Acórdão nº 01061/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelVALENTE TORRÃO
Data da Resolução12 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I.

“A………, SA”, com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF do Porto que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação adicional de sisa, no montante de 13.966,34 euros, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: 1ª) - Discordando da liquidação de Sisa que foi efectuada, impugnou a recorrente tal liquidação, pois que entendeu que inexistia qualquer fundamento legal para que no caso em apreço se tivesse considerado ter ocorrido caducidade da isenção de sisa, de que beneficiava em virtude de ter adquirido quinhão de prédio urbano com destino a revenda.

  1. ) - Para estribar a sua tese, invocou então a ora recorrente que no prazo legal de três anos havia transmitido o dito quinhão, pois que havia ajustado contrato promessa de compra e venda, por força do qual transmitiu a posse do prédio urbano identificado nos autos.

  2. ) - Pelas razões constantes da Douta Sentença proferida em Primeira Instância, não foi porém acolhida a tese da impugnante.

  3. )- Posto que a matéria de facto em apreço nos autos é incontrovertida, importa pois unicamente saber e decidir se o invocado contrato promessa de compra e venda acompanhado da tradição da coisa, equivale ou não, a uma verdadeira transmissão.

  4. ) - Ora, entende a recorrente que a resposta terá de ser positiva.

  5. ) - Com efeito, de acordo com o preceituado no n° 3 do art° 11, do CIMSISSD, ficariam isentas de sisa, entre outras, as aquisições de prédios destinados a revenda no âmbito do exercício da actividade comercial dos adquirentes, sendo certo que, tal isenção caducaria, caso o adquirente desse destino diferente ao prédio assim adquirido, ou caso tal prédio adquirido para revenda não fosse transmitido no prazo de três anos.

  6. ) - Por seu turno, definindo a incidência do imposto em apreço, estipulava-se, no art° l do diploma legal em causa, que " são sujeitas a sisa e a imposto de sucessões e doações nos termos dos artigos seguintes, as transmissões perpétuas ou temporárias dos bens, qualquer que seja o título porque operou", sendo que, 8ª) - de acordo com o art° 2 do CIMSISS, "a sisa incide sobre as transmissões a título oneroso, do direito de propriedade, ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis", adiantando-se, também, no primeiro parágrafo desse normativo que "consideram-se, para estes efeitos, transmissões de propriedade imobiliária, as promessa de compra e venda ou troca de bens imobiliários, logo que verificada a tradição para o promitente comprador ou para os promitentes permutantes, ou quando aquele ou estes, estejam usufruindo dos bens"'.

  7. ) - Conforme decorre dos normativos em referência, e conforme é, aliás, plenamente reconhecido pela Doutrina e Jurisprudência, o conceito de transmissão para efeitos de lei fiscal, é diverso daquele que decorre do ordenamento jurídico ínsito à Lei Civil, sendo certo que, para efeitos fiscais, tal conceito é mais amplo e abrangente do que aquele que está enraizado no Direito Privado.

  8. ) - Concretamente, é sabido que, em tese geral, e em concreto, em tese de Sisa, a figura da transmissão compreende não só a transmissão civil, como também a mera transmissão económica ou transmissão de facto, mesmo que despidas das formalidades exigíveis por lei.

  9. ) - A diversidade de conceitos, entre a Lei Privada e a Lei Fiscal, alcança o seu expoente máximo, na consagração de determinados actos como transmitivos de propriedade, que como tal, não são considerados pela lei civil.

  10. ) - É o caso paradigmático do contrato promessa de compra e venda acompanhado da tradição do bem, que não sendo um acto transmitivo de propriedade para a lei civil, já o é, para a lei fiscal, tal como se alcança, aliás, pelo disposto no ponto segundo do parágrafo primeiro do artigo segundo do CIMSISSD.

  11. ) - Ora, por força dessa circunstância, é que se deverá concluir que, se entende a lei fiscal que tal tradição da coisa se equipara a uma verdadeira transmissão de propriedade, para efeitos de incidência do Imposto de Sisa, também se deverá entender tal acto ou facto tributário como acto transmitivo da propriedade para efeitos de manutenção da isenção de Sisa que previamente havia sido concedida.

