Acórdão nº 0373/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução10 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO G..., Ldª, já identificada nos autos, interpõe recurso para o Pleno da 1ª Secção deste Supremo Tribunal Administrativo, do acórdão de 12 de Junho de 2007, proferido a fls. 1898 - 1919 dos autos, com fundamento em oposição com o julgado no acórdão da 1ª Secção, 3ª Subsecção, deste Supremo Tribunal, proferido em 6 de Março de 2002, no recurso nº 46 143.

1.1. Na sua alegação com vista a demonstrar a invocada oposição sustenta o seguinte: 1. A ora Recorrente considera, para os efeitos dispostos no art. 765º, nº 2 do CPC (versão anterior a 1996), que o douto Acórdão proferido nos presentes autos se encontra em contradição com o que foi proferido em 06/03/2002, pela 3ª Subsecção do Contencioso Administrativo, no Processo nº 46 143.

  1. De facto, para os efeitos do disposto no art. 765º, nº 3 do CPC, a recorrente desde já pode adiantar que a oposição encontrada, entre o Douto Acórdão recorrido e o não menos douto Acórdão fundamento, resulta de este último considerar que, perante a cominação da sanção de nulidade a contrato submetido à sua apreciação, o Tribunal deveria procurar preservar essa relação jurídica, mediante o recurso ao instituto da conversão do negócio jurídico nulo, enquanto o Aresto sub Judice se decidiu pela inaplicabilidade deste mesmo instituto, uma vez que, reconhecendo estarem reunidas as condições para o efeito, não procedeu a tal conversão.

  2. Com efeito, no Acórdão fundamento pode ler-se, no ponto 2 da sua fundamentação de Direito: "Mas além disso, e mesmo que tal bem estivesse, como está, fora do comércio, tal venda seria igualmente nula por se tratar de venda de bens alheios, uma vez que a mesma teve por objecto uma parcela de cuja propriedade é titular a junta de Freguesia.

    Todavia, admitindo que a pretensão dos outorgantes nesse contrato foi a da transmissão do direito de concessão ao uso do identificado bem e não a transmissão da propriedade deste e, portanto, admitindo a conversão desse contrato de compra e venda num contrato de transmissão dessa concessão, ainda assim do mesmo não resultariam os efeitos pretendidos pelos Recorridos Particulares." 4. Bem pelo contrário, no douto Acórdão recorrido podemos ler: "Não resulta no entanto dos autos que a nomeação tivesse sido acompanhada de documento de ratificação do contrato ou de procuração, nos termos do art. 453º, nº 2 do Cód. Civil, pelo que à nomeação assim feita, não pode ser atribuída qualquer eficácia favorável à Autora (cf. Artº 453º a 455º do Cód. Civil).

    E daí que assista razão ao recorrente quando, na conclusão B) invoca violação do disposto «no nº 2, art. 453º do Código Civil (ineficácia)» já que, como expressamente refere, «não consta do contrato qualquer declaração ou ratificação, pelo que o tribunal a quo tinha de sancionar o mesmo com a ineficácia».

    ............ Daí a procedência das conclusões A/a5 e B) formuladas pelo recorrente, com a consequente procedência do recurso jurisdicional sem necessidade de apreciação de qualquer outra questão que o recorrente suscitou na respectiva alegação" 5. Daqui resulta que o douto Acórdão recorrido decidiu conceder provimento ao recurso interposto da sentença proferida em 1ª instância, por qualificar o contrato celebrado em 30/09/1989 entre a ora Recorrente, de um lado, e H... e I..., de outro, como exercício de uma faculdade de nomeação de contraente, feita ao abrigo do disposto na Cláusula 22º do Contrato - Promessa de Compra e Venda e nos arts. 453º e ss do CC, sem procurar proceder à sua conversão, nos termos do art. 293º do CC, para preservar o negócio efectivamente realizado pelas Partes.

  3. No entanto, o mesmo douto Acórdão recorrido afirma: "Por outra via, face ao estabelecido nos arts. 424º e segs. do Cód. Civil, temos igualmente de concluir que o «acordo» celebrado em 30.09.1989, entre H... e I... (1ºs outorgantes) e a Autora desta acção G..., Lda (2ª outorgante) como resulta das respectivas cláusulas, os próprios outorgantes o classificaram e como se entendeu na sentença recorrida, integra a celebração de um «contrato de cessão da posição contratual»" 7. Ora se assim é e se o douto Acórdão recorrido acolhe a matéria de facto dada como provada, pela 1ª instância, designadamente (i) a celebração da referida "... transmissão da posição contratual ..." em 30/09/1989 (cf. ponto 12 dos factos provados); (ii) a comunicação dessa transmissão, feita nessa mesma data ao Município de Mira (cf. ponto 13 dos factos provados); (iii) a declaração camarária de 31/08/1990 (cfr. art. 53º a) do Dec-Lei nº 100/84, vigente a essa data), quanto à dita cessão de posição contratual (cf. ponto 16 dos factos provados); e (iv) as inúmeras diligências de execução da relação contratual estabelecida, levadas a cabo pela ora Recorrente e pelo Município de Mira, entre 1989 e 1991 (cfr. pontos 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 35 e 36 dos factos provados); então forçoso é concluir que se encontram reunidos todos os requisitos essenciais de substância e de forma, bem como demonstrada a vontade das Partes quanto ao efectivo estabelecimento da relação contratual entre a ora Recorrente e o Município de Mira, se não por via de uma nomeação daquela pelos originários promitentes - compradores nos termos do art. 453º do CC (a Recorrente permanece convicta que, desde o momento da prática dos factos supra referidos, as Partes sempre agiram e quiseram agir no quadro de uma cessão da posição contratual), então por via da conversão dessa ineficaz nomeação em cessão de posição contratual nos termos do art. 424º do CC.

  4. Ao não proceder a esta conversão do negócio jurídico que julgou ineficaz, noutro relativamente ao qual reconheceu estarem reunidos todos os requisitos estabelecidos pelo art. 293º do C.C., o douto Acórdão recorrido incorre em oposição ao decidido no douto Acórdão fundamento, oposição essa que deverá ser dirimida pelo Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, nos termos do disposto nos arts. 102º e ss da LPTA, art. 24º b) do ETAF e arts. 765º, nºs 2 e 3 do CPC." CONCLUSÕES: A. A oposição encontrada, entre o Douto Acórdão recorrido e o não menos douto Acórdão fundamento, resulta de este último considerar que o Tribunal deveria procurar preservar a relação jurídica subjacente a contrato submetido à sua apreciação, em caso de cominação da sanção de nulidade do mesmo contrato e mediante o recurso ao instituto da conversão do negócio jurídico julgado nulo, enquanto o Aresto sub judice se decidiu pela inaplicabilidade deste mesmo instituto, uma vez que, reconhecendo estarem reunidas as condições para o efeito, não procedeu a tal conversão.

    B. O douto Acórdão recorrido decidiu conceder provimento ao recurso interposto da douta sentença proferida em 1ª instância, por qualificar o contrato celebrado em 30/09/1989 entre a ora Recorrente, de um lado, e H... e I..., de outro, como exercício ineficaz de uma faculdade de nomeação de contraente, feita ao abrigo do disposto na Cláusula 22ª do Contrato - Promessa de Compra e Venda e nos arts. 453º e ss do CC, sem procurar preservar o negócio efectivamente realizado pelas Partes, mediante a sua conversão em contrato de cessão de posição contratual, nos termos do art. 293º do CC (que é aplicável, por analogia, aos negócios ineficazes, como julgou a Relação de Coimbra, em Acórdão de 08/02/1989, "Colectânea de Jurisprudência", 1989, 1º, pág. 60).

    C. Ao não proceder à conversão do negócio jurídico que julgou ineficaz, noutro relativamente ao qual reconheceu estarem reunidos todos os requisitos essenciais de substância e de forma e que, além disso, concluiu corresponder ao fim prosseguido pelas Partes (cfr. ponto 4 supra), o douto Acórdão recorrido incorre em oposição ao decidido no douto Acórdão fundamento, por oposta aplicação do disposto no art. 293º do CC, oposição essa que deverá ser dirimida pelo Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, nos termos conjugados do disposto nos arts. 102º e ss da LPTA, art. 24º b) do ETAF e arts. 765º, nºs 2 e 3 do CPC." 1.2 O Município de Mira contra-alegou dizendo, no essencial, que não se verifica a alegada oposição, uma vez que o tratamento jurídico desigual no acórdão recorrido e no acórdão fundamento se justifica por serem dissemelhantes as situações de facto subjacentes.

    1.3. O Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu o seu douto parecer nos seguintes termos: " O recurso por oposição de julgados pressupõe que a mesma questão fundamental de direito, na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica e versando a mesma ou idêntica situação de facto, tenha obtido soluções opostas em diferentes acórdãos do STA ou do TCA - art. 24º, alíneas b) e b') do ETAF.

    Ora, no caso em apreço, os acórdãos recorrido e fundamento, confrontados com diferentes realidades factuais, conheceram e decidiram questões jurídicas...

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