Acórdão nº 151/11 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução23 de Março de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 151/2011

Processo n.º 488/08

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

    Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

    I Relatório

    1. Na sequência do agravo interposto do despacho que, nas Varas Cíveis de Lisboa, indeferiu parcialmente a reclamação da conta de custas, a Relação de Lisboa confirmou tal decisão, negando do mesmo passo procedência à questão de inconstitucionalidade – orgânica e material – suscitada pelas recorrentes quanto à norma do artigo 13.º do Código das Custas Judiciais em conjugação com a tabela anexa a este Código, e do artigo 17.º, n.º 2, alínea b) do mesmo diploma, mediante a alegação de que a taxa de justiça aplicada se traduzia num verdadeiro imposto, para cuja aprovação faltaria a necessária autorização legislativa. Além disso, as normas em causa violariam os princípios da proporcionalidade e da igualdade, pelo que seria materialmente inconstitucionais.

    2. É desta decisão que as recorrentes interpõem recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC), nos seguintes termos:

    “(…)As aqui recorrentes pretendem ver apreciada a inconstitucionalidade orgânica do artigo 13.º do CCJ e da tabela a que o mesmo artigo se refere (publicada pelo DL n.º 323/2001 de 17/12) e ainda do artigo 17.º, n.º 2, al. b) do CCJ.(…)

    As recorrentes pretendem (…) ver apreciada a inconstitucionalidade material do artigo 13.º do CCJ e da tabela a que o mesmo artigo se refere (publicada pelo DL n.º 323/2001 de 17/12) e ainda do artigo 17.º, n.º 2, al. b) do CCJ.

    A questão da inconstitucionalidade das normas supra referidas foi suscitada pela primeira vez nestes autos na Reclamação apresentada pelas Recorrentes contra a conta de custas de fls. 2079 e seguintes.

    A referida arguição de inconstitucionalidades foi apreciada no despacho proferido pelo Tribunal de 1.ª instância a fls. 2179 e seguintes dos autos, que decidiu indeferir a referida arguição.

    Deste despacho interpuseram as recorrentes recurso de agravo para o Tribunal da Relação de Lisboa que, quanto a esta questão, confirmou o despacho recorrido. (…)”

    3. Admitido recurso, as partes foram convidadas a alegar. As recorrentes apresentaram a sua alegação e concluíram:

    “(…)1ª O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu, por Acórdão proferido a 6 de Maio de 2008, não julgar inconstitucionais os artigos 13º (e respectiva tabela anexa, aprovada pelo Decreto-lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro) e 17º, n.º 2, al. b) do Código das Custas Judiciais aprovado pelo Decreto-lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro (doravante CCJ), cuja aplicação nos presentes autos conduziu ao apuramento de uma conta de custas que ascenderá (nos termos decididos neste aresto) a € 390.369,89. No entanto,

  2. É inequívoco que estamos perante um montante manifestamente desproporcionado para uma acção em que (i) houve desistência parcial do pedido ainda antes do saneamento do processo e (ii), no pedido que prosseguiu, as Recorrentes obtiveram ganho parcial de causa.

  3. As Recorrentes suscitaram a questão da inconstitucionalidade orgânica dos artigos 13º e da tabela a que o mesmo artigo se refere (publicada pelo DL nº 323/2001, de 17/12) e 17º, n.º 2, al. b) do CCJ, por considerarem que a taxa de justiça aplicável ao caso dos autos, não reveste a natureza, verdadeira e própria, de “taxa”, mas sim de “imposto”, como tal devendo ser tratada. Contudo,

  4. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa julgou não padecerem as referidas normas de inconstitucionalidade orgânica.

