Acórdão nº 00264/05.3BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelFonseca Carvalho
Data da Resolução17 de Abril de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Não se conformando com a sentença do TAF de Penafiel que julgou improcedente a oposição deduzida por Federação Portuguesa de Futebol contra a execução que contra si foi instaurada para pagamento da quantia de €36.020,87 referente a dívidas à Fazenda Nacional, veio a oponente dela interpor recurso para o TCAN concluindo assim as suas alegações: D.I) DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: I.

Com base na documentação constante dos autos o Tribunal a quo considerou como provados os factos descritos na pág. da 3, da sentença de fls...

II.

Desses factos considerados provados, há um que manifestamente não está: “Esta cláusula de salvaguarda que neutraliza qualquer risco financeiro da dação em cumprimento, foi subscrita pela Federação e pela Liga, dado que o referido Despacho em que se insere faz parte integrante do Auto de Aceitação de Dação.” III.

Tal suposto facto é mesmo um dos aspectos fundamentais em que existe divergência entre a Administração Fiscal e a oponente e aqui recorrente.

IV. A ora recorrente nunca actuou em nome próprio.

V.

De acordo com as regras do ónus da prova, caberia à Administração Fiscal demonstrar que a aqui recorrente actuou em nome próprio, o que não se mostra feito.

VI.

Assim sendo, não se pode dar como assente que a Federação subscreveu a cláusula de salvaguarda constante do nº 7 do Despacho n 7/98-XIII, o que precisamente não aconteceu e constitui a questão nuclear destes autos.

VII.

O tribunal não pode dar como provado aquilo que nenhum documento nem outro meio de prova atestam.

VIII.

Deve, por isso, eliminar-se da matéria de facto assente o segmento acima referido sob o n° 6 destas alegações.

IX.

Acresce que, quando, nos factos provados na douta sentença recorrida, se faz menção à Federação Portuguesa de Futebol, quer no Auto de Aceitação da Dação em Pagamento de 25 de Fevereiro de 1999, quer na notificação de 17.12.2004, efectuada pela Comissão de Acompanhamento das Dívidas Fiscais dos Clubes de Futebol, não há qualquer referência a que essa intervenção foi feita em representação e por conta dos clubes devedores originários, como efectivamente aconteceu — de forma expressa e inequívoca.

X.

No Auto de Aceitação, consta expressamente referência às procurações habilitantes da qualidade em que interveio o Presidente da Federação Portuguesa de Futebol.

XI.

Na notificação da Comissão de Acompanhamento das Dívidas Fiscais dos Clubes de Futebol, há expressa menção à qualidade dos destinatários enquanto “representantes dos clubes de futebol.” XII.

Deste modo, naqueles segmentos de facto, deve ser feita referência a que a FPF interveio naquele Auto como representante doas clubes e que aquela notificação foi endereçada à aqui recorrente nessa mesma qualidade.

XIII.

É luz deste enquadramento fáctico que o presente recurso deve ser apreciado.

D.II) DO DIREITO: XIV.

Acresce que a aqui recorrente agiu sempre em representação dos clubes seus associados.

XV.

A FPF agiu sempre em nome e por conta dos clubes que a seu favor emitiram as procurações com vista à respectiva representação.

XVI.

Ademais quer o Despacho n 7/98-XIII, de 4 de Março, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, quer a notificação de 17 de Dezembro de 2004, efectuada pela Comissão de Acompanhamento das Dívidas Fiscais dos Clubes de Futebol, referem expressa e inequivocamente a qualidade de representante em que a recorrente actuou nas diversas fases do processo.

XVII.

Em face do exposto, não restam dúvidas sobre a tipologia de relações contratuais estabelecidas e sobre o enquadramento que conforma tais relações em face do ordenamento jurídico vigente.

XVIII.

Estávamos, efectivamente, perante relações contratuais de mandato com representação.

XIX.

Nessa decorrência, juridicamente, tudo se terá passado como se fossem os próprios clubes mandantes a realizar o acto jurídico para cuja prática o mandato fora outorgado.

XX.

Donde, se a recorrente não interveio “a se” no auto de dação em pagamento, mas apenas como representante, é interdito vislumbrar, nesse auto, estribo para a efectivação da responsabilidade solidária.

XXI.

Além de que há requisitos formais associados à assunção de dívida que jamais foram in casu cumpridos.

XXII.

Da análise dos normativos que regulam a assunção de dívida, nesta sede, resulta evidente que ela fica dependente da apresentação de requerimento, devidamente fundamentado, da prestação de garantias adequadas e da respectiva aceitação por despacho.

