Acórdão nº 0486/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Março de 2012

Data13 Março 2012
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A……, magistrada do Ministério Público com a categoria de procuradora adjunta, com os demais sinais dos autos, instaurou a presente acção administrativa especial contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, pedindo a anulação da deliberação do Plenário desse Conselho, datada de 19 de Fevereiro de 2010, que indeferiu a sua reclamação e confirmou a deliberação da Secção, datada de 20 de Novembro de 2010, que lhe atribuiu a classificação de «Medíocre».

Alega para o efeito e, em síntese, que o objecto de inspecção respeita ao serviço, por si prestado, na comarca do …… – ……, no período de 19 de Março de 2005 a 19 de Março de 2009.

Considera que não foram observados os critérios legais e regulamentares que regem a classificação dos magistrados do MP e que constam dos artº110, nº1 e 113º, nº1 e 2 do respectivo Estatuto e do artº13º do Regulamento de Inspecções do MP.

A seu ver, só por erro na consideração dos diversos factores a ter em conta na avaliação é que é possível atribuir à Autora uma classificação de “Medíocre”, uma vez que, quer a entidade demandada, quer o Senhor Inspector reconhecem, genericamente, a sua preparação técnica e adequação para a defesa dos interesses públicos colocados a cargo do MP.

Entende que na avaliação o factor quantitativo (gestão do tempo e atrasos nos processos) foi hiperbolicamente considerado, não tendo sido ponderado o devido peso das razões justificativas, por si apresentadas, dos atrasos verificados no andamento dos inquéritos, que reconhece.

Alega que a generalidade dos elementos constantes do processo apontam para uma classificação de mérito quanto às diversas alíneas do nº2 e do nº3 do artº13º do Regulamento de Inspecções, apenas indiciando indicações desfavoráveis quanto às alíneas c) e d) do nº4 do mesmo artº13º.

Ora, por erro de apreciação na subsunção da matéria de facto considerada provada à fórmula de classificação estabelecida na lei, não foram as circunstâncias favoráveis devidamente ponderadas, tendo-se violado a regra da proporção inerente à ponderação das circunstâncias prevista no nº1 do artº110º do EMP e no artº13º do Regulamento de Inspecções.

Para além disso, a atribuição da classificação de Medíocre faz “tábua rasa” sobre o enorme esforço e empenho que a Autora desenvolveu com vista a recuperar os atrasos na movimentação de processos, em condições particularmente difíceis que não podem deixar de ser valorados, matéria que não carece de actividade probatória específica porquanto se encontra devidamente assente no processo instrutor.

Salienta o facto de a deliberação impugnada assentar exclusivamente na consideração de critérios quantitativos e embora reconhecendo genericamente a prestação positiva da autora nos restantes factores, designadamente o apetrechamento técnico da Autora e a sua adequação ao exercício de funções (fls.92 e 93 do relatório final do Senhor Inspector), desconsiderou em absoluto as informações hierárquicas amplamente positivas referentes aos anos de 2004 a 2007, valorizando opiniões bem menos fundamentadas, o que traduz um erro de avaliação e ponderação injustificável e incompreensível.

Salienta também o facto de existirem razões exógenas (do foro funcional e do foro pessoal), que explicita nos artº 49º a 60º da petição e que, refere, determinaram os atrasos censurados e se encontram provadas no processo instrutor, não tendo sido devidamente ponderadas.

Pese embora essas circunstâncias, refere o seu empenho na recuperação do serviço, conforme decorre da análise da estatística mensal e até do relatório de inspecção, embora frustrado entre o final de 2007 e meados de 2008 por ter estado doente, tendo actualmente o serviço em dia.

Refere ainda que entre 2005 e Janeiro de 2008 teve a seu cargo todo o expediente e todas as acções da área de menores, o que determinou um acréscimo de serviço a cargo da Autora, que foi totalmente desconsiderado pelo Senhor Inspector e pela deliberação impugnada. Também não foi dado o devido peso à sua actuação, entre o final de 2005 e Abril de 2009, junto da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo em …….

O acto impugnado desvaloriza completamente o facto de ter existido simultaneamente na comarca de …… uma situação paralela de atrasos por parte de colegas da Autora e que comprova que existiu uma acumulação generalizada de serviço na comarca decorrente da diferença de número de magistrados do MP e judiciais, o que só foi suprido a partir de Setembro de 2007.

Apesar disso, são imputadas à Autora as culpas desses atrasos, quando as intervenções dos colegas, em sua substituição, ocorreram essencialmente entre Janeiro e Maio de 2008 (altura da sua doença) e não poderiam justificar atrasos anteriores generalizados e comprovados. De qualquer modo, reitera que estava em causa um problema sistémico que afectava todo o funcionamento do MP na comarca.

Finalmente, repudia todas as insinuações que foram sendo deixadas ao longo do relatório de inspecção de que as suas faltas não estavam relacionadas com doença.

Conclui, pois, que a deliberação impugnada padece de erro de apreciação indiciador de violação de lei por contrariedade ao nº1 do artigo 110º e ao artigo 113º do EMP, bem como ao artigo 13º do Regulamento de Inspecções e requer a sua anulação.

*Na sua contestação, a entidade demandada pronunciou-se pela total improcedência do pedido.

Embora reconheça que o súbito acréscimo dos juízes auxiliares induziu um aumento do serviço, que a hierarquia não reagiu de imediato, que a responsabilidade delegada na Autora quanto à condução do processo nº 1198/04.04TB…… lhe angariou algum tempo e acréscimo de cuidados e que o acompanhamento de doença grave e prolongada do pai da Autora, que faleceu em 2009, subtraiu, compreensivelmente, tempo e dedicação ao exercício da actividade profissional e que todos estes factores potenciaram perturbações na prestação funcional da Autora, entende que não justificam a sua postura abstencionista, consubstanciada no recurso frequente à falta de serviço, exaustiva e pormenorizadamente analisada no Relatório de Inspecção a fls. 455 a 459, inclusive, do processo instrutor.

O que conduziu a inexoráveis atrasos processuais, de forma continuada, ao longo de meses e anos, dos quais se dá notícia a fls.402 e seguintes do mesmo Relatório.

No que respeita ao âmbito tutelar cível ou educativo, o relatório refere que «apenas uma conclusão é possível extrair: uma prestação eminentemente negativa quer em substância, quer na forma» (fls.449).

Os restantes factos alegados foram devidamente considerados na avaliação, mas não lhes foi reconhecida suficiente carga idónea para justificar a apurada conduta abstencionista.

Quanto à recuperação de atrasos que a Autora imprimiu com o aproximar da inspecção ao seu serviço irreleva no contexto da inspecção que apreciou o seu trabalho em momento anterior, podendo ser considerada numa futura inspecção.

Finalmente, refere a jurisprudência do STA, constante do acórdão de 29.06.2004, rec. 48013, no sentido de que «ao apreciar e valorar o mérito do exercício de funções aos Magistrados do Ministério Público em ordem a atribuir-lhes uma nota classificativa, a Administração goza de uma margem de livre apreciação onde a possibilidade de fiscalização contenciosa se circunscreve aos elementos vinculados do acto e à verificação da existência de erro manifesto ou de adopção de critérios claramente desajustados, não podendo o tribunal, neste contexto, substituir pelos seus os juízos formulados pela Administração.»*Por despacho do então relator do processo, a fls. 42, foi determinado que as partes fossem notificadas para alegações escritas, nos termos do artº91º, nº4 do CPTA, não tendo qualquer das partes apresentado alegações dentro do prazo legal, pelo foram colhidos os vistos dos então adjuntos.

O processo foi, posteriormente, objecto de redistribuição, após o que a entidade demandada veio apresentar as suas alegações, tendo a actual relatora ordenado o seu desentranhamento, por extemporâneas, por despacho de fls. 87, devidamente notificado às partes e já transitado em julgado.

Colhidos novos vistos, dos actuais adjuntos, vêm agora os autos à conferência, para decisão.

*II- OS FACTOS Com base nos elementos constantes do processo instrutor em apenso, consideram-se provados os seguintes factos e ocorrências com interesse para a decisão dos autos: 1. A Autora é magistrada do Ministério Público, com a categoria de procuradora adjunta.

  1. A Autora prestou serviço, nessa qualidade, na comarca do …… – ……., o qual foi objecto de inspecção, determinada pelo CSMP, abrangendo o período de 19 de Março de 2005 a 19 de Março de 2009, tendo por finalidade proceder à sua avaliação e classificação.

  2. Realizada a inspecção, foi elaborado o Relatório Final e anexos, pelo Senhor Inspector que à mesma procedeu, no qual se propôs que à Autora fosse atribuída, pelo serviço referido em 2., a classificação de “Medíocre” (cf. fls. 375 a fls. 571 do processo instrutor, que pela sua extensão aqui se dão por integralmente reproduzidas).

  3. Na resposta à reclamação apresentada pela Autora, o Senhor Inspector manteve a proposta de classificação (cf. fls. 1380 a 1395, cujo teor, pela sua extensão, aqui se dá por integralmente reproduzido).

  4. Por deliberação da Secção do CSMP, datada de 20 de Novembro de 2009, foi atribuída à Autora a classificação de “Medíocre” proposta pelo Senhor Inspector, acolhendo na íntegra os fundamentos apresentados para a mesma no Relatório Final referido em 3.

    (cf. fls. 1401 a fls. 1419 do processo instrutor, que pela sua extensão, aqui se dá por integralmente reproduzido) 6. A Autora reclamou para o Plenário do CSMP que, por deliberação de 19 de Fevereiro de 2010, aqui impugnada, confirmou a deliberação da Secção referida em 4, mantendo, a classificação de “Medíocre” à Autora, com a seguinte fundamentação, que se transcreve: «III- Resulta do...

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