Acórdão nº 743/2001.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Nesta acção declarativa de condenação com processo ordinário, que a AA, SA, propôs contra BB e mulher CC, pede a autora que (i) seja confirmada e declarada a resolução do contrato promessa celebrado entre as partes, em 21/08/2000 e que (ii) sejam os réus condenados a pagar-lhe a quantia de 60.000.000$00, correspondente ao dobro do sinal prestado pela autora, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo pagamento.

Fundamentando a sua pretensão, alega, em síntese, que autora e réus celebraram um contrato-promessa de compra e venda, em que a primeira prometeu comprar e os segundos prometeram vender os prédios e demais bens identificados na petição inicial, tendo a autora entregue aos réus, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de 30.000.000$00. Entretanto, os réus incumpriram o referido contrato, tendo vendido a terceiros os bens objecto do contrato.

Os réus contestaram, alegando, em síntese, que as partes acordaram em que as escrituras de compra e venda deveriam ser outorgadas em simultâneo e impreterivelmente até 15/10/2000, o que se traduziu na fixação de um prazo absolutamente fixo, sendo que a autora começou por pretender condicionar a referida outorga à obtenção de financiamento, o que os réus não aceitavam, tendo no entanto concordado que as escrituras fossem outorgadas até 31/12/2000, desde que a autora procedesse a um reforço do sinal até 7/11/2000, o que a mesma não fez, tendo, nessa data, remetido aos réus uma carta em que, a certa altura, diz que estavam livres para, a partir de então, negociarem com terceiros.

Concluem pela improcedência da acção e pedem a condenação da autora como litigante de má-fé.

A autora replicou, tendo-se os réus oposto, com o fundamento de que se não tinham defendido por excepção.

Esse articulado veio a ser admitido preliminarmente ao despacho saneador, decisão de que os réus agravaram.

Saneado, instruído e julgado o processo, foi proferida sentença que absolveu a autora do pedido de condenação como litigante de má-fé e, na parcial procedência da acção, condenou os réus a devolverem à autora a quantia de 150.000 euros, correspondente aos 30.000.000$00 que dela haviam recebido a título de sinal.

Desta decisão apelaram a autora e os réus, o que arrastou a subida do agravo, vindo a ser proferido o acórdão de fls. 865/872 que, conhecendo, em primeiro lugar, do agravo, julgou o recurso procedente, ordenando o desentranhamento da réplica e anulando, consequentemente, todo o processado bem como todos os actos que se seguiram ao despacho que admitiu o referido articulado, ordenando, ainda, que, na elaboração da condensação, se tivessem, apenas, em conta os factos articulados na petição inicial e na contestação, seguindo-se os demais termos até final.

Do referido acórdão veio a ser interposto recurso que, embora recebido, veio a ser considerado inadmissível no Supremo Tribunal de Justiça.

Cumprindo-se o decidido no acórdão da Relação, foi convocada a audiência preliminar, tendo a autora oferecido o articulado de fls. 1046/1049 concretizando a matéria de facto, alegada nos artigos 9º e 10 da petição inicial, ao que os réus se opuseram, ao mesmo tempo que, por sua vez, ofereceram o articulado de fls. 1051/1066, concluindo dever proferir-se, desde logo, saneador-sentença, tendo a autora respondido, no sentido de que esta pretensão devia ser julgada improcedente, o que foi objecto de contra-reposta por parte dos réus.

Tentada e frustrada a conciliação das partes, foi apreciado o articulado de fls. 1046/1049, concluindo-se pela sua inadmissibilidade, o que motivou a interposição de recurso de agravo por parte da autora.

Seguiu-se a prolação do saneador e, considerando não poder conhecer-se, desde logo, do mérito da causa, a selecção da matéria de facto assente e controvertida com a organização, quanto a esta última, da base instrutória, de que reclamaram ambas as partes, tendo, porém, sido desatendidas.

Instruído o processo, teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida a sentença, julgando a acção improcedente e absolvendo os réus do pedido. Outrossim foi julgado improcedente o pedido de condenação da autora, como litigante de má-fé.

Inconformada com esta decisão, apelou a autora para a Relação, tendo este recurso arrastado consigo o de agravo.

Foi, então, proferido o douto acórdão de 29/11/2011, que julgou improcedente o recurso de agravo e improcedente também a apelação, confirmando a sentença.

De novo inconformada, a autora recorre para o Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formula as seguintes conclusões[1]: 1ª - A audiência preliminar, no caso concreto, foi convocada pela Sr.ª Juiz de Direito com os fins previstos no artigo 508º - A n.

os 1 e 2 do Código de Processo Civil.

3ª - Se o Tribunal da Relação de Évora decidiu que a contestação dos réus nestes autos não tinha matéria de excepção e a autora não podia replicar, tal está definitivamente decidido e tudo o que se passou após a contestação foi anulado, ou seja, é como se nunca tivesse acontecido.

