Acórdão nº 264/08 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Vitor Gomes
Data da Resolução06 de Maio de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 264/2008

Processo n.º 1147/07

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

1. O relator proferiu a seguinte decisão, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional (LTC):

«1. A., Lda., melhor identificada nos autos, interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, que julgou improcedente a acção que intentou para reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, em consequência do deferimento da reclamação graciosa que havia interposto do acto de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, relativos ao ano de 1992, no valor global de 257.727.353$00, com os fundamentos que resumiu nas seguintes conclusões da sua alegação de recurso:

“1. A douta sentença do Tribunal a quo deve ser anulada por sofrer de erro na interpretação da lei, quando decidiu que o pedido de constituição do direito a juros indemnizatórios deveria ter constado na petição de reclamação graciosa e da respectiva decisão;

  1. O direito a juros indemnizatórios deriva directamente da lei quando verificados os respectivos pressupostos que constam do nº 1 do artº 43 da LGT, ou seja, que

  2. Esteja pago o imposto que indevidamente foi pago e que seja anulada a respectiva a liquidação por erro imputável aos serviços;

  3. A lei não prevê qualquer necessidade de pedido, sendo, portanto, ilegais as decisões que imponham para o respectivo reconhecimento a necessidade de solicitação de pedido expresso e a necessidade de que esse reconhecimento conste da decisão anulatória;

  4. O reconhecimento só pode referir-se ao erro dos serviços.

  5. A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios a contar da data do pagamento até à data da emissão da nota de crédito.

  6. Sendo o direito a juros um efeito jurídico que resulta directamente da lei em resultado da verificação dos respectivos pressupostos, não seria previsível para a recorrente saber que os mesmos não lhe iam ser pagos aquando da devolução do imposto anteriormente pago, na sequência da decisão da reclamação graciosa.

  7. Em face desse facto, é legítimo o recurso à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo quanto ao pagamento daqueles juros que resultaram da decisão administrativa;

  8. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo decidiu contra a lei ao não compreender no artº 145º do CPPT este tipo de pedido porque, indevidamente, o incluiu como sendo enquadrável no nº 4 do artº 61º da LGT;

  9. A própria AF, em instruções administrativas emitidas para os serviços determinou no Oficio Circulado nº 60052, da Direcção de Serviços de justiça Tributária, de 3/10/2006, que deveriam ser pagos juros indemnizatórios sempre que estivessem verificados os pressupostos de facto e de direito constantes do artº 43º da LGT, mesmo que não exista pedido nesse sentido, bastando que esteja reconhecido que o erro é imputável aos Serviços.

  10. Ao não entender que o que está em causa é o reconhecimento do direito ao pagamento e não o direito ao surgimento de juros indemnizatórios e ao considerar que ao caso é aplicável o referido nº 4 do artº 61º da LGT, a douta sentença padece de erro de julgamento por violação de lei.

  11. Finalmente entende a recorrente que o Tribunal, ao interpretar o artº 145º do CPPT, por força da leitura que, segundo a decisão, resulta do nº 4 do artº 61º do CPPT, está a violar o nº 4 do artº 268º da CRP, sendo aquelas normas inconstitucionais quando interpretadas no sentido que foi pela sentença recorrida de que à recorrente está vedado o recurso à acção para o reconhecimento de um direito prevista no nº 1 do artº 145º do CPPT;

  12. Com efeito, tratando-se de uma decisão administrativa, o sujeito passivo não dispõe de um meio judicial similar ao que a lei prevê para a execução das decisões judiciais;

  13. Negando o acesso a este meio processual, está a impedir-se o exercício da tutela judicial dos direitos constitucionais previsto no normativo citado, que garante aos administrados a tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.”

    2. Por acórdão de 17 de Outubro de 2007 o Supremo Tribunal Administrativo negou provimento ao recurso, fundamentando-se no seguinte:

    “3 - A recorrente intentou contra a Administração Fiscal a presente acção para reconhecimento do seu direito a receber juros indemnizatórios sobre a quantia que, em 17/6/97, pagou, indevidamente, de IRC, liquidada com a fundamentação que consta do nº 3 do probatório.

    Alegou em abono da sua pretensão que conhecido, pela Administração Fiscal, o erro cometido, determinando a anulação do acto de liquidação em sede de reclamação graciosa, estaria implícito o reconhecimento do direito do contribuinte a receber juros indemnizatórios, não podendo a entidade fiscal pretender que a requerente tivesse reclamado ou impugnado do despacho de omissão do reconhecimento do erro imputável aos serviços.

