Acórdão nº 01115/08.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Abril de 2012
Magistrado Responsável | Jos |
Data da Resolução | 20 de Abril de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório EP - Estradas de Portugal, SA - com sede na Praça da Portagem, Almada - recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto – em 29.11.2010 – que a condenou a pagar a F. … a quantia de 9.234,06€, sendo 8.074,06€ para indemnizar os danos patrimoniais e 1.160,00€ a título de compensação pelo dano de privação do uso do veículo - a sentença recorrida culmina acção administrativa comum, sob a forma ordinária, em que a ora recorrida F. … demanda a ora recorrente EP pedindo ao TAF, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual, que condene a entidade ré a pagar-lhe precisamente as quantias em que terminou condenada.
Conclui assim as suas alegações: 1- Há várias partes da gravação que são imperceptíveis, sendo certo que, tendo o julgador assentado a decisão sobre a matéria de facto nos testemunhos prestados, é nula a decisão que assim foi proferida; 2- Uma grande parte do depoimento de MC. … está imperceptível na gravação feita, sendo que a decisão do tribunal recorrido relativa ao quesito 37, que o julgou não provado, assentou nos documentos e nos depoimentos precisamente das testemunhas MC. … e JC. …; 3- Além disso, a gravação apresenta ruído de fundo muito intenso, sendo que algumas vezes é mais fácil ouvir o programa de rádio da estação sintonizada do que o depoimento que é prestado; 4- Não é perceptível grande parte do depoimento relativamente aos factos relacionados com a existência de um outro acidente no mesmo local, invocado pela ré, e a análise que é feita, neste depoimento [da testemunha MC. …], das duas participações juntas aos autos; 5- Assim, e concretamente quando a testemunha MC. … [no gravador utilizado pela signatária inicia o depoimento à rotação 338] se pronuncia sobre o local onde se terá dado o sinistro, o local onde se encontrava o new jersey em causa e ainda o local onde se terá dado o sinistro com o camião [que correspondem às rotações 676, 684, 688, 690, 692, 700, 702, 703 - não se percebe a resposta dada desde logo sobre qual será a participação correcta - 720, 724 e sobretudo 737]. Além disso, não se ouve o que é dito quando a testemunha em causa é confrontada com o quilómetro a que se terá dado o sinistro, isto porque não se consegue ouvir com certeza aquilo que é respondido; 6- Assim como também, quando [rotação 766 da mesma], é questionada a mesma testemunha sobre a dinâmica do acidente, não se consegue perceber a sua resposta, nomeadamente não se percebe se o acidente se deu no local da imobilização, ou mais atrás, sendo que se trata de matéria determinante para decidir sobre a localização do objecto em alegada saliência [separador central] e a coincidência ou não deste local com o local do acidente que a demandada alega ter ocorrido momentos antes; 7- Atendendo a que a decisão sobre a matéria de facto assentou em testemunhos gravados, cuja gravação está imperceptível em largos momentos da mesma, e atendendo ainda a que esta decisão foi determinante para a qualificação jurídica dos factos, porque assentou em prova irregular, nessa medida deverá haver-se por nula, devendo ordenar-se a repetição do julgamento e sua gravação, o que se requer seja decidido por esse Tribunal Superior; 8- Cautelarmente, e para o caso de se entender que a decisão recorrida não enferma da nulidade invocada, deverá ela ser alterada por esse Tribunal ad quem porquanto não só existem nos autos elementos bastantes que determinam uma decisão contrária à da sentença recorrida, como ainda não foi feita prova de factualidade que é determinante para que a decisão de condenação pudesse ser proferida com legalidade; 9- O tribunal recorrido deu como provado que o veículo envolvido fosse da autora, sendo certo que tratando-se de prova do direito de propriedade, a qual apenas de faz por meio de documento autêntico, não tendo sido apresentado nenhum documento que ateste a propriedade da autora relativamente ao veículo em causa, nem resultado provado por qualquer outro meio aquela propriedade, não pode a mesma assumir-se como titular do direito à indemnização. Não foi feita prova documental da propriedade do veículo a favor da autora, sendo que o direito à indemnização pelos danos, alegadamente produzidos na sequência do alegado despiste e subsequente embate, compete ao proprietário do veículo; 10- Não poderá a ré ser chamada a responder civilmente, pagando uma indemnização a quem invoca um direito mas não comprova que o mesmo lhe pertence, por não se poder considerar demonstrado que este sofreu danos. Não pode, como tal, dar-se como provado o quesito 1º na parte em que diz que “a autora conduzia o seu veículo automóvel ligeiro de mercadorias …” [sublinhado nosso]; 11- Também relativamente ao quesito 3º há depoimentos gravados que contrariam a decisão tomada pelo julgador recorrido. Entendeu o tribunal a quo que era um dia chuvoso e que o trânsito