Acórdão nº 03576/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução10 de Maio de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Carlos …………………., com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. As alíneas E) e F) da base instrutória deveriam ter sido dadas como provadas, atento os elementos constantes dos autos e os depoimentos das testemunhas, as quais conhecem o Recorrente há vários anos, acompanharam as suas angústias com o atraso na resolução do processo e prestaram um depoimento credível, isento e objectivo em audiência de julgamento.

  1. A responsabilidade civil extracontratual do Estado por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, com as especialidades resultantes das normas próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos, os quais, com o devido respeito pela opinião em contrário, estão preenchidos.

  2. A ilicitude que o Recorrente alegou na P.I. como fundamento do pedido, consiste no incumprimento por parte do Recorrido dos prazos legais para a tramitação do processo, pelo que, ao contrário do decidido na Douta Sentença Recorrida, está demonstrado nos autos que não foram cumpridos os prazos legais para a tramitação e decisão dos pedidos formulados pelo Recorrente.

  3. Pois, aferindo-se a culpa "pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso", não oferece dúvidas que o Recorrido ao não ter cumprido esses prazos, praticou actos ilícitos culposos, verificando-se assim o primeiro pressuposto da responsabilidade civil extracontratual.

  4. Para se analisar o conceito de prazo razoável há que ter em consideração o caso concreto, nomeadamente, o tempo gasto na diligência, a sua complexidade, a conduta dos serviços e comportamento do Recorrente, mas independentemente do processo ser complexo ou não, não se pode aceitar que 13 anos e 257 dias, sem julgamento, seja um prazo razoável e não justifica o atraso.

  5. Com o devido respeito pela opinião em contrário, o Recorrente não pretende que os seus prejuízos lhe sejam ressarcidos pela falta do cumprimento aritmético dos prazos processuais, conforme consta na fundamentação da Douta Sentença Recorrida, mas esses prazos existem com o objectivo de se assegurar o direito dos cidadãos a uma decisão em prazo razoável, muito embora sejam meramente ordenadores ou reguladores, conforme se alegou em 18. e 19., que se dá como reproduzido, mas 13 anos e 257 dias, não pode ser considerado "prazo aritmético".

  6. Para além disso, com o devido respeito pela opinião em contrário, os fundamentos invocados na Douta Sentença Recorrida, não são suficientes para se justificar que não está verificado o pressuposto da responsabilidade civil extracontratual do Recorrido, conforme se alegou em 20.1. a 20.3.2.2.

  7. Pois, o facto de ser necessária a conta do processo no recurso da habilitação de herdeiros, não é justificação para demorar l ano e 5 meses para se apreciar esse, o qual não reveste complexidade.

  8. Por outro lado, também não é razoável esperar-se mais de l ano para que seja solicitado o exame ao IML, o qual deveria ter sido solicitado de imediato, ou, pelo mesmo, quando foram recebidos os boletins clinicos.

  9. Para além disso, o Tribunal deveria, atento o principio da cooperação, solicitar os elementos clinicos que o Recorrente estava impossibilitado de apresentar e não indeferir para 4 meses passados vir a deferir.

  10. Por outro lado, também o arbitramento de reparação provisória não é motivo para justificar a "paragem" no processo principal, por não impedir o prosseguimento deste, pelo que enquanto decorreu o arbitramento o processo principal esteve praticamente parado, tanto mais que o Juiz ordenou em 6/11/97 a solicitação de informações para conclusão do exame médico, o que só veio a ser cumprido em 24/6/98, ou seja, durante 7 meses o processo principal esteve "parado".

  11. Com efeito, o Recorrido não conseguiu fazer prova de que havia justificação para os atrasos invocados e impeditivos do direito do Recorrente, como lhe competia e dos factos provados apenas consta da ai. BBBBB1 da Douta Sentença Recorrida, que em 24/6/98, haveria um grande volume de serviço, o que não justifica os restantes atrasos, uma vez que, já anteriormente a essa data, ou seja, em 6/11/97, o Mmo Juiz tinha ordenado a solicitação de informações, o que não foi cumprido, mas, mesmo que assim fosse, o que apenas por hipótese se admite, caberia ao Recorrido assegurar pelo decurso normal dos processos.

  12. Com efeito, com o devido respeito pela opinião em contrário, na Douta Sentença Recorrida não foi fundamentado, nem dado como provado, o motivo para justificar as várias "paragens" processuais, tendo ao longo do processo o Recorrido agido de forma negligente ou de qualquer modo culposa, sem qualquer justificação pelo que deverá responder por facto ilícito extracontratual, tanto mais que os factos ilícitos e culposos dados como provados, foram causa adequada da produção dos prejuízos reclamados na acção pelo Recorrente, pelo que se verifica a existência de nexo de causalidade entre os factos ilícitos e os danos apontados, conforme se alegou em 27. e 33., que se dá como reproduzido.

