Acórdão nº 0446/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução09 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A Fazenda Pública interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a reclamação judicial interposta por A……., da decisão de indeferimento do pedido por esta última formulado de dispensa de prestação de garantia bancária no âmbito do processo de execução fiscal nº 18772200401011901.

Terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: «Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal e, em consequência, decide anular o Despacho proferido no âmbito do Processo de execução fiscal (PEF) n." 1872200401011901 e Aps., pendente no Serviço de Finanças da Póvoa do Varzim, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado pela Reclamante/ executada por reversão, por forma a suspender a execução.

- Para assim decidir o Tribunal a quo considerou que ocorreu preterição de formalidades legais porque, "está em questão o pedido de dispensa de garantia, logo por força do referido normativo, é exigida a audição prévia (. . .) tendo em conta os motivos que fundamentaram o indeferimento da dispensa de garantia deveria ter sido realizada a audição prévia. " - E, ainda que não tendo a Administração Tributária realizado a audição prévia "viola da alínea b) do n. °1 do art.º 60. ° do CPPT, e n ° 1 do art. o 103º do CPA" - Ressalvado o devido respeito, com o que desta forma foi decidido não se conforma a Fazenda Pública, pelas razões que passa a expender.

- Para uma correcta contextualização dos factos cumpre assinalar que, nesta sede se litiga o Despacho que indeferiu o pedido de dispensa de garantia apresentado pela Reclamante, enquanto responsável subsidiária, no âmbito do PEF n." 1872200401011901 e Aps., instaurado por dívidas de IVA dos exercícios económicos dos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006, no valor de 213.352,06 euros e acrescido, em que é primitiva executada a sociedade B……, Lda., em liquidação, nipc......., - relativamente ao qual veio oportunamente a ser deduzida Oposição Judicial junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto - autuada com o n." 321/11.7 BEPRT - e ulteriormente a ser solicitada a constituição de garantia idónea, no valor de 338.940,59 euros.

- O fundamento legal em que assenta a decisão que indeferiu o pedido (de dispensa da prestação de garantia) assenta no art.º 52.° n.os 1, 2 e 4 dos da LGT e art.°s 169.° e 170.° n." 3 do CPPT, a que acrescem as directivas emanadas pelo Oficio-circulado nº 60.077, de 29.07.2010, da DGCI, i.e., ante o não cumprimento por parte da requerente/executada por reversão da prova, de todos os requisitos exigíveis, para obter a dispensa de prestação de garantia, mormente no que respeita à necessária prova da sua irresponsabilidade pela situação de inexistência/insuficiência de bens da executada originária.

- A douta sentença padece erro de julgamento que determinou a errada aplicação do direito, consubstanciado na incorrecta apreciação e valoração da matéria factual, como igualmente na errada interpretação dos preceitos legais, nomeadamente, do disposto nos art.°s 276.° e 277.° do CPPT, artº 60.° da LGT e art.º 125.° do CPA. - Desde logo, se se atentar a que a reclamação do art.º 276.° prevê a possibilidade de impugnação de quaisquer decisões do órgão de execução fiscal ou outras autoridades tributárias que afectem os direitos ou interesses legítimos do executado.

- A denominação reclamação é utilizada na LGT [art. 103.°, n” 2], mas a denominação de recurso era utilizada no art.” 62.°, nº 1, alínea g) do ETAF de 1984, no art. 10.°, nº 1 do RCPT, no art.º 101.°, alínea d), da LGT e no art.º 97.°, nº 1, alínea n) do CPPT.

- O ETAF de 2002 fala em acção e impugnação dos actos praticados pela entidade competente nos processos de execução fiscal [artº 49.°, n.s 1 alíneas a), subalínea iii), e d)]. Faz também referência à impugnação de actos lesivos, no âmbito dos actos praticados no processo de execução fiscal, na alínea d) do mesmo nº 1, mas sem dar qualquer denominação ao meio processual.

- Embora no ETAF não resulte se se reporta a impugnação no âmbito do processo de execução ou em acção impugnatória autónoma, o certo é que o art.º 276.° do CPPT abrange na sua formulação a generalidade dos actos praticados pela administração tributária no processo de execução fiscal, mesmo que não sejam praticados pelo órgão da execução, como pode suceder com os actos de autorização do pagamento em prestações ou de aprovação de garantias quando o valor da dívida exequenda for superior a determinado montante, nos termos expressos nos art.°s 197.°, n” 2 e 199.°, n” 8 do CPPT. Pelo que parece não haver suporte para não conexionar com esta reclamação qualquer daquelas referencias feitas no nº 1 do art.º 49°.

- A denominação reclamação parece ser menos adequada do que a de recurso ou a de acção de impugnação, pois aquela expressão é usualmente utilizada para referir os pedidos de reapreciação de um acto pela entidade que o praticou [art.º 158.°, n." 2, alínea a), do CPA] embora também seja utilizada para pedir a apreciação pelo juiz dos actos da secretaria (art.°s 161.°, n." 5, do CPC e 60.°, n.º 2, e 61.° do CCJ).

- A utilização daquela expressão reclamação justificar-se-á, eventualmente, por o processo de execução fiscal ser considerado um processo de natureza judicial (art.º 103.°, nº 1, da Lei Geral Tributária) e, por essa razão, poder entender-se que ele já está na dependência do juiz do tribunal tributário, isto ainda e mesmo na fase que corre termos perante as autoridades administrativas, não havendo, assim, uma introdução do processo em juízo.

- Sobre as dificuldades de conceptualização deste meio processual e que esta reclamação «tem um misto de recurso contencioso - pois trata-se do controlo um acto de um órgão administrativo por parte do tribunal e de recurso jurisdicional - na medida em que o acto a ser controlado pelo tribunal é um acta praticado num processo “. Em consonância prevê o CPPT uma secção destinada particularmente a disciplinar o modo de reacção contra actuações supostamente lesivas praticadas pelos órgãos administrativos no âmbito da execução fiscal. Não se trata de um verdadeiro recurso jurisdicional, pois não estão aqui a ser sindicadas actuações de tribunais, nem tampouco se pode dizer que estamos perante um recurso contencioso [lato sensu], na medida em que a actuação aqui a ser analisada pelo tribunal não se incorpora num procedimento, mas num processo.

- Estar-se-á, nesta perspectiva, perante uma situação de reclamação semelhante à prevista no art. ° 161.°, n.º 5, do CPC em que se estabelece que «dos actos dos funcionários da secretaria judicial é sempre admissível reclamação para o Juiz de que aquela depende funcionalmente». De qualquer forma, independentemente da designação adequada, a reclamação prevista no art.º 276.° constitui um incidente do processo de execução fiscal, por ser uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal do processo.

- A este propósito, entendemos salvo o devido respeito por opinião diversa que, é duvidosa a enunciação pelo tribunal a quo, que a falta do exercício do direito de audição determina a anulação, por vício de forma (. .. ) da decisão de indeferimento do pedido de isenção da prestação de garantia, dada a natureza judicial do processo de execução fiscal.

- Não é demais lembrar o disposto no nº 1 do art.º 103.° da LGT, "O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional". Acrescentando o nº 2 que ''É garantido aos interessados o direito de reclamação para o Juiz da execução dos actos...

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