Acórdão nº 104/2002.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução08 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Revista n.º 104/2002.L1.S1 Recorrente: “AA (Herdeiros), Lda.” Recorrida: “BB – Sociedade Portuguesa de Hotelaria. Lda.” I. – RELATÓRIO.

Irresignada com a decisão proferida na apelação que a Ré-reconvinte, “BB – Sociedade de Hotelaria Portuguesa, Lda.”, havia interposto da decisão prolatada na 9.ª Vara do Tribunal Cível de Lisboa, e que na parcial procedência condenou a Autora-reconvinda, “AA (Herdeiros), Lda.”, a pagar à Ré-reconvinte a quantia de cento e sessenta e quatro mil setecentos e setenta e seis euros e trinta e cinco cêntimos (€164.776,35), depois de operada a compensação dos valores resultantes das parciais procedências dos pedidos da acção e da reconvenção, recorre a Autora-reconvinda, havendo a considerar os sequentes, I.1. - ANTECEDENTES PROCESSUAIS.

“AA (HERDEIRO), Lda.”, intentou a presente acção declarativa comum, sob a forma ordinária, contra “BB – SOCIEDADE PORTUGUESA DE HOTELARIA, LDA.”, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de 108.742,61€, acrescida de 36.393,60€ de juros moratórios vencidos, bem como nos juros moratórios vincendos.

Para tanto alega, em síntese, que as partes celebraram entre si um contrato de empreitada, nos termos do qual a Autora ficaria também obrigada a efectuar trabalhos extra que lhe fossem solicitados, cujo pagamento se regeria pelos mesmos moldes dos inicialmente previstos para a empreitada. A Autora efectuou diversos trabalhos a mais, constantes de ordens de execução que recebeu da fiscalização da obra e que foram sendo pagos pela Ré. Todavia, não pagou os últimos trabalhos efectuados, invocando dificuldades financeiras, pagamento esse que a Autora vem agora reclamar.

A Ré contestou e deduziu reconvenção, defendendo ser titular dum crédito sobre a Autora, excepcionando que seja efectuada a compensação entre os créditos, na parte coincidente e pedindo a condenação da Autora reconvinda no pagamento à Ré da parte do crédito que excede o daquela.

Para tanto narrou abundantemente tudo o que ocorreu no decurso da empreitada, com realce para o facto de as facturas da Autora virem todas desacompanhadas dos autos de medição, mas foram sendo pagas pela Ré, confiando que quaisquer irregularidades seriam corrigidas aquando do fecho de contas da empreitada. Finalmente, e apesar dos trabalhos não estarem concluídos, começaram as partes com reuniões, no decurso das quais a Autora admitiu – através de um documento – creditar a Ré pelo valor de obras não efectuadas ou cujas áreas ou dimensões não eram as previstas inicialmente. Entende a Ré que tem a haver o valor destas tarefas mal executadas ou não executadas de todo e que foram adiantadamente pagas, a abater ao valor das facturas cujo pagamento ora se pede e na parte em que são devidas. Refere ainda que muitos dos trabalhos orçamentados e cobrados respeitam a erros de medição ou de contagem constantes do chamado “adicional” ao contrato, pelo que a A deve devolver à R os valores respeitantes a esses trabalhos mal orçamentados. A não se entender assim estaríamos perante uma situação de locupletamento da A., com o valor orçamentado e pago para obras que não realizou e não eram de realizar, com o correspondente desembolso, por parte da R., que pagou por trabalhos que não foram feitos, porque pura e simplesmente não existiam para serem feitos.

A Proposta/Orçamento elaborada, medida, quantificada e avaliada pela Autora para servir de elemento de referência nas discussões do Eng.º Lory (CC) com o Metropolitano e no Contrato de Empreitada, continha graves e ilícitos aumentos naquelas medições e quantificações referindo, igualmente, “obras virtuais” que, por o serem não era possível executar em locais do Hotel, excessos esses que, aliados a outros relativos a trabalhos extra, tudo já pago pela Ré – com excepção do que se viesse a apurar quanto ao pedido da Autora – por solicitação da fiscalização, mostravam que ela, Ré, pagara mais ESC 87.197.924$00 do que o executado, pelo que deveria ter sido efectuada a compensação pedido e na diferença condenada a R.

Terminou requerendo a compensação do que viesse a ser apurado dever à Autora e a condenação desta a devolver ou pagar, a ela Ré, a diferença.

Na sua réplica argumentou a Autora que o contrato de empreitada era por preço global, pelo que tinha o direito de guardar para si a totalidade dos preços unitários e respectivo somatório, quer as obras tivessem sido, ou não, executadas designadamente as obras virtuais não obstante haver decidido creditar a R. pelo valor de alguns trabalhos orçamentados e não executados havendo, todavia, aceite numerosas correcções às medições/quantificações por si anteriormente indicadas como documentado nos documentos por nós já identificados nestas alegações.

