Acórdão nº 472/08-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelAUGUSTO CARVALHO
Data da Resolução10 de Abril de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Benjamim P... e mulher L... Peixoto intentaram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra M..., S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhes a quantia de 91.693,91 17.500,00, acrescida do que vier a liquidar-se em execução de sentença, no que concerne ao valor indemnizatório ainda não apurado.

A fundamentar o seu pedido alegaram, em síntese, terem negociado com a ré, no mês de Outubro de 2000, o arrendamento das salas n.º5, 6 e 8 do segundo andar e a totalidade do 1º andar de um edifício de que são proprietários e de que a ré é arrendatária da cave, rés-do-chão e de uma sala no segundo andar; o arrendamento do 1º andar dependeria da sua desocupação que era assegurada a todo o tempo, destinando-se os referidos espaços à ampliação do negócio da ré; em Novembro de 2000 o representante da ré remeteu ao autor o rascunho de um contrato promessa; em Agosto de 2005 o autor remeteu à ré cópia da minuta do contrato promessa de arrendamento, tendo a ré, em Setembro desse ano, comunicado por carta a sua disponibilidade em outorgar o contrato definitivo de arrendamento, ficando a aguardar a indicação de data e local para a celebração do contrato de arrendamento; na sequência de carta enviada pelo autor à ré em que aquele referia que o contrato a celebrar seria de continuação duradoura, a ré informou não aceitar as condições impostas e não ter ulterior interesse no contrato. A actuação injustificada da ré causou prejuízos aos autores correspondentes a valor das rendas que deixou de receber durante todo o período em que as salas objecto de futuro arrendamento à ré foram mantidas devolutas para esse efeito e, em consequência, deixaram de ser arrendadas a terceiro.

A ré contestou, excepcionando a ilegalidade da actuação dos autores, que deram causa ao desinteresse contratual da ré, ao imporem uma continuação e vinculação contratual duradoura vedada pela lei do arrendamento. Mais impugnam a matéria alegada na petição inicial, invocando que os autores apenas mantiveram as salas do 2º andar devolutas por vontade própria, já que o interesse da ré nessas salas estava directamente dependente da desocupação do 1º andar, que só ocorreu em Setembro de 2005.

Conclui pela improcedência da acção.

Na réplica, os autores responderam à excepção arguida, pugnando pela sua improcedência e mantendo os termos da petição inicial.

Procedeu-se a julgamento e, a final, foi proferida sentença, na qual se julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenada a ré M..., S.A., a pagar aos autores Benjamim P... e mulher L... Peixoto, a quantia de 40.000,00 euros, acrescida de juros, à taxa legal a cada momento devida, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento.

Inconformados com a referida decisão, autores e ré recorreram para esta Relação, formulando as seguintes conclusões: Recurso dos autores: 1.De acordo com o Professor Mário Júlio de Almeida Costa, no artigo 227º, nº 1, do C. Civil, sanciona-se, em termos gerais, a responsabilidade por culpa na formação do contrato (culpa in contrahendo) que, entre nós, encontra disciplina básica satisfatória, no âmbito da responsabilidade extracontratual.

  1. Atende-se, portanto, aos aspectos negativo e positivo decorrentes, ou seja, à reparação indemnizatória dos lesados pelos danos emergentes e lucros cessantes.

  2. Daí, assistir aos autores o direito a, para além da indemnização atribuída na sentença, de 40.000,00 euros e juros, mais o valor de 38.660,00 euros, relativo à diferença entre esses 40.000,00 euros já fixados e a perda do valor dos arrendamentos das três salas referidas nas alíneas g), h) e i), por virtude do contrato frustrado culposamente pela ré com toda a má-fé, pelo período de Dezembro de 2000 a Agosto de 2005, o que perfaz 57 meses, sendo que o valor corrente mensal para estas salas é de 500,00 euros, 500,00 euros e 380,00 euros e, no seu todo daria 78.660,00 euros.

  3. Mais a esta diferença acresce a indemnização relativa aos três meses, de 4 de Outubro de 2005, data da marcada concretização do tratado e a entrada da presente acção, em 12 de Dezembro de 2005, correspondentes aos valores da renda dessas três salas e do primeiro andar, no montante de 8.640,00 euros.

  4. Mas, caso se venha a pensar, tal como fez a Mmª Juiz a quo, que a indemnização deve abarcar a renda completa das três salas do 2º andar e do 1º andar, o seu valor não deverá ser o de um ano, mas sim de dois e, assim, mais 40.000,00 euros a acrescer à fixada na sentença, por o exigir a reparação do prejuízo verificado, nas condições em que o foi.

  5. Essas indemnizações sempre terão de comportar os juros, nos precisos termos a que se reporta a decisão, na parte condenatória.

  6. Assim, ao não atribuir mais a importância indemnizatória de 47.300,00 euros (38.660,00 + 8.640,00) ou, então, mais a quantia de 40.000,00 euros, procedeu a Mmª Juiz a quo com não acatamento do disposto no artigo 227º, nº 1.

    Nestes termos, deve ser concedido provimento ao recurso dos autores e, por via disso, revogada a sentença, na parte em que lhes foi desfavorável, proferindo-se acórdão que atribua aos mesmos autores, para além dos já fixados 40.000,00 euros e juros, mais o montante indemnizatório de 47.300,00 euros ou, então, o de 40.000,00 euros, ambos acrescidos dos juros, nos termos dos que são atribuídos na sentença, por força das razões acima invocadas, por só assim serem reparados, em termos justos e razoáveis, os prejuízos que os autores suportaram com o ilegal comportamento da ré.

    Recurso da ré: 1.Não obstante os factos apurados e u) e v), da sentença, certo é que a ré não concluiu o contrato de arrendamento acordado com os autores, porque estes lhe tolheram a liberdade de contratação, advertindo-a de que, caso denunciasse o dito contrato, exigir-lhe-iam indemnização pelos danos causados.

  7. Sendo que o direito de denúncia do arrendatário não pode ser coarctado.

  8. Tal advertência não pode ser configurada como mera carta de intenções.

  9. Nem a ré, ao não pretender outorgar o contrato de arrendamento sujeita a uma imposição de não denúncia, faculdade que lhe assistia, porquanto, legítima, actuou sustentada em motivo superficial.

  10. O comportamento dos autores, através da missiva que dirigiram à ré, em 28.9.2005, dando-lhe notícia de tal ameaça indemnizatória, caso esta denunciasse o contrato para o seu termo, concorreu para a não conclusão do negócio.

  11. Sustentando-se a responsabilidade, prevista no artigo 227º, nº 1, do C. Civil, na culpa, os factos provados demonstram abundantemente a concorrência culposa dos autores para a frustração do negócio.

  12. Devendo, assim, a indemnização arbitrada ser reduzida para 20.000,00 euros.

  13. A sentença recorrida violou, pois, o preceituado no artigo 570º, nº 1, do C. Civil.

    Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deverá revogar-se a sentença recorrida, reduzindo-se a indemnização fixada para 20.000,00 euros.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    A sentença recorrida considerou assentes os seguintes factos:

    1. Mostra-se registada na C.R.P. de Braga a aquisição a favor do autor marido do imóvel aí descrito sob o número 29.341, por arrematação em hasta pública, imóvel esse situado na Praça Conde Agrolongo, com os números 32 e 35 de polícia (A).

      b) Há mais de 50 anos, por si e antepossuidores, os autores têm utilizado o imóvel referido na anterior alínea para comércio e escritórios, de modo directo ou por arrendamento, recebendo as respectivas rendas, custeando as obras de transformação e conservação e pagando as contribuições e impostos a ele relativos, o que fazem à vista de toda a gente, continuamente, sem oposição de quem quer seja, na convicção de proprietários (B).

      c) Em escritura pública outorgada em 1/03/91, no 1º Cartório Notarial de Braga, os autores declararam dar de arrendamento à ré, que declarou aceitar, a cave e rés do chão com entrada pelo n.º 32 de polícia do imóvel referido nas anteriores alíneas, pelo prazo de um ano, sucessivamente renovável por iguais períodos, com início no dia 1/02/91, para o comércio por junto e a retalho de tecidos, estofos, móveis e decorações, todo o género de confecções interiores e exteriores para homem, senhora e criança, artigos desportivos e campismo, sapatos, carteiras, malas de viagem e cintos, bijutaria e perfumaria e todos os acessórios referentes ao comércio de modas, pela renda anual de três milhões e seiscentos mil escudos, a ser paga em prestações mensais de trezentos mil escudos, no primeiro dia útil do mês anterior a que respeitar, no escritório dos senhorios, nesta cidade, renda que após sucessivos aumentos é dois mil quatrocentos e vinte e quatro euros e sessenta e um cêntimos (C).

      d) Em escritura pública outorgada em 18/12/91, no 1º Cartório Notarial de Braga, os autores declararam dar de arrendamento à ré, que declarou aceitar, a sala das traseiras, lado esquerdo, do segundo andar do imóvel referido nas anteriores alíneas, pelo prazo de um ano, sucessivamente...

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