era intenso. Contrariamente ao que foi referido pelo tribunal, os depoimentos são coincidentes na fluidez do trânsito e na ausência de trânsito intenso na altura que se deu o sinistro, sendo que o único testemunho da intensidade do trânsito justifica o mesmo com o acidente da autora; 12- Da mesma forma, deverá julgar-se de maneira diferente o quesito 36º, e os quesitos 6º a 11º. Relativamente ao quesito 36º, são vários os depoimentos que referem que o acidente se deu numa recta, ou seja na conhecida recta de Coimbrões. Não poderá o julgador admitir que o sinistro se tenha dado numa curva, podendo somente dar como provado que o local era de boa visibilidade, já que se localizava no final de uma longa recta, pelo que também neste aspecto deverá reformular-se a resposta dada ao quesito, no sentido de ficar claro que o local representava o final de uma recta com boa visibilidade; 13- Quanto à dinâmica do acidente, a que correspondem os quesitos 6º a 11º, de nenhum dos depoimentos prestados resulta que alguma das testemunhas tenha presenciado o sinistro. A única testemunha que diz que viu o acidente refere que o que viu foram os carros a desviar-se, referindo expressamente que “não viu ela [a autora] a bater”, insistindo que ia 2 ou 3 carros mais atrás, e não reparou se a autora bateu noutros carros ou não. Daí que não possa o julgador dar como provado que o separador central de cimento estava saído para a via, ocupando parte da faixa de rodagem em que a autora seguia, provocando uma alteração da trajectória, que em consequência do surgimento inesperado e imprevisível do separador central de cimento saído para a via, a autora se viu forçada a fazer um desvio de trajectória de forma brusca e súbita, do qual resulta que o veículo entrasse em despiste e fosse embater de forma violenta no separador central e finalmente que, em consequência do embate o veículo da autora rodou sobre o seu eixo, imobilizando-se na via de trânsito em sentido inverso ao da via; 14- Não se pode aceitar de maneira nenhuma que um desvio de um palmo, que é de poucos centímetros, represente uma ocupação de parte da faixa de rodagem e por isso provoque uma alteração da trajectória; 15- O desvio em causa, num new jersey colocado no separador central localizado no final de uma recta, não pode deixar de ser perceptível a um condutor prudente e avisado, como a autora deveria ser, condutor que conhece o percurso, já que o faz diariamente, que não pode deixar de conhecer que atentas as condições atmosféricas que se faziam sentir, devia conduzir com redobrada prudência e a velocidade mais reduzida do que a que empregou na condução em causa; 16- Daí que, não só não aceita o recorrente que a constante dos quesitos 6 a 11 e 36 sejam dados como provados porquanto dos depoimentos gravados não resulta nem que o desvio do separador seja causador de alteração de trajectória, nem sequer que o acidente se tenha dado numa curva, mas sim no final de uma recta, facto este que releva para a qualificação do local do sinistro, desde logo no que respeita à localização do new jersey em causa; 17- A alteração pretendida da decisão da matéria de facto é em si mesma determinante para que se altere a condenação final, não só mas também, porque não permite o preenchimento dos requisitos da responsabilidade civil; 18- Acontece que a presunção de culpa da ré foi desde logo afastada pela prova que fez das actividades de fiscalização, de manutenção e conservação que desencadeia diariamente na via em causa, tendo-se demonstrado, e claramente, que o desvio do new jersey não podia ter sido provocado senão por um embate violento de um veículo pesado - o que confirma a versão da recorrente que alega a ocorrência de um sinistro anterior com um camião que desviou o new jersey que foi posteriormente colocado no sítio pela testemunha [JC. …] - e que o fez com notória celeridade; 19- Assim sendo, como é, provada que foi a rapidez no restabelecimento do separador nas condições anteriores ao desvio, provada que foi a fiscalização diária da via em causa pela ré, provada ainda que foi a inexistência de qualquer outro registo de acidente no local, para além do camião que foi reportado e pela ré resolvido no mesmo início de manhã, não pode deixar de ser demonstrado que a ré cumpriu com os deveres de vigilância que legalmente lhe eram impostos, e que só por facto fortuito, associado à imperícia da condutora, se deu o acidente invocado; 20- Daí que não só tenha o ora recorrente logrado afastar a presunção de culpa, como ainda a autora não logrou estabelecer o nexo causal entre os danos sofridos e o facto ilícito; 21- O desvio existente não era de sorte a provocar alteração de trajectória do veículo conduzido pela autora, caso ela conduzisse o mesmo com a necessária prudência e cautela que se impunham não só em condições climatéricas normais como ainda e sobretudo em condições adversas, como aquelas que se faziam sentir à data, tanto mais que se tratava de local de boa visibilidade, não...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO