Acórdão nº 178/08 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Março de 2008

Data12 Março 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 178/2008

Processo nº 96/08

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral

Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I

Relatório

  1. A Magistrada do Ministério Público junto do 2.º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto vem reclamar para este Tribunal Constitucional, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 77.º e 78.º-A, n.ºs 3 e 4, ambos da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei Tribunal Constitucional), do despacho da Juiz daquele 2.º Juízo, de 19 de Novembro de 2007, que não lhe admitiu o recurso, interposto para este Tribunal ao abrigo do disposto no artigo “70.º, n.º 1, alíneas a) e/ou c)” da Lei Tribunal Constitucional, do despacho da mesma Juiz, de 5 de Novembro de 2007, com fundamento em que “(…) da análise dos preceitos em causa, não se vislumbra que a decisão em causa nos autos admita recurso para o Tribunal Constitucional, atendendo a que não se subsume a qualquer das alíneas supra referidas. Requisitos de admissibilidade do recurso, nos termos do art.º 70.º, al. a), é a existência de recusa de aplicação de uma norma com fundamento na sua inconstitucionalidade. Ora, isso não acontece, nem explicita nem implicitamente, no despacho em causa nos autos; no mesmo sentido Acórdãos do Tribunal Constitucional disponíveis na página/site do Tribunal Constitucional, com o n.º convencional ACT00000118, ACT00004871 e ACT00000019.”

    O despacho pretendido recorrer para este Tribunal Constitucional tem o seguinte conteúdo:

    Do auto de notícia elaborado pela autoridade policial resulta que o arguido foi detido em flagrante delito e depois restituído à liberdade, tendo sido notificado para comparecer perante o M.P. junto do Tribunal de turno.

    Resulta também dos autos que não foi deduzida verdadeira acusação escrita contra o arguido.

    O M.P. apresentou apenas o expediente ao juiz de turno para os efeitos do art° 387°, nº 2 ali. a) C.P.P., pretensão que foi deferida, adiando-se simplesmente o início da audiência do julgamento.

    Aberta vista à Digna Magistrada do M.P., pela mesma foi referido que aguardará o início da audiência, para aí requerer a substituição da apresentação da acusação pela leitura do auto de notícia da autoridade que procedeu à detenção.

    É certo que no auto de notícia constam alguns factos.

    Todavia, tais factos, por si só, não constituem qualquer crime.

    É de ter em conta que a consciência e a vontade de praticar tais factos típicos, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei – o dolo – constitui elemento típico dos ilícitos criminais, e designadamente do perfunctoriamente indiciado no auto de notícia.

    O mesmo sucede quanto à negligência, nos termos do disposto nos art°s.13° e 15° do C.P.

    Tal elemento subjectivo deverá constar da acusação e/ou do auto de notícia — cfr os art°s 243º e 283°, n° 3 ali. b) do C.P.P., e ainda sobre o tema, entre outros, o AC do TRG de 7/04/2003, in CJ, tomo II, pg. 291-294.

    Qualquer acusação em que se omita este facto – falta dos factos integradores do dolo ou da negligência – deve ser rejeitada, por se encontrar manifestamente infundada, com base no art° 311°, n° 3, al. d) do C.P.P. – quando os demais elementos típicos do crime se encontrarem nela descritos.

    Do expediente ora em análise não consta qualquer um desses elementos (dolo ou neg1igência).

    De tal expediente também não se retira a indicação das disposições legais aplicáveis, a chamada qualificação jurídica dos factos, o que é relevante e implica até a rejeição da acusação, nos termos do citado art° 311, n° 3 ali. e) do C.P.P.

    Dado o teor do auto de notícia, mesmo com sua leitura em audiência nada mais se acrescenta ao que aí consta.

    É condição da realização de julgamento em processo sumário e desta forma de processo especial a existência de um crime concreto e devidamente identificado, com indicação dos respectivos factos integradores (objectivos e subjectivos) e de todas as disposições legais aplicáveis. Só assim se podem apreciar os apertados requisitos de admissibilidade do processo sumário, bem como a competência do tribunal.

    Está em causa a natureza acusatória do processo penal, além das garantias de defesa do arguido e o princípio da vinculação temática do tribunal.

    Afigura-se-nos, pois, que não se verificam os requisitos que justificam o julgamento em processo sumário, nos termos do disposto no art° 381° do C.P.P., na redacção da Lei n° 48/07, de 29/08.

    Assim sendo, e por razões de economia processual, e ainda nos termos dos art°s. 381°, e 390º, al. a) do C.P.P., na actual redacção, determino a remessa dos presentes autos ao Ministério Público para tramitação sob outra forma processual.

    Na reclamação ora em apreço expende a recorrente as seguintes razões:

    Alega o/a Mmo/a Juiz a quo no douto despacho ora reclamado, por referência ao anteriormente citado art°. 70°, da Lei 28/82, de 15 de Novembro, além do mais que infra se analisará “Ora da análise dos preceitos em causa, não se vislumbra que a decisão em causa nos autos, admita recurso para o tribunal Constitucional, atendendo a que não se subsume a qualquer das alíneas supra referidas.” (sic).

    Salvo o devido respeito, conforme aliás expressamente consta do requerimento de interposição de recurso ora indeferido, a situação sub judice subsume-se à previsão das al.s a)...

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