Acórdão nº 71/12 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelCons. Joaquim de Sousa Ribeiro
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 71/2012

Processo n.º 250/11

  1. Secção

Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é recorrente o Ministério Público e recorridos A., B. e C., S.A., foi interposto recurso obrigatório de constitucionalidade, ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão daquele Tribunal, na parte em que aplica a norma do artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações de 1999 (aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de setembro, e alterado, por último, pela Lei n.º 56/2008, de 4 de setembro), interpretada no sentido de ser indemnizável como solo apto para construção um terreno classificado em PDM como “Espaço Florestal” e “Espaço Agrícola” com aptidão edificativa segundo os elementos do n.º 2 do artigo 25.º do mesmo Código.

    O recorrente invoca, em síntese, que a dimensão normativa aplicada é idêntica à que anteriormente foi julgada inconstitucional nos Acórdãos n.ºs 417/2006 e 118/2007, proferidos pelo Tribunal Constitucional em processos de fiscalização concreta da constitucionalidade.

  2. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal Constitucional apresentou alegações onde conclui o seguinte:

    «VIII. Conclusões

    1. Por todo o exposto ao longo das presentes alegações, crê-se que se deverá confirmar o Acórdão recorrido, de 23 de fevereiro de 2011, do Tribunal da Relação de Coimbra, negando-se, nessa medida, provimento ao presente recurso de constitucionalidade.

      Com efeito, resulta claro dos autos que a parcela expropriada:

      1. se encontrava classificada, no Plano Diretor Municipal de Viseu, como “Espaço florestal 1” e “Espaço agrícola 1”, não integrando, por outro lado, tanto quanto se conseguiu apurar, nem a Reserva Agrícola Nacional (RAN), nem a Reserva Ecológica Nacional (REN);

      2. tem acesso por via pública em asfalto e é servida por rede de distribuição de energia elétrica e rede telefónica;

      3. encontra-se integrada no núcleo urbano de Cabanões de Baixo e Teivas existindo várias construções industriais e habitacionais a menos de 300m;

      4. apresenta, pois, aptidão construtiva aferida pela potencialidade, de acordo com os critérios objetivos constantes do art. 25, nº 2 do Código das Expropriações, assente em elementos de grande proximidade física, designadamente das infraestruturas atrás referidas;

      5. essa capacidade “aedificandi” foi reconhecida, pelo último grupo de peritos que interveio na avaliação do terreno, tendo tal posição merecido, depois, acolhimento, quer pelo tribunal de 1ª instância, quer pelo Tribunal da Relação de Coimbra:

      6. atendeu-se, para o efeito, ao disposto no nº 12 do Artigo 26º do C.E., com base na tipologia e ocupação médias das construções existentes ou que podem vir a existir, na área definida pelo perímetro de 300m da envolvente da parcela;

      7. o terreno expropriado foi, assim, classificado como “solo apto para a construção”, tendo, no entanto, os peritos tido em conta, especificamente, os índices de construção dos espaços designados por “Espaço florestal” e “Espaço agrícola”;

      8. a expropriação teve, por outro lado, em vista a edificação de uma construção no terreno que dela foi objeto, ou seja, do “Centro de Assistência e Manutenção” de Viseu, gerido por um concessionário de autoestrada, o que naturalmente extravasa da classificação anterior do solo como “Espaço florestal” ou “Espaço agrícola”.

    2. A fixação do montante indemnizatório, obtido por recurso ao art. 26º, nº 12 do Código das Expropriações, respeita o conceito de “justa indemnização” definido pelo art. 23º do mesmo Código, qual seja, o de “ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”.

    3. Respeita, também, da mesma forma, o sentido maioritário da jurisprudência deste Tribunal Constitucional, relativa ao conceito de “justa indemnização”.

      Com efeito, salvaguarda-se, por esta via, uma “adequada restauração da lesão patrimonial” sofrida pelos expropriados, atendendo-se ao valor de mercado do bem objeto de expropriação, por referência às infraestruturas e construções que lhe estão próximas.

      Alcança-se, assim, pela mesma via, uma “garantia de valor de troca” e de “equivalência de valores”, com “um mínimo de correspondência a referenciais de mercado na determinação do quantum indemnizatório”.

      E respeita-se, da mesma forma, o princípio de “colocar o lesado na situação económica em que estaria se não se tivesse verificado o evento que obrigou à reparação”, através do ingresso, na sua esfera, de “um valor pecuniário equivalente, de forma a repor a situação patrimonial afetada por essa perda”. Ou seja, “efetuada a expropriação, o seu património muda de composição, mas não diminui o valor”.

      Ora, tal só é possível se se atender à aptidão edificativa do terreno expropriado, uma vez que a expropriação representa, justamente, “a privação do valor económico correspondente, pelo que este tem que ser levado em conta no cálculo indemnizatório”.

    4. Constitui jurisprudência assente, deste Tribunal Constitucional, considerar que “a potencial aptidão para a edificabilidade dos terrenos situados fora dos aglomerados urbanos, deveria ser considerada «como um dos fatores de fixação valorativa, ao menos naquelas situações em que os respetivos bens envolvam uma muito próxima ou efetiva potencialidade edificativa»”.

      Potencialidade edificativa, essa, “evidenciada, no presente, por elementos certos e objetivos indiciadores da sua previsível concretização, num horizonte temporal próximo”.

      Sendo certo, por outro lado, que: “Por razões de certeza e de segurança, o legislador optou deliberadamente por uma enumeração taxativa dos elementos relevantes para evidenciação dessa capacidade, não deixando espaço para uma apreciação livre, por parte dos aplicadores, de verificação do padrão valorativo que está na sua base. Mas, ao fazê-lo, não descurou a perspetiva evolucionista, reconhecendo potencialidade edificativa também a terrenos que ainda não preenchem (ou não preenchem em pleno) as condições materiais de construção, no que se refere a acessibilidades e infraestruturas (cfr. as alíneas b), c) e d) do n.º 2 do artigo 25.º).”

      Acresce, que: “Compreende-se bem que a lei, em caso de expropriação, não coloque esses expropriados em situação significativamente pior do que a dos restantes, quando a possibilidade de construir, existente nos termos gerais, por os terrenos preencherem as respetivas condições, tenha sido retirada por instrumento de gestão territorial que lhes fixara outro destino, tido por mais conveniente ao interesse público. Se, com a expropriação, a afetação a esse fim deixa de vigorar, desaparece o único fundamento da proibição de construir, pelo que se justifica o afastamento do critério de cálculo indemnizatório aplicável aos terrenos que não gozam de edificabilidade.”

    5. A solução de se atender à potencialidade edificativa do terreno expropriado, também não se apresenta como violadora do princípio constitucional da igualdade, designadamente “na relação externa de expropriação”, que procura refletir “uma ideia de igualdade entre os cidadãos, quando um destes é diretamente afetado pela atribuição individualizada de um custo da prossecução do interesse público, não repartido equitativamente pelos restantes colocados na mesma posição de partida do afetado”.

      Com efeito, “num Estado de Direito, tem que haver igualdade de tratamento, designadamente perante os encargos públicos. Por isso, a desigualdade imposta pela expropriação tem que compensar-se com o pagamento de uma indemnização que assegure “uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelo expropriado”.

      Desta forma, a indemnização proposta visa, apenas, “restabelecer a igualdade perdida, colocando o expropriado na precisa situação em que se encontram os seus concidadãos que, tendo bens idênticos, não foram atingidos”, o que pressupõe a necessidade de reconhecimento da aptidão edificativa do terreno expropriado, para efeitos indemnizatórios.

      Tanto mais que a expropriação tem, por objetivo principal assegurar, como se disse, a edificação de uma construção no mesmo terreno.

    6. E a mesma expropriação terá, naturalmente, de atender, ainda, às expectativas legítimas dos expropriados, na medida em que “a proximidade até 300 m de áreas de construção, ou onde seja possível construir, pode implicar expectativas de valorização fundiária, a curto, médio ou longo prazo, expectativas estas que são definitivamente cortadas ao expropriado com a ablação do direito de propriedade, contrariamente ao não expropriado que mantém intactas essas expectativas”.

      Assim, “ao atender-se, na procura de um valor justo para a compensação do sacrifício decorrente da expropriação à extinção de expectativas (que, note-se, persistem incólumes relativamente ao não expropriado), estar-se-á ainda a realizar a justiça entre expropriados e não expropriados”.

      Por outras palavras, “corresponde a um imperativo de justiça, no momento em que, com a expropriação para outro fim, fica sem efeito a adstrição resultante da classificação administrativa, não considerar o terreno, sem mais, como inapto para construção, por único efeito dessa classificação”.

      Ou, ainda: “Não se exclui que as expectativas de alteração do estatuto do terreno em causa, no sentido da aquisição de aptidão construtiva, sejam contabilizáveis como uma componente da perda sofrida pelo expropriado. Só na medida que se atende a elas é dispensado um tratamento igualitário a expropriados e não expropriados. Isto porque o ato expropriativo fez malograr definitivamente o benefício que para o expropriado resultaria da concretização futura dessas...

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