da República titular do processo em investigação, sob invocação do disposto nos art. 15.º n.º2 da Lei n.º 88/89, de 11 de Setembro, 187.º n.º1, alin. a) e 4, alin. a) e b), 252.º-A e 269.º n.º1, alin. e) do CPP, promoveu, entre outras diligências, se solicitasse às 3 operadoras telefónicas móveis nacionais (TMN, VODAFONE e OPTIMUS) o envio em suporte digital (CD ou DVD), as listagens completas do tráfego telefónico às chamadas recebidas e efectuadas no período de tempo compreendido entre o dia 28 de Abril de 2007 até 9 de Setembro de 2007, incluindo a localização celular e trace-back, bem como as chamadas em roaming e mensagens SMS e MMS e respectivo conteúdo, dos seguintes números de telefone: (Seguem-se 10 números de telefone) :::::: - n.º de telefone ainda não identificado que durante o dia 02 Maio 2007 enviou 14 mensagens escritas SMS para G.M. e outras 4 no dia a seguir ao desaparecimento de M.M.

- Se solicitasse junto da operadora telefónica móvel TMN, o envio em suporte digital (CD ou DVD), da listagem completa do tráfego telefónico referente às chamadas recebidas e efectuadas no período de tempo compreendido entre as 20H00 M do dia 03 de MAIO de 2007 e as 12H00 M do dia 04 de MAIO de 2007, incluindo a localização celular e trace-back, bem como as chamadas em roaming e mensagens SMS e MMS e respectivo conteúdo, dos seguintes números de telemóvel: ::::::::::::: 2.

Porém, o Senhor Juiz de Instrução Criminal, por seu despacho de 24.09.2007, não autorizou a remessa em suporte digital (CD ou DVD) do conteúdo de qualquer mensagem enviada ou recebida em SMS ou MMS no que concerne a todos os números de telefone acima referidos, por, em seu entender, tal significaria tomar conhecimento do conteúdo da conversação ou comunicação telefónica já efectuada, sem que tivesse havido despacho judicial prévio de autorização, e por inexistir suporte legal para o requerido (cf. fls. 12 destes autos).

  1. Inconformado com o assim decidido, o Ministério Público interpôs o presente recurso nos termos constantes de fls.1 a 7, extraindo da motivação que apresentou as seguintes conclusões: "1 - O nosso dissentimento reporta-se ao douto despacho do M.° Juiz de Instrução Criminal, de fls. 2687 a 2689, na parte em que não autorizou "a remessa em suporte digital (cd ou dvd) do conteúdo de qualquer mensagem enviada e ou recebida por SMS ou MMS.

    2 - Não há razão para distinguir, como distinguiu o M.° Juiz, entre os dois tipos de comunicações - conteúdo de mensagens SMS e MMS e listagens do tráfego telefónico referente às chamadas recebidas e efectuadas. Onde a lei não distingue, a ninguém é dado distinguir.

    3 - O direito à reserva da intimidade da vida privada não corre maior risco de ser lesado pelo acesso ao conteúdo de mensagens SMS ou de MMS do que pelo conhecimento das precisas circunstâncias de tempo, lugar, modo e frequência das chamadas recebidas e efectuadas.

    4 - Se a lei processual faz referência à utilização de comunicações já efectuadas, é para expressamente as admitir, como decorre linear e inequivocamente do estatuído no n.° l do art. 189° do CPPenal.

    5 - Para preservar a reserva da intimidade da vida privada dos interlocutores das mensagens SMS ou MMS no caso em apreço, obviando, através do seu controlo judicial, a qualquer intromissão abusiva nessa intimidade, bastará ao M.° Juiz lançar mão do estabelecido no n.° 3 do art. 179° do CPPenal, sujeitando ao próprio e prévio conhecimento do respectivo conteúdo a possibilidade de utilização como meio de prova das mensagens SMS e MMS.

    6 - Ao não autorizar o acesso ao conteúdo das mensagens SMS e MMS, o douto despacho recorrido violou o disposto nos arts. 179°, 187° e 189° do CPPenal.

    Nestes termos, revogando, no assinalado âmbito, o douto despacho recorrido e ordenando a sua substituição por outro que solicite às três operadoras telefónicas móveis nacionais a remessa em suporte digital (cd ou dvd) do conteúdo de qualquer mensagem enviada e ou recebida por SMS ou MMS e do respectivo conteúdo no que concerne a todos os números de telefone que constam a fls. 2681 e 2682, com observância do preceituado no n.° 3 do art. 179°.".

  2. O recurso veio a ser admitido por despacho de 21.12.2007, na sequência de reclamação apresentada nesta Relação (cf. fls.15).

  3. O Senhor Juiz manteve o despacho recorrido, dizendo, no essencial, o seguinte: " A tomada de conhecimento do teor das comunicações realizadas por SMS's ou MMS, por se tratar de comunicação realizada por meio de telefone, carece necessariamente de autorização judicial prévia e há-de resultar de intercepção realizada e autorizada por esse despacho, relativa a comunicação em curso.

    Do meu ponto de vista e salvo o devido respeito não se pode efectuar qualquer equiparação entre dados de tráfego (vg, os relativos às listagens dos números marcados e recebidos) e dados de conteúdo (os que se prendem com o teor da comunicação efectuada, as palavras trocadas) para efeito de os tratar da mesma forma e isto pela própria natureza de uns e outros, Não é o mesmo saber que se estabeleceu, no dia X, a determinada hora, uma comunicação entre os números Z e K, em determinado local (dados de tráfego) e saber o que aí se falou, combinou ou discutiu.

    Inexistindo qualquer telemóvel legitimamente apreendido também não me parece legal a utilização das normas relativas à apreensão de correspondência sob pena de, por essa forma, se estar a relegar as exigências colocadas à intercepção de comunicação em curso, o que sucederia se fosse ordenado à operadora que enviasse, se tecnicamente possível, o conteúdo dessas comunicações realizadas por meio do telefone.

    Finalmente, o argumento «guardadas em suporte digital» refere-se a comunicações realizadas por qualquer meio técnico diferente do telefone, vg. correio electrónico, em tempo real por rede informática, etc., pelo que não tem aqui, salvo o devido respeito, qualquer aplicação." 6.

    Nesta instância, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto, no seu douto parecer de fls.22 a 97, é do entendimento de que o recurso deve ser julgado manifestamente improcedente.

  4. Foi cumprido o disposto no art. 417.º n.º2 do CPP, não tendo sido apresentada qualquer resposta. Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre decidir.

  5. Questão a examinar.

    Face às conclusões da motivação apresentada pelo...

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