A gerência da R. encarregou o Subdirector do Hotel, Eng.º M...A..., de confirmar todas as ordens de execução (menos as 3 que se referiam a pagamentos a fazer ao Metropolitano) em virtude de, em conjunto e duma vezada lhe haverem sido entregues pouco faltava para que a obra pudesse ser considerada finalizada – o que nunca sucedeu – pelo representante do Fiscal, Eng.º L..., para serem assinadas por aquela gerência que entendeu, atentas as dezenas de documentos então recebidos, só o poder fazer após a comparação dos conteúdos das OE com o da Proposta/Orçamento e facturas, tudo já pago e proceder à sua confirmação através da medição, quantificação e valorização dos trabalhos efectivamente executados pela A.

No âmbito de reuniões finais, e tomando por base a Proposta Adicional, a Autora elaborou e enviou à Ré, um "Resumo Geral dos Erros e Omissões", no qual se propôs creditar esta por obras não realizadas ou pela diminuição de quantidades de área ou artigos, creditando-a pelo valor de cobertores, espelhos e patins de degraus, pelo valor de rodapé em maronagres que não fora colocado, corrigiu o número de portas a tratar" diminuindo-o, corrigiu o comprimento do corrimão a colocar, eliminou o corrimão da escada de caracol e a reparação da guarda da escada de serviço, diminuiu o número de sanitas e lavatórios, de bases de duche, de urinóis, de autoclismos, de misturadores de lavatório, duche, fluxómetros, reduziu ou eliminou áreas de afagamento, betume, envernizamento e pintura a tinta em várias zonas, diminuiu ou eliminou quantidades de bancadas de lavatório, tectos em pladur, portas e sua pintura, janelas, tratamento de roupeiros e guarda-roupas, etc., etc. como consta dos documentos juntos de fls. 199-212 e 213.

Tiveram entretanto lugar reuniões para discutir as contas finais da empreitada nas quais a R. apresentou, desta vez por escrito, as reclamações resultantes do trabalho de confirmação que efectuara (fls. 214 e sgts.) e que mereceu resposta da A. através do seu documento denominado “Resumo Geral de Erros e Omissões” (fls. 199 e sgts.) Neste “Resumo” a R. reconheceu as correcções feitas pela R. quanto a medições/quantificações e valores unitários mas só a creditou pelo valor de alguns items não o havendo feito quanto aos demais e em cujas colunas escreveu “medições de n/ responsabilidade” no sentido de que – ainda que tivesse aceite noutros items a correcção das medições/quantificações – não creditava a R. por se tratar de empreitada por preço global. Aliás já tomara conduta semelhante no art.º 48 da sua réplica. Decisões contrárias para cuja divergência a A. não deu explicações, se a empreitada era por preço global a A. teria de manter a totalidade do constante da sua Proposta já que, não o fazendo, aceitava que aquela não era por preço global ou que, sendo-o, permitia as respectivas correcções.

Ora, de harmonia com as intenções e desejos da R. quando contratou os serviços da A., só não tinham sido executados a repintura do telhado e a pintura de gradeamento, trabalhos que a R. decide efectuar directamente pedindo, por isso, que a A. a reembolse dos valores respectivos mencionados na Proposta/Orçamento.

Sendo assim e tendo em conta os interesses da R. quanto à execução das obras nada mais tinha ela a solicitar sobre as mesmas até porque não podia perder tempo com discussões quanto a obras mal executadas em virtude de o Hotel ter de estar em condições aquando do início da Expo 98 para satisfazer as reservas que anteriormente lhe haviam sido feitas pelas agências de viagens sob pena de ter de as indemnizar.

Como a A. soube desde sempre, essas obras virtuais e pagas pela R. sempre foram inexequíveis em virtude de não existirem no Hotel locais, espaços ou necessidade para as consumar, o que a A. confessa saber quando declarou, sem que as tenha executado, que a empreitada estava terminada (fls. 362).

Estando efectuadas as obras necessárias à reparação interior do Hotel, e havendo a R. decidido tomar sobre si a repintura do telhado e a pintura do gradeamento, não tem a R. mais obras ou trabalhos a solicitar à A.

  1. forjou a sua Proposta/execução e facturação delas fazendo constar obras desde sempre inexequíveis aumentando, assim, em cerca de 87 milhões de escudos o valor da empreitada, valor com que enriqueceu, tendo a R. empobrecido por idêntico valor que já havia pago.

    As disposições constantes do CE, do CEG do Dec. Lei 405/93 ou as relativas ao contrato de empreitada do nosso CC não apadrinham a utilização pelo empreiteiro de meios ínvios, ilegais, imorais e ilícitos com objectivos egoístas e meramente pessoais sem causa justificativa ou fundamento que respeitasse directa e imediatamente com a obra a realizar. Antes pelo contrário o proíbe de harmonia com os arts. 227 e 334 do CC.

    O caso vertente rege-se pelo nosso direito das obrigações e, designadamente pelo disposto nos artigos já referidos e nos art. 473, 476, 479 e 762 do CC quer nos preliminares quer no contrato definitivo.

    A acção da fiscalização em nada diminui a responsabilidade pela boa execução dos trabalhos (art.º 28, r), § 4.º do CEG) Assim: - ou se considera que a A. tinha a obrigação de satisfazer fisicamente tudo o mencionado na Proposta/Orçamento e facturação – o que como já vimos não é possível – e, porque ela...

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