Acórdão nº 0237/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A……, LDA, com os demais sinais dos autos, veio interpor recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 15 de Dezembro de 2011, a fls. 232 a 242, que negou provimento ao recurso interposto da sentença do TAF de Braga que, no âmbito da reclamação de decisão do órgão da execução fiscal proferido nas execuções fiscais n.º 0450201101005081 e n.º 0450201101008358, manteve o acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia formulado pela executada vista à suspensão desses processos de execução fiscal.

1.1.

As alegações dos recursos mostram-se rematadas com o seguinte quadro conclusivo: 1. O artigo 52º n.º 4, da LGT não impõe a cumulação do requisito relativo ao prejuízo irreparável com os restantes requisitos enumerados no Acórdão recorrido, a saber: insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis e não contribuição do comportamento da recorrente para a verificação da referida situação de insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis.

  1. O accionamento da dispensa de garantia com fundamento em prejuízo irreparável pressupõe, só e apenas, o preenchimento do requisito relativo à eventual ocorrência de uma situação de prejuízo irreparável provocada pela obrigatoriedade da prestação de garantia.

    In casu é o que sucede. Como provado ficou, sobretudo documentalmente, mas também como depoimento da testemunha B……, o alegado prejuízo irreparável verificar-se-á, irremediavelmente, dada a total incapacidade da recorrente para prestar qualquer tipo de garantia.

  2. Se o legislador tivesse pretendido cumular os requisitos relativos ao prejuízo irreparável e à ausência de responsabilidade da recorrente em matéria de insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis não teria, em simultâneo, colocado os requisitos referentes ao prejuízo irreparável e à falta de meios económicos - revelada pela insuficiência ou inexistência de tais bens - numa relação de alternatividade, uma vez que a verificação da ausência de responsabilidade - ou melhor, da questão previa referente a insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis - é, por si só, reveladora da falta de meios económicos.

  3. Por outro lado, não faz sentido fazer depender a concessão de dispensa de garantia - com fundamento na eventual verificação de uma situação de prejuízo irreparável da ocorrência de uma situação de insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis e da ausência de responsabilidade da recorrente no que a verificação das mesmas respeita, uma vez que pode não existir uma relação directa entre a verificação prejuízo irreparável e a insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis. Isto é, pode a recorrente possuir bens susceptíveis de penhora e, mesmo assim, a obrigatoriedade de prestação de garantia - com a consequente recusa do pedido da sua dispensa - conduzir a uma situação de prejuízo irreparável.

  4. O preenchimento cumulativo dos requisitos supra expostos - prejuízo irreparável, insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis e ausência de responsabilidade da recorrente na insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis - revelar-se-ia excessivo, tornando o accionamento do artigo 52°, n.° 4, da LGT demasiado apertado e desproporcionado.

  5. No entendimento da recorrente e salvo o devido respeito, a redacção do artigo 52°, n.° 4, da LGT pressupõe o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: •Que a prestação de garantia seja susceptível de causar à recorrente prejuízo irreparável, ou •Que a prestação de garantia seja susceptível de causar a recorrente uma manifesta falta de meios económicos - revelada pela insuficiência de bens penhoráveis - para o pagamento da divida exequenda e acrescido e que a insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis não lhe possa ser imputável, a título de responsabilidade.

  6. Em consequência, o artigo 52°, n.° 4, da LGT deve ser lido da seguinte forma: “a administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido desde que em qualquer dos casos» de insuficiência económica ou inexistência de bens não haja responsabilidade do executado.

  7. Ainda que se admita - por mera cautela de patrocínio - a necessidade de preenchimento dos requisitos elencados no Acórdão recorrido, cumpre atentar às especificidades das regras de distribuição do ónus da prova em matéria tributária e, em consequência, ao âmbito de aplicação do artigo 170°, n ° 3, do CPPT.

  8. A existência de meios económicos, designadamente de bens susceptíveis de penhora, e a responsabilidade do executado na sua dissipação representa facto impeditivo do direito à dispensa de garantia, uma vez que coarctam o seu exercício.

  9. Nestes termos, o artigo 342°, n.° 2, do CC impõe que a sua prova pertença àquele contra quem a invocação do direito - que se pretende fazer valer - é feita.

  10. Em consequência, a prova da matéria de facto acima referida terá necessariamente de pertencer à Administração Tributária, entidade contra quem a recorrente invocou o seu direito à dispensa de garantia, nos termos do artigo 52°, n.° 4, da LGT.

  11. Caso o Tribunal ad quem discorde do entendimento exposto, sempre será de considerar que a falta de meios económicos, a insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis e a ausência de responsabilidade pela insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis - requisitos elencados no artigo 52°, n.° 4, da LGT - constituem factos negativos.

  12. A oneração da recorrente com os factos negativos supra expostos constitui uma situação de probatio diabolica, na medida, na medida em que a matéria em apreço não se baseia em quaisquer comportamentos empiricamente comprováveis, mas em omissões.

  13. Nestes termos, tal ónus - a admitir-se - será de difícil concretização por parte da recorrente, sendo altamente propenso a despoletar as consequências jurídicas decorrentes do seu incumprimento, in casu o indeferimento do pedido de dispensa de garantia.

  14. Perante o exposto, as regras de distribuição do ónus da prova em matéria fiscal, devem ser interpretadas e aplicadas com cautela, sob pena de desprotecção jurídica dos contribuintes.

  15. Assim sendo, sobre a recorrente não pode recair o ónus de provar tout court - de forma rígida - o preenchimento dos requisitos do artigo 52°, n.°4, da LGT.

  16. Na verdade, sobre a recorrente - na qualidade de executada impende o dever de alegar a factualidade em que alicerça o preenchimento de tais...

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