Acórdão nº 112/08 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 112/2008

Processo n.º 547/07

  1. Secção

Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins

Acordam, na 3ª Secção, do Tribunal Constitucional

I – RELATÓRIO

  1. O presente recurso vem interposto pelo Ministério Público, com natureza obrigatória, ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea a), e n.º 3 da CRP e dos artigos 70º, n.º 1, alínea a), e 72º, n.º 3, ambos da LTC, da sentença proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, em 23 de Janeiro de 2007 (fls. 634 a 654) que julgou improcedente o recurso interposto e determinou a desaplicação da norma extraída do n.º 4 do artigo 23º do Código de Expropriações, uma vez que aquele, constituindo “um preceito de natureza exclusivamente fiscal, é inconstitucional por violar de forma flagrante o princípio da irretroactividade da lei fiscal e da igualdade fiscal” (fls. 649).

    2. Notificado para alegar, o Ministério Público apresentou as suas alegações, cujo teor ora se reproduz:

    “1. Apreciação da questão de constitucionalidade suscitada.

    O presente recurso obrigatório vem interposto pelo Ministério Público da decisão, proferida no Tribunal da Relação do Porto, que recusou aplicar, com fundamento em inconstitucionalidade, a norma constante do artigo 23°, nº 4, do Código de Expropriações de 1999.

    Esta questão não é nova na jurisprudência constitucional, tendo sido — em momento relativamente recente — apreciada pelo Plenário do Tribunal Constitucional que concluiu, no Acórdão nº 422/04, que a referida norma não viola o disposto nos artigos 13° e 62°, n°2, da Constituição da República Portuguesa.

    A decisão recorrida adere, no essencial, à tese que ficou vencida no referido aresto, bem como às posições doutrinárias que aí foram analisadas e ponderadas.

    Deste modo, não se verificando qualquer elemento novo ou superveniente que determine a reponderação do juízo de não inconstitucionalidade formulado, por maioria, pelo Plenário deste Tribunal Constitucional — e que coincide, aliás, com o sentido propugnado na alegação, apresentada pelo Ministério Público no processo que culminou na prolação de tal acórdão — entendemos que — reiterando os fundamentos do Acórdão n° 422/04 — deverá proceder o presente recurso.

  2. Conclusão

    Nestes termos e pelo exposto, conclui-se:

    1. Pelas razões invocadas no Acórdão nº 422/04, proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional, a norma constante do artigo 23°, nº 4, do Código de Expropriações de 1999 não viola o disposto nos artigos 13° e 62°, nº 2 da Constituição da República Portuguesa.

    2. Termos em que deverá proceder o presente recurso.”

    4. Por sua vez, notificado das alegações do Ministério Público, o recorrido A. juntou requerimento aos autos, informando que “prescinde de o fazer, mais requerendo que o prazo concedido se esgote com o presente requerimento.

    Quanto à recorrida Câmara Municipal de Amarante, notificada das referidas alegações, deixou esgotar o respectivo prazo de resposta sem que viesse aos autos pronunciar-se.

    Cumpre, então, apreciar e decidir.

    II – FUNDAMENTAÇÃO

  3. Entre a data de apresentação dos autos, conclusos, à Relatora do presente recurso e a prolação do presente acórdão, este Tribunal teve oportunidade de apreciar a questão relativa à inconstitucionalidade do n.º 4 do artigo 23º do Código de Expropriações, mediante intervenção do seu Plenário, com vista à prevenção de eventuais divergências jurisprudenciais, conforme decorre do n.º 1 do artigo 79º-A da LTC. Em 14 de Janeiro de 2008, foi aprovado o Acórdão n.º 11/2008, que procedeu a uma reorientação do sentido da jurisprudência deste Tribunal a propósito daquela questão de inconstitucionalidade normativa, tendo-se, consequentemente, abandonado o sentido da jurisprudência anteriormente espelhada no Acórdão n.º 422/2004.

    Em função desta recentíssima fixação de jurisprudência constitucional, procede-se apenas a uma remissão para a fundamentação exaustivamente desenvolvida no referido Acórdão n.º 11/2008, de 14 de Janeiro de 2008. Assim:

    “2. A posição anterior do Tribunal Constitucional

    Este Tribunal decidiu, no Acórdão n.º 422/2004 (pub. em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 59º vol., pág. 687), tirado em Plenário, ao abrigo do disposto no art.º 79.º - A, da LTC, num caso em que estava em causa a mesma norma, mas que a entidade expropriante era o Município onde se situava o terreno expropriado, não julgar inconstitucional a norma questionada.

    Considerou-se que o disposto no n.º 4, do artigo 23.º, do Código das Expropriações de 1999, não violava nem o princípio da igualdade, nem o direito a uma justa indemnização, consagrados, respectivamente, nos artigos 13.º e 62.º, n.º 2, da C.R.P. - fundamentos então invocados para recusar a aplicação daquela norma pela sentença proferida no processo em que foi prolatado o referido acórdão.

    Posteriormente, efectuaram o mesmo juízo de constitucionalidade, por remissão para os fundamentos do acórdão acima referido, os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional:

    - n.º 585/2004 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 588/2004 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 625/2004 (pub. em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 60.º vol., pág. 503).

    - n.º 629/2004 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 643/2004 (pub. no Diário da República, II Série, de 10-1-2005).

    - n.º 644/2004 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 662/2004 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 683/2004 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 251/2005 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    - n.º 332/2005 (disponível no site www.tribunalconstitucional.pt).

    No acórdão n.º 625/2004 afirmou-se que “o acolhimento dessa orientação implica não apenas o acatamento do sentido da decisão das questões de constitucionalidade expressamente tratadas pelo acórdão do Plenário, mas também o respeito pela projecção que, relativamente a questões nele não explicitamente apreciadas, há que atribuir aos juízos em que se fundaram tais decisões, pelo menos quando constituam seu pressuposto lógico necessário.”

    Este raciocínio permitiu que também se considerasse, nesse acórdão e noutros posteriormente proferidos, que o disposto no n.º 4, do art.º 23.º, do Código das Expropriações de 1999, não violava também o princípio da não retroactividade fiscal, consagrado no art.º 103.º, n.º 3, da C.R.P..

    (…)

  4. O princípio constitucional da justa indemnização

    O artº 62.º, n.º 2, da C.R.P., determina que a expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada mediante o pagamento de justa indemnização.

    Apesar da Constituição ter remetido para o legislador ordinário a fixação dos critérios conducentes à fixação da indemnização por expropriação, ao exigir que esta seja “justa”, impõe a observância dos seus princípios materiais da igualdade e proporcionalidade, assim como do direito geral à reparação dos danos, como corolário do Estado de direito democrático (artº 2.º, da C.R.P.).

    Em termos gerais e utilizando definição comum à jurisprudência deste Tribunal, poder-se-á dizer que a “justa indemnização” há-de tomar como ponto de referência o valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo princípio da equivalência de valores. O valor pecuniário arbitrado, a título de indemnização, deve ter como referência o valor real do bem expropriado.

    Se é admissível que na fixação deste montante interfiram razões de interesse público que justifiquem a introdução de cláusulas de correcção do puro valor de mercado, de modo a evitar avaliações que não se enquadrariam na ideia do valor “justo”(v.g. o disposto nos art.º 23.º, n.º 2, a), b), c) e d) e n.º 3), já não devem ser admitidas operações redutoras do valor real do bem expropriado, visando apenas uma diminuição oportunista da indemnização a pagar, ou com fundamentos estranhos à equidade desse valor.

    O art.º 23.º, n.º 4, do Cód. das Exp., ao impor a dedução do valor...

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