4ª - Ora assim sendo, em face do alegado pela autora, ora recorrente, na sua petição inicial, é necessário concretizar matéria de facto que aí foi alegada, nomeadamente nos artigos 8° e 9°. Na verdade, desses artigos consta a seguinte matéria: “8º - Os réus tinham conhecimento, desde o início das negociações, que a autora iria recorrer a um financiamento bancário para poder comprar os bens do contrato-promessa.

  1. - Por razões alheias à vontade da autora, surgiram dificuldades na obtenção do financiamento bancário, indispensável à outorga das escrituras prometidas, dificuldades a que os réus não foram totalmente alheios, e que vieram a inviabilizar, efectivamente, o referido financiamento”.

    5ª - Ao convocar a audiência preliminar, não se pode vedar a complementação da matéria de facto alegada.

    A alegação feita pela autora necessita de ser concretizada ou complementada. Assim: 1º - Os réus sabiam desde o início que a autora iria recorrer a um financiamento bancário para poder comprar os bens do contrato-promessa no montante de 250.000.000$00 (duzentos e cinquenta milhões de escudos); 2º - Uma vez que os réus não quiseram declarar o valor real das compras e vendas 300.000.000$00 (trezentos milhões de escudos); 3º - E por causa disso; 4º - A autora não conseguiu obter o financiamento bancário indispensável à outorga das escrituras prometidas, uma vez que precisava de um valor de financiamento superior ao montante que os réus estavam dispostos a declarar nas escrituras; 5º - Sendo que o que inviabilizou o respectivo financiamento foi o facto de os réus não quererem declarar o valor real das vendas.

    7ª - A causa de pedir desta acção não será alterada se for admitido o articulado a aperfeiçoar a petição inicial que a autora atravessou nos presentes autos na audiência preliminar. A causa de pedir na presente acção é: com a actuação e conduta que os réus adoptaram, estes impossibilitaram que a autora cumprisse o contrato-promessa que celebrou com os réus, ao mesmo tempo que estes incumpriram o contrato-promessa celebrado com a autora.

    8ª - Ao admitir-se que os factos alegados no artigo 8° e 9° da petição inicial necessitam de ser concretizados, não é nem será por causa de existir uma decisão de um Tribunal Superior a não admitir a réplica que a autora poderá se impedida de concretizar a matéria factual alegada deficientemente nos artigos 8° e 9° da sua petição inicial, bem como essa concretização dos artigos 8° e 9° não pode ser entendida como sendo uma alteração da causa de pedir.

    A autora não altera a causa de pedir com a concretização que pretendia fazer até porque todos os factos que por si foram alegados na petição inicial não são extravasados, desde que melhor concretizados. E isto independentemente do preço das compras e vendas que os réus acabam por reconhecer ser de 300.000.000$00, quando transcrevem uma carta que foi endereçada ao réu pelo legal representante da autora.

    9ª - Sentenciou-se que, perante a declaração da autora, (onde, em síntese, se julga que se atribui à autora que esta queria concretizar o negócio mas que essa declaração não deixa dúvidas quanto ao não cumprimento do negócio, nos exactos termos prometidos, tendo a autora sugerido aos réus a venda de bens a terceiros, caso surgisse a oportunidade de venda), esta teria emitido uma declaração onde a mora se teria convertido em incumprimento definitivo.

    10ª - O escrito que foi julgado como uma declaração de incumprimento do contrato contém uma declaração onde a autora diz não ter capacidade de obter o dinheiro que necessita, na banca, para poder pagar o preço, atenta a divergência dos valores existentes, ou seja, o valor declarado e o valor real das compras e vendas prometidas. É só isso que se diz e nada mais.

    13ª - A declaração à contraparte que o devedor não tenciona cumprir o contrato, para que signifique o anúncio de um verdadeiro incumprimento, é necessário que seja ilícita ou que a impossibilidade não esteja conexionada com eventos que nos remetam para a zona da repartição do risco contratual e que é delimitada em geral pelos artigos 795º e 796º do Código Civil. No mínimo impunha-se que fosse averiguada a diferença de preços pois se no contrato-promessa junto com a petição inicial se estabelece um valor de 162.540.000$00 para as compras e vendas prometidas como é que no documento que os réus juntam e que foi apelidado de declaração antecipada de não cumprimento está um valor de 300.000.000$00? O abuso de direito é conhecido oficiosamente e não foi.

    16ª - A declaração da autora diz que não pode pagar no prazo contratado mas diz que paga tudo e que quer cumprir com o contrato.

    Não é uma manifestação intencional, pessoal e unilateral, suficientemente clara, unívoca e séria de modo a que provoque nos credores ou réus a certeza de que a autora não iria cumprir o contrato.

    19ª - Não pode interpretar-se a declaração que se atribui à autora como sendo uma...

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