  12. )- Com efeito, não poderá a lei fiscal para efeitos de tributar o promitente adquirente, ficcionar que, nos casos em que existe contrato promessa de compra e venda, com tradição da coisa, ocorre uma verdadeira transmissão, e ao mesmo tempo, para efeitos de determinar a caducidade do benefício da isenção do imposto de sisa, entender que tal transmissão afinal não se verifica, ignorando os efeitos que a própria lei fiscal confere ao dito contrato promessa de compra e venda, já que, o facto tributário ou real, em si, qual seja, a tradição da coisa, não perde a sua relevância, consoante se estiver a tratar de tributação ou isenção de tributação.

  13. ) - Na verdade, sendo certo que a lei fiscal se reveste de especialidade própria, é também inquestionável que em sede de interpretação e integração das normais fiscais, se não pode esquecer os comandos informadores da lei geral, no que tange à aplicação das normas, e dentro de tais princípios, não se pode olvidar o princípio da unidade do sistema jurídico, e da necessidade da sua coerência e objectividade.

  14. )- Com efeito, sendo certo que se aceita a diversidade de conceitos entre a lei civil e a lei fiscal, já não se poderá aceitar que dentro dessa mesma lei fiscal, os conceitos divirjam, em termos de qualificação, de determinadas realidades, unicamente por razões de se pretender obter um, ou outro efeito, pois que, admitir-se tal, seria admitir, a total destruição dos princípios da objectividade, clareza e segurança jurídicas.

  15. )- Quer isto dizer que, a nossa lei fiscal ao deformar o conceito de transmissão tal qual ele é definido no direito privado, e ao considerar equiparado à transmissão do direito de propriedade, a outorga do contrato promessa de compra e venda, acompanhado da tradição do bem, e da transmissão da posse, tem de o fazer de forma plena e coerente, e consequentemente, tem de recepcionar tal deformação conceituai quer para efeitos de incidência de Sisa, quer para efeitos de apuramento das circunstâncias que conduzem ou não à caducidade da isenção de sisa anteriormente concedida, 18ª) - devendo então, concluir-se que, se a lei fiscal considera, na perspectiva do promitente comprador, que a outorga do contrato promessa de compra e venda acompanhado da tradição da coisa se equipara a uma verdadeira transmissão, obrigando o promitente comprador a liquidar o imposto sobre tal transmissão, também terá de considerar esse mesmo acto como transmissão, desta feita, para reconhecer, já na perspectiva do promitente vendedor, que este revendeu ou retransmitiu o prédio dentro de três anos, podendo assim beneficiar da isenção de sisa anteriormente concedida.

  16. ) - Aliás, tanto assim é que, para efeitos de incidência doutros impostos, e tendo em conta a mesma realidade, reconhece a lei fiscal a tal transmissão por via do ajuste de contrato promessa com tradição da coisa, o valor e o significado de uma verdadeira transmissão formal.

  17. ) - De facto, a própria lei fiscal a partir do momento da outorga do contrato promessa em análise considera o promitente adquirente como o titular dos rendimentos do prédio objecto de tal contrato, razão pela qual, para além de o obrigar a liquidar Sisa, ou actualmente, IMT, o obriga, também, a partir de tal momento, a liquidar, a anterior Contribuição Autárquica, e o actual IMI, sendo que, por seu turno, a nossa lei fiscal, a partir do ajuste de tal contrato, deixa de considerar o promitente vendedor, como titular dos rendimentos do prédio prometido vender, deixando assim de sobre ele incidir a obrigação de liquidar o correspondente IMI.

  18. ) - Assim, também por esta ordem de razões, e sob pena de notória violação do princípio da unidade do sistema jurídico, e sob pena ainda de total incoerência lógica do sistema fiscal, não se poderá aceitar que um acto ou realidade, seja considerado transmissão para efeitos de IMI, e já não o seja unicamente para efeitos de facto impeditivo da caducidade da isenção de sisa.

  19. ) - Acresce que, atenta a própria natureza do imposto em causa, a isenção da liquidação ou pagamento de Sisa, nas situações de aquisição para futura revenda, tem por fundamento a circunstância de reconhecer o legislador que o sujeito adquirente não pretende incluir o bem no seu património imobilizado, ou no seu acervo patrimonial, mas sim pô-lo em circulação comercial, sendo por isso mesmo que na escrituração comercial respectiva tais bens integram o activo circulante.

  20. )- Ora, é indubitável que a outorga de contrato promessa de compra e venda, com pagamento integral do preço, e com transmissão da posse do bem em causa, é um sinal evidente de que o...

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