  13. O Recorrente alegou factos concretos de traduzirem perda ou afectação de bens, direitos ou interesses juridicamente tutelados e integradores de danos patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes da violação do direito fundamental a uma "justiça em prazo razoável", pelo que não estamos perante uma situação desmerecedora da tutela do direito, por não se tratar de danos normais ou comuns, que recaem genericamente sobre o universo dos cidadãos e que são considerados habituais e inerentes ao risco próprio da vida, tanto mais que o atraso na justiça não só viola o direito a uma justiça célere e equitativa como também o direito que se pretende fazer valer em tribunal e que ficou coarctado pelo atraso da justiça.

  14. Com o devido respeito pela opinião em contrário, foram causados danos patrimoniais ao Recorrente, com o atraso na marcação do julgamento, tanto mais que, quando o mesmo foi marcado, a Ré pagou ao Recorrente, pelo que, e ao contrário do que consta na fundamentação da Douta Sentença Recorrida o "desfecho do litigio" não seria outro, senão a Ré não teria pago ao Recorrente 11472,35 euros, uma vez que já tinha em seu poder o relatório do 1NML e aguardaria pela Sentença, que atenta a fundamentação, e que apenas por hipótese se admite, lhe seria favorável.

  15. Por outro lado, mesmo sem exigência de culpa ou nexo causal, na Douta Sentença Recorrida sempre se deveria ter condenado o Recorrido pelos danos morais causados ao Recorrente, por violação do direito a uma decisão num prazo razoável, pelo que foi desconsiderado o seu sofrimento com o atraso na resolução do processo.

  16. Tara além disso, ao contrário do que consta da fundamentação da resposta aos quesitos, para aquilatar de tal facto não era necessário exame médico ao Recorrente, por ser do senso comum e não são necessários conhecimentos especiais, que esperar mais de 13 anos pela resolução de um processo causa aflição, inquietação, incerteza aflitiva, revolta, aborrecimentos, incómodos e tristeza.

  17. Mas, se o Tribunal entendesse que seria necessário a prova pericial deveria ter sido solicitada oficiosamente, nos termos do art.° 579º do C.P.C., conforme se alegou em 46. a 48..

  18. Com o devido respeito pela opinião em contrário, atentos os factos provados constantes das als. CCCCC), IIIII) e LLLLL) da Douta Sentença Recorrida e a prova testemunhal apresentada, está demonstrado que o Recorrente sofreu danos morais, prejuízos do equilíbrio anímico e psíquico, com as angústias, desanimes, desespero e ansiedades, tendo-se sentido frustrado pela ineficácia do sistema judicial na defesa dos seus interesses, pelo que devem esses danos ser reparados conforme se alegou em 49. a 58., que se dá como reproduzido.

  19. Na Douta Sentença Recorrida violou-se por erro de interpretação e de aplicação o disposto nos art.°s 20.° n.° l e 4 C.R.P., 342.° n.° 2, 388.°, 483.° n.° l, 487.° n.° 2 e 496.° n.° l e 3 do C.C. aplicável ex vi art.° 4.° do Dec.-Lei 48051, 579.° do C.P.C., 6.° n.° l da C.E.D.H., 2.°, 6.° do Decreto-Lei n.° 48051, de 21/11/1967 * O Ministério Público, em representação do Estado, contra-alegou, concluindo como segue: 1. Como bem refere o M.° Juiz a quo, sendo inquestionável que a acção n.° 5872/90 pendeu no 1.° Juízo Cível de Lisboa entre 24 de Maio de 1990 e 4 de Fevereiro de 2004 tal facto não é suficiente para, sem mais, julgar verificada a violação do invocado direito a uma decisão jurisdicional em prazo razoável segundo um parâmetro ideal de três anos uma vez que a tramitação dessa acção «se revestiu de grande complexidade», conclusão que é sobejamente patenteada na matéria de facto dada como assente; 2. Com efeito, segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, são critérios para determinação do prazo razoável a natureza e complexidade do processo, o comportamento das partes e o comportamento dos órgãos do poderes judicial, executivo ou legislativo, critérios que, por sua vez, deverão ser aferidos, não em função da demora de um qualquer acto de sequência processual ou de prolação de decisão interlocutor ia, mas relativamente a todo o conjunto do processo, desde a propositura da acção até à notificação da decisão definitivo, nomeadamente nas instâncias de recurso; 3. Hl. No caso sub judicio, como o revela a decisão recorrida - v. HI-C, p/18 a 25 da sentença recorrida - a morosidade do processo (treze anos e quatro meses) ficou a dever-se à complexidade de que se revestiu a tramitação da acção por efeito da estratégia e comportamento processuais nela adoptados pelo Autor (demanda de Ré falecida, insistência na sua citação pessoal e edital, dedução de incidente de habilitação de herdeiros por forma deficiente e mal instruído, interposição de recurso para o Tribunal da Relação da decisão de improcedência por forma igualmente deficiente...

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