    O Tribunal recorrido, que apreciou e decidiu a causa, fê-lo de modo desfavorável à ora recorrente, por entender que “não se pode determinar o pagamento de juros indemnizatórios quando, no processo gracioso ou judicial em que é exigida a anulação do erro, não tenha sido feito pedido de pagamento a eles atinente e, portanto, não tenha sido proferida decisão a reconhecer o direito do contribuinte aos mesmos” e ainda por que a reclamação ou impugnação autónoma dos juros indemnizatórios só é possível nos casos em que o pagamento do tributo não tenha sido efectuado depois do termo do prazo geral de reclamação ou impugnação – o que não é o caso dos autos.

    Do que fica exposto ressalta que a pretensão que a recorrente quer ver judicialmente reconhecida com a presente acção é a de que, tendo sido anulada a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, respeitante ao exercício de

    1992, determinada por decisão proferida em processo de reclamação graciosa, tem o direito de receber da Administração Fiscal juros indemnizatórios.

    4 - Antes do mais e por dever de oficio, importa abordar a questão da propriedade do meio escolhido pela recorrente para fazer valer a sua pretensão em juízo.

    Como é hoje jurisprudência quase pacífica deste STA, a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo constitui um meio complementar dos restantes meios contenciosos previstos no contencioso tributário, destinados a servir aqueles casos em que a lei não faculta aos administrados os instrumentos processuais adequados à tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos e interesses legítimos. Daí que se recuse a este meio processual a função de uma segunda garantia de recurso aos tribunais, perdida a primeira pela preclusão do respectivo prazo.

    O que, aliás, resulta do artº 145º, nº 3 do CPPT, aqui aplicável, que tem um teor idêntico ao nº 2 do artº 69º da LPTA e ao artº 165º, nº 2 do CPT, ao dispor que as acções para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária podem ser propostas sempre que esse meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efectiva do direito ou interesse legalmente protegido.

    É o que se tem vindo a designar por teoria do alcance médio (vide Jorge Sousa, in CPPT anotado, 4ª ed., pág. 621 e segs.).

    Também no sentido da constitucionalidade deste entendimento, se pronunciou já o Tribunal Constitucional no Ac. de 16/ 7/98, in rec. nº 435/98, DR, II Série, de 10/12/98, citado pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto, no seu douto parecer.

    Aí se escreve que “o legislador constitucional pretendeu assim criar, no quadro da justiça administrativa, um modelo garantístico completo, de forma a facultar ao administrado uma tutela jurisdicional adequada sempre que esteja em causa um interesse ou direito legalmente protegido....

    Porém, não pode afirmar-se que o legislador constitucional tenha pretendido uma duplicação de mecanismos contenciosos utilizáveis. Com efeito, o que decorre do n.º 5 do artigo 268º da Constituição é que qualquer procedimento da Administração que produza uma ofensa de situações juridicamente reconhecidas tem de poder ser sindicado jurisdicionalmente. E nesta total abrangência da tutela jurisdicional que se traduz a plena efectivação das garantias jurisdicionais dos administrados”.

    Neste sentido, pode ver-se, entre outros, os Acórdãos da Secção do Contencioso Administrativo de 3/3/94, in rec. nº 33.290; de 12/3/96, in rec. nº 38.367 e de 1/10/02, in rec. nº 47.063 e do Pleno de 5/6/00, in rec. nº 41.915 e desta Secção de 2/5/01, in rec. nº 23.829; de 14/1/04, in rec. nº 1.693/03; de 6/10/05, in rec. nº 607/05 e de 18/1/06, in rec. nº 1.152/05.

    Voltando ao caso dos autos e como vimos, o que está em causa é a pretensão da recorrente em receber da Administração Fiscal juros indemnizatórios em consequência de ter sido anulada, por decisão proferida em processo de reclamação graciosa, por si, oportunamente, intentada, a liquidação do tributo em causa e respectivos juros compensatórios.

    Ora, não se pode dizer que, no caso em apreço, a presente acção seja o meio mais adequado para a recorrente assegurar a tutela efectiva do seu direito, já que dispunha de outros meios processuais para obter a condenação da Administração Fiscal e, consequentemente, obter o pagamento dos juros agora peticionados.

    Desde logo, podia ter deduzido recurso hierárquico, mas não o fez.

    Podia ainda ter recorrido a juízo, intentando impugnação judicial, quer da decisão da reclamação graciosa (artº 102º, nº 2 do CPPT), quer do subsequente recurso hierárquico (artº 76º do mesmo diploma legal), sendo a decisão deste “passível de recurso contencioso (acção administrativa especial), salvo se de tal decisão já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objecto”, bem como pedir...

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