  5. Não ignoram as Recorrentes que já por diversas vezes foi este Alto Tribunal chamado a pronunciar-se sobre a inconstitucionalidade orgânica de diversos preceitos do CCJ – designadamente com fundamento em que, ao menos a partir de certo montante, a taxa de justiça deverá ser tratada, designadamente para efeitos de constitucionalidade, como um verdadeiro imposto –, tendo sempre concluído pela constitucionalidade dos mesmos. Porém,

  6. Estando perante um caso de fiscalização concreta da constitucionalidade, haverá que se aferir se, no caso concreto, a interpretação e aplicação do art. 13º (e respectiva tabela anexa) e do art. 17º, n.º 2, al. b), ambos do CCJ, está ou não ferida de inconstitucionalidade.

  7. A taxa de justiça tem sido entendida como uma verdadeira taxa por corresponder, conceptualmente, a um pagamento que pressupõe a contraprestação de um serviço por parte do Estado. Ou seja,

  8. Enquanto o imposto tem estrutura unilateral, por não corresponder a qualquer contraprestação por parte do Estado, a taxa tem carácter sinalagmático, decorrente do pagamento de um correspectivo pela prestação de um serviço, tendo, todavia, que existir proporcionalidade (ainda que não rigorosa) entre o serviço prestado e o seu custo. De facto,

  9. Tem este Tribunal expressamente reconhecido que é fundamental para a caracterização de um tributo como taxa que não exista uma desproporção intolerável, ou flagrante, entre o serviço prestado e o seu custo ou utilidade que do mesmo resultou para o particular.

  10. Ainda que se não exija uma equivalência económica rigorosa entre o serviço prestado e o custo cobrado, o valor a pagar não pode ser completamente alheio ao custo daquele serviço concretamente prestado, sob pena de se afectar irremediavelmente a correspectividade que a relação sinalagmática pressupõe — o que, como melhor se verá, acontece manifestamente no caso dos autos.

  11. A conta de custas apurada nos presentes autos resulta num valor intoleravelmente desproporcional ao serviço prestado, colocando em causa a consideração da taxa de justiça como verdadeira taxa. Assim é que,

  12. Considerando, por exemplo, a taxa de justiça devida pela transacção de fls. 1282, temos que num processo em que os autores desistiram dos pedidos ainda antes de proferido o despacho saneador (ou seja, sem qualquer intervenção judicial e praticamente nenhuma da secretaria, já que nada mais do que a produção de articulados se havia ainda passado) é devida taxa de justiça no montante de €187.414,57 !!

  13. E considerando o pedido de indemnização por danos não patrimoniais que prosseguiu contra A-, as Recorrentes, que viram reconhecido o direito à indemnização quer na 1ª Instância, quer no Tribunal da Relação, embora não o montante indemnizatório pretendido, são condenadas a pagar em custas cerca de três vezes o montante que o Dr. A. foi condenado a pagar à B. a título de indemnização por danos não patrimoniais!!

  14. As custas totais da responsabilidade das Recorrentes são, não só totalmente injustas do ponto de vista substancial, como totalmente desproporcionadas ao serviço prestado pelo sistema judicial nesta acção, e nem mesmo a redução do artigo 17º nº 2 al. b) do CCJ, no que à transacção de fls. 1282 respeita, repõe a necessária proporcionalidade e adequação entre serviço e custo/utilidade do mesmo para as Recorrentes.

  15. Esta desproporção radica no facto de as custas judiciais serem calculadas exclusivamente a partir do valor da acção, aumentando directamente em função dele, à ratio de “x” unidades de conta por “y” aumento do valor da causa (de acordo com o estabelecido na Tabela a que se refere o artigo 13º do CCJ), sem qualquer limite máximo e sem qualquer desagravamento gradual da taxa aplicável na medida do aumento do valor da causa. Pelo que,

  16. Pelo menos a partir de certo montante, o aumento da taxa de justiça em função do aumento do valor da causa deixa de corresponder ao serviço prestado pelo Tribunal, prejudicando obrigatoriamente o carácter bilateral da taxa e o necessário juízo de proporcionalidade entre o...

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