XXIII.

Pelo que, repise-se, se é certo que nenhum membro do Governo ou da Administração Fiscal exarou qualquer despacho de aceitação referente a qualquer iniciativa da recorrente no sentido da assunção, menos certo não é também que nunca foi apresentada qualquer garantia nem tão pouco qualquer requerimento a solicitar a assunção das dívidas em causa.

XXIV.

Ademais, numa claríssima inflexão ao “princípio da liberdade declarativa”, se deve inferir do nº 1 do artº 7º do DL n 124/96, de 10 de Agosto, a exigência de que o assuntor deve declarar expressamente a vontade de assumir a dívida de terceiro.

XXV.

O Código Civil contém uma definição de declaração expressa que não pode deixar de ser aqui levada na devida conta, colocando-nos a coberto dalgumas dúvidas que possam emergir quanto ao sentido dos requisitos formais da declaração supra explicitados.

XXVI.

A este propósito dispõe o nº 1 do artº 217º do CC que a declaração é expressa “(...) quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade.” XXVII.

A exigência de requerimento convenientemente fundamentado que resulta do nº 1 do artº 7º do DL 124/96, afasta, desde logo, a possibilidade de relevar a declaração expressa por palavras.

XXVIII.

Aplicando-se o critério enunciado nas disposições vindas de referir à declaração do assuntor, dir-se-á que a mesma tem de ser exteriorizada por escrito ou por qualquer outro meio formal e imediato de expressão de vontade, não satisfazendo o requisito legal a declaração de assunção de dívida cujo sentido se possa, quando muito, depreender a latere de factos concludentes, i.e., de meros índices ou sinais.

XXIX.

Como, in casu, a interpretatio do que pode querer significar o nº 7 do Despacho nº 7/98 —XIII do SEAF.

XXX.

Assim sendo e atendendo a que a recorrente jamais requereu qualquer assunção de dívida, não pode vislumbrar-se a existência de qualquer declaração expressa naquele sentido, o que não pode deixar de ter consequências quanto à validade da suposta declaração.

XXXI.

Por outro lado, deve rejeitar-se liminarmente qualquer tentativa de interpretação daquela disposição no sentido da relevância, quanto à assunção, da mera declaração tácita por via de deduções, inferências ou presunções que é exactamente o que parece vir defendido pela Administração Tributária e acolhido, pelo menos implicitamente, pelo M Juiz a quo.

XXXII.

Quanto às consequências da inobservância de forma e exigindo o nº 1 do artº 7º do DL nº 124/96 para a assunção de dívida uma declaração expressa, a falta de declaração ou até mesmo a utilização pelo destinatário do comando (o assuntor) de uma declaração tácita (sem conceder quanto à ausência de declaração, mesmo tácita, no sentido da assunção), sempre terá de determinar, no mínimo, a ineficácia da declaração, quiçá até a sua nulidade.

XXXIII.

Consubstanciando-se tal ineficácia ou nulidade na não produção do efeito em causa, i.e., na ausência de assunção de dívida.

XXXIV.

Não havendo assunção de dívida ou mostrando-se essa assunção ineficaz, a tese responsabilidade solidária não pode deixar de falecer e, se assim for, não pode deixar de emergir a questão da ilegitimidade da recorrente para estar, a título de devedora solidária, nas respectivas lides executivas.

XXXV.

Certo sendo que ainda que assunção de dívida tivesse ocorrido em respeito pelo formalismo legal exigido vindo de enunciar (o que não se aceita) sempre se teria de admitir que tal suposta assunção violaria, de forma manifesta, o princípio da especialidade que decorre do estatuído no arte l60º do CC, porquanto, tal acto, exorbitaria os fins do ente associativo aqui recorrente.

XXXVI.

Do que resulta que a assunção pela Federação das dívidas fiscais dos clubes — a ter existido, o que não se aceita — é nula, vício invocável a todo o tempo (artigos 160º, nº 1, e 294º do Código Civil) — cfr. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, pág. 315 (“o acto estará ferido de nulidade e não apenas de anulabilidade”) e Heinrich Hörster, A Parte Geral do Código Civil Português, pág. 391 (“qualquer acto praticado sem capacidade é nulo”).

XXXVII.

Mas, à cautela, ainda que se entenda, o que por mera hipótese académica se aventa, que o nº 7 do Despacho 7/98-XIII do SEAF configura uma assunção...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT