Acórdão nº 6150-06.2TBALM.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução29 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - MARIA M.

e G.

intentaram contra O. - INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, Ldª, acção declarativa de condenação, com o processo experimental, pedindo a sua condenação a pagar-lhes a quantia de € 29.683,00, acrescida de juros vincendos à taxa de legal, desde a citação até pagamento.

Alegaram, para tanto, em síntese: - A A. e a R. são donas de duas moradias geminadas, tendo a R. procedido a obras na sua moradia de que resultaram danos na moradia da A., uma vez que ao demolirem a parede confinante deixaram desguarnecida a parede da moradia da A., o que foi causa de infiltrações decorrentes de águas pluviais durante todo o período em que a referida parede se manteve desguarnecida.

A R. contestou, alegando que iniciou a realização de obras na moradia que adquiriu e que procedeu à demolição da parede que encostava à parede da moradia dos AA., não sendo obrigada a rebocar e isolar essa parede.

Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido e condenar a R. a pagar-lhes a indemnização de € 18.390,95, com juros de mora desde a citação, sendo € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais.

A R. apelou tendo sido revogada a sentença.

Os AA. interpuseram recurso de revista em que concluíram:

  1. A R. causou ilícita e culposamente danos ao prédio dos AA., ao abrir buracos na respectiva parede Sul e ao arrancar, ainda que parcialmente, a tela isoladora que estava colocada sobre parte daquela parede, procedendo em contravenção aos arts. 1347°, 1348° e 1350° do CC.

  2. E também procedeu ilícita e culposamente, porque não assegurou, como devia, a segurança do prédio vizinho no decurso das obras que levou a cabo, violando o disposto nos arts. 128° e 129° do RGEU.

  3. Na verdade, bem sabia a R. que as moradias dela e dos AA. eram geminadas e que era a parede Norte do seu imóvel que assegurava o isolamento da parede Sul do imóvel dos AA., até porque ao demoli-la verificou que esta ficou desprotegida, em tijolo! Deveria pois, mesmo que não construísse logo a sua parede definitiva, tapar os buracos na parede dos AA., rebocar aquela parede, repor nela a tela isoladora arrancada, colocando se necessário uma tela isoladora que a cobrisse por completo, e isto até que reconstruísse a sua parede Norte, isolar devidamente a junção da placa do seu imóvel com a empena dos AA.. Nada fez apesar dos constantes alertas e reclamações dos AA..

  4. Por outro lado a R. iniciou as obras, com a demolição da parede da sua moradia que confrontava com a dos AA. e demais actos referidos nas respostas dadas aos pontos 2.° e 3.° da Base Instrutória, bem sabendo não ter licenciamento camarário para aquelas obras, só tendo parado as obras, numa ocasião em que já a parede da casa dos AA. estava totalmente desprotegida por força dos actos da R.

  5. Não estava a R. impedida de em qualquer altura proceder nos termos indicados na parte final do n° 4 destas conclusões, até porque além do mais não houve qualquer ordem camarária de paragem das obras. Nem naturalmente estava impedida de reparar os danos sofridos pelos AA. e minimizar a sua gravidade, o que não fez apesar das insistências dos AA.

  6. Aliás, a culpa da R. presume-se nos termos do art. 493°, nº 2, do CC, uma vez que os danos resultaram de actividade perigosa, atendendo à natureza dos meios utilizados, desenvolvida pela R.

  7. Incorre a R. pois em responsabilidade civil extracontratual para com os AA., nos termos dos arts. 483°, nº 1, e 486° do CC.

  8. Mesmo que não se demonstrasse culpa da R., o que por mera hipótese académica se admite, sempre deveria ela indemnizar os AA. dos danos sofridos: é que as obras levadas a cabo deveriam respeitar os princípios previstos nos arts. 1347° e 1348° do CC; como tal manifestamente não se verificou, é devida indemnização independentemente de culpa da R. (cfr. arts. 483°, nº 2, 1347°, nº 3, e 1348°, nº 2, do CC).

  9. A indemnização deve restituir os AA. à situação em que se encontravam antes de sofrerem os graves danos patrimoniais e não patrimoniais comprovados nos autos (art. 562° do CC), para o que deverá a R. pagar aos AA. o exacto montante previsto na condenação proferida na 1ª instância, naturalmente incluindo o montante das despesas feitas pelos AA. nos anos de 2003 e 2005 com reparações provisórias e urgentes.

    11. O douto acórdão recorrido violou pois lei substantiva, em concreto os arts. 483°, nºs 1 e 2, 486°, 493°, nº 2, 562°, 563°, 1347°, 1348° e 1350° do CC, disposições que deveria ter aplicado ao caso concreto nos termos supra alegados, devendo revogar-se o douto acórdão proferido pela Relação, condenando-se a R. nos precisos termos da sentença proferida pela 1ª instância.

    Não houve contra-alegações.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    II - Matéria de facto provada (organizada de forma lógica e cronológica): 1. Resulta da compra e venda por escritura pública celebrada no dia 21-4-01 entre L. e a A. que o objecto da venda é constituído por “prédio urbano destinado a habitação composto de casa de r/c e logradouro com a área de 145,085 m2, sito na Praceta J., freguesia e concelho de Almada, inscrito na respectiva matriz sob o art. 2100, com o valor patrimonial de 4.207.500$00, descrito na 1ª CRP de Almada sob o nº 928 da freguesia de Almada, nela registado a favor dos vendedores pela inscrição G-2” (fls. 3 a 6) - G); 2. Encontra-se inscrita em favor da A. a aquisição do prédio descrito na 1ª CRP de Almada sob o n° 928, sito na Praceta J., em Almada - A); 3. Os AA. casaram um com o outro em 27-3-04 no regime de comunhão de adquiridos e, desde 2001, que vivem na mesma casa, partilhando mesa, cama e contribuindo para os encargos financeiros - C) e 1º; 4. Desde Abril de 2001 que os AA. têm permanentemente feito nesse prédio a sua vida familiar, as suas refeições, pernoitando, recebido o correio a eles dirigido e as suas visitas - B); 5. A A. adquiriu a sua moradia em 2001, completamente restaurada e ampliada, tendo os trabalhos sido efectuados pelo vendedor - 58º e 59º; 6. A casa dos AA. é constituída actualmente por 1º andar, além do rés-do-chão - O); 7. No ano de 2003 a R. adquiriu a moradia contígua ao prédio onde residiam os AA. - D); 8. As moradias da R. e dos AA. datam de 1948, tendo ambas sido licenciadas pelo processo camarário n.º 214/48 - H); 9. As duas moradias encostam pela parede Sul da casa dos AA. e parede Norte da moradia da R., sendo que o isolamento da casa dos AA., a Sul, era parcialmente assegurado pelo encosto da moradia da R. - 48º e 52º; 10. Os AA. isolaram a empena exterior da sua moradia para evitar infiltrações na mesma, sendo que a tela de isolamento que os AA. mandaram aplicar cobria a sua parede na parte não abrangida pelo encosto da moradia da R. e dobrava sobre a empena desta - 45º, 46º e 54º; 11. Antes das obras referidas em 12.

    e 13.

    , a empena exterior adjacente à moradia contígua adquirida pela R., na parte não coberta por esta, encontrava-se isolada com tela de alcatrão e alumínio com pintura - 4º; 12. A R. procedeu a obras na sua moradia; procedeu à demolição de uma parte da sua moradia - I) e 3º; 13. Nos meses de Novembro e Dezembro de 2003, a R., sem qualquer conhecimento e sem autorização dos AA., efectuou as seguintes obras:

  10. Arrancou parcialmente, ao nível do 1° andar do prédio em que os AA. residem, uma tela isoladora de alcatrão e alumínio e pintura que isolava a empena exterior adjacente à moradia contígua propriedade da R.; b) Colocou uma placa para construção do piso do 1° andar da moradia sem qualquer protecção ou isolamento na junção ao prédio dos AA.; c) Deixou ao nível do 1° andar do prédio dos AA. a maior parte da superfície da parede do prédio dos AA. com o tijolo à vista; d) Fez na parede do prédio dos AA. vários buracos de grande tamanho que deixaram o interior da casa dos AA. totalmente aberto ao exterior na zona dos referidos buracos; e) Sem proceder ao isolamento do prédio dos AA. - 2º; 14. Quando a R. demoliu a sua parede, deixou a descoberto parte da parede do imóvel dos AA. - 56º; 15. A certa altura, próxima do início das obras, a R. pediu ao empreiteiro para ir a casa dos AA. averiguar da veracidade e dimensão dos prejuízos que estes alegavam - 66º; 16. Após o referido em 13.

    , os AA. pediram à R. que procedesse à reparação da sua parede com a sua restituição ao estado anterior, o que a R. não fez - 5º e 6º; 17. Em 5-11-03, um técnico camarário tinha comparecido no local e verificado que o processo camarário nº 214/98 contemplava os lotes nºs 13 e 14 e que no lote nº 14, casa dos AA., tinham sido efectuadas obras alterando totalmente a fachada e área de construção inicialmente aprovada, sem ter existido o licenciamento das mesmas - 39